sexta-feira, 21 de julho de 2006

ESTAMOS NO VERÃO?

Sócrates florescem os enigmas: a administração pública engordou ou emagreceu como prometido?

O «Diário Económico» diz – citando o boletim da Direcção-Geral do Orçamento - que no primeiro semestre deste ano entraram no «pay-roll» da função pública 22 420 pessoas, contra 12 245 saídas por aposentação.
Em maré de contrariedades, o Governo reage: é mentira!
O que acontece - diz o secretário de Estado da Administração Pública – contraria a informação, uma vez que «apesar da actualização de 1,5% em 2006, houve uma diminuição de 1,2% da massa salarial», facto que, conclui o Governo, constitui um sinal de que o volume de trabalhadores está a diminuir.
Será assim ou há uma razão que explica o enigma: a massa salarial dos que saíram, tendencialmente em fim de carreira, supera significativamente os custos daqueles que entraram.
Será?
Em maré de enigmas, o Governo começa a ser obrigado a explicar-se: o número exacto de funcionários públicos só seria conhecido no final do ano; horas depois o ministro das Finanças avançava um número - 580.291.
Mas o ministro refere-se apenas à administração central.
Quando Sócrates prometia uma nova era, de rigor e transparência, garantia que por cada dois funcionários que deixassem o Estado entraria apenas um.
Moral da história: no fim do ano continuar-se-á sem saber o número exacto de funcionários públicos. Sócrates não desfaz o enigma. E promete ser o pai de uns quantos mais.

P.S. A polémica que envolve a ministra de Educação é o primeiro caso de evidente má gestão da comunicação no Governo Sócrates. E é grave porque atinge uma das referências da equipa. Afinal, o mestre da comunicação também falha. Ou será que a comunicação não chega para disfarçar tudo?

Raúl Vaz

6 Comments:

At 21 de julho de 2006 às 14:51, Anonymous Anónimo said...

A manchete de ontem do Jornal de Negócios deu que falar.
É natural: uma redução de 23% na reforma dos que hoje têm cerca de 35 a 40 anos não é coisa pouca. O Governo desmentiu.
O Jornal de Negócios mantém.
E como a coisa se passa no campo da matemática é sempre mais fácil berrar do que explicar para conseguir convencer.

O Jornal de Negócios prefere explicar.
É o que faz de novo, hoje ainda com mais detalhe, para que o leitor tenha a informação que necessita para decidir.
É, também, aquilo que o Governo não faz: não dá todos os dados aos jornalistas, aos deputados, aos parceiros sociais – aos portugueses.
É uma opção.
Mas não é a melhor opção. E dizer que é impossível prever dados para as próximas décadas é atenuante mas não é desculpa.

A reforma da Segurança Social ainda nem iniciou o processo legislativo mas o Governo já dá o figurino como quase definitivo. Por isso, é nesta altura já uma obrigação (política e moral) prestar toda a informação para que qualquer português possa perceber o que lhe vai suceder.
Há uma razão para que o Jornal de Negócios simule o que acontece a quem se reforme em 2030 e não o faça para quem se reforme em 2033 ou em 2027: é que a parca informação que foi revelada só permite fazer o cálculo para 2030...

O secretário de Estado da Segurança Social, Pedro Marques, apressou-se a ir à RTP dizer que o Jornal de Negócios estava errado. E preferiu afirmar que as pensões de quem se reformar em 2030 vão é aumentar 35%.
Com a verdade me enganas.
Estes 35% são a comparação entre o que um pensionista médio recebe hoje e o que vai receber no futuro.
Mas com mais anos de contribuições e outras expectativas salariais.
A comparação que o Jornal de Negócios entende como pertinente é também outra: é entre o que um pensionista receberá em 2030, perante as novas regras, e o que receberia se as regras se mantivessem como estão agora (e portanto sem compensar com mais anos de trabalho): menos 23%.

A diferença entre os +35% e os -23% não é matemática.
É de pressupostos.
É de seriedade.
Se é verdade que as pensões aumentam 35% com as novas regras, elas aumentariam quase o dobro se nada mudasse.

O Governo fez uma proposta para reformar a Segurança Social corajosa, até engenhosa, competente e que tem o mérito de produzir efeitos para além dos ciclos de vida políticos.
Pela primeira vez, este ano as despesas vão ser superiores às receitas e é neste contexto que esta reforma se assume como inadiável.
Mas não há como negar: ou se trabalha mais tempo ou se recebe menos na reforma. E não havia outro caminho - excepto pagar mais impostos.

