A PROCISSÃO AINDA VAI NO ADRO
Quando o desemprego atinge os quadros
A economia vai mal por razões diversas e complexas, nada fáceis de escortinar, mas que todos sentimos no bolso.
Contudo, não há dia em que douto economista ou político arvorado em comentador não nos surja na pantalha a arengar que a maleita da economia nacional está na falta de qualificação dos nossos trabalhadores. Será por isso, também. Mas dá-se o caso de os dados mais recentes do Instituto Nacional de Estatística (INE) revelarem que o desemprego está a crescer assustadoramente também entre os quadros superiores. Um paradoxo – resta saber se da economia ou do discurso – que António Maia tão bem ilustra na mensagem directa que só o cartoon permite, e que encima esta página.
Quantas famílias que investiram com esforço na formação dos seus filhos e se vêem hoje nesta paradoxal situação? Jovens de formação académica superior sem emprego nem perspectivas de tal; que acabam por seguir directamente da licenciatura para o mestrado e deste para o doutoramento sem conseguirem entrar no mercado de trabalho; ou quando o conseguem é numa situação precária, mal remunerada e que raramente tem que ver com a sua formação específica.
A isto chama-se desperdício e desorganização do tecido económico nacional. Os números do INE são, de resto, reveladores deste drama que afecta a nossa economia e cria a insegurança de tantos quadros superiores, afectando-lhes as vidas, por vezes de modo irremediável, e acima de tudo a auto-estima.
De acordo com os dados do INE, temos actualmente menos15,2% de quadros superiores no mercado produtivo do que há sete anos atrás. Ou seja, menos 71 mil quadros e dirigentes empregados. Significa isto que temos hoje na globalidade do sector produtivo apenas 8% de quadros superiores (entre licenciados, mestres e doutorados); sendo que, como é sabido, a administração pública emprega a grossa maioria destes quadros, nomeadamente nos sectores da educação e da saúde.
A situação traduz uma completa inversão da tendência dos últimos anos, em que este universo de trabalhadores cresceu sempre, mas que agora o mercado deixou de absorver e até repele. Uma parte do fenómeno é atribuída à reestruturação ou ao encerramento de empresas; mas o Estado também está a tentar reduzir os custos com os seus quadros. O desemprego entre a classe dos professores é já assustador. Cerca de 20 mil receberam subsídio de desemprego no ano passado e, no ensino superior, são já perto de 10 mil o número de docentes sem trabalho.
Como dar a volta a esta situação, quando os sinais de crescimento da economia são tão ténues, é a questão a que o Governo pretende responder com o conceito da flexisegurança. Como é habitual, patronato e sindicatos travam-se de razões nesta proposta de mais flexibilidade no emprego, nos horários e categorias. Os primeiros a favor e os segundos contra uma flexibilidade onde adivinham mais precaridade laboral.
A procissão ainda vai no adro, mas a situação económica do país tende a favorecer a aplicação aportuguesada do modelo dinamarquês de flexisegurança. Talvez que por essa via os jovens licenciados e doutorados tenham mais fácil acesso ao mercado de trabalho, e as famílias respirem mais segurança no futuro dos seus filhos.
Joaquim Duarte
Contudo, não há dia em que douto economista ou político arvorado em comentador não nos surja na pantalha a arengar que a maleita da economia nacional está na falta de qualificação dos nossos trabalhadores. Será por isso, também. Mas dá-se o caso de os dados mais recentes do Instituto Nacional de Estatística (INE) revelarem que o desemprego está a crescer assustadoramente também entre os quadros superiores. Um paradoxo – resta saber se da economia ou do discurso – que António Maia tão bem ilustra na mensagem directa que só o cartoon permite, e que encima esta página.
Quantas famílias que investiram com esforço na formação dos seus filhos e se vêem hoje nesta paradoxal situação? Jovens de formação académica superior sem emprego nem perspectivas de tal; que acabam por seguir directamente da licenciatura para o mestrado e deste para o doutoramento sem conseguirem entrar no mercado de trabalho; ou quando o conseguem é numa situação precária, mal remunerada e que raramente tem que ver com a sua formação específica.
A isto chama-se desperdício e desorganização do tecido económico nacional. Os números do INE são, de resto, reveladores deste drama que afecta a nossa economia e cria a insegurança de tantos quadros superiores, afectando-lhes as vidas, por vezes de modo irremediável, e acima de tudo a auto-estima.
De acordo com os dados do INE, temos actualmente menos15,2% de quadros superiores no mercado produtivo do que há sete anos atrás. Ou seja, menos 71 mil quadros e dirigentes empregados. Significa isto que temos hoje na globalidade do sector produtivo apenas 8% de quadros superiores (entre licenciados, mestres e doutorados); sendo que, como é sabido, a administração pública emprega a grossa maioria destes quadros, nomeadamente nos sectores da educação e da saúde.
