quarta-feira, 2 de novembro de 2005

O PARTIDO SOCIALISTA NO SEU MELHOR!


Segundo a Visão Online

a Polícia Judiciária

faz buscas em casa de

Jorge Coelho.

12 Comments:

At 2 de novembro de 2005 às 17:51, Anonymous Anónimo said...

A minha posição era a de não indemnizar os sujeitos. Isto é: não lhes dar aquilo que eles queriam. O meu entendimento e o do meu gabinete era o de que a pretensão da Eurominas não tinha razão de ser. (...) Nem sei que negociações é que houve, nem por por que razão é que se decidiu dar aquela pipa de massa à Eurominas.

João Cravinho, hoje, no Público

 
At 2 de novembro de 2005 às 17:54, Anonymous Anónimo said...

Já referenciamos a história da eurominas, que o Público desbaratou a semana passada.
Dito isto, e num serviço prestado aos nossos leitores, reproduzimos abaixo o texto integral da mesma história. Cada um que julgue, que a história nos julgará a todos.



Jornal PÚBLICO

23 de Setembro de 2005



12 milhões pagos pelo Estado em 2001

Escritório de Lamego, Costa e Vitorino conseguiu indemnização para um
cliente que tinha sido recusada por Cavaco Silva

José António Cerejo

Logo após ter saído do Governo, onde tinha tido responsabilidades na negociação do caso, José Lamego passou a representar a parte contrária ao Estado e o seu cliente obteve a indemnização que lhe havia sido recusada.

O Governo de António Guterres pagou, em 2001, uma indemnização de quase 12 milhões de euros à multinacional Eurominas, depois de a empresa ter passado a ser representada, nas negociações destinadas a pôr fim ao litígio que a opunha o Estado, pelo dirigente socialista José Lamego e outros advogados do escritório criado por ele próprio, por António Vitorino e pelo actual ministro da Justiça, Alberto Costa, após a saída dos três do Executivo em finais de 1997.

A indemnização em causa tinha sido expressamente recusada por Cavaco Silva em 1995 e era reivindicada pela Eurominas devido ao facto de o Governo do PSD ter decretado a devolução ao Estado, sem qualquer compensação, dos 86 hectares do estuário do Sado que tinham sido cedidos à empresa em 1973 para aí instalar uma fábrica entretanto encerrada.

Mesmo António Guterres sustentou depois em tribunal, durante anos, que a reivindicação da Eurominas não tinha qualquer fundamento legal. Todavia, logo a seguir à sua tomada de posse como ministro da Defesa e da Presidência no primeiro Executivo Guterres, ainda em 1995, António Vitorino desencadeou um longo processo de negociações, a pedido da Eurominas, que
envolveu também, em nome do Governo, o então secretário de Estado da Cooperação José Lamego, e acabou por conduzir ao acordo indemnizatório de 2001.

O valor estabelecido nesse acordo, dois milhões e 384 mil contos (quase 12 milhões de euros), mais do que duplicou o montante de um milhão e 143 mil contos proposto por todos os técnicos representantes do Estado num grupo de trabalho nomeado para determinar a indemnização a pagar depois de Vitalino Canas, à época secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros, ter formalmente aceite, em 1998, o princípio de que a Eurominas tinha direito a ser indemnizada.

O processo negocial iniciado por António Vitorino passou para as mãos de Vitalino Canas no final de 1997, após a demissão do ministro da Defesa e da Presidência, e foi depois herdado pelo secretário de Estado da Administração Portuária, Narciso Miranda, e pelo seu sucessor na pasta,
José Junqueiro, que haveria de celebrar o acordo final com empresa em meados de 2001.

Representada inicialmente nos contactos com o Governo pelo seu advogado e administrador delegado Bernardo Alegria, a Eurominas passou a ser representada pelo advogado José Lamego, amigo de longa data daquele administrador, quando o secretário de Estado da Cooperação deixou o Governo, juntamente com António Vitorino e Alberto Costa.

Ao longo de quase dois anos, entre 1998 e finais de 1999, José Lamego, que foi eleito deputado nas eleições de Outubro desse ano, passou a enfrentar à mesa das negociações, em nome da Eurominas, os quatro representantes do Estado que com ele discutiram o valor da indemnização a pagar à empresa. O acordo não foi obtido nessa altura, mas acabou por sê-lo um ano e meio
depois, em Maio de 2001, numa base idêntica à negociada com José Lamego, pelo seu irmão António Lamego, igualmente sócio do escritório de advogados de Alberto Costa, José Lamego, Rui Afonso e Associados [António Vitorino tinha saído meses antes para a Comissão Europeia].

