terça-feira, 19 de julho de 2005

O ESCORPIÃO



E então, disse o escorpião para o sapo: «É a minha natureza...»

6 Comments:

At 20 de julho de 2005 às 09:30, Anonymous Anónimo said...

EIS A ENTREVISTA DO PROFº. FREITAS DO AMARAL:

Ao aceitar o convite para fazer parte do Governo de José Sócrates colocou definitivamente de parte a hipótese de poder ser candidato às próximas eleições presidenciais?

Eu acho que uma coisa não tem a ver com a outra. E que, portanto, o facto de ter aceite o convite para integrar o Governo não me impede a mim, como não impede nenhum outro membro do Governo, de eventualmente ser candidato a esse ou outros cargos electivos. Agora, não lhe posso adiantar mais nada sobre a questão presidencial, porque acho que não devo ser o único cidadão português a falar antes daqueles que se sabe que estão pessoalmente muito interessados em ser candidatos presidenciais. Quando esses ficam calados, acho que os outros têm o direito de também continuar calados.

Tem consciência que com essa resposta abre caminho a todas as especulações, nomeadamente a de poder daqui a um mês ou dois deixar o Governo para ser candidato presidencial.

Não abro nenhum caminho a nenhuma especulação, estou muito bem onde estou, estou a fazer uma coisa que gosto muito. Desde a última eleição presidencial, que foi a da reeleição de Jorge Sampaio, que eu decidi e tornei público que não faria nada para uma candidatura presidencial. Não fiz diligências, não fiz iniciativas, não publiquei autobiografias, não convoquei jornalistas para conversar sobre o assunto, não fiz contactos com independentes, não me reuni com antigos governadores civis, não fiz rigorosamente nada. Portanto, salvo o devido respeito, parece-me que é excesso de especulação estar sempre a pensar que eu tenho esse objectivo escondido, quando a verdade é que eu não faço rigorosamente nada para atingir o tal objectivo. Há outros que o fazem, mas eu não faço e isso quer dizer que não estou empenhado na corrida às presidenciais.

Mas não põe liminarmente de parte essa hipótese...

Never say never. É um princípio fundamental da vida. Eu sei lá o que é que me vai acontecer daqui a seis meses... Posso estar morto, posso estar doente, posso estar vivo e no Governo, posso ser chamado para um cargo internacional, posso ter de ir fazer uma missão extraordinária à China, eu sei lá... Não faço a menor ideia.

Mas não seria estranho que poucos meses depois de tomar posse como ministro deixasse o Governo para se candidatar à Presidência da República?

Estranho, não acho que fosse. Seria com certeza pouco habitual.

O que sente quando vê responsáveis do PS, como João Soares, a falar do seu nome como um bom candidato para disputar as presidenciais com Cavaco Silva?

Por um lado, sinto-me naturalmente lisonjeado, porque isso significa uma coisa que eu acho positiva que um centrista tenha granjeado significativas formas de respeito em áreas onde há 10 ou 20 anos atrás as não tinha. Isso é importante e útil, até para as funções que estou actualmente a desempenhar. Mas não tiro daí mais nenhuma consequência. Faço em cada momento aquilo que considero ser mais útil ao País e, neste momento, aquilo que considero ser mais útil ao País é ser ministro dos Negócios Estrangeiros deste governo.

Algumas vozes do PS, como Ferro Rodrigues e João Cravinho, consideram que a eventual eleição de Cavaco Silva para a Presidência da República pode colocar em risco a estabilidade política e a estabilidade desta legislatura. Concorda?

Sim. Eu acho que esse perigo, como perigo potencial, existe.

Porquê?

Porque se trata de uma pessoa de uma área política muito diferente, que faz as suas declarações públicas sempre em função dos pontos de vista da área política em que se situa, sem qualquer abrangência relativamente ao resto da sociedade portuguesa, e portanto é natural que não fosse propriamente um amigo do Governo PS.

Há outra coisa, já agora, que me surpreende muito. É que estamos a cinco meses das eleições presidenciais, não há nenhum candidato assumido, é a primeira vez que isso sucede desde 1976, quando as coisas se passaram um pouco assim, mas estávamos no princípio da nossa democracia. Trinta anos depois, voltamos a estar assim. Se isso revela falta de interesse pelo cargo, é mau para o sistema político. Se revela excesso de táctica, é mau para a democracia, porque a democracia exige que uma eleição presidencial seja precedida de um amplo debate nacional, e não dum prolongado silêncio, destinado a criar as condições, não para uma eleição democrática e pluralista, mas para um plebiscito unanimista. Sob essa dupla perspectiva, eu acho que a situação que estamos a viver é negativa.

Mas o próprio PS embarcou nesse tacticismo, porque está a deixar todo o terreno para o professor Cavaco.

Não estou a criticar ninguém, não estou a fazer apenas uma reflexão no plano dos princípios do princípio democrático, por um lado, e daquilo que deve ser um grande debate nacional que preceda uma eleição democrática em que os problemas possam ser discutidos, clarificados, as posições definidas, em vez de se passar apenas um cheque em branco a um determinado candidato a salvador da pátria. Eu isso confesso que não me parece compatível com o regime democrático.

Considera que era importante que, o mais depressa possível, houvesse um contraditório a esse único proto-candidato?

É exactamente essa a fórmula. Com o que eu estava a dizer eu não queria significar que fosse importante que o mais depressa possível houvesse candidatos, acho é que o mais depressa possível tem que haver contraditório, tem que haver debate, tem que haver tomadas de posição, discussão pública na comunicação social e noutros forae, para que os portugueses comecem a ficar esclarecidos e não tenham que se render à ideia de que vão votar numa inevitabilidade. Em democracia não há inevitabilidades, há escolhas, e neste momento os portugueses ainda não foram confrontados com possibilidades de escolha.