Como dar a volta a esta situação, quando os sinais de crescimento da economia são tão ténues, é a questão a que o Governo pretende responder com o conceito da flexisegurança. Como é habitual, patronato e sindicatos travam-se de razões nesta proposta de mais flexibilidade no emprego, nos horários e categorias. Os primeiros a favor e os segundos contra uma flexibilidade onde adivinham mais precaridade laboral.
A procissão ainda vai no adro, mas a situação económica do país tende a favorecer a aplicação aportuguesada do modelo dinamarquês de flexisegurança. Talvez que por essa via os jovens licenciados e doutorados tenham mais fácil acesso ao mercado de trabalho, e as famílias respirem mais segurança no futuro dos seus filhos.
Joaquim Duarte
Etiquetas: Emprego
9 Comments:
Maquiavel era, e continua a ser, o melhor de todos os conselheiros de quem quer deter o poder. Tudo o que escreveu tornou-se uma arte. Para ele, o poder era uma coisa boa. O problema era consegui-lo e mantê-lo. Para isso aconselhava o Príncipe a mentir e a dissimular. Isso pode parecer ser moralmente repugnante.
Mas os políticos que desejam estar no trono do poder têm de conviver com isso. José Sócrates é o mais puro político maquiavélico que existe em Portugal. Que outro dirigente consegue dizer que quer emagrecer a função pública enquanto sabe que, no futuro, para ter uma maioria eleitoral, terá de alimentar essa importante classe? Ela é uma ameaça ao seu poder. Terá de a aniquilar, mesmo que um dia tenha de passar a mão pelo seu pêlo. Quem, como ele, consegue conciliar as teias que hoje são fundamentais para garantir o trono: uma imagem sedutora, uma gestão eficaz das relações públicas e uma leitura perspicaz das sondagens de opinião? Todos os políticos ficam, muitas vezes, prisioneiros das suas habilidades. Sócrates consegue gerir a distância entre si próprio e os cidadãos, através da sua imagem remota, fazendo com que estes nunca saibam quem, na verdade, é. Ele é o único político português, neste momento, que consegue projectar, de si, a imagem que deseja. Sócrates leu Maquiavel. E assimilou os seus ensinamentos. É esse maquiavelismo que lhe permite eliminar os adversários. Usando todos os meios para manter o que na realidade é importante: o poder.
Quando olha para os dois primeiros anos de Governo, que hoje se cumprem, o candidato a analista independente tem dificuldades em fugir da metáfora do copo meio cheio ou meio vazio. O pessoal da oposição, os pessimistas, os cépticos dirão que entre as promessas e a realidade vai uma distância inaceitável – como muito bem fez este fim de semana o PSD, com a rábula dos "tesourinhos deprimentes" do "Gato Fedorento".
O pessoal da oposição, os pessimistas, os cépticos dirão que entre as promessas e a realidade vai uma distância inaceitável – como muito bem fez este fim de semana o PSD, com a rábula dos "tesourinhos deprimentes" do "Gato Fedorento".
Os adeptos do Governo, onde se incluem muitos socialistas mas não todos, os optimistas e os crédulos, dirão que se fez o que era possível fazer em dois anos, cumprindo os objectivos de controlar o défice e pôr a economia a crescer alguma coisa.
Sem fazer parte de um ou de outro grupo – pelo menos no que toca a fidelidades partidárias, porque quanto a ser céptico ou ingénuo, não se é grande juiz em causa própria –, o candidato a analista adopta a táctica do prof. Marcelo, e diz que o Governo merece um 13+.
A seu favor tem sobretudo a mão e o estilo de um rapaz normal e ambicioso – acreditar na biografia do Sol –, que às vezes se transforma em animal feroz. É a determinação de Sócrates (que pode ser lida como arrogância), a teimosia de segurar os ministros envolvidos em batalhas difíceis, sobretudo na Saúde e na Educação, que mantém a imagem do Governo junto dos portugueses. Isso e a eficaz e já consabida máquina de marketing político, que até agora tem funcionado sem falha.
O que é que o Governo fez? Disse aos portugueses que havia liderança, manteve decisões apesar da oposição, das manifestações e das greves, cumpriu as metas de redução do défice orçamental. Os pontos fracos são a frequente multiplicação de focos de conflito e o carácter incipiente das reformas, muitas vezes anunciadas. Nas carreiras da administração pública cumpriu na semana passada o compromisso de uma proposta de revisão, que por muito tímida que seja assume o fim do tabu do emprego para a vida na função pública, mas cujos efeitos práticos não serão visíveis antes de um par de anos.