Lamego diz que lhe escapou "impedimento legal"

Confrontado com o facto de ter enfrentado o Estado em nome da Eurominas menos de um ano após ter cessado as suas funções governamentais, o que é proibido por lei -- independentemente do facto de ter previamente acompanhado o processo enquanto membro do Governo - , o actual deputado socialista José Lamego começou por negar a existência de qualquer ilegalidade nessa situação. "Quando participei nessas negociações, eu não era deputado. Nunca iria cometer uma falha grosseira a esse nível", garantiu ao PÚBLICO, em Abril deste ano, o também professor de Direito José Lamego, excluindo assim a hipótese de a sua intervenção violar algum preceito legal. Mas, posto perante o artigo 9º da Lei 6/93 - segundo o qual "os titulares de cargos políticos e de altos cargos públicos estão impedidos de servir de árbitro ou de perito, a título gracioso ou
remunerado, em qualquer processo em que seja parte o Estado e demais pessoas colectivas", mantendo-se esse impedimento "até ao termo do prazo de um ano após a respectiva cessação de funções" -, o deputado corrigiu a sua posição: "Sinceramente não me apercebi na altura da existência desse impedimento. Admito que me tenha escapado esse preceito, que aliás é um
bocado esdrúxulo."

"Agi em total boa-fé"

José Lamego secundariza o seu papel, enquanto secretário de Estado, na fase inicial das negociações com a Eurominas - "Recebi uma vez o dr. Bernardo Alegria apenas na óptica dos bons ofícios. Aliás, sou amigo dele há muitos anos e considero que não houve qualquer conflito de interesses, porque eles nunca chegaram a formalizar, junto da Secretaria de Estado da Cooperação, o projecto de investimento que queriam fazer em Angola, se fossem indemnizados -, mas considera que "o Estado fez um excelente acordo" com a empresa. Quanto à Eurominas, o deputado acha que a empresa também ficou bem. "Ir para os tribunais demorava sete ou oito anos. Eu recomendei que fizessem o acordo pelos três milhões de contos e eles aceitaram por um
pouco menos."

Sustentando que "o decreto de reversão [de Cavaco Silva] é um absurdo, porque configura uma forma de confisco", o deputado frisou que não esteve nas negociações até ao fim. Questionado sobre o nome de quem ficou a representar a Eurominas, respondeu: "Foi o dr. Gonçalo Capitão." "Mas o seu irmão, o dr. António Lamego, também ficou...", lembrou o PÚBLICO. "É
possível", admitiu. A propósito do facto de tanto ele como António Lamego serem sócios da sociedade de advogados a que também pertencia o ministro que tinha sido o motor das negociações com os seus clientes, José Lamego assegurou: "O dr. António Vitorino não estava sequer a par de que o processo estava a ser tratado por nós." A lei das sociedades de advogado estabelece, contudo, que "devem os sócios prestar mutuamente informações sobre a actividade
profissional de advogado, sem que tal envolva violação do segredo profissional".
Em todo o caso, a representação da Eurominas através do escritório de advogados que tinha como sócios dois ex-membros do Governo ligados às negociações que a sociedade mantinha com o Estado não levanta qualquer problema a José Lamego. "Acho que não há razão nenhuma para me sentir incomodado. Agi em total boa-fé. Vi agora que não podia intervir como
árbitro, mas as arbitragens são as coisas mais inócuas que há", afirmou.

Vitalino não responde, Vitorino diz que não é nada com ele e Junqueiro engana-se

Vitalino Canas, o secretário de Estado e actual vice-presidente do grupo parlamentar do PS que tutelou uma parte das negociações entre o Estado e a Eurominas, quando esta era representada por José Lamego, recusou-se a responder às várias perguntas escritas do PÚBLICO sobre este assunto. Após muitas insistências telefónicas justificou-se: "Não respondo, porque as minhas respostas seriam tratadas de uma forma desonesta."

Já António Vitorino, no essencial, limitou-se a responder por escrito: "Os actos a que se reporta são posteriores à minha saída do Governo, a qual, como decerto bem sabe, se verificou em Novembro de 1997." E acrescentou: "No que me diz respeito, apenas se me afigura pertinente sublinhar que, no período em que exerci a advocacia, entre 1998 e 1999, nunca tive qualquer
interferência, nem directa nem indirecta, no processo em causa."

Mais prolixo foi José Junqueiro, o secretário de Estado a quem coube, em 2001, fechar as negociações com o escritório de advogados que representava a Eurominas. Provavelmente por não ter tido tempo de reavivar a memória - uma vez que respondeu ao PÚBLICO poucas horas depois de ter recebido as perguntas -, o também vice-presidente do grupo parlamentar socialista
invocou, para explicar o acordo que assinou, uma resolução do Conselho de Ministros e um acórdão do Tribunal Constitucional que, simplesmente, nunca existiram.

Em causa, na pergunta, estava a possibilidade legal de o protocolo que atribuiu a indemnização à Eurominas contrariar o disposto no decreto de reversão de 1995, segundo o qual a reversão dos terrenos não daria lugar a qualquer indemnização.

O antigo secretário de Estado respondeu que a celebração desse protocolo "não configura qualquer ilegalidade", uma vez que "resulta do cumprimento da Resolução do Conselho de Ministros que reconhece àquela empresa o direito a uma indemnização". Sucede que a resolução invocada pelo deputado nunca foi aprovada nem publicada.