Mas o mesmo Governo que quer ficar com os louros da grande reforma não deve esconder o custo que ela comporta.
Este é um assunto delicadíssimo na vida das pessoas.
Elas têm o direito de perceber o seu caso pessoal. E isso o Governo não dá.
Quando muito, dá exemplos. Desmente pressupostos sem explicar os seus.
Liberta informação parcelar, incompleta, insuficiente. E assim dificulta a discussão esclarecida. Mas o assunto é demasiadamente importante para que não coloquemos questões e façamos o nosso trabalho de casa.

O que interessa não é o desmentido do secretário de Estado ou o brio profissional do jornal.
É a informação esclarecida a que todos os pensionistas, actuais e futuros, têm direito.
As contas do Jornal de Negócios prestam.
As contas do Governo, Pedro Marques não presta.

 
At 21 de julho de 2006 às 16:26, Anonymous Anónimo said...

Acho que ontem foi uma das raras vezes que ouvi um ministro das Finanças falar de Recursos Humanos, o que é um grande progresso, nos funcionários públicos manda-se enquanto os recursos humanos gerem-se.

Mas à mudança terminológica não correspondeu até ao momento qualquer medida que traduza preocupação com a gestão dos recursos humanos da Administração pública, aliás, a forma como este governo, bem como os que o antecederam, tratam os recursos humanos do Estado revela um total desprezo pelas mais elementares normas de gestão. Aliás, esse desprezo pelas normas de gestão dos recursos é ele próprio uma norma, a norma do Estado.

Para não sair do ministério das Finanças sugiro ao ministro que chame ao seu gabinete os responsáveis pela gestão de recursos humanos do seu ministério e lhes faça umas perguntas de surpresa. Pergunte-lhes, por exemplo, qual a taxa de absentismo e as suas causas, ou como evoluiu essa taxa nos últimos anos, ou quais as estratégias adoptadas para as reduzir. Pergunte-lhes quanto tempo os directores-gerais já dedicaram a essa temática, que orientações adoptaram, que resultados foram obtidos.

Se não quiser incomodar os dirigentes então que leia os relatórios de actividades e os balanços sociais e verifique se revelam uma gestão dinâmica dos recursos humanos ou se não são feitos copiando-os de uns anos para os outros.

Saberá o ministro que níveis de produtividade tem no seu ministério e quais os que seriam alcançados com uma boa gestão dos recursos humanos? Saberá o ministro quantas horas de trabalho perde a Administração Fiscal diariamente só porque a RITA não funciona e quantos funcionários/ano isso representa?

Duvido que este ou qualquer outro ministro ou mesmo os directores-gerais saibam seja o que for sobre o tema. Neste capítulo a Administração Pública é um péssimo exemplo para o país.

Talvez o ministro não saiba, mas pouparia muito mais com uma boa gesto dos recursos do que com muitas das medidas que tem adoptado, começando pelo próprio Prace.

 
At 21 de julho de 2006 às 16:35, Anonymous Anónimo said...

O falhanço do Governo é claro: por cada funcionário público que deixou os quadros do Estado nestes últimos seis meses, dois novos foram admitidos. Mais simples: há hoje mais 10 mil funcionários públicos em Portugal. Em vez de emagrecer, o Estado engordou novamente.

Podiam agora alinhar-se uma mão cheia de desculpas (justificadas) para explicar este desaire. Como se podia, apenas, valorizar este número impressionante apenas como uma promessa que não se cumpriu. Mas há um outro ângulo de visão. Diz assim: Sócrates insistiu (e insiste) que as funções do Estado não estão em discussão. Isto é, o primeiro-ministro acredita que é possível reformar o monstro por dentro. Reeducá-lo lentamente. Os números provam que está enganado. O monstro, mesmo quando o aprisionam entre quatro paredes, cresce por dentro. É verdade: este não era seguramente o desejo de José Sócrates. Mas este foi o resultado da sua escolha política.

O que permite reforçar aqui uma convicção antiga (e alarmante): é o mecanismo de escolha pública em Portugal - seja qual for o Governo no poder - que explica este aumento constante da máquina pública e, pior, do seu peso sobre a economia. O raciocínio não é inovador, e sustenta-se nas teorias do Nobel da economia James M. Buchanan, “guru” da teoria da Escolha Pública. Uma das suas conclusões é reveladora: grande parte dos gastos e excessos da administração pública explica-se, simplesmente, pelos interesses económicos que caracterizam esta nova classe - a das burocracias governamentais.