Manuel Alegre poderia protagonizar uma candidatura de combate a este estado de coisas?

Certamente que sim, mas eu não gostaria de começar agora aqui a enunciar os dez, ou quinze, ou vinte, ou trinta, ou cinquenta nomes que há em Portugal que têm mérito para serem presidentes da República. Felizmente, temos muitos.

Não lhe perguntamos sobre 10 nem 20 nomes, mas apenas sobre um se Manuel Alegre fosse candidato, teria o seu voto?

Como sabe, em democracia o voto é secreto.

 
At 20 de julho de 2005 às 09:30, Anonymous Anónimo said...

...

Ainda nos próximos meses poderá haver um referendo sobre a despenalização da interrupção voluntária da gravidez. Se for convocado o referendo, vota a favor da proposta do PS?

Quando entrei para o Governo, coloquei essa questão ao primeiro-ministro. E disse-lhe que, por uma razão de consciência, não poderia votar a favor das propostas tradicionais do PS nessa matéria. Se isso fosse um impedimento à minha participação no governo, eu teria que ficar de fora. O primeiro-ministro disse-me que não era impedimento, que o PS tem nessa matéria, como em todas, uma grande abertura e uma grande tolerância para com todos os seus militantes e para com todos os independentes que colaboram com o partido, que até já tinha tido um primeiro-ministro que era contra a proposta do PS em matéria de aborto, e que, portanto, não via nenhuma dificuldade nessa matéria e desde logo me autorizava a, no momento oportuno, expor essa situação. Aqui está o momento oportuno.

Portanto, vota 'não'. E admite fazer campanha pelo 'não'?

Não farei nenhuma campanha.

 
At 20 de julho de 2005 às 09:31, Anonymous Anónimo said...

...

Embora o voto seja secreto, nas últimas legislativas declarou o seu apoio a José Sócrates e suponho que tenha votado PS...

Porque nesse caso renunciei ao segredo do voto e tornei públicas em três artigos as minhas razões. Algumas pessoas acharam que era uma leviandade. Não foi foi produto de uma reflexão teórica, que os adeptos da opinião contrária nunca rebateram. No primeiro artigo disse por que é que achava que o País estava numa situação muito difícil. No segundo, disse como é que eu achava que se tirava o País dessa situação. E no terceiro comparei a proposta do PS com a proposta do PSD no campo ideológico, no campo da capacidade governativa, da coesão interna partidária e, por último, no campo da força e capacidade de liderança dos dois candidatos a primeiro-ministro. E foi na sequência dessa reflexão que, num acto de civismo democrático, tirei a conclusão. Mas as pessoas em Portugal têm a tendência para discutir o fácil e não discutir o difícil. Teria sido interessante que os adeptos de Santana Lopes tivessem rebatido, uma por uma, se fossem capazes, as dez ou vinte razões que eu fui apontando ao longo desses três artigos. Não o fizeram, alguns deles preferiram fazer-me ataques pessoais e um debate sério não pode ser feito com base em ataques pessoais.

Mas enquanto votante no PS também se sente enganado por José Sócrates ter contrariado uma promessa eleitoral, aumentando os impostos quando tinha prometido que não o faria?

Não, não sinto, de todo.

Mas compreende que o cidadão comum se sinta enganado?

Não. Acho que quem tiver esse sentimento tem certamente poucos conhecimentos quer de economia quer da vida natural dos povos. Eu sonho com o dia em que, na política, haja menos hipocrisia e se pratique mais o jogo da verdade. Se em Portugal, como nalguns outros países acontece, já se fizesse na política o jogo da verdade, o que todos os partidos, sem excepção, diriam em matéria de impostos, eram estas duas coisas muito simples e perfeitamente evidentes primeiro - os impostos hão-de subir sempre que for necessário; segundo - os impostos hão-de descer sempre que for possível.

Segundo essa regra, não deveria haver mais cautela nas promessa que se fazem em campanha eleitoral?

Eu penso que sim...

Talvez o primeiro-ministro não devesse ter dito que não ia aumentar os impostos...

Eu acho que nem devia haver cautelas - não devia, pura e simplesmente, haver declarações sobre matéria de impostos. É como se, no tempo das desvalorizações das moedas, que agora não temos por causa do euro, houvesse em campanha eleitoral a promessa de desvalorizar ou não desvalorizar a moeda. Não se pode...

Portanto, Sócrates não devia ter prometido...

Prometes fazer uma remodelação ministerial ao fim de um ano? Prometo, não prometo - não faz sentido. Há coisas que não fazem sentido em política. Prometes que nunca terás nenhuma guerra nos próximos cem anos? Quem é que pode fazer essa promessa? Portanto, eu gostaria muito - e alguma coisa farei enquanto tiver vida e força para isso - de explicar ao povo português que os impostos nem se aumentam por sadismo nem se diminuem por favor. Os impostos aumentam-se sempre que o Estado carece de mais meios financeiros para prosseguir as finalidades que os cidadãos esperam do Estado, e descem quando, para prosseguir essas finalidades, é conveniente diminuir a carga fiscal. À volta dos impostos não devia haver mitos, nem promessas, nem contra-promessas, nem hipocrisias. Nós estamos numa perfeita hipocrisia, que é a oposição actual criticar a este Governo exactamente o mesmo que ela fez há três anos. Não foi há trinta, nem há trezentos. Foi há três anos fizeram exactamente o mesmo.

E há três anos também o PS criticou isso.