Para reforçar a ideia da legalidade do tal protocolo, José Junqueiro reconhece que ele "não tem poderes revogatórios" do decreto de reversão, mas acrescenta que este diploma "veio a ser declarado inconstitucional pelo Tribunal Constitucional" - o que é manifestamente falso, uma vez que esse assunto nunca foi levado ao TC e o Supremo Tribunal Administrativo nunca se chegou a pronunciar sobre ele, precisamente a pedido da Eurominas, que tinha interposto o recurso de anulação do decreto, e do Estado, que sempre advogou a sua constitucionalidade.

Contactada pelo PÚBLICO, a antiga assessora jurídica para quem José Junqueiro remeteu a prestação de esclarecimentos complementares não respondeu ao pedido que lhe foi feito para identificar a resolução e o acórdão em questão.

Quanto ao resto, o deputado entende que o acordo por ele assinado "foi um bom acordo para o Estado, que viu reduzido o montante da indemnização em cerca de 4,5 milhões de euros, com a desistência dos demais processos judiciais contra o Estado, para além de ter desbloqueado um litígio com mais de cinco anos, lesivo dos interesses da própria APSS, que, assim, facultou àquela entidade o início de processos de concessão mais vantajosos para aqueles terrenos". Por explicar fica o sentido da afirmação de que houve uma redução de 4,5 milhões de euros na indemnização paga, dúvida que também não teve resposta da antiga assessora jurídica de Junqueiro. J.A.C.

O chefe de gabinete de Guterres e o tio

"Lembrei-me de lhe fazer chegar às mãos a opinião técnica abalizada do assessor fiscal do PM (obtida a título particular e confidencial por intervenção do meu sobrinho)." Neste caso o tio é o juiz-conselheiro jubilado Luciano Patrão, ex-presidente do Supremo Tribunal Administrativo, e o sobrinho é Luís Patrão, o antigo chefe de gabinete do PM (primeiro-ministro) António Guterres e actual chefe de gabinete de José Sócrates. A lembrança do alto magistrado, que dois anos antes tinha sido nomeado pelo Governo para presidir ao grupo de trabalho que procurou chegar a um acordo entre o Estado e a Eurominas, foi dirigida em Maio de 2000, em carta manuscrita, ao chefe de gabinete de Vitalino Canas, então secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros. Objectivo: solicitar os bons ofícios do gabinete para que lhe fossem pagos os honorários combinados e correspondentes aos serviços prestados como presidente do grupo de trabalho dissolvido meses antes.

Anexo à carta do juiz - que se inclui entre os documentos que a Presidência do Conselho de Ministros considerou, em Abril passado, que não eram públicos, por conterem "dados pessoais" e só facultou ao PÚBLICO depois de a Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos ter emitido parecer em sentido contrário - encontra-se uma folha avulsa onde "o assessor fiscal do PM" esclarece, em abstracto, que o pagamento daquele tipo de serviços pode ser feito sem especiais formalismos de natureza fiscal, no quadro dos chamados "actos isolados".

Juntamente com a carta pessoal e com o documento "confidencialmente" obtido pelo sobrinho no gabinete do primeiro-ministro, o ex-presidente do STA enviou também a Paulo Tavares, o chefe de gabinete de Vitalino Canas, pedindo-lhe que as transmitisse aos destinatários, duas declarações de débito e dois recibos de quitação dirigidos à Eurominas e à Administração dos Portos de Setúbal e Sesimbra, entidades, a quem competia pagar os 1500 contos dos seus honorários. O PÚBLICO tentou repetidas vezes obter uma comentário de Luís Patrão ao seu papel neste caso, mas o chefe de gabinete de José Sócrates não deu qualquer resposta. J.A.C.
Lei determinava reversão sem indemnização

A origem desta história está na desafectação do domínio público marítimo, em 1973, de 86 hectares de terrenos pantanosos do estuário do Sado, em Setúbal, para serem cedidos à Eurominas por um preço simbólico (6906 mil contos), na condição de ali implantar uma unidade metalúrgica de ligas de manganés. A finalidade da desafectação e da cedência era apenas essa e a lei (DL 48 784, de 21 de Dezembro de 1968) estabelecia expressamente que "reverterão ao domínio público os terrenos a que for dada utilização diferente da fixada no decreto de desafectação", determinando que "a reversão importa a perda a favor do Estado das obras e benfeitorias realizadas nos terrenos e não confere direito a qualquer indemnização nem à restituição do preço por eles pago".

Construída a fábrica e as instalações portuárias, a laboração começou em 1975 e durou uma década, beneficiando dos fortíssimos apoios do Estado à empresa em energia eléctrica, principal custo da mesma e factor determinante da sua competitividade internacional. Já em 1984, e depois de no ano anterior ter informado a sociedade de que não renovaria o acordo de preços estabelecido por dez anos em 1974, a EDP aumentou as tarifas. Como a Eurominas os recusou e continou a pagar segundo a tabela de 1974, a EDP fez as contas ao diferencial e, em Agosto de 1986, cortou o fornecimento de electricidade, reclamando à empresa o pagamento de uma dívida acumulada de quase 4,5 milhões de contos. Sem energia eléctrica, a Eurominas suspendeu a actividade fabril, iniciando-se, em simultâneo, um complexo litígio entre a empresa e a EDP, que se arrastou até 1996. E foi assim que, em Maio de 1995, nove anos depois da interrupção da actividade industrial, o Governo de Cavaco Silva entendeu que "as condições em que foi efectuada a desafectação não estão a ser satisfeitas, inexistindo perspectivas razoáveis de que a situação se modifique". Face a esta constatação, o Decreto 14/95, assinado pelo então primeiro-ministro, ordenou a reversão, em 20 dias, dos 86 hectares para o domínio público marítimo, determinando que "a reversão implica a perda a favor da Administração dos Portos de Setúbal e Sesimbra (APSS) de todas as obras e benfeitorias realizadas nos terrenos".

