INFORMAÇÃO, AMBIENTE E A USURA DO TEMPO
Quando em tempo de seca os leitos das ribeiras são amontoados de lixo e de plantas que ali crescem desordenadamente (...) com que Ambiente é que nos preocupamos?
A época estival remete-nos inapelavelmente para as coisas boas que a natureza e a intervenção humana proporcionam, em termos de lazer e bem-estar.
É também um período por excelência para se deitar contas à vida e porque o tempo parece passar mais devagar, pôr sonhos e ambições na ordem do dia e retrospectivar o passado mais recente.
Com as lucubrações em alta, detém-se a atenção na forma como a agenda mediática gere os temas e o tempo – ao contrário da lógica política, onde se produzirão efeitos amanhã, o tempo mediático é por natureza muito restrito, tem lugar hoje e apresenta-se secundarizando causas e consequências.
Quando, por de entre muitos outros exemplos possíveis, nas últimas eleições presidenciais francesas, do pé para a mão, Le Pen surge como potencial vencedor sobre Chirac, para os que não acompanham a actualidade daquele país, dá-se um sobressalto que os media criam e não esclarecem – o que é que aconteceu nos anos anteriores, no tempo que passou, como é que a situação evoluiu até chegar ali? – Toda a atenção dos media foi focalizada na dramatização desse cenário para suscitar a atenção da «plateia» no momento, mas, concluído o processo eleitoral, com o regresso à normalidade, a realidade francesa voltou a eclipsar-se da grande informação até às eleições legislativas e ao referendo europeu seguintes.
Talvez não haja espaço noticioso nem tempo disponível para acompanhar o essencial (e quem define o que é essencial?), porventura o noticiário de cada dia necessita deste desligamento, desta ausência de encadeamento para suscitar atenção redobrada.
Na falta deste fio condutor, justa ou injustamente, dá-se o flanco, abre-se espaço para a dúvida e para a especulação.
E assim, dando asas ao livre pensamento e com a memória de lugares e factos avivada neste período, recorda-se à época, salvo erro no primeiro mandato de José Luís Judas como presidente do município de Cascais, a polémica sobre o empreendimento turístico «Casa da Guia», situado na arriba frente ao oceano Atlântico, a caminho do Guincho.
Foi considerado na altura um grave atentado ambiental em zona de protecção, ilegal por não estar licenciado, em risco potencial de escorregamento da costa, mas quase uma década depois lá continua, para quem não conheça é um espaço arborizado, com um antigo solar central, recuperado e uma dúzia de pequenas instalações amovíveis com restaurantes, esplanadas e lojas muito bem integradas no magnífico cenário natural.
No mandato seguinte do mesmo senhor, a urbanização dos Jardins da Parede (entre a Parede e S. Pedro do Estoril), foi apresentada como o paradigma da construção desenfreada que reinava naquele concelho, perante o balbuciar de uma defesa que parecia comprometida e injustificada.
Ambas as situações mereceram ampla contestação política, ambiental e mediática – seriam apenas sinais e símbolos de atropelos mais graves?
Do empreendimento da Guia nunca mais se ouviu falar – terão sido corrigidas as eventuais irregularidades? O risco de desmoronamento é agora menor ou está controlado?
Onde hoje se situa aquela urbanização, já poucos se lembrarão, era outrora um misto de terrenos baldios com um bairro de barracas apenas estancado pela linha-férrea.
Relativamente incaracterísticos em termos arquitectónicos os «Jardins da Parede» revelam visível cuidado nas distâncias entre prédios, nos estacionamentos e qualidade das vias, dispondo de um amplo espaço verde criado de raiz.
Provavelmente feito a pensar nas classes média e média alta, também a polémica em torno deste empreendimento, apesar de continuar em edificação, desapareceu da cena pública mal mudaram os intérpretes.
Se em termos políticos e mediáticos se percebe a coisa, conhecendo-se mal as causas e pior as consequências, em termos ambientais, perante as muitas organizações criadas para a preservação e defesa do meio ambiente, causa perplexidade o seu silêncio prolongado sobre estas matérias, a ausência de avaliação no tempo decorrido, confirmando ou corrigindo os receios então expressos, até porque o seu tempo de intervenção não deve ser o mediático e a informação pública não se restringe ao combate e confronto político.
Quando em tempo de seca, os leitos das ribeiras são amontoados de lixo e de plantas que ali crescem desordenadamente, quando em pleno século XXI, no alto dessa mesma localidade, junto a outra urbanização recente de qualidade ainda é possível correr, metros a fio e a céu descoberto, um esgoto sem repúdio público, com que Ambiente é que nos preocupamos, quais as prioridades políticas sectoriais e as das organizações especializadas?