É do PRACE, que prometia simplificar toda a orgânica da administração do Estado, que chegam os sinais mais inquietantes. Basta acompanhar, por exemplo, o que se passa em institutos públicos envolvidos na reforma, onde, a acreditar no que transpira, não está a passar-se rigorosamente nada. O PRACE arrisca-se a ser o maior flop deste Governo.
O candidato a analista independente tem de reconhecer que o Governo foi eleito para uma legislatura, pelo que ainda lhe restam dois anos para mostrar trabalho. Concretizar as reformas é um dos trabalhos mais importantes e a esse respeito chegaram de Belém, também em dia de aniversário, os primeiros sinais amarelos.
Mas o que será determinante para que Sócrates consiga renovar a maioria absoluta em Outubro de 2009, com o argumento de que precisa de mais quatro anos para completar o trabalho iniciado, será o desempenho da economia. Obviamente, estamos melhor hoje do que há dois anos mas ficar entusiasmado com um crescimento de 1,3% é contraproducente. Não só é insuficiente para criar emprego como mantém Portugal em divergência face à União Europeia. A receita mais fácil seria regressar ao programa dos grandes investimentos públicos mas já não vai a tempo. Claro, que entretanto começam a chegar os milhões do QREN. Uma ajuda que não dispensa Sócrates de continuar a seguir o caminho difícil. E não leva grande avanço.
Os apoiantes de Cavaco Silva lembram que o presidente, no primeiro ano de mandato, cumpriu o que prometeu: vigilante e exigente, não interferiu na governação. Como se viu no Sábado, quando disse que a presidência (da UE) não é motivo para adiar as reformas de que o país precisa.
Têm razão. Mas o que interessa não é isso; é saber que margem tem Cavaco para "forçar" o Governo a ser eficiente. Se é que a tem... Vejamos: o último "recado" tem subjacente a reforma da Administração Pública, cuja parte mais importante (redução de efectivos) já foi para a gaveta. Sócrates ouviu e deve ter ficado com as orelhas a arder. Mas e daí? Quando os jornalistas o interpelarem dirá que concorda, que "não há desculpas para adiar o que é preciso fazer". Será por isso que vai mudar de política? Não.
A natureza do cargo permite ao presidente "focar-se" no longo prazo, ao invés do Governo, condicionado pelas manifestações de rua (v.g. o que se passou na Saúde). Isso cria a Cavaco o dilema de saber como influenciar Sócrates, sem cair na guerrilha que Soares lhe fez quando primeiro-ministro: porque prometeu não o fazer e porque sabe que afecta a governação. Esta caminhada no fio da navalha não tem sido (nem vai ser) nada fácil. É por isso que a pergunta sobre o que distingue esta presidência das anteriores continua sem resposta.
OPOSIÇÃO FIRME PRECISA-SE
O Governo de José Sócrates está sem Oposição.
O PSD tem de decidir se quer ser Oposição ou se quer andar ao sabor das ondas.
O Governo de José Sócrates está a afundar Portugal.
Mas o PSD está adormecido. Sem Oponente à altura ,José Sócrates vai passeando e levando cada vez mais Portugal para um beco sem saída.
Marques Mendes tem de perder os complexos. É baixo mas pode falar alto.
O ensaio de oposição que fez em relação à OTA só peca por tardio.
Mas gostei. Porque foi além do que esperava dele. Meteu o dedo na ferida: Os interesses económicos de grupos e de donos dos terrenos agrícolas.
E fez aquilo que há muito era necessário fazer: Propor abaixamento de impostos.
É aqui que está parte do problema. Há que baixar a carga fiscal e moralizar os lucros dos bancos.
Mas anunciando medidas concretas, palpáveis.
O PSD tem de ir à carga. Mobilizar o Pais para as suas ideias.
Agora que já se livrou de José Miguel Judice, há que fazer combate político.
Falando alto, mas racionalmente.
As sondagens não são verdadeiras. O PS sai beneficiado das sondagens, porque os portugueses estao muito descontentes, nao tendo o PS ,neste momento ,intenções de voto que lhe atribuam maioria.
O PSD não pode dar descanso ao PS só por causa da União Europeia.
O PSD deveria ter porta-vozes para as diversas áreas.
E há tanto terreno para a oposição:
- Desemprego;
- Saúde;
- Crescimento económico;
-Segurança interna;
- Política externa;
- Agricultura;
-Industria;
- Turismo;
- Defesa;
- PALOPS;
- Energia.
Vamos a eles que Portugal está a gangrenar!!!