O que eu acho é que se o País quer dar uns passos em frente em matéria de civismo democrático e de densificação da cidadania, é importante que se separe as matérias em que vale a pena fazer polémica e controvérsia partidária e aquelas em que não vale a pena, porque o que tem que ser feito é feito. Antes, diziam os clássicos que a política era a arte do possível. Eu acrescento que a política é a arte de tornar aceitável aquilo que é necessário e de tornar evidente aquilo que é possível. É necessário aumentar os impostos, aumentam-se. É possível diminuí-los, diminuem-se. O que não faz sentido é criticar um aumento de impostos quando ele é absolutamente indispensável ou não fazer uma diminuição de impostos quando ela seja possível e conveniente.

Parece evidente que contrariar uma promessa eleitoral tem custos políticos. Que custos acha que podem resultar deste aumento de impostos?

Só tem custos políticos se quem está à frente dos governos não tiver capacidade explicativa.

Acha que tem existido?

Hoje o poder político não se traduz apenas pela capacidade de mando, mas também pela capacidade de persuasão. Aliás, já os clássicos, Xenofonte, por exemplo - um filósofo grego pouco celebrizado nos nossos tempos, mas que tem obra muito interessante -, dizia que a principal arte da política era a arte da persuasão. Querendo com isso significar que quem quer ser seguido e apoiado (hoje acrescentaríamos eleito numa eleição) tem que saber explicar as razões das suas decisões.

O Governo tem tido essa arte?

Eu acho que tem tido bastante, mas porventura seria necessário mais. Eu acho que este Governo não pode ser acusado de ter tomado poucas medidas nos seus primeiros quatro meses da sua permanência no poder, mas, se algum erro cometeu, ou se alguma deficiência se pode apontar - e faço mea culpa, porque sou solidário com todo o Governo - é de não se ter explicado suficientemente a inevitabilidade da subida dos impostos. E outra coisa o facto de que certas medidas que estão a ser tomadas e que são logo apresentadas pela oposição ou pelos sindicatos como verdadeiros ataques mortais ao Estado Social, de facto não são ataques nenhuns, são as condições mínimas para que esse Estado Social sobreviva em boas condições de sustentabilidade para as próximas décadas. A reforma do Estado Social é uma condição sine qua non da própria manutenção em boas condições de saúde da ideia de Estado Social. E isso tem que ser explicado.

Repare o que é que fez Salazar quando chegou ao Governo, perante uma situação financeira caótica? Para equilibrar o orçamento, Salazar diminuiu em 15% os vencimentos de todos os funcionários públicos, aumentou em 15%, 20% todos os impostos - todos, e não apenas um, e não foi em 2%, foi em 15% -, cortou cerca de 10% em todas as pensões de reforma dos trabalhadores, quer do sector público, quer do privado, que já estivessem reformados. E extinguiu centenas de organismos, despediu pessoal aos milhares, e com isso chegou ao fim do ano e tinha o orçamento equilibrado. É claro que isto não foi nem justo nem democrático. Numa democracia que respeita os direitos adquiridos e a justiça, não se pode fazer isto. E não se fez. Ninguém diminuiu os vencimentos, ninguém diminuiu os montantes das pensões que estão a ser recebidas, ninguém subiu todos os impostos, mas apenas o IVA e o imposto automóvel. Portanto, há uma diferença abissal, mas as pessoas reagem como se se tivesse tomado um conjunto de medidas próprias da arma atómica.

Foi tudo feito com muita ponderação, conta, peso e medida, anulando apenas alguns privilégios, que por um lado são injustificados e, por outro lado, estavam escondidos. Não eram conhecidos da opinião pública, mas hoje são. E hoje já é a própria comunicação social, e os cidadãos, que escrevem para os jornais, telefonam para as rádios e para as televisões, a denunciar outros casos semelhantes. Finalmente o país aderiu à campanha deste Governo para pôr termo a essas injustiças, a esses privilégios injustificados. Isto não é combater o Estado social. Nada do que é característico do Estado Social foi afectado minimamente. Diminuiram-se vencimentos? Não. Diminuiram-se pensões de reforma? Não. Despediram-se aos milhares funcionários públicos? Não. Liberalizaram-se os despedimentos à moda americana? Não. Retirou-se a alguém os direitos de acesso à Saúde ou à Segurança Social? Não. Então, as traves mestras da Saúde e da Segurança Social estão intactas.

O ministro das Finanças está a pôr à luz do dia medidas e encargos que estavam formalmente assumidos pelo Estado, mas que eram escondidos e não eram devidamente orçamentados. Só no meu ministério, para este ano de 2005, havia compromissos formais já assumidos, com organizações internacionais e com sindicatos dos trabalhadores dos consolados, no valor de 20 milhões de euros. O que o Governo está a fazer é uma política de verdade a pôr todas estas coisas escondidas - quer sejam encargos não estão orçamentados, quer sejam privilégios excessivos, quer sejam situações de monopólio de facto, que são ilegais, mas que se vão prolongando por desconhecimento do grande público -, o Governo está a pôr tudo isto à luz do dia para que se crie um ambiente que torne mais sã a situação económica e social portuguesa.

O caso é que a contestação social está na rua. É neste clima que vai haver eleições autárquicas, vai ser apresentado um Orçamento do Estado que o ministro das Finanças já avisou que vai ser difícil, e depois haverá as presidenciais. Como vê este ciclo político?

