DICIONÁRIO DO FIM / DICIONÁRIO DO PRINCÍPIO? (1)
Rui Pimentel/VISAOONLINE
QUE FAZER?
- O que é que se pode fazer? Tudo ou quase tudo. Ou nada ou quase nada. Fará toda a diferença.
ABRIR PORTAS ABERTAS
- Parece que agora há quem peça muito "tempo", muita "calma", para se "analisarem" os resultados do PSD, como se houvesse qualquer mistério teórico à sua volta. Não há: a derrota do PSD, com fuga de votos para todo o lado, para o PS, para a abstenção, para o voto em branco, mesmo para a CDU, só tem uma razão que todos intimamente conhecem mesmo que não queiram nomear: as eleições foram um plebiscito a Santana Lopes. E como é que podia ser de outra maneira, se o partido nada mais lhe deu do que a figura obsessiva do seu líder e das suas idiossincrasias pessoais? Será que ninguém viu, quando se passava o "menino-guerreiro" e se recebia aquela carta "contra o sistema" e que pedia o voto por favor pessoal, que um partido como o PSD não podia nunca fazer isto e que era a sua credibilidade como grande partido nacional que era deitada fora?
ABRIR PORTAS FECHADAS
- Se desejam fazer uma reflexão séria - e que bem precisado está o PSD! -, é tentarem perceber como é que isto aconteceu, como é que o programa (escrito e não escrito) do partido pôde ser tão impunemente violado, pela deslocação do PSD à direita, colado ao PP, esmaecendo a sua identidade histórica e o legado de Sá Carneiro, perdendo o "lugar" do centro reformista para se apresentar sem pudor como "partido de direita", como é que se apostou num populismo e no culto de personalidade apenas pelo desejo de conservação do poder a todo o custo, como é que se caminhou para a primeira campanha negativa da história do PSD com a sua componente de ataque à dignidade do adversário, como é que se deixou degradar a direcção partidária e o grupo parlamentar aos amigos de confiança pessoal do líder, com cada vez menos qualidade no discurso político e firmeza na condução estratégica. Estes são aspectos interessantes de se discutir, e aqui é que se podem abrir novas portas com utilidade.
BASES / BARÕES
- Esta é uma dicotomia que ajuda mais a confundir do que a esclarecer. Nem hoje há "bases" como no passado, independentes de interesses, de "lobbies" de secções, de arregimentações várias, nem os "barões", os "notáveis", que tanto são exorcizados, existem hoje como no passado. Há "bases", mas essas "bases" são os militantes, os simpatizantes, os eleitores que apoiam o seu partido por razões de escolha política e pouco frequentam as secções. Aqueles que aparecem a falar pelas "bases" são quase sempre os permanentes das secções ou os dirigentes que usam o nome para se legitimarem eleitoralmente. A esses é que a palavra "barões" se devia aplicar, visto que são chefes de sindicatos de votos que lhes servem para negociar lugares para si e para os seus. A diferença entre estes novos "barões" e os antigos é que nos primeiros dez, 15 anos, do partido os "barões" originais acumulavam influência eleitoral dentro do partido e na sociedade e os "barões" actuais não têm qualquer prestígio, credibilidade social e profissional, ou influência para além das paredes das secções. Pessoas como Manuela Ferreira Leite, Carlos Encarnação, Rui Rio, Aguiar Branco, Álvaro Barreto, Rui Machete, Balsemão, Cavaco Silva, Teresa Patrício Gouveia, Marcelo, e muitos e muitos outros, são um capital precioso para o partido, não pelos votos que controlam, mas pela influência social que têm. O antielitismo que caracterizou a direcção de Santana Lopes, de que a candidatura Menezes é sucessora, é o prolongar do desperdício das vozes sociais-democratas que mais autoridade têm na sociedade. É não ter percebido nada do que se passou e querer continuar a errar.
DIRECTAS
- É também por isto que é necessário caminhar para eleições directas, para mecanismos que favoreçam a maior participação dos militantes nas escolhas decisivas, diminuindo o peso dos sindicatos de votos. Estes sindicatos, a começar pelos da JSD e dos TSD, mas a acabar nos de distritais que hoje são controladas eleitoralmente por votos oriundos de determinadas secções onde há um número absurdo de filiados cuja única vida partidária é votar e cujas quotas são pagas pelos presidentes da secção. Medidas da "refiliação" de Rio, como o pagamento individualizado e pessoal das quotas, que foram abandonadas, devem ser introduzidas para haver maior lisura nos actos eleitorais. Talvez não seja possível neste processo actual tomar essas medidas, mas uma liderança que se comprometesse a avançar neste sentido e a relegitimar-se com as novas regras poderia obter aí a força que necessita para atravessar estes anos de oposição.
CANDIDATURAS
- Quantas mais melhor, porque o unanimismo é mau conselheiro e umas candidaturas "limpam" as outras. Das duas que se conhecem no momento em que escrevo, a de Marques Mendes tem o mérito de ser uma resposta directa à situação de 20 de Fevereiro, numa altura em que ninguém ainda sabia o que ia acontecer, e revelou coragem. Hoje parece fácil, mas não o era de todo naquele dia. A de Menezes é uma candidatura de continuidade com a direcção de Santana Lopes, assente numa variante do mesmo populismo com outro figurante. No entanto, ao fixar na sua candidatura uma parte dos responsáveis pela actual situação pode facilitar a ruptura que a candidatura de Marques Mendes tem que ser, para mudar alguma coisa. É este o principal problema político de Marques Mendes: não pode querer unir tudo, porque senão não muda nada, nem, a prazo, une verdadeiramente alguma coisa. Marques Mendes tem uma oportunidade única para ter sucesso: credibilizar o partido e isso vem de fora para dentro, através da influência social e política e não por arranjos internos.
TRANSITÓRIA OU DEFINITIVA?
- Será a próxima liderança do PSD condenada a ser transitória e de passagem? Penso que não e penso que é errado entende-la "a priori" com este destino. Tudo depende do que disse no ponto anterior: credibilizar o partido da sociedade para dentro. Se o conseguir, terá sucesso, mesmo no deserto dos anos sem poder.
RECONSTRUIR A OPOSIÇÃO
- O papel central de qualquer direcção que saia do próximo congresso é reconstruir uma capacidade de oposição política ao Governo socialista. Para essa reconstrução, o centro da oposição deveria ser o grupo parlamentar. Devido às vicissitudes da sua formação e à sua fragilidade, é natural que uma parte importante dessa oposição deva deslocar-se para o partido, o que aliás pode ser visto como uma grande oportunidade para o renovar. Desde o princípio deveriam ser constituídas equipas sectoriais, abertas a independentes, assentes no mérito profissional e político, e cujo trabalho possa ser medido. Caso essas equipas falhem e a influência do partido numa determinada área continue inexistente, essas equipas e os seus responsáveis devem ser substituídos. Praticamente tudo tem de ser construído de novo, para levar o partido, e a visão da social-democracia portuguesa às escolas, às universidades, aos centros de investigação, às empresas, a todos os sítios onde se forjam os novos "self-made man" que são a base social do PSD.
(Continua)
José Pacheco Pereira
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