Nos derradeiros anos do século passado, a denominada Agenda XXI para um desenvolvimento sustentável, inspirada em conferência internacional, foi um «must» para a projecção e aplicação de novas políticas ambientais obedecendo àquele desiderato.
Como sempre as intenções eram as melhores, estudos, projectos e seus financiamentos foram muitos, mas quanto à avaliação dos resultados alcançados, aí fia mais fino, porque se há qualquer coisa de detestável é o exercício para comprovar ou não o acerto e eficácia de terapias laboriosamente congeminadas?
Já vai sendo tempo de saber-se, ao nível das várias Agendas Locais produzidas, o que foi feito ou não e porquê, e respectiva relação custo-benefício.
Novas lógicas de crescimento para além de um mal-amado e pouco compreendido Ordenamento do Território?
Também o desenvolvimento sustentável, pese a atracção de conceito e as boas intenções que expressa, se arrisca a rapidamente engrossar as galerias dos placebos.
Tal como na actividade política tudo muda vertiginosamente, perdida a idade da inocência ambiental, os lixos viraram resíduos sólidos e a defesa emocional das causas deu lugar à nova indústria que gere o sector com a frieza dos números e estatísticas.
Hoje, o princípio, meio e fim da história, de cada história, restringe-se em tempo real às novelas; como alguém definia de modo exemplar, poder, relações, traições e dinheiro, está tudo lá.
Mas o quotidiano político, mediático e ambiental, parecendo ser uma outra coisa, compete pela primazia da superficialidade, onde só contam o hoje e os «amanhãs que cantam».
Para que o ser humano se possa condoer da sua própria natureza?
Luís Sousa
A época estival remete-nos inapelavelmente para as coisas boas que a natureza e a intervenção humana proporcionam, em termos de lazer e bem-estar.
É também um período por excelência para se deitar contas à vida e porque o tempo parece passar mais devagar, pôr sonhos e ambições na ordem do dia e retrospectivar o passado mais recente.
Com as lucubrações em alta, detém-se a atenção na forma como a agenda mediática gere os temas e o tempo – ao contrário da lógica política, onde se produzirão efeitos amanhã, o tempo mediático é por natureza muito restrito, tem lugar hoje e apresenta-se secundarizando causas e consequências.
Quando, por de entre muitos outros exemplos possíveis, nas últimas eleições presidenciais francesas, do pé para a mão, Le Pen surge como potencial vencedor sobre Chirac, para os que não acompanham a actualidade daquele país, dá-se um sobressalto que os media criam e não esclarecem – o que é que aconteceu nos anos anteriores, no tempo que passou, como é que a situação evoluiu até chegar ali? – Toda a atenção dos media foi focalizada na dramatização desse cenário para suscitar a atenção da «plateia» no momento, mas, concluído o processo eleitoral, com o regresso à normalidade, a realidade francesa voltou a eclipsar-se da grande informação até às eleições legislativas e ao referendo europeu seguintes.
Talvez não haja espaço noticioso nem tempo disponível para acompanhar o essencial (e quem define o que é essencial?), porventura o noticiário de cada dia necessita deste desligamento, desta ausência de encadeamento para suscitar atenção redobrada.
Na falta deste fio condutor, justa ou injustamente, dá-se o flanco, abre-se espaço para a dúvida e para a especulação.
E assim, dando asas ao livre pensamento e com a memória de lugares e factos avivada neste período, recorda-se à época, salvo erro no primeiro mandato de José Luís Judas como presidente do município de Cascais, a polémica sobre o empreendimento turístico «Casa da Guia», situado na arriba frente ao oceano Atlântico, a caminho do Guincho.
Foi considerado na altura um grave atentado ambiental em zona de protecção, ilegal por não estar licenciado, em risco potencial de escorregamento da costa, mas quase uma década depois lá continua, para quem não conheça é um espaço arborizado, com um antigo solar central, recuperado e uma dúzia de pequenas instalações amovíveis com restaurantes, esplanadas e lojas muito bem integradas no magnífico cenário natural.
No mandato seguinte do mesmo senhor, a urbanização dos Jardins da Parede (entre a Parede e S. Pedro do Estoril), foi apresentada como o paradigma da construção desenfreada que reinava naquele concelho, perante o balbuciar de uma defesa que parecia comprometida e injustificada.
Ambas as situações mereceram ampla contestação política, ambiental e mediática – seriam apenas sinais e símbolos de atropelos mais graves?