Inconformada com esta decisão, a Eurominas (ligada ao grupo Pechiney e controlada por capitais franceses e sul-africanos) recusou-se a acatar a decisão e desencadeou diversas acções judiciais para suspender a aplicação do decreto (que perdeu sempre) e conseguir a sua anulação (que nunca chegou a ser julgada).

Pouco antes de perder as eleições de Outubro de 1995, Cavaco assinou uma declaração que reconhecia a "grave urgência para o interesse público da imediata execução" do decreto de reversão, que permitiria ultrapassar o pedido de suspensão da sua eficácia apresentado em tribunal pela Eurominas.

A queda do Governo impediu que essa solução fosse posta em prática. Nos dois anos seguintes, a APSS pediu por duas vezes ao Executivo, em 1996 e em 1997, que accionasse idêntica iniciativa.
A resposta nunca chegou a Setúbal. Mas quatro anos depois, em 2001 - por intermédio dos advogados da sociedade de Vitorino, Lamego e Alberto Costa - a Eurominas chegou a acordo com o Estado e recebeu uma indemnização de 2 milhões e 384 mil contos sem que o decreto de Cavaco Silva tivesse sido revogado. J.A.C.

Seis anos de negociações à margem dos tribunais José António Cerejo

A justificação para as negociações foi sempre a de que os tribunais levavam muito tempo a decidir. Mas para conseguir o acordo sobre a indemnização, o Estado e a Eurominas pediram repetidamente aos tribunais que nada decidissem

Aproveitando a circunstância de António Vitorino - acabado de eleger deputado pelo distrito onde a empresa estava sediada - ter sido nomeado ministro da Presidência do primeiro Governo de António Guterres, a Eurominas não perdeu tempo. No próprio dia da posse do Executivo, em Outubro de 1995, entregou no seu gabinete um extenso memorando e um pedido de audiência urgente.

A justificação para endereçar àquele ministro um dossier relativo a um assunto totalmente alheio à sua "competência material" foi dada pela própria empresa no documento entregue: "Tendo em consideração o conhecimento que V. Ex.ª tem desta situação e a necessidade de articular os vários ministérios relacionados com este assunto, pensamos também ser oportuno fornecer-lhe esta informação."

A ideia apresentada e desenvolvida nas semanas seguintes junto do secretário de Estado da Cooperação José Lamego e das secretarias de Estado da Administração Portuária e da Energia passava por uma solução extrajudical dos conflitos entre a Eurominas e o Estado e incluía um projecto de cooperação com Angola financiado pela indemnização que viesse a receber do Estado.

A DUPLA POSIÇÃO DO ESTADO

Ao longos dos dois anos seguintes, as reuniões entre as partes envolvidas multiplicaram-se, sempre sob a direcção da equipa de António Vitorino - em particular através do seu chefe de gabinete, Jorge Dias. E o entendimento foi-se desenhando em torno da aceitação, pelo Governo, do princípio oposto ao estabelecido pelo Executivo anterior: o Estado teria de indemnizar a empresa para ficar com os terrenos destinados à APSS. Para trás ficava, entretanto, a ideia do investimento em Angola, que tinha recebido o pronto apoio de José Lamego.

Paralelamente corriam nos tribunais diversos processos que a Eurominas ia sucessivamente perdendo a favor do Estado. E no processo principal, em que a empresa pedia ao Supremo Tribunal Administrativo a anulação do decreto de reversão, António Guterres, em nome do mesmo Estado, rejeitava frontalmente todas alegações da outra parte, seguindo inteiramente a linha de argumentação do Governo de Cavaco Silva. "O que se verifica é que [com o decreto de reversão] foi cumprido - embora porventura tarde - o comando contido no art.º 5.º do D.-L. 48784 que manda (e não apenas permite) que seja operada a reversão", escreveu o então primeiro-ministro socialista em Dezembro de 1995.

Esta opinião continuará, aliás, a ser a do Estado nas sucessivas alegações e contra-alegações que vão sendo subscritas pelo Ministério Público e pelos juristas da Presidência do Conselho de Ministros (PCM), neste e noutros processos sobre o mesmo assunto. É o caso das alegações entregues por Rui Barreira ao STA no pleito sobre a anulação do decreto de Cavaco, onde aquele consultor jurídico do Governo insiste na defesa da legalidade da reversão sem pagamento de indemnização.

