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UM SAFARI LONGE DEMAIS
Criticar o facto do primeiro-ministro ter ido passar umas férias luxuosas é pasto para todas as demagogias. Um safari no Quénia é o equivalente a ir a Bora Bora, ou a um caríssimo hotel do Dubai com piscina privativa. Não é isso que me afronta. Ele paga as férias do seu bolso, e se tem dinheiro e vontade para o gastar com a família num safari, parabéns. A concepção punitiva da vida pública que obriga os políticos a uma vida hipocritamente monástica presta-se a todos os populismos e eu não sou desse clube.
Mas, se me espanta, face ao safari do eng. Sócrates, o silêncio comedido da maioria da comunicação social, sempre pronta a levantar a chama do ressentimento populista para os outros, e que não acredito que esteja calada porque aprendeu, acontece que me espanta tanto mais esse silêncio, quanto neste caso se justifica mesmo criticar o Primeiro-ministro pela sua opção de férias e exigir que as interrompa.
Por várias razões: uma é porque a altura é pessimamente escolhida para ter umas férias sumptuárias quando o seu governo está a pedir a todos sacrifícios e “apertar do cinto”; outra, porque a sua ausência do país, numa altura em que o fogo, mais uma vez, destrói pessoas e bens com grande dimensão, é por si mesma uma enorme desvalorização da importância do que está a acontecer. Quando há uma emergência num navio, o capitão não entrega o comando a um qualquer outro oficial para ir ver um DVD na sua cabine. Mesmo que seja do National Geographic.
(Escrito há uma semana. Agora que o PM voltou das férias, nada dá mais razão às críticas do que a sua atitude hoje, tentando remediar, em visitas "simbólicas" e conferências de imprensa, o que há muito devia ter feito e não fez. Nada apagará o significado político da da sua atitude, do PM substituto, dos governadores civis, do Secretário de Estado do Ambiente e de muitos responsáveis com nomeações políticas para Parques Naturais, e que se resume numa só frase: nada de importante aconteceu, nada de grave, nada de irreparável. Ardeu tudo como de costume. É por esta política, porque ter escolhido as férias que escolheu e não as ter interrompido, é uma política, que faz com que não seja demagogia criticar as opções do PM.)
José Pacheco Pereira
Criticar o facto do primeiro-ministro ter ido passar umas férias luxuosas é pasto para todas as demagogias. Um safari no Quénia é o equivalente a ir a Bora Bora, ou a um caríssimo hotel do Dubai com piscina privativa. Não é isso que me afronta. Ele paga as férias do seu bolso, e se tem dinheiro e vontade para o gastar com a família num safari, parabéns. A concepção punitiva da vida pública que obriga os políticos a uma vida hipocritamente monástica presta-se a todos os populismos e eu não sou desse clube.
Mas, se me espanta, face ao safari do eng. Sócrates, o silêncio comedido da maioria da comunicação social, sempre pronta a levantar a chama do ressentimento populista para os outros, e que não acredito que esteja calada porque aprendeu, acontece que me espanta tanto mais esse silêncio, quanto neste caso se justifica mesmo criticar o Primeiro-ministro pela sua opção de férias e exigir que as interrompa.
Por várias razões: uma é porque a altura é pessimamente escolhida para ter umas férias sumptuárias quando o seu governo está a pedir a todos sacrifícios e “apertar do cinto”; outra, porque a sua ausência do país, numa altura em que o fogo, mais uma vez, destrói pessoas e bens com grande dimensão, é por si mesma uma enorme desvalorização da importância do que está a acontecer. Quando há uma emergência num navio, o capitão não entrega o comando a um qualquer outro oficial para ir ver um DVD na sua cabine. Mesmo que seja do National Geographic.
(Escrito há uma semana. Agora que o PM voltou das férias, nada dá mais razão às críticas do que a sua atitude hoje, tentando remediar, em visitas "simbólicas" e conferências de imprensa, o que há muito devia ter feito e não fez. Nada apagará o significado político da da sua atitude, do PM substituto, dos governadores civis, do Secretário de Estado do Ambiente e de muitos responsáveis com nomeações políticas para Parques Naturais, e que se resume numa só frase: nada de importante aconteceu, nada de grave, nada de irreparável. Ardeu tudo como de costume. É por esta política, porque ter escolhido as férias que escolheu e não as ter interrompido, é uma política, que faz com que não seja demagogia criticar as opções do PM.)
José Pacheco Pereira
2 Comments:
O regresso
As férias de José Sócrates evitaram que tivesse de explicar os critérios de nomeação da nova administração da CGD.
Finalmente, temos o primeiro-ministro de regresso. O País que o recebe de volta das retemperadoras férias africanas não é o mesmo que ele deixou no início de Agosto. É uma nação a arder não só com os fogos mas também com artigos de opinião e entrevistas insólitas dos seus ministros entre os quais avultam Mário Lino e Teixeira dos Santos que, nas páginas do Diário Económico, não tiveram problemas em justificar, com fundamentos em que poucos acreditam, o porquê das suas opções. Em causa estão as críticas aos investimentos no aeroporto da Ota e a composição da nova administração da Caixa Geral de Depósitos. Sócrates regressa com a casa arrumada e a equipa ministerial a responder à sua voz de comando mas com o País desarrumado, confuso e a meditar nas causas que levam um Governo de maioria absoluta a desperdiçar tantas oportunidades.
Sócrates regressa com os preços do petróleo a subir e com más notícias da Direcção Geral do Orçamento: o défice do sub-sector do Estado continua a aumentar, situando-se nos quatro mil milhões de euros nos primeiros sete meses do ano, excluindo as despesas de anos anteriores. O valor divulgado corresponde a um agravamento de 194 milhões de euros face ao período homólogo de 2004. O aumento do défice deve-se ao crescimento da receita ser inferior à despesa em 0,2 pontos percentuais. É certo que estamos em período de reembolsos do IRS mas não deixam de ser números preocupantes pois não revelam qualquer tendência de descida.
