terça-feira, 17 de maio de 2005

CORRUPÇÃO UMA DEMOCRACIA ANESTESIADA ?

Há uma semana que os diários, semanários, televisões, rádios, locais de trabalho, cafés e a rua têm por assunto o tráfico de influências e a corrupção. Hoje, como ontem, a indignação popular desgraçadamente descarrega-se em julgamentos na praça pública. Reacção fácil de compreender, à míngua de investigações conclusivas, quanto mais de julgamentos nos tribunais. Por omissão ou deficiência da investigação, por ausência de cooperações essenciais, por falta de meios, disto ou aquilo, por milagrosa e salvadora prescrição legal. As pessoas têm direito à presunção de inocência. Mas o sistema político, pelas provas dadas e resultados alcançados ao longo de 30 anos, não têm qualquer direito a essa presunção. Em tese geral, tem sido gravemente negligente, o que já não é pouco. Mas em vários e repetidos casos, terá sido provavelmente conivente. Ou desfrutador parcial de ilícitos, numa perspectiva bem mais realista que ninguém poderá recusar, em nome da verdade.

A habitual reacção do sistema político a este tipo de sobressaltos tem--se limitado a um rosário de banalidades e clichés que procuram demonstrar o mais profundo respeito pela democracia e pelo Estado de direito, mas que na realidade o ofendem gravemente.

As reacções do cidadão comum e do corpo político são opostas.
No primeiro caso é cada vez mais e forte a certeza de que as instituições democráticas não têm vontade de combater a corrupção. Essa acusação vai directamente para os partidos e os políticos que moldam o ambiente administrativo, jurídico e político em que essas instituições exercem as suas competências. Para mais, são eles que escolhem e comandam os dirigentes que aplicam os seus poderes, fintando habilidosamente a lei ou a boa prática aplicável. Pelo contrário, o corpo político faz questão de mostrar confiança inabalável na capacidade das instituições democráticas para assegurar os princípios do Estado de direito contra a corrupção.

Curiosamente, onde o povo desconfia e desespera quase sem limite, o corpo político confia inabalavelmente. Este autismo do corpo político, a continuar, tem forte probabilidade de levar a uma espécie de italianização, à portuguesa, como referi em crónica já antiga.

Como vai reagir o nosso sistema político a esta nova tempestade?
Os primeiros sinais não prometem comportamento muito diferente, como sublinhado por editorialistas e comentadores. Cito dois, por todos.
Em editorial no DN de sexta-feira passada, escreve Raul Vaz "A verdade é que o Estado vive um momento de rara conflitualidade, sem que o poder político saia da toca para se indignar. Não há um dirigente partidário que fale, um político que se atreva, um candidato que se atravesse". Por sua vez, Fernando Madrinha, num texto extremamente elucidativo do Expresso de sábado, diz-nos que "os cuidados com que os dirigentes partidários do chamado arco do governo - PS, PSD e CDS - têm abordado o caso dos sobreiros de Benavente são compreensíveis cautela e caldos de galinha nunca fizeram mal a ninguém e são até muito aconselháveis em situações destas, porque quando se destapa uma panela a ferver muita gente se pode queimar. E assim, enquanto se declara solidariedade, se manifesta confiança na justiça ou se afirma uma vaga e formal convicção de que tudo se há-de esclarecer - acrescentando sempre que os suspeitos são pessoas de bem e têm direito ao bom nome, que tudo não deve passar de um equívoco, mas a justiça dirá, etc. e tal -, ganha-se tempo para não se dizer nada que comprometa. É neste jogo de palavras um pouco hipócrita que se resumem as reacções políticas oficiais ao caso CDS/BES e sobre elas pouco haverá a dizer".

Pouco mais a dizer?
É que se os partidos continuarem a tratar tão irresponsavelmente a corrupção tentacular que grassa em Portugal, então nada mais poderemos esperar para o futuro que uma democracia anestesiada ou sonâmbula a caminho da sua própria implosão.

Que todos os partidos se convençam de que é absolutamente inadiável uma política sistémica anticorrupção, controlada democraticamente pelo Parlamento e pela opinião pública.
É já uma vitalíssima questão de regime.
Nada, nem sequer o défice, poderá reduzir essa prioridade das prioridades. Aliás, o combate sistémico à corrupção é condição fundamental de eficaz consolidação das finanças públicas, em si mesma e pelo poder reflexo do efectivo respeito pelo Estado de direito. Sócrates tem aqui o mais difícil desafio do seu Governo.

João Cravinho

4 Comments:

At 17 de maio de 2005 às 12:01, Anonymous Anónimo said...

Ontem na rtp1, no programa prós & contras, tivemos uma fotografia real da corrupção que se alastra em Portugal.
O Isaltino Morais, brindou-nos com um discurso de m..., próprio de alguns autarcas corruptos, que dirgem as câmaras de Portugal, não foi capaz de responder a nenhuma das questões do Prof. Saldanha Sanches.
Se o caso fosse a câmara municipal de Ponte de Sor, o debate devia ser lindo.
Com os casos divulgados aquí e alí, vai ser necessário um tribunal inteiro para julgar os casos e podem importar um super juiz.

João Prates

 
At 17 de maio de 2005 às 15:50, Anonymous Anónimo said...

Chamadas eróticas;
Obras em casa de primos;
Pedido de dinheiro para aprovar obras;
Pedido de mais valias patrimoniais para aprovar loteamentos;
Extinção de serviços com a retirada de funcionários;
Milhões gastos em obras a mais e em prolongamento de execução de obras municipais;
E muito mais.
Em 8 de Outubro de 2005, está na mão dos Pontessorenses, acabar com isto tudo.

 
At 17 de maio de 2005 às 18:04, Anonymous Anónimo said...

É proibido os jornais locais serem subsidiados pela Câmara. Mas o jornal Ecos do Sor é subsidiado directa e indirectamente. Directamente, com um subsídio mensal a fingir de publicidade e indirectamente através do pagamento ao Albuquerque, a fingir que é para outros trabalhos. Mas não estivesse ele no Ecos do Sor... Para bom entendedor, meia palavra basta.

 
At 18 de maio de 2005 às 10:09, Anonymous Anónimo said...

Ao anonimato e à calúnia devemos dar-lhe o valor que tem... Mas neste caso e em particular tenta-se sujar o meu nome e o da minha família...
Mas meu amigo se está certo do que escreve vamos com isso para a frente, dê a cara, faça queixa a quem de direito, porque eu estou cá para resolver as coisas consigo.
Tenha coragem, não se esconda cobardemente atrás do seu PC.
Fernando d'Albuquerque

 

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