A CLARIFICAÇÃO DE VITALINO CANAS

A data destas alegações é 17 de Abril de 1998. Nove dias antes, porém, Vitalino Canas, secretário de Estado da PCM, e mais três dos seus colegas secretários de Estado, já tinham posto as suas assinaturas num protocolo celebrado com a Eurominas, onde o Estado assumiu a posição contrária, comprometendo-se a indemnizar a empresa.

Vitorino demitira-se do Governo no fim do ano anterior, mas nessa altura já Jorge Dias tinha tudo negociado com a outra parte. A tal ponto que, mais de dois meses depois de ter deixado as suas funções juntamente com o ministro, o gabinete de Vitalino Canas ainda lhe remeteu, por fax, para o seu novo emprego e não se sabe porquê, uma cópia do projecto de protocolo que viria a ser assinado em 8 de Abril.

O documento estabelecia um prazo de dez dias para a constituição de um grupo de trabalho formado por representantes do Estado e da Eurominas, que tinha como missão o estabelecimento de um acordo "sobre os montantes a pagar, a título de indemnização, pelos terrenos e pelas benfeitorias, de modo a pôr termo aos litígios existentes entre a Eurominas e o Estado". E dias depois, numa altura em que alguns dos processos já se encontravam prontos para julgamento - e quando os sucessivos pareceres dos juristas do Governo apenas admitiam a realização de negociações no caso de o acto de reversão vir a ser anulado por decisão judicial -, a PCM e a empresa começam a pedir aos tribunais para os suspenderem, uma vez que as partes estavam em vias de encontrar uma solução negociada.

JOSÉ LAMEGO PASSA PARA A EUROMINAS

A primeira reunião do Grupo de Trabalho efectuou-se na Presidência do Conselho de Ministros, em Junho de 1998, e em representação da Eurominas sentaram-se dois advogados. Um deles era José Lamego, que tinha saído do Governo com Vitorino e com Alberto Costa, então ministro da Administração Interna. Os três estavam por essa altura a lançar a sociedade de advogados que criaram formalmente em Janeiro do ano seguinte e no seio da qual José Lamego e o seu irmão António, também advogado, viriam depois a apoiar a Eurominas em todo o processo negocial que se seguiu até Maio de 2001. No último dia desse mês, com o secretário de Estado da Administração Portuária José Junqueiro a assinar pelo Estado, foi finalmente celebrado o acordo que fixou em 2.384.861 contos (quase 12 milhões de euros), o valor da indemnização que depois foi paga à empresa.

Mas para chegar a este montante, o caminho não foi fácil. Os quatro representantes do Estado no Grupo de Trabalho - um da PCM, outro da Direcção-Geral do Património, mais um da Direcção-Geral da Indústria e outro da APSS - não se entenderam com o advogado José Lamego e com o colega sobre o valor a pagar. Para tentar o acordo, o presidente do Grupo de Trabalho, um juiz jubilado que presidiu ao Supremo Tribunal Administrativo e é tio de Luís Patrão, à época (tal como agora) chefe de gabinete do primeiro-ministro, avançou com uma proposta intermédia.

O montante proposto por Luciano Patrão era de 3 milhões e 58 mil contos, incluindo 609 mil contos para os equipamentos fabris que permaneceriam nas instalações. Os quatro representantes do Estado, incluindo Paulo Tavares, chefe de gabinete de Vitalino Canas, ficaram-se, todavia, por 1 milhão e 143 mil contos e rejeitaram unanimemente a avaliação do presidente do Grupo de Trabalho.

NARCISO MIRANDA ENTRA EM CAMPO

Perante este impasse, Vitalino Canas dissolveu o Grupo de Trabalho no final de 1999 e o dossier passou para as mãos de Narciso Miranda, secretário de Estado da Administração Portuária. Por decisão pessoal deste, as conversas foram retomadas pouco depois, através de António Lamego, que reiterou a disponibilidade dos clientes para aceitarem "a solução conciliatória proposta pelo juiz-conselheiro Luciano Patrão".

E foi isso mesmo que veio a acontecer formalmente em 2001: o protocolo assinado por José Junqueiro fixou uma indemnização de 2 milhões e 384 mil contos, que foi paga em três prestações. O valor acordado, note-se, corresponde praticamente aos 3 milhões e 58 mil contos propostos pelo juiz. Isto porque os equipamentos por ele avaliados em 609 mil contos acabaram por ser levados pela empresa, não sendo contabilizados na indemnização.

Narciso Miranda retomou proposta rejeitada

Recusada pelos representantes do Estado em Setembro de 1999, a proposta do presidente do grupo de trabalho em que José Lamego representava a Eurominas voltou à mesa das negociações em Março seguinte, através de uma carta "confidencial" dirigida pelo advogado António Lamego ao secretário de Estado dos Assuntos Portuários Narciso Miranda.