A estratégia política para fazer face a todas essas dificuldades pertence ao primeiro-ministro, não me cabe a mim, portanto essa pergunta deverá ser feita ao primeiro-ministro e não a mim. Mas, como membro do Governo, e solidário inteiramente com o primeiro-ministro e com os meus colegas de Governo, quero dizer o seguinte há aqui um combate pela adesão do povo português às medidas anunciadas, e muitas delas já tomadas, pelo Governo. É esse combate que tem de ser feito. Os sindicatos e a oposição parlamentar criticam - estão no seu direito. O Governo e o partido que o apoia têm de defender e explicar as medidas do Governo - esse é o seu dever. Se cada um fizer o que lhe compete, estou convencido que a maioria dos portugueses manterá a sua confiança no actual Governo e no primeiro-ministro.

Quem é que não o tem feito? Acha que é generalizado ou identifica alguma falha num dos elos [Governo ou PS]?

Não identifico falha nenhuma, acho que todos somos colectiva e solidariamente responsáveis, porque as medidas eram tão difíceis e demoraram tantas horas de trabalho e de ponderação a definir e a aprovar, que todos nós, a começar por mim, descuidámos a frente externa, a frente da explicação ao País das medidas tomadas. Mas isso certamente se vai intensificar.

Deixe-me só dizer-lhe o seguinte a primeira grande confrontação que houve entre este Governo e os sindicatos foi a propósito da greve aos exames, e a verdade é que o Governo ganhou essa confrontação, e de uma forma espectacular, muito próxima dos cem por cento. Isto não significa que haja da parte do Governo ou do primeiro-ministro qualquer intenção de ofender a dignidade da classe dos professores do ensino público, que colectivamente merece os maiores elogios pelos grandes sacrifícios que faz e tem feito para educar os jovens que lhes estão confiados. O que não é legítimo é, no final dum ano lectivo, os professores fazerem greve aos exames, anulando e destruindo o esforço inteiro dum ano de trabalho dos alunos. Se me diz que há aí uma grande contestação - pois há, mas a única grande contestação que houve até agora foi ganha pelo Governo, com o apoio total dos professores, dos alunos e dos pais. Eu tiro deste exemplo que se os sindicatos forem por este caminho, não vão ter grandes vitórias relativamente a este Governo.

E, já agora, que falamos dos sindicatos, por quem todos temos o maior respeito, e que são muito importantes para o equilíbrio duma sociedade democrática e para a defesa dos direitos dos seus associados, eu gostava de dizer que um país moderno, do século XXI, não deve ter sindicatos que se agarrem à defesa de privilégios injustificados de poucos, mas que promovam lucidamente a defesa dos verdadeiros direitos da grande maioria. Ver sindicatos que deviam defender todos os trabalhadores, a vir para a rua em defesa dos privilégios de meia dúzia de trabalhadores, parece-me um contra-senso. Eu espero que de futuro os sindicatos portugueses alinhem neste grande esforço de modernização da sociedade portuguesa, que implica um Estado mais eficiente, um empresariado mais lúcido e mais capaz de produzir riqueza e de criar novos postos de trabalho e um sindicalismo verdadeiramente apostado em modernizar o País, com ressalva dos direitos dos trabalhadores, e não na defesa de privilégios adquiridos no passado, que deixaram de fazer qualquer sentido no presente.

Refere-se a si próprio como um centrista. Sente que nos Conselhos de Ministros traz um contributo ideológico diferente? Mais conservador nos costume, mais liberal nas questões económicas?

Eu sou um ministro como qualquer outro, não tenho nenhuma espécie de estatuto ou de influência especial. Aplica-se a mim um princípio que eu costumo ensinar aos meus alunos, que é o princípio da igualdade dos ministros. Todos os ministros são iguais em direitos e deveres. O meu contributo nos Conselhos de Ministros não tem nada de especial a não ser o facto de vir de uma pessoa que, infelizmente para mim, é mais velha e tem mais cabelos brancos do que todos os outros membros do Governo, porventura menos um.

Mas este é um Governo do PS, e o senhor, que se sabia, não é socialista...

Pois não, mas muitas das orientações que têm sido propostas pelos vários ministérios têm merecido a minha concordância, todas as propostas que eu tenho apresentado têm merecido concordância. Não houve, até hoje, nenhuma votação em Conselho de Ministros, todas as medidas têm sido aprovadas por consenso, e se o consenso não se obtém à primeira, a matéria é adiada por oito dias e ao fim de oito dias o consenso está encontrado. Não me recordo de nenhuma matéria que tenha tido que esperar mais de oito dias para se conseguir obter o consenso. Portanto, as questões não se põem no plano ideológico, põem-se no plano pragmático o que é o melhor para o País neste momento. Em torno de questões concretas, e à luz duma visão pragmática, ninguém sente que haja divisões ideológicas no Governo, apesar de eu vir do centro-direita, apesar de alguns dos actuais militantes socialistas virem do Partido Comunista, apesar de, entre os que foram sempre do PS, haver uns mais de influência francesa e outros mais de influência anglo-saxónica. Nada disso levou até hoje a qualquer clivagem intransponível ou a qualquer necessidade de votação, o que se deve, por um lado, ao facto do Governo ter uma orientação muito pragmática e, por outro lado, à capacidade de liderança do primeiro-ministro, que quando sente que existe uma diferença chama a si a resolução dessa diferença. Neste base, não tem havido nenhum problema, até agora, e espero que as coisas continuem exactamente assim.

 
At 20 de julho de 2005 às 09:32, Anonymous Anónimo said...

...

Que marca gostaria de deixar da sua passagem pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros (MNE), nesta circunstância de ser um ministro centrista num governo socialista?

Não se nota que haja um centrista no Governo socialista, como não se nota que haja ex-comunistas neste governo socialista, como não se nota que dentro do PS haja diferentes correntes. Há uma grande unidade e solidariedade dentro do Governo, portanto quando me pergunta que marca é que eu gostaria de deixar, não será certamente uma marca ideológica.

