quinta-feira, 10 de fevereiro de 2005

DICIONÁRIO DE CAMPANHA A DUAS SEMANAS DO FIM



CAVACO PRESIDENCIAL - É a palavra-chave para a noite de 20 de Fevereiro, porque será sob a sua sombra, real e virtual, necessária e ambígua, que o pós-legislativas no PSD se desenrolará. Na melhor das hipóteses, porque haverá uma escola de pensamento que se centrará nas autárquicas como argumento para manter o que resta e não mudar nada, e outra que se centrará nas presidenciais como momento de redenção partidária. Suspeito que esta escolha da sombra não será pacífica.

DEBATE SÓCRATES-SANTANA 1 - Toda a interpretação tem que ser minimalista, logo o resultado é pouco relevante.

DEBATE 2 - Foi pouco interessante, porque o método escolhido favorecia a ausência de espontaneidade, a única coisa que podia valorizar a interacção entre os dois candidatos. Foi pouco interessante, porque ambos têm pouca coisa a dizer para além de "slogans" mais ou menos plastificados e, acima de tudo, não falam normalmente, como as pessoas, nem falam dos problemas, a não ser para os adiar.

DEBATE 3 -Tudo o que Sócrates propõe custa mais dinheiro, tudo o que Santana propõe implica mais despesa. Nenhum diz uma única coisa concreta que pudesse significar uma efectiva redução ou redefinição do peso excessivo do Estado, e, quando o sugerem, aumentam-no noutro lado.

DEBATE 4 - O debate, para o que conta, favoreceu Sócrates junto do eleitorado, porque não o prejudicou, e beneficiou Santana, porque, quando a miséria é muita, qualquer migalha faz falta. No essencial não mudou nada.

FACT CHECKING.ORG - É um tipo de organização que faz falta em Portugal e que pudesse, em tempo útil, um dia ou dois, fornecer elementos sobre a fiabilidade e rigor dos números e afirmações que envolvem factos, do debate, e, por extensão, de toda a campanha.

FINANCIAMENTO DAS CAMPANHAS - Para haver maior transparência dos gastos de campanha era importante saber quais são as empresas a trabalhar para cada partido em áreas como a publicidade, "marketing" e relações públicas, consultadoria de campanha, montagem de palcos e contratação de artistas, colocação de cartazes, transportes e empréstimos de viaturas, etc.

GUTERRES - Apareceu em força na campanha do PS. É um erro clamoroso, dado que Guterres é um dos políticos portugueses cuja mera presença lembra sempre a fuga às responsabilidades e uma má governação, exactamente a sombra que o PS não deveria querer para a sua campanha.

HÁ COISAS QUE NÃO SE PERCEBEM e uma delas é por que razão Santana Lopes abriu um conflito com Bagão Félix com o argumento de que não poderá voltar a fazer parte do seu governo ,porque já faz parte de "outro". E Portas, Nobre Guedes e Telmo Correia também estão excluídos?

JOTAS - As "jotas" são a tropa de choque das campanhas, já menos do que o que foram, mas o bastante. Hoje os idosos também são tropa de choque, porque servem para ir de comício em comício, como as excursões da terceira idade.

JOTAS 2 - A verdadeira "jota" é a JSD. Gostaria de saber se finalmente se acabou com o péssimo hábito de lhes pagar uma espécie de salário diário pelos serviços em campanha, verdadeira corrupção do militantismo político.

O MEU É MAIOR QUE O TEU - Como todas as competições para os pobres de espírito, enganadoras, simples, fáceis, o truque da comparação dos comícios de Castelo Branco resulta sempre. Os jornalistas vociferam nas suas páginas de opinião contra a falta de "novidade" deste tipo de campanha, mas fazem a cobertura noticiosa a partir desses mesmos factores que consideram obsoletos.

OBJECTIVOS PARA O PS - Maioria absoluta. Não estão a fazer campanha para isso, mas as coisas estão tão mal do lado do PSD, que lhes pode cair o resultado nos braços.

OBJECTIVOS PARA O PSD - Ganhar as eleições, colocando a hipótese de ter maioria absoluta, é o único objectivo aceitável para o PSD. Reconhecendo isso, Santana Lopes já o afirmou, mas o problema é que ele afirma várias coisas ao mesmo tempo e depois, quando é preciso, só lembra a que lhe interessa. Qualquer "downgrade" deste objectivo, como tenho visto na boca de alguns jornalistas incautos, considerando 30 por cento o limiar de um razoável resultado do PSD, ignora o histórico eleitoral nos últimos 20 anos. Antes é arqueologia, não serve de comparação. Desde Cavaco Silva, queira-se ou não, o objectivo natural do PSD é a maioria absoluta. Foi, aliás, o que Durão Barroso pediu nas últimas eleições legislativas, para ficar perto desse objectivo. Resultados abaixo de 40 por cento afastam decisivamente uma liderança que foi "vendida" ao partido como garantia de vitória eleitoral. Outros suportariam resultados medíocres, Santana Lopes, o do "karma" eleitoral, desde a Figueira só pode ganhar, até porque nunca nenhuma eleição foi tão personalizada. Ao escolher fazer propaganda de si próprio mais do que do PSD, Santana Lopes colocou-se num plebiscito que ele mesmo provocou.

OBJECTIVOS PARA O PCP - Pela natureza destes dias de fim do comunismo, tal como o conhecemos, o PCP está de há muito tempo em "dire straits". Mas Jerónimo de Sousa trouxe ao PCP uma personagem apaziguadora, mais moderado do que muitos pensaram, mais simpático para a opinião pública do que muitos anteviram (certamente muito mais do que o agressivo moralista Louçã). O PS terá aqui uma reserva para governar mais sólida do que o BE, caso não tenha maioria absoluta. O PCP é mais confiável e menos errático do que o BE, e hoje muito mais moderado. Convém não esquecer que sem o beneplácito do PCP não teria havido acordo social entre os sindicatos e o patronato.

OBJECTIVOS PARA O PP - Depois da parada pessoal de Santana Lopes, a parada do PP é a mais arriscada destas eleições. O PP não está a fazer campanha para ser partido de governo (sabe que não o será, dada a derrocada do PSD), mas sim para sobreviver. Não parece mas é. Há que reconhecer que o faz bem, tendo para já conquistado uma complacência elogiosa da comunicação social como de há muito não tinha. Os órgãos de comunicação social ignoram benevolamente que o PP é o partido que mais está a usar o Estado (no seu topo, o Governo), para ganhar votos, com a agenda ministerial de Paulo Portas, Nobre Guedes e Bagão Félix subordinada à campanha.

"O SENHOR SILVA DEVERIA SER EXPULSO DO PSD" - O "senhor Silva" é Cavaco Silva e o autor da frase é Alberto João Jardim. Está tudo dito quanto ao que vai acontecer depois de 20 de Fevereiro. Uma pequena guerra civil, obra de Santana Lopes.

José Pacheco Pereira