"A fim de proceder à liquidação da indemnização cujo direito o Estado explicitamente reconhece no protocolo assinado em 8 de Abril de 1998, venho reiterar a disponibilidade da Eurominas em aceitar a solução conciliatória proposta pelo juiz-conselheiro Luciano Patrão", escreveu o irmão e sócio do antigo secretário de Estado da Cooperação. A partir desta iniciativa, Narciso Miranda pediu à Administração dos Portos de Setúbal e Sesimbra (APSS) um parecer sobre o valor indemnizatório proposto por aquele juiz (3 milhões e 58 mil contos) e recebeu uma resposta que lhe desagradou particularmente.

"A Eurominas não terá direito a qualquer indemnização", pelo que o Estado "deverá lançar mão da solução de que dispõe, reconhecendo, através de despacho de S. Ex.ª o Primeiro-Ministro, a grave urgência para o interesse público na imediata execução" do decreto de 1995 que determinou a reversão dos terrenos da Eurominas, escreveu o então presidente da APSS, Gonçalo Monteiro. "Insistindo a Euromina , como decerto fará, na continuação dos processos que contra o Estado moveu, caberá aos tribunais (...) decidir se lhe assiste ou não razão", acrescentou.

"Normalmente, em casos deste género, a solução que se encontra é remeter estes assuntos para a decisão dos tribunais. Também é verdade que as decisões finais sobre casos análogos, normalmente, é mais gravosa para as instituições públicas, que nem sempre se defendem bem. Assim, pretendo saber se esta decisão é uma decisão do Conselho de Administração e com que base a tomou", contrapôs Narciso Miranda, sobre o parecer assinado pelo presidente do Conselho de Administração da APSS, entidade por si tutelada. E a concluir, o secretário de Estado advertiu Gonçalo Monteiro: "Aconselho no entanto que o assunto seja reanalisado com a profundidade possível e comunicada a deliberação do Conselho de Administração da APSS."
Como era previsível, depois deste "conselho", a resposta de Gonçalo Monteiro foi, grosso modo, a de que "a APSS não discorda de uma solução negociada".

Logo a seguir, em Junho de 2000, Narciso Miranda pediu à Secretaria de Estado da Presidência do Conselho de Ministros (SEPCM) que nomeasse um representante numa reunião em que seria preparada a decisão final sobre os valores a pagar à Eurominas. A resposta de Paulo Tavares, o chefe de gabinete de Vitalino Canas que tinha integrado o grupo de trabalho, também não terá agradado muito a Narciso Miranda, que, aliás, a ignorou. Num memorando de 14 páginas em que resume todo o processo negocial, o chefe de gabinete, com a concordância de Vitalino Canas, considera que, em consequência da dissolução do grupo de trabalho, "o litígio prosseguirá pelos meios judiciais respectivos", pelo que se "afigura desnecessária representação da SEPCM na reunião proposta".

Pouco depois, em Setembro, Narciso Miranda foi substituído por José Junqueiro e o protocolo final que atribuiu à Eurominas uma indemnização muito próxima da proposta por Luciano Patrão foi assinado no ano seguinte. J.A.C.

