terça-feira, 11 de janeiro de 2005

A TRAGÉDIA DO HOMEM A LUTAR CONTRA AS MARÉS




Pode um "outdoor" de campanha encerrar a tragédia de um candidato? Pode. O cartaz do PSD assume, numa frase singela, o destino de Pedro Santana Lopes: é candidato a primeiro-ministro "contra ventos e marés", contra o líder histórico, Cavaco Silva, e outras figuras iminentes do seu partido, contra o Presidente da República que o despediu por falta de credibilidade, contra as sondagens que o arrasam na praça pública, contra os amigos que o acusam das mais desvairadas malfeitorias.

"Contra ventos e marés. A favor de Portugal" é uma frase de resistência e nem por isso das mais mobilizadoras. Uma frase de resistência para apelar ao voto, no actual contexto político, limita-se a comprovar o que Lopes pede ao eleitorado do PSD: que resista, que resista o que puder, que resista às duras provas dos imponderáveis ventos e das imprevisíveis marés. "A favor de Portugal" não acrescenta nada (nem era um cartaz de Santana Lopes se não estivesse lá a palavra Portugal).

Lopes está exangue e sabe que o seu eleitorado se encontra exangue. Aliás, o próprio assumiu essa luta pela resistência, quando, na assinatura do acordo com o CDS, pediu aos votantes do PSD que continuassem a votar no seu partido. Os estrategas de campanha não podem pedir o céu ou a maioria absoluta sem dar vontade de rir, mas é duvidoso o modo como optaram por deliberadamente colar o seu candidato ao "bebé na incubadora" em que os "irmãos mais velhos" dão "murros e pontapés" em vez de carícias. A vitimização pode ser uma boa estratégia só até ao ponto certo - aquele ponto em que o que se vitimiza ainda tem suficiente força para recuperar o amor de alguém (do eleitorado, no caso).

José Sócrates, depois de pedir para "voltar a acreditar", assegura que "agora, Portugal vai ter um rumo". O desafio de "acreditar" é bom num contexto presente de crise e derrocada das crenças na boa governação. O eleitorado, presume-se, estará disponível para "voltar a acreditar" e isso implica, conforme a sugestão do cartaz, a alternância. Mas o PS confronta-se com uma questão problemática: "Acreditar em quê"? Acreditar que o guterrismo reciclado por um José Sócrates já de cabelos brancos que traz um futuro melhor? Mas, agora, Sócrates pede ao eleitorado para acreditar que tem um "rumo". É sintomático o recurso a uma palavra do léxico cavaquista. O actual secretário-geral do PS teve necessidade de repescar, eventualmente para se distanciar das constantes acusações de "falta de rumo" do guterrismo, o famoso "rumo" popularizado por Cavaco Silva. Pode ser que o eleitorado esteja disposto a "acreditar" que Sócrates tem "um rumo", mesmo que não saiba ainda muito bem qual.

"Mais votos para mudar a sério", pede o rosto de Jerónimo de Sousa. Para a CDU, "mudar a sério" não é, obviamente, com o PS e isso tenta a coligação explicar, campanha eleitoral após campanha eleitoral, há muitos anos. O cartaz é uma reciclagem do discurso tradicional para as legislativas da coligação que integra o PCP. A novidade está em Jerónimo, exclusivamente em Jerónimo, na imagem fortíssima de Jerónimo que enfrenta pela primeira vez as eleições na pele de secretário-geral do PCP. E é essa imagem que está em causa para determinar se é possível inverter "a sério" o declínio da CDU.

O Bloco de Esquerda - que não tem líder a quem mostrar o rosto - é o único partido a optar nesta fase pela campanha negativa, lembrando "os trabalhos" de Santana e Portas, de forma jocosa. A campanha acaba por ser complementar à do PS: o Bloco de Esquerda recorda o "odioso" do Governo, o PS fala para o centrão sem pôr a mão na massa. Se daqui sai um acordo pós-eleitoral talvez seja, nesta fase, apressado concluir.

Portas não gostou da fotografia

Dos cinco partidos com assento parlamentar, só o CDS ainda não colocou nas ruas um cartaz. E não o fez porque o líder do partido, Paulo Portas, não gostou da fotografia. Na semana passada, o presidente do CDS e ministro da Defesa esteve a tirar fotografias para o "outdoor", mas, quando viu o resultado final, não gostou da sua imagem e vai repetir a sessão fotográfica. A campanha do CDS está a ser feita pela mesma empresa que fez os cartazes do "Eu fico", nas autárquicas de 2001, em Lisboa. E.L.

Ana Sá Lopes

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