A marca que eu gostaria de deixar no MNE é a marca reformista. Entendendo por reformismo a capacidade de fazer as mudanças necessárias para que sejam tomadas com rapidez as decisões concretas mais acertadas à persecução dos superiores interesses nacionais. Em termos europeus, trata-se de, por um lado, afirmar a vocação europeia de Portugal e a nossa capacidade de fazer propostas que mereçam o consenso dos nossos parceiros, e trata-se de defender os interesses nacionais legítimos de um país que não é dos mais desenvolvidos da Europa e tem, portanto, necessidade de apoios para poder crescer mais depressa e atingir mais rapidamente a média europeia. Portanto, defesa do espírito europeu e defesa dos interesses nacionais na Europa.

Nas relações transatlânticas aprofundá-las, desenvolvê-las, torná-las mais úteis a Portugal. Penso que o consegui nesta viagem a Washington [na semana passada]. Um colega vosso dizia que eu vim muito entusiasmado do meu encontro com Condoleezza Rice pela forma como fui tratado. Penso que esse título, que, aliás, não corresponde inteiramente ao título, não denota expressamente aquilo que se passou. Eu vim de facto entusiasmado, mas não foi pela maneira como fui tratado, porque eu, felizmente, tenho sido bem tratado em todas as capitais do mundo por onde passo. Eu vim entusiasmado foi porque tive a noção de que abrimos um novo capítulo na história das relações bilaterais entre os Estados Unidos e Portugal.

Desta vez, é um capítulo marcado não apenas pela solidariedade de Portugal com iniciativas globais dos EUA, mas também pela solidariedade dos EUA para com problemas e necessidades específicas de Portugal.

Pode especificar?

Primeiro foi aceite, em princípio, a nossa proposta de cooperações trilaterais entre EUA, Portugal e PALOP (países africanos de língua oficial portuguesa) para ajudar no desenvolvimento dos PALOP; segundo, foi aceite a nossa proposta de iniciar uma série de cooperações reforçadas em áreas onde, até agora, nunca tinha havido cooperação entre os dois países ou tinha havido cooperações pontuais: ensino superior, investigação científica e médica, alta tecnologia e outras áreas que não são ainda do conhecimento público porque ainda vão ter que ser aperfeiçoadas pelos canais diplomáticos. Mas estas já são suficientes para se mostrar que há aqui uma atitude nova dos EUA para com Portugal.

Desde o fim da II Guerra Mundial, os EUA pediram sobretudo a Portugal que apoiasse iniciativas que, do ponto de vista comum, eram boas para a paz e segurança internacionais a Base das Lages, a participação em determinadas operações militares nos Balcãs, no Médio Oriente, em África, etc. Portugal, que nunca foi nessa matéria um país egoísta, aceitou, por vezes sem qualquer contrapartida, doutras vezes apenas com contrapartidas simbólicas. Do que se trata agora - e não é apenas pelos lindos olhos de Portugal ou do seu MNE, é porque isso faz parte duma visão global dos EUA em relação aos seus aliados europeus - é que, ao mesmo tempo que os outros países colaboram em iniciativas de interesse global, os EUA apoiam aqueles países que mais precisam para se desenvolverem mais depressa. Porque o desenvolvimento mais acelerado ajuda à paz, ajuda à consolidação da democracia, ajuda e promove o respeito pelos direitos humanos.

É esse novo aproach, duma atitude proactiva dos EUA a favor do desenvolvimento de países como Portugal (certamente o estarão a dizer a outros países como nós, não quero de maneira nenhuma fazer passar a ideia de que isto é um privilégio de Portugal, aliás, se o fosse, acho que seria errado). Penso que está certa esta ideia que os EUA, a Inglaterra e os outros países do G8 também afirmaram numa outra óptica, agora na ajuda a África. Os países mais avançados tecnologicamente, mais ricos financeiramente, mais poderosos economicamente, têm obrigações para com os países menos desenvolvidos. E essas obrigações devem traduzir-se em cooperações reforçadas.

A propósito de PALOP e da sua visita a Angola, de que forma é que Portugal pode chamar a atenção dos responsáveis angolanos para o facto de que os níveis de corrupção não abonam nem a favor do país nem para a sua imagem externa?

Posso ser inteiramente franco consigo? Eu acho que Portugal, em matéria de corrupção não pode dar lições a nenhum outro país do mundo. Infelizmente. Comecemos nós por liquidar esse fenómeno cá dentro e então, depois, talvez possamos falar da nossa experiência perante outros países.

A cooperação não nasceu hoje, nem com este Governo. Muitos governos anteriores fizeram coisas importantes em matéria de cooperação, nós recebemos o testemunho e vamos procurar fazer o nosso melhor nessa matéria. Escolhi para secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação uma pessoa que, além duma formação teórica invejável, com doutoramento em relações internacionais em Oxford, tem experiência prática em matéria de cooperação, e que está a fazer um trabalho extremamente importante, embora só deva ser anunciado nos finais do Verão rever de cima a baixo a política de cooperação portuguesa, procurando transformá-la, passando duma política de acções isoladas para uma programação de conjunto. Passando de orçamentos anuais, muitas vezes divergentes uns dos outros, para orçamentos plurianuais. Passando duma acção dispersa de quinze ministérios para um plano integrado de todos os ministérios que fazem cooperação. Já começámos a reunir uma comissão que existia, criada por um governo anterior, mas que há mais de um ano não reunia, que é a Comissão Interministerial para a Cooperação, e todos os outros ministérios manifestaram o seu grande agrado por aquela comissão ter voltado a reunir. É um primeiro ponto, porque podemos começar a pôr em cima da mesa tudo aquilo que cada um está a fazer ou tenciona fazer.