AS DATAS DA HISTÓRIA


1973 - Governo decreta a desafectação do domínio público marítimo, para efeito exclusivo de implantação de uma unidade de produção de ligas de manganés, dos 86 hectares de sapais que a Eurominas comprará ao Estado, no ano seguinte, por 6906 contos.
1975 - Eurominas inicia a actividade depois de ter estabelecido, com a empresa que antecedeu a EDP, um contrato de fornecimento de energia válido por dez anos e com preços apoiados pelo Estado, altamente favoráveis à empresa.
1984 - EDP, depois de ter avisado a Eurominas nos termos contratuais, põe fim ao acordo de 1973 e passa a facturar à empresa os preços do mercado, obedecendo à regras da CEE e às recomendações do FMI.
1986 - EDP suspende o fornecimento de energia à Eurominas, alegando que a empresa lhe deve mais de quatro milhões de contos, e esta cessa a actividade industrial que tinha justificado a desafectação dos terrenos do domínio público. Inicia-se um longo litígio entre as duas empresas.
1992 - Eurominas pede indemnização de 16 milhões de contos à EDP, no quadro de uma comissão arbitral, por ter interrompido o fornecimento de energia em 1986. A EDP, por seu turno, pede à Eurominas mais de seis milhões de contos por dívidas e juros.
Maio de 1995 - Governo decreta a reversão dos terrenos da Eurominas para o domínio público, por cessação da sua actividade, com perda de todas as obras e benfeitorias neles realizados e sem qualquer indemnização.
Verão de 1995 - Eurominas desencadeia duas acções judiciais com o objectivo de obter a suspensão da eficácia e a posterior anulação do decreto de reversão [A primeira perde-a em todas as instâncias e a segunda nunca chega a ser julgada, devido aos sucessivos pedidos de suspensão entregues ao STA, pelo Governo e pela empresa, entre 1998 e 2001].
Outubro de 1995 - Eurominas inicia contactos com o ministro António Vitorino com vista a uma solução extrajudicial que evite a reversão sem indemnização.
1996/1997 - Eurominas e o gabinete de António Vitorino, juntamente com o secretário de Estado José Lamego e outros responsáveis governamentais, prosseguem as negociações.
1996 - Eurominas e EDP põem termo a todos os litígios que as opõem mediante um acordo através do qual a segunda paga à primeira 400 mil contos.
Abril de 1997 - Eurominas entrega em tribunal um pedido de indemnização de 15,6 milhões de contos, contra o Estado, justificando-o com os alegados prejuízos de 16 milhões de contos que a EDP lhe teria causado e subtraindo-lhes os 400 mil que recebeu na sequência do acordo com esta empresa.
Julho de 1997 - Ministério Público, em nome do Estado, contesta o pedido de indemnização. "O que o Estado não pode aceitar é que a Eurominas pretenda agora responsabilizá-lo por eventualmente não ter efectuado um bom acordo, obtendo dele, por via da presente acção, o que não logrou obter por via negocial com a EDP", diz o M.P. [O processo também nunca foi julgado a pedido da Eurominas e do Estado]
Novembro de 1997 - António Vitorino, José Lamego e Alberto Costa saem do Governo e começam a trabalhar juntos, constituindo uma sociedade de advogados no ano seguinte.
Abril de 1998 - Eurominas e Estado celebram o protocolo em que o Estado se compromete a indemnizar a empresa, para que ela abandone os terrenos objecto do decreto que ordenou a sua reversão sem indemnização.
Junho de 1998 - Reúne-se pela primeira vez o grupo de trabalho conjunto que vai determinar o montante da indemnização a pagar pelo Estado. À mesa das negociações senta-se José Lamego, como representante da Eurominas.
Dezembro de 1999 - O grupo de trabalho conjunto cessa as suas funções depois de os representantes do Estado terem unanimemente rejeitado o montante indemnizatório proposto pelo juiz presidente do grupo.
Março de 2000 - A Eurominas, através do escritório de advogados de José Lamego, António Vitorino e Alberto Costa, retoma os contactos com o Governo, por intermédio do secretário de Estado Narciso Miranda, propondo-se aceitar o valor proposto pelo juiz.
Maio de 2001 - O secretário de Estado José Junqueiro assina o protocolo entre o Estado e a Eurominas que fixa definitivamente a indemnização, paga nos dois anos seguintes, num valor praticamente igual ao proposto pelo juiz em 1999. A Eurominas, por seu lado, obriga-se a desistir de todas as acções judiciais contra o Estado.

 
At 2 de novembro de 2005 às 17:58, Anonymous Anónimo said...

Num país normal, de gente séria e decente, a carreira política de Alberto Costa, José Junqueiro, António Vitorino, José Lamego tinha acabado hoje. Com efeito, ainda a propósito do escândalo Eurominas, João Cravinho veio hoje rebater inapelavelmente as 'clarificações' vidas a público - nomeadamente da parte de José Lamego - e que contextualizavam o negócio, e que acabou por redundar na choruda indemnização. Num país normal as coisas não ficariam assim. Em Portugal, muito provavelmente, vão ficar. 'Eles' sabem que 'o povo é sereno'.

 
At 2 de novembro de 2005 às 19:36, Anonymous Anónimo said...

A verdade é que temos de dar uma lição a estes gajos.

 
At 3 de novembro de 2005 às 09:49, Anonymous Anónimo said...

Em mais um episódio da novela sul-americana em que se está a tornar a justiça portuguesa, Jorge Coelho veio, hoje, numa conferência de imprensa memorável declarar-se "impoluto e incorruptível". Aproveitou para saúdar a poética nota da PGR, aproveitando para declarar não esperar outra coisa. Eu também já não espero nada.
Só registo que o Dr. Coelho é um dos poucos portugueses que, vendo o seu nome na 'baila', consegue, no curto espaço de 2/3 horas um 'salvo-conduto' da PGR.
Tão rápida numas coisas, e tão..., tão... noutras.
De resto, é naturalíssimo a residência de um dos homens fortes do PS, e do País, ser alvo de buscas.
Como também é naturalíssimo que daqui por uns tempos já ninguém se lembre de nada e nunca se venha a perceber coisíssima nenhuma.

 
At 3 de novembro de 2005 às 09:50, Anonymous Anónimo said...

Será que ninguém explica à PJ, que o que é valiosíssimo não é o Tabuleiro, mas sim a capacidade de Jorge Coelho em fazer mexer essas peças?

«Uma lista de prendas, apreendida na empresa de construção civil de Américo Santo, empresário de Cascais, esteve na origem da busca realizada à casa de Jorge Coelho, no dia 24 de Outubro. Além do dirigente socialista, outras pessoas que constavam dessa lista, que dizia respeito a ofertas a enviar pela empresa pela altura do Natal do ano 2000, também terão sido alvo de buscas. O Ministério Público (MP) de Cascais promoveu esta diligência argumentando com a relação entre as prendas oferecidas e alegados favores concedidos ao empresário. Certo é que em casa de Jorge Coelho não foi encontrado o que era procurado, um tabuleiro de xadrez, presumivelmente de altíssimo valor.»
in:DN

 
At 3 de novembro de 2005 às 09:52, Anonymous Anónimo said...

ESTÁ TUDO DITO?

