terça-feira, 2 de agosto de 2005

Ctrl + Alt + Del


É bom ter ambição. É estimulante ver governantes com essa atitude. Fixar metas revolucionárias. Ajudar a imprimir o ritmo. Dar um bom exemplo é a primeira condição para se construir uma boa reputação. O programa «Ligar Portugal» deve ser aplaudido. Essencialmente por isso. O Governo quer mobilizar a sociedade para a internet. Tal como muitos governos fizeram a expansão da rede eléctrica ou de saneamento básico.

Essa é uma responsabilidade do Estado. Que os socialistas assumem, ao mais alto nível, com o primeiro-ministro a dar a cara, a empenhar a sua imagem na difusão de uma causa.

Guterres chamava-lhe «desígnio nacional».

Sócrates apenas diz que «compete ao Estado ter uma visão para que as tecnologias de informação e da comunicação cheguem a toda a sociedade». Tudo bem.

Até se justificam benefícios fiscais, desde que transitórios, para baixar preços de equipamentos.

Até se apoiam as preocupações levantadas pela falta de concorrência em Portugal, com o objectivo de baixar preços de telecomunicações.

E até se compreendem medidas voluntariosas, como a de promover uma espécie de «Feira da Ladra» dos computadores em segunda mão.

Só que há mais, muito mais, que o Estado pode e deve fazer pela inovação em Portugal. Agora que parece ter abandonado a via errada - ser o Estado a criar emprego científico, ser o Estado a criar laboratórios de I&D, ser o Estado a criar sociedades de capital de risco para a inovação - então que o «Ligar Portugal» seja aquilo que deve ser.

Desde logo, a pedagogia: a massificação da internet é insuficiente para o progresso social e económico da nação. A internet e a tecnologia são uma forma de pressionar a mudança. São um simples meio para o choque cultural das empresas, das famílias, dos agentes educativos. Jamais o fim, em si mesmo.

Sócrates deseja mobilizar, entre recursos públicos e privados, 2.500 milhões de euros para facilitar o acesso à tecnologia. É uma verdade que pode verificar na própria administração pública.

O Portal do Cidadão existe para facilitar, agilizar e conferir à burocracia uma capacidade formidável: responder em «tempo real». O sonho de qualquer cidadão e de qualquer empresa. Um choque de produtividade para a economia.

Mas isso não é garantido por uma boa página na internet.
O choque vem a seguir:
com o fim dos «silos» de funcionários desmotivados;
com a sua transformação em «redes colaborantes»;
com o mercado a pressionar, constantemente, de fora para dentro, a inovação da administração pública.

O primeiro-ministro, que entre outras qualidades é teimoso, garantia este fim-de-semana que «era destes projectos que falávamos, quando falámos em Plano Tecnológico». Olhe que não, senhor engenheiro. No Plano, o Estado era o centro do processo e a UMIC condenada à morte.

O «Ligar Portugal» propõe mais ambição, não a morte, de algo que correu muito bem nos últimos três anos.
O ministro Gago já fez esse acto de contrição: Ctrl, Alt, Delete - o movimento correcto para um Plano feito com bons princípios, porém totalmente equivocado desde o princípio.

Sérgio Figueiredo