Hoje há cooperação militar do Ministério da Defesa, cooperação policial do Ministério da Administração Interna, cooperação judiciária e judicial pelo Ministério da Justiça, cooperação educativa pelo Ministério da Educação, cooperação cultural pelo Ministério da Cultura, etc. De tudo isto resulta esta situação paradoxal é que o MNE é considerado o único responsável pela cooperação, mas só gasta 20% das verbas públicas que o Estado português aplica em cada ano na cooperação. Nós temos que dar visibilidade pública a este fenómeno, e como não temos a preocupação de retirar aos outros ministérios as suas funções de cooperação e concentrar tudo num ministério, porque seria um erro, o que vamos é começar a apresentar, se possível já no próximo ano, um programa plurianual de cooperação integrada, incluindo todos os ministérios que fazem cooperação. Aí se verá que o que Portugal pode fazer é muito mais do que o que tem feito, e é muito mais do que se pensa.

Até lá, anunciaremos a criação duma nova instituição financeira destinada especificamente a apoiar projectos de investimento nos PALOP, que também reforçará muito os meios de acção portugueses.

Uma das questões que tem levanta a nível de cooperação tem a ver com a defesa da língua portuguesa. Ainda recentemente nos Encontros da Arrábida houve grandes críticas à cooperação, nomeadamente nessa área, porque, por um lado, o português é a língua oficial, mas depois não falam português, não têm professores... Como é que se pode defender a língua, e não só em Timor, mas em todo o espaço lusófono?

É claro que há um problema específico em Timor-Leste e Portugal tem concedido uma parcela muito significativa do seu apoio externo a Timor-Leste e vai continuar a fazê-lo. Mas eu acho que a problemática da língua portuguesa não pode ser vista numa perspectiva financeira. Custa dinheiro, é verdade, mas isso não é o mais importante. O mais importante é potenciarmos o valor do conjunto dos países que formam a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), que são 200 milhões de seres humanos a falar português. Por outro lado também temos que fazer um esforço paralelo nas comunidades portuguesas de emigrantes, que representam hoje cerca de 5 milhões de pessoas, além dos 10 milhões que estão aqui no nosso pequeno território.

Muitos portugueses não sabem, mas entre essas comunidades portuguesas espalhadas pelo resto do mundo, designadamente nos EUA, no Canadá, na Venezuela, África do Sul, Brasil e na Europa, há portugueses que atingiram o topo das carreiras na sua profissão, no seu sector económico. São milhares de casos de sucesso. É potenciando tudo isso que se defende o valor e a importância da língua portuguesa. A minha experiência da ONU diz-me isso de cada vez que, em vez dos países de língua portuguesa falarem separados, há um que fala em nome de todos, de 200 milhões de pessoas, põem logo o auscultador para seguir a tradução do que está a ser dito. Quando está a falar apenas um destes países, as pessoas não ouvem.

Eu acho que tem de ser duma forma política, e através de modernas técnicas de marketing, que se defende a língua portuguesa. Mas ela não está em perigo - é uma falsa ideia em que os portugueses gostam de se vitimizar e pensar que a língua está em perigo no mundo. Não está, é a sexta língua mais falada no mundo. A Espanha não tem nenhum país irmão que tenha a dimensão territorial e humana do Brasil. A França não tem nenhum país de língua francesa que tenha a dimensão do Brasil. Nesse contexto, a posição de Portugal não é a do pequenino país pobre, pedinte, que tanta gente pretende dar; Portugal tem, de facto, uma projecção, quer no âmbito da UE, quer da ONU, que excede em muito este pequeno rectângulo onde estão, todos os dias, 10 milhões de pessoas a queixarem-se de que nada corre bem. Quando passamos a vida a lamentarmo-nos, há aí muito mais de fado do que de realismo.

Vai haver encerramento de embaixadas? E abertura de novas embaixadas e consulados?

Depois da primeira análise, a que já procedi, cheguei à conclusão - diferente da ideia com que entrei para o MNE - de que na redução de embaixadas já foi feito por governos anteriores quase tudo o que é possível fazer. Se houver redução, são mais quatro ou cinco, não mais do que isso. Criação de embaixadas, não podem ser muitas, mas algumas tem que ser, nomeadamente nos dez novos países da UE, mais dois que estão para entrar em 2007. Se calhar, o saldo vai acabar por ser mais a favor da criação do que da extinção. Quanto aos consulados, tudo depende da evolução demográfica. Dou dois exemplos em Inglaterra, há dez anos, em Londres, viviam cerca de 40 mil portugueses, hoje vivem cerca de 500 mil - é evidente que tem que se aumentar o número de consulados à volta de Londres. Na Alemanha, há dez anos vivam mais de 300 mil portugueses, hoje vivem menos de cem mil - é evidente que alguns consulados terão que fechar na Alemanha. Não podemos partir para esse problema com nenhuma ideia pré-concebida. Onde for necessário aumentar, aumentamos, onde for possível extinguir, extinguimos. É um pouco como nos impostos...

Propositadamente não centrámos esta entrevista na questão do Tratado Constitucional europeu, porque tem sido bastante discutida, mas ainda não está claro o que irá acontecer em Portugal. Admite que Portugal possa ratificar o Tratado sem referendo?

Não, de maneira nenhuma. A posição do Governo português é muito clara no dia em que houver um tratado constitucional, este ou outro, para aprovar pelos 25 países membros da UE, Portugal escolherá o método do referendo para o aprovar. Não há qualquer dúvida sobre isso.