O combate à corrupção é ilusório. Não podemos continuara a falar de escândalos sem que nada aconteça ao nível da punição das condutas graves. A falta de consequências é o pior sinal.

Maria José Morgado

 
At 3 de novembro de 2005 às 09:55, Anonymous Anónimo said...

Sou funcionário público.
Ainda não vi a minha fotografia numa esquina anunciando que se procura “vivo ou morto, um criminoso perigoso”.
Mas graças à incompetência dos políticos, já evito dizer a profissão em público e começa a ser frequente ouvir os conhecidos mandarem-me piropos desagradáveis, para não falar daquilo que se ouve no café ou na mercearia.

Entrei para a Função Pública por mero acidente conjuntural. Mas entrei.
Num tempo em que o funcionário era tratado com um mínimo de dignidade.
Os políticos referiam-se a eles com o mínimo de consideração e não apenas com uma educação contida por receio da perda de votos. Naquele tempo sentia-me socialmente útil.
Os incentivos não eram muitos, mas trabalhava com prazer.
Sentia-me empenhado naquilo que fazia.
Nem pensava na reforma. E só as dificuldades do dia-a-dia me levavam a questionar o que ganhava ou os aumentos que poderia ter.

Passados alguns anos, e porque os portugueses têm o mau gosto de escolher os políticos com menos cuidado com que votam em quem vai ganhar a Primeira Companhia, passei a ser bode expiatório de todos os males do país.
Agora sou um parasita.
Não produzo nada.
O que ganho equipara-me a qualquer proxeneta.
Sou um "gandulo" que não justifica o ordenado.
Agora estou a mais no meu país. Ainda antes de haver quadros de excedentários, sinto-me um excedente social.

Ganhe muito ou ganhe pouco, trabalhe muito ou trabalhe pouco, ganho demais.
O que faço não serve de nada.

O empresário que gasta o dinheiro da empresa em putas e não a moderniza não tem culpa.
O político que ganha por fora (é para financiar o partido, diz ele aos seus corruptores) não é responsável.
O "boy" incompetente não faz parte do problema. O único problema sou mesmo eu.

Acontece que estou a ficar farto de ser o problema...

 
At 3 de novembro de 2005 às 13:34, Anonymous Anónimo said...

Por onde anda a gente séria deste país?

 
At 3 de novembro de 2005 às 17:42, Anonymous Anónimo said...

Foi notícia a busca a uma das Casas de Jorge Coelho, mas o Procurador-Geral informou mais tarde que o dirigente do PS não é suspeito de nada. Como um mandato judicial para uma busca a uma residência não é assinado de ânimo leve, que que tem que ser minimamente fundamentado, terei que concluir que a PGR celebrou um protocolo com a EDP e a PJ foi a casa de Jorge Coelho para ler o contador da electricidade.

 
At 4 de novembro de 2005 às 10:59, Anonymous Anónimo said...

Comédia?


A PJ fez buscas à casa de Jorge Coelho, aparentemente por causa de um "tabuleiro de xadrez valiosíssimo" que um construtor civil teria oferecido ao dirigente do PS em retribuição de alegados favores políticos. A cena é de uma comicidade irresistível, por muito merecedora que seja de considerações e indignações solenes. Somos inevitavelmente levados a magicar sobre o que esconde o mistério dos materiais preciosos utilizados na confecção de uma prenda tão absolutamente kitsch, como se fosse possível ressuscitar a velha e vitoriana Agatha Christie no Portugal novo-rico e suburbano que se revê em Fátima Felgueiras, Valentim ou Isaltino.

Apesar de constar da lista de prendas do construtor A. Santo, enredado em escuros negócios de betão com J. L. Judas, ex-presidente da Câmara de Cascais, o fabuloso tabuleiro não foi encontrado chez Coelho que, entretanto, se apressou a convocar uma conferência de imprensa para declarar-se "impoluto e incorruptível". E como se isso não bastasse, um comunicado da Procuradoria-Geral da República assegurava que a busca da PJ "não assentou em suspeitas que pudessem existir de ilícito criminal imputável ao Sr. Dr. Jorge Coelho". O mistério do tabuleiro de xadrez tornou-se definitivamente inextricável que faria a PJ em casa de Coelho se não houvesse suspeita de "ilícito criminal"? Será lícito invadir assim a intimidade de cidadãos insuspeitos?

Depois das trapalhadas da recente "Operação Furacão" (que confirma a veia cinéfila e james-bondiana da PJ e do MP, já ilustrada com o "Apito Dourado") ou das reviravoltas do caso Felgueiras, a Justiça portuguesa já parece um remake da comédia italiana dos anos 60. Mas enquanto os seus agentes vivem em plena febre de reivindicações corporativas, as instituições judiciais prestam-se à inversão de uma fórmula clássica agora, é a comédia que ameaça transformar-se em tragédia.

Vicente Jorge Silva
In:Diário de Notícias

 
At 4 de novembro de 2005 às 11:09, Anonymous Anónimo said...

"É mais fácil acertar no Euromilhões do que descobrir o jogo de Jorge Coelho"


Raul Vaz

 

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