Mas se os números não o deixam tranquilo, as mais recentes declarações de Mário Soares sobre a sua provável (re)candidatura à Presidência da República revelam que o PS e a esquerda têm homem e que a democracia deixou de estar em perigo porque Cavaco Silva não tem a vitória garantida – é impressionante como é que se pode considerar a democracia em perigo 30 anos depois do 25 de Abril. Arrumado o assunto das presidenciais, Sócrates tem assim tempo para se concentrar no combate das autárquicas e nas pedras do sapato que ainda tem por resolver. Pode começar por explicar, por exemplo, porque é que a campanha do PS em Oeiras praticamente não existe – será porque os socialistas apostam “secretamente” na vitória do agora independente Isaltino Morais? – e porque é que Carrilho não entusiasma Lisboa. Claro que Felgueiras e e a sua Fátima não lhe tiram o sono pois esse é um problema que Jorge Coelho resolverá.
O País que Sócrates reencontra continua novamente envolto em chamas sem ninguém conseguir explicar porquê. Às imagens de pânico de uma população desnorteada, juntam-se a impotência do bombeiros e os habituais lamentos de falta de equipamento e de estruturas eficazes de comando e controlo. Seria interessante saber, por exemplo, quanto dinheiro é que os bombeiros receberam nos últimos anos do Estado português, o que é que fizeram a esse dinheiro – grande parte dele foi gasto em bons e sofisticados quartéis – e como o aplicaram na modernização de meios e na formação do seu pessoal e novas técnicas de combate aos incêndios. Seria também interessante perceber porque é que os Governadores Civis – com este ou com outros Governos – estão primeiro ao lado do Executivo que os nomeou e só depois do lado das populações que servem. Convém mesmo perguntar é para que servem os Governos Civis, cujo prazo de validade há muito expirou.
De facto, o País que Sócrates vai encontrar não é o mesmo que deixou no início de Agosto. As férias evitaram que tivesse de responder às desconfianças sobre os grandes projectos públicos e de explicar os critérios de nomeação da nova administração da CGD, mas colocaram-lhe um desafio inesperado: reconquistar o País e os portugueses.
A política florestal no país é trágica
O que está a arder é aquilo a quem, um dia, alguém chamou o petróleo verde. Eis o resultado da política florestal de vinte anos. Já temos livros brancos, livros pretos, livros vermelhos, livros verdes sobre os fogos e todos os anos é a mesma coisa.
TVI - Dói, ver o país a arder assim.
MST - A primeira coisa que nos vem à cabeça é a seguinte: há vinte anos, várias pessoas – entre as quais tive a honra de estar incluído – protestaram contra a eucaliptização do país, contra o facto de só se plantarem pinheiros e eucaliptos para servir as celuloses. Foi uma política florestal trágica e, na altura o que se dizia e com razão é que ia contribuir para a desertificação: seca os solos, conduz ao abandono da agricultura, conduz ao abandono das populações locais, desertifica humana e fisicamente o interior e funciona como um inacreditável combustível. O que está a arder é aquilo a quem, um dia, alguém chamou, o petróleo verde. O que arde sobretudo, são eucaliptos e pinheiros que são árvores que são muito rentáveis porque são de crescimento rápido, usadas para a celulose. Onde ainda há zonas agrícolas que permeiam com árvores como carvalhos, como nogueiras, etc., o fogo não progride a esta velocidade e é mais fácil de combater. Aquilo que está a arder, acima de tudo, é uma política criminosa de uso da floresta em Portugal. Essa é a primeira coisa. Segunda, uma política de abandono das zonas rurais, das zonas agrícolas do interior, abandono esse que passa por muitas coisas como por exemplo, o desmantelamento das linhas de comboios da CP e, por isso é que eu fico indignado quando hoje vejo, proporem-nos um TGV para ligar Aveiro a Salamanca, ou Faro a Huelva – uma anedota nacional – querem gastar milhões no TGV mas desmantelaram as linhas de caminho de ferro que iam para o interior e que fixavam populações no interior. Todo o ordenamento do país foi feito para tirar pessoas do interior. Diziam que a agricultura não era rentável e que o futuro eram os campos de golf e as celuloses. O resultado está à vista. Já temos livros brancos, livros pretos, livros vermelhos, livros verdes sobre os fogos e todos os anos é a mesma coisa. Não se entende como é que o exército não vigia a mata, porque é que temos submarinos e F-16 e não temos meios militares para combater os fogos. Chegou a altura de se pensar em todo o ordenamento do país não é por acaso que temos um terço de área ardida de todo o sul da Europa. Sobre um mês que tem sido muito difícil, com as notícias da frente política, o panorama dos incêndios, conduz a um estado de desanimo. E no meio disto, há uma sensação de que está tudo entregue a si próprio. Não se vê o poder político. Não quero entrar na discussão se o primeiro-ministro devia ou não ter interrompido as férias, ou o Presidente da República, mas há coisas que a mim me chocam. O Presidente não interrompe as férias por causa dos incêndios mas interrompe-as para condecorar os U2? Faz-me confusão. Parece-me que o país está à deriva em relação às coisas que interessam. Discute-se se Soares se candidata contra Cavaco, ou não. Discute-se se o Armando Vara vai para a CGD ou não. E aquilo que verdadeiramente interessa, parece entregue ao seu destino que é arder.
Miguel Sousa Tavares
No Jornal da Noite da TVI
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