O que nós não podemos garantir neste momento é se será este projecto, tal e qual, ou este projecto com alterações, ou um projecto completamente novo. Foi decidida uma pausa de um ano, só daqui a um ano é que se chegará a uma conclusão sobre essa matéria. Até lá, vamos reflectir, vamos debater. O Governo tenciona apresentar em Setembro um programa com aquilo que, pela sua parte, pode fazer, e um convite para que outras instituições da sociedade civil façam aquilo que está nas suas mãos fazer, porque o tema europeu precisa de ser mais reflectido e mais debatido. Mais uma vez, o que nós precisamos aqui é de debate, não é de silêncio.

Na situação económica frágil que Portugal atravessa, quais são as consequências de não ter havido acordo no conselho europeu sobre as perspectivas financeiras [e os fundos para o nosso país]?

Por agora não há nenhumas consequências negativas. As perspectivas financeiras, que não são mais do que um orçamento plurianual, só deverão entrar em vigor a 1 de Janeiro de 2007. Portanto, o facto de não se ter chegado agora a acordo não é grave, no sentido dm que ainda não é tarde. Aliás, no passado nunca um orçamento plurianual da UE foi aprovado na primeira tentativa, foi sempre à segunda ou à terceira.

Tem um deadline na sua cabeça?

Se o orçamento for aprovado em Dezembro, sob a presidência britânica, eu posso dizer com relativa segurança, de acordo com as informações que me são dadas pelos serviços do meu ministério, que será perfeitamente possível que o orçamento entre em vigor efectivamente no dia 1 de Janeiro de 2007. Se não houver acordo sob a presidência britânica e a matéria passar para a presidência austríaca [primeiro semestre de 2006], aí as coisas começam a ser mais complicadas. É que se o orçamento puder ser aprovado até Março/Abril, o mais tardar, ainda estamos a tempo de entrar em vigor a 1 de Janeiro do ano seguinte, se passar para além desse período, de certeza já não entrará em vigor a 1 de Janeiro e, aí sim, haverá alguma perda, embora relativa, para Portugal.

Há um ano e meio, dois anos, sabíamos o que é que pensava sobre o Presidente George Bush. O que é que pensa hoje?

Vou repetir exactamente aquilo que disse em plena guerra do Iraque, e que está muito esquecido. Num debate realizado no programa Prós e Contras, disse a seguinte frase sou estruturalmente pró-americano, sou conjunturalmente anti-guerra do Iraque. Para quem saiba a diferença entre estrutura e conjuntura, isto é fácil de interpretar. Para quem não saiba, vou tentar traduzir em palavras mais simples: sou, em tudo o que é essencial, pró-americano, fui pontualmente contra a guerra do Iraque, naqueles termos, porque se tivesse sido com autorização da ONU, eu teria sido a favor dessa guerra. Eu fui contra porque ela não passou pela necessária autorização prévia da ONU. A minha posição é a mesma.

Conjunturalmente não respondeu à pergunta. Qual a sua opinião sobre a pessoa que é Presidente dos EUA?

Não se pede aos 25 MNE da União Europeia que digam o que pensam sobre o Presidente Bush. E estou convencido que ninguém perguntará à senhora Rice o que é que ela pensa dos chefes de Estado e de Governo dos 25 países da UE. O que temos de apreciar em cada momento, e o momento presente é aquilo que me interessa, é há boas condições para uma colaboração frutuosa entre a UE e os EUA? Há. Há boas condições para uma cooperação frutuosa entre Portugal e os EUA? Neste momento a minha resposta é que há. Porquê? Porque o Presidente Bush veio à Europa, fez as pazes, por assim dizer, com o Presidente Chirac e com o chanceler Schroder, que foram os seus dois maiores críticos durante a guerra do Iraque, e propôs que se entrasse num novo capítulo, marcado pela prevalência da diplomacia sobre a guerra, do multilateralismo sobre o unilateralismo, e pela prevalência da consulta frequente dos aliados sobre a ignorância por parte dos EUA das opiniões dos aliados. Se é esta a nova política americana, eu só posso aplaudir.

Independentemente da forma como foi desencadeada a guerra do Iraque, olhando para a situação do país neste momento, acha que valeu a pena?

Essa é uma resposta que só os historiadores poderão dar daqui a 50 anos. A minha responsabilidade neste momento é esta de acordo com a resolução que foi aprovada por unanimidade nas Nações Unidas, todos os países membros da ONU estão convidados, interpelados, para, na medida das suas possibilidades, ajudarem à reconstrução do Iraque numa base de democracia, de separação entre o Estado e as confissões religiosas, e de contribuição para a paz no Médio Oriente. É isso que Portugal está a fazer. Não pode lá ter muitos homens porque é um país pequeno, não pode dar contribuições financeiras muito generosas porque não é um país rico. Mas pode simbolicamente dar a sua contribuição em forças militares ou militarizadas e em dinheiro para que o Iraque deixe de ser aquilo que era e é - um grande foco de terrorismo e de instabilidade - para passar a ser uma democracia pluralista, assente na separação entre o Estado e as confissões religiosas e que contribua para a paz e segurança do Médio Oriente.

 
At 20 de julho de 2005 às 10:52, Anonymous Anónimo said...

Freitas do Amaral no seu pior...
Quer é ser Presidente da República!
Isto a acontecer é o mesmo que tranformar Portugal numa República de "macacos sem bananas"

 
At 21 de julho de 2005 às 12:42, Anonymous Anónimo said...

Já por aqui o escrevi várias vezes que em Portugal se confunde muito, e demasiadas vezes, a táctica com a estratégia. Também se confunde vezes sem conta a realidade com aquilo que gostariamos que ela fosse, mas não é.