Do empreendimento da Guia nunca mais se ouviu falar – terão sido corrigidas as eventuais irregularidades? O risco de desmoronamento é agora menor ou está controlado?
Onde hoje se situa aquela urbanização, já poucos se lembrarão, era outrora um misto de terrenos baldios com um bairro de barracas apenas estancado pela linha-férrea.
Relativamente incaracterísticos em termos arquitectónicos os «Jardins da Parede» revelam visível cuidado nas distâncias entre prédios, nos estacionamentos e qualidade das vias, dispondo de um amplo espaço verde criado de raiz.
Provavelmente feito a pensar nas classes média e média alta, também a polémica em torno deste empreendimento, apesar de continuar em edificação, desapareceu da cena pública mal mudaram os intérpretes.
Se em termos políticos e mediáticos se percebe a coisa, conhecendo-se mal as causas e pior as consequências, em termos ambientais, perante as muitas organizações criadas para a preservação e defesa do meio ambiente, causa perplexidade o seu silêncio prolongado sobre estas matérias, a ausência de avaliação no tempo decorrido, confirmando ou corrigindo os receios então expressos, até porque o seu tempo de intervenção não deve ser o mediático e a informação pública não se restringe ao combate e confronto político.
Quando em tempo de seca, os leitos das ribeiras são amontoados de lixo e de plantas que ali crescem desordenadamente, quando em pleno século XXI, no alto dessa mesma localidade, junto a outra urbanização recente de qualidade ainda é possível correr, metros a fio e a céu descoberto, um esgoto sem repúdio público, com que Ambiente é que nos preocupamos, quais as prioridades políticas sectoriais e as das organizações especializadas?
Nos derradeiros anos do século passado, a denominada Agenda XXI para um desenvolvimento sustentável, inspirada em conferência internacional, foi um «must» para a projecção e aplicação de novas políticas ambientais obedecendo àquele desiderato.
Como sempre as intenções eram as melhores, estudos, projectos e seus financiamentos foram muitos, mas quanto à avaliação dos resultados alcançados, aí fia mais fino, porque se há qualquer coisa de detestável é o exercício para comprovar ou não o acerto e eficácia de terapias laboriosamente congeminadas?
Já vai sendo tempo de saber-se, ao nível das várias Agendas Locais produzidas, o que foi feito ou não e porquê, e respectiva relação custo-benefício.
Novas lógicas de crescimento para além de um mal-amado e pouco compreendido Ordenamento do Território?
Também o desenvolvimento sustentável, pese a atracção de conceito e as boas intenções que expressa, se arrisca a rapidamente engrossar as galerias dos placebos.
Tal como na actividade política tudo muda vertiginosamente, perdida a idade da inocência ambiental, os lixos viraram resíduos sólidos e a defesa emocional das causas deu lugar à nova indústria que gere o sector com a frieza dos números e estatísticas.
Hoje, o princípio, meio e fim da história, de cada história, restringe-se em tempo real às novelas; como alguém definia de modo exemplar, poder, relações, traições e dinheiro, está tudo lá.
Mas o quotidiano político, mediático e ambiental, parecendo ser uma outra coisa, compete pela primazia da superficialidade, onde só contam o hoje e os «amanhãs que cantam».
Para que o ser humano se possa condoer da sua própria natureza?
Luís Sousa
1 Comments:
As boas e as más notícias
Portugal, normalmente, balançava entre as boas e as más notícias. Hoje em dia as boas parecem ter desaparecido e as más desequilibram o barco para estibordo.
Os passageiros olham para a água e vão em busca de um colete-de-salvação. No caso de não haver, como começa a ser habitual, alguma comissão de inquérito há-de estudar o problema. Isto é: funcionará como tumba para a insuficiência de decisões.
O Governo é incapaz de mostrar que é uma equipa com meia dúzia de ideias coerentes para o país.
O Presidente condecora os U2 e com isso resolve o mal-estar de nunca termos tido uma política concreta nas nossas relações com os países africanos que oficialmente falam português.
O Estado português olha para tudo com uns óculos escuros: quando vê o sol, manda-o tapar.
A CGD está a ter lucros excessivos? Demita-se a administração e coloque-se lá um amigo.
Os fogos derretem o país? Os ministros devem fazer o mínimo ruído, para ninguém reparar que alguém tem nas mãos as rédeas das decisões.
O Governo está numa fase crítica: ainda está há seis meses no poder e já sofre de colesterol. Em vez de tratar dos problemas do país, já baixou às urgências. Espera-se que alguns dos seus membros se vão juntar a Fernando Gomes.
Quando o petróleo sobe lá fora, todas as desculpas são possíveis.
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