Na prática, esta teoria significa que as administrações públicas só conhecem um método de responder aos desafios - engordando as suas estruturas. Porquê? Porque cada nova decisão (supostamente necessária) implica a criação de um novo grupo de trabalho, de uma nova equipa de estudo, de um novo departamento público. E como a Constituição não permite despedimentos, contratam-se novos funcionários.

O que facilita a conclusão: se Buchanan estiver certo (como seguramente estará), reformar o Estado sem discutir primeiro as suas funções nunca produzirá resultados agradáveis. Dito de outra forma: enquanto se mantiver a convicção de que o Estado tem uma palavra a dizer em toda a sociedade (da educação à indústria, do turismo à saúde, etc), este perverso mecanismo das burocracias governamentais continuará a atraiçoar sucessivos Governos. Pelo que a alternativa é simples: focar o Estado naquilo que faz melhor do que ninguém e encerrar o Estado naquilo em que não cria valor para a sociedade.

 
At 23 de julho de 2006 às 18:39, Anonymous Anónimo said...

AFINAL SEMPRE SÃO 750.000

Os funcionários públicos:

«Aos 580 291 funcionários públicos referidos esta semana pelo ministro das Finanças na Assembleia da República há ainda a somar todos os trabalhadores das administrações Regional e Local. Esse número não foi disponibilizado pela equipa de Teixeira dos Santos por estar ainda a ser apurado, mas tudo aponta para que, no total, os funcionários públicos rondem as 750 mil pessoas - contra cerca de 730 mil, em 1999.»

In: Jornal de Notícias
Pergunte-se ao ministro das Finanças se também vai contabilizar os assessores do Carmona.

 
At 28 de julho de 2006 às 14:37, Anonymous Anónimo said...

A falta de número
O ministro das Finanças corrigiu a Direcção Geral do Orçamento (a DGO), dizendo que os números divulgados sobre a admissão de funcionários públicos estavam errados.

Melhor: que estavam pouco rigorosos. Para quem não sabe, a DGO é um departamento do ministério das Finanças criado, justamente, para trazer rigor e detalhe ao controlo das contas públicas.

Dito de outra forma: a DGO, que existe para ser rigorosa, terá falhado (segundo o ministro) num assunto tão delicado como o saldo que resulta da entrada e da saída de funcionário públicos no primeiro semestre deste ano. O assunto é grave.

Primeiro: os valores da DGO explicavam que, nesses mesmos primeiros seis meses, tinha dado entrada na Segurança Social 22.420 funcionários públicos. E dizia, logo a seguir, que Portugal tinha 12.254 novos pensionistas. A conta era bem simples: 22.420-12.254 = 10.166. Fê-la o Diário Económico, em primeira-mão, e logo a seguir a oposição, forçando Teixeira dos Santos a ir ao Parlamento explicar-se porque tinha o Estado contratado 10.166 novos funcionários públicos. As contas que o ministro levou à sessão de justificação na Assembleia concluíam, porém, que estes números resultavam da falta de rigor da DGO.

Segundo: Dessas 22.420 novas entradas, disse o ministro, 2458 não são funcionários públicos. Depois, há 8029 que estavam inscritos por duas vezes na segurança social. Finalmente, 5084 desistiram dos empregos. O novo saldo de entradas transformou, assim, 22.420 novas entradas na Função Pública em 6849. Cerca de três vezes menos do que os dados originais.

Terceiro: É espantoso que um organismo criado para trazer rigor à análise das contas públicas as faça assim, em cima do joelho, contabilizando 2458 salários que não tem de pagar, registando duas vezes 8029 dessas pessoas e esquecendo-se de retirar os 5084 que, pelo caminho, desistiram do emprego. Diz muito sobre o Estado e o governo desse Estado.

Quarto: um país sem estatísticas rigorosas é um país que não se conhece. Joseph Stiglitz, Nobel da economia, explicou que quando a informação disponível é assim, assimétrica, gera situações em que os vários jogadores cometem erros sistemáticos de avaliação. E disse que isso é grave porque limita a liberdade - as pessoas não têm toda a informação necessária para escolher bem. O Governo sabe-o. Stiglitz é um autor muito querido entre os socialistas. Mas também sabe que a falta de rigor permite, como neste caso, baralhar todos os números para os dar de novo. Só que o mesmo Stiglitz sublinhava: quando o sistema não se altera, chega um momento em que ninguém acredita em ninguém.