Serve esta introdução para dizer que eu não acho que exista qualquer divergência de fundo entre o Eng. Sócrates e o Dr. Campos e Cunha, achando mesmo que o célebre artigo de domingo passado dado à estampa no Público, foi objecto de combinação cirúgica entre os dois.

Convém, por uma vez, perceber o Eng. Sócrates. Não subiu por ter ideias, grandes ideias, subiu, simplesmente, porque não foi visto como uma ameaça por nenhum dos grandes poderes fácticos, do PS à chamada sociedade civil, Sócrates singrou porque conseguiu agradar a muitos sem hostilizar, ou fazer sombra, particularmente ninguém em particular. Não ter ideias às vezes faz jeito, porque descompromete e permite fazer no momento isto e o seu contrário sem riscos maiores de contradição, mas também há o reverso da medalha, a inexistência de um rumo claro e seguro.

Sócrates sabe que é chefe mas que ainda não é líder, o seu poder no PS - caucionado por Jorge Coelho - é-o enquanto tiver dinheiro, poder, lugares e benesses para distribuir, sendo que muito boa gente no PS ainda não digeriu a sua entronização como Primeiro Ministro. Sócrates também sabe, faç0-lhe essa justiça, que algo tem de ser feito, porque as coisas no País estão más de mais. Falta-lhe a bagagem, a segurança, a visão e o rasgo, e - certamente - a coragem, sobra-lhe Campos e Cunha.

Campos e Cunha pode ser politicamente infeliz, mas é a única esperança de Sócrates, deste Governo e desta legislatura. É-o porque se houver (alguns) resultados, estes não serão dele, mas de Sócrates, é-o porque ao ser pintado como o duro, protege Sócrates, o contemporizador/gerador de consensos, sendo que se há alguém neste governo com consciência do que está mal (embora nem sempre com as melhores ideias para apresentar) esse alguém é Campos e Cunha.

Irá pelo PS um grande sururú já que alegadamente as declarações de Campos e Cunha serão inoportunas em termos autárquicos, resta saber - numa noite quente de Outubro - se os resultados do PS se deverão mais a Campos e Cunha ou à gestão luminosa de Jorge Coelho do processo autárquico socialista. José Sócrates que tem capitalizado na guerrilha surda entre Coelho e por exemplo António Costa - que de príncipe ainda passa um destes dias a remodelado sem apelo nem agravo - sabe muito bem que enquanto for Primeiro-Ministro será sempre chefe do PS, se chegará a ser líder não sabemos.

Acresce ao enunciado que a entrevista pateta de Diogo Freitas do Amaral, também ela combinada com Sócrates, serve prefeitamente - como uma luva - os intentos do actual primeiro-ministro. Manifestamente José Sócrates conhece muito bem Freitas do Amaral, e também conhece muito bem o seu partido.

Sejamos francos, Freitas, o vaidoso-mor do regime, só aceitou integrar este governo porque lhe foi garantido que seria o candidato do PS contra o Prof. Cavaco. Ao contrário de Freitas que acredita genuinamente poder derrotar Cavaco, Sócrates não só espera, como deseja, Cavaco em Belém. E deseja-o porque não há ninguém no PS que lhe dê garantias de, desde Belém, não interferir, e não havendo só lhe resta menorizar a função presidencial.

Sócrates, que vai tendo memória, tem bem presentes as palhaçadas encenadas por Manuel Alegre no tempo do Eng. Guterres, como conhece muito bem a afeição que Ferro lhe nutre, e sabendo tudo isso prefere ter alguém do outro lado em Belém, e de quem não se espera à priori solidariedade, do que um companheiro de partido, ou de Governo, pronto a apunhalá-lo à primeira oportunidade (alguém está a ver um Freitas Presidente a preocupar-se primeiro com Sócrates, com o Governo ou com o Páis do que com o seu próprio umbigo ?)

Mas não se pense que este desejo de vitória de Cavaco é estritamente inocente ou conjuntural, não é, e é vem a ser aí que entra extraordinária imbecilidade - não há meio termo - do Prof. Diogo Freitas do Amaral. Sócrates quer, ao mesmo tempo que deixa Cavaco ganhar (não tem alternativa) esvaziar de vez a função presidencial, teatralizando-a, tentando assim criar um presidencialismo de primeiro-ministro.

É a esta luz que devem ser interpretadas as palavras de Freitas do Amaral, na sua entrevista de ontem, ao alegar que Cavaco não sendo da área do PS não será automaticamente imparcial e equidistante. Só que o actual MNE - cego pela vaidade - é demasiado limitado para perceber que isto não é sequer uma crítica a Cavaco - que até é, e sempre foi, um formalista, ao contrário por exemplo do guerrilheiro Soares que não se coibiria de dar umas aulitas ao jovem Sócrates - é, antes, um redesenho das funções constitucionais atribuidas a Governo e Presidente, bem delimitadas pela Constituição.

Freitas, enebriado, até nem se importa de ser PR, decorativo q.b., espécie de figura amorfa e palaciana, mestre de cerimónias, já Sócrates, mais lúcido, espera apenas que tal discurso obrigue Cavaco se não a dar garantias de sossego - que dá, aliás, por definição - pelo menos a polarizar realmente as presidenciais (afinal mais de metade dos eleitores que em fevereiro preferiram Sócrates afirmam ir votar em Cavaco) para finalmente poder ter mão num PS, unido finalmente à sua volta, que não vê, ainda, no PSD uma ameaça real.

Freitas é apenas o idiota útil ao serviço da estratégia de Sócrates. Só é pena que a habilidade que parece sobrar a Sócrates para comer o Partido Socialista falte tanto na gestão dos destinos do País.

 

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