 
At 28 de julho de 2006 às 14:40, Anonymous Anónimo said...

O valor da Administração Pública
Em lugar da obsessão com o número de funcionários públicos importa saber qual o valor gerado por cada serviço público.

O número de funcionários públicos voltou a ser notícia recentemente, a propósito de um novo aumento do seu número e da necessidade de novas contratações serem aprovadas pelo Ministro das Finanças.

Embora reconhecendo que a massa salarial da função pública é um dos factores de desequilíbrio das contas públicas, e que é essencial uma redução da despesa pública, centrar a discussão no número de funcionários públicos é bastante redutor.

É verdade que custa, em vários sentidos, ter uma Administração Pública que não sabe quantos funcionários possui. Sabendo-se que esses funcionários são pagos, a falta de informação sobre o seu número exacto só pode ser resultado de descoordenação e falta de comunicação dentro da própria Administração Pública.

Estará então a solução numa maior centralização (como parece ser o caminho apontado pelo novo processo de admissões que pretende ser seguido) ou por um novo sistema informático central de processamento de vencimentos (magnífico, certamente, se alguém o propuser)?

Dificilmente se alterará algo, na minha opinião, indo por esse caminho. Em lugar da obsessão com o número de funcionários importa saber qual o valor gerado por cada serviço público. E depois realizar as transferências para cada serviço de acordo com esse valor gerado, independentemente do número de funcionários. Se o valor gerado for insuficiente para manter os níveis salariais a todos os funcionários do serviço, duas soluções são desde logo possíveis: cada um aceita uma menor remuneração a troco de emprego para todos, ou a direcção do serviço terá de gerir os seus recursos humanos, fazendo-os criar mais valor ou reduzindo o seu número.

Um sistema deste tipo apresenta diversas vantagens: dispensa a necessidade de saber quantos funcionários tem cada serviço como instrumento de gestão ao nível do Ministro das Finanças; torna cada serviço mais sensível à importância de criar valor para a sociedade, e não apenas interessado em aumentar o número de funcionários como forma de “garantir orçamento”; levará ao desenvolvimento de uma cultura de serviço ao cidadão, como parte do processo de criação de valor, em lugar de uma cultura centrada nos e para os funcionários; a avaliação de desempenho dos funcionários deixará de ser uma imposição vinda do topo da hierarquia administrativa (e logo objecto de todas as resistências) para constituir um instrumento de gestão dentro de cada serviço; evidenciará o bom desempenho de muitos serviços públicos de qualidade que existem; e tornará claro quais os serviços que devem ser extintos (aqueles que não geram valor e consomem recursos). Com um pouco de ousadia poderíamos mesmo ter departamentos a candidatarem-se a realizar as funções de outros, por orçamento mais baixo (fazendo obviamente desaparecer os departamentos substituídos), bem como assistir a fusões voluntárias entre serviços. E a “mobilidade” dos funcionários públicos surgiria naturalmente...

O grande problema com este tipo de solução está na medição do valor gerado pela Administração Pública. Será certamente difícil, mas os ganhos de fazer essa medição justificam que se dê mais atenção a esse aspecto do que a mera contagem de funcionários públicos, além de libertar futuros Ministros das Finanças do fardo de autorizar cada contratação. A existência de muitos aspectos intangíveis e o facto de não existir “mercado” para muitos dos serviços prestados obriga a abordagens potencialmente diferentes para cada serviço. Essas dificuldades não devem ser menorizadas. Exigem definição cuidada e prática nessa avaliação. Mas há que a iniciar.

Será também necessário maior transparência e informação publicamente disponível sobre os recursos consumidos e os resultados obtidos por cada serviço público. Não é uma missão impossível, mas obriga a pensar de forma diferente a Administração Pública: não como uma soma de muitos funcionários, a quem é preciso pagar menos e reduzir o número, e sim como uma entidade que tem a missão de prestar serviços específicos à sociedade em que se insere. A administração pública (central, regional e local) deverá ser valorizada pelo que faz, e não apenas pelos recursos que consome. Pelo valor que gera, e não pelo número de funcionários que tem.

 

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