O genocídio dos funcionários públicos
O que o Governo acaba de propor para o funcionalismo público é a continuação de um genocídio em que os professores foram os primeiros imolados. Muitos dos que aplaudiram a cruzada, sendo funcionários públicos, perceberão, quando lhe tocarem à porta, que os dividendos do egoísmo são efémeros. O que se fez aos professores vai agora ser aplicado aos restantes funcionários públicos. Concluído este segundo assalto, o sector privado ficará à mercê da lógica dos patrões: se a precariedade já é máxima no público, porque havemos de manter o que sobra de estabilidade no privado? Pela mão de Sócrates, o Único, a esquerda moderna terá então feito, numa legislatura, mais do que direita desejou, mas não fez durante toda a Terceira República.
Os comportamentos mudam-se com incentivos, com formação, com comunicação organizacional, com chefias competentes, com gestão adequada. O grande problema dos serviços públicos não radica nos que obedecem. Está nos que mandam. Os que mandam querem convencer os indígenas de que a chave do sucesso é a avaliação do desempenho. Mas não sabem do que falam. O que produzem é tecnicamente grosseiro e com objectivos únicos: diminuir as remunerações, aumentar as horas de trabalho, despedir, vergar. Não será por aí que aumentarão a qualidade e a produtividade.
A avaliação do desempenho só serve se for um instrumento de gestão do desempenho. Os reformadores ignorantes confundem avaliação do desempenho com classificação do desempenho. Avaliar é comparar um percurso percorrido com um percurso planeado, para identificar obstáculos e formas de os superar. Supõe objectivos claramente definidos e estratégias adequadas. À boa gestão importa, sobretudo, o carácter formativo da avaliação: para identificar as dificuldades das pessoas e ajudá-las a superá-las, com formação e assistência; para apurar a ineficácia e a ineficiência dos processos e substituí-los por outros mais adequados. Um processo credível de avaliação tem uma lógica de 360 graus. Envolve todos. Não deixa de fora os chefes, obviamente.
Classificar é seriar. Tão-só! Tendo aplicações e importância, não põe conhecimentos onde não existe. Pode haver avaliação sem classificação. Mas não se deve classificar sem se avaliar. A obsessão dos novos reformadores reside na classificação. Construíram uma fantasia com a qual julgam chegar ao fim sem abordar o inicial e o intermédio. O que têm produzido são grelhas de classificação mal feitas, a aplicar por processos e critérios que a gestão moderna há muito abandonou. Isto não provocará mudança organizacional. Isto vai gerar, por parte dos funcionários visados, o que a literatura da especialidade denomina por retaliação organizacional. Ou seja, oposição dissimulada e desmotivação generalizada, a última coisa de que necessitamos para melhorar os serviços. Quando tal acontece, é evidente, que a culpa não reside nos funcionários, mas nos chefes e nos processos e sistemas que impõem. Sobre o essencial para reformar a função pública, continuará a pairar o silêncio do Olimpo. Quanto a avaliação do desempenho, pura e simplesmente não existe. Apenas bolsa da pesporrência retórica e oca dos novos justiceiros.
O que se conhece da grelha proposta para classificar os professores que concorrerão ao topo da carreira é paradigma do que acabo de afirmar. Está lá tudo: o atropelo grosseiro à lei; a evidência de que legislam por impulso, sem coerência nem norte (começaram por achar que 120 pontos eram o mínimo e já baixaram para 95); o primado do administrativo sobre o pedagógico (menosprezo escandaloso da docência e do conhecimento, que chega ao ridículo de valorar ou não um doutoramento em função do dia em que foi feito). É a burocracia posta num altar, que nenhum Simplex disfarça.
Santana Castilho, professor do ensino superior
12 Março 2007
In:PÚBLICO
Dois anos de desilusão e um erro crasso
São bem conhecidas as dificuldades estruturais da nossa economia. E, sem dúvida, depois dos clamorosos erros cometidos entre 1996 e 2001, ter-se-ia sempre que passar por um período de ajustamento que seria sempre longo e doloroso. Em que nos afastaríamos da Europa.
Infelizmente, porém, desde aquela altura, muito pouco foi feito para inverter, de forma estrutural, esta situação. Incluindo pelo actual Governo, que completou ontem dois anos – e que tem contribuído para agravar ainda mais o (já de si difícil) estado de coisas, com uma actuação desajustada em vários quadrantes, de entre os quais destaco a área fiscal. Uma verdadeira desilusão, para quem possuía (e possui) condições ímpares para agir de outra forma e recolocar Portugal no bom caminho – isto é, retomar a aproximação ao nível de vida médio europeu. Vamos aos factos.
Em 2005, o então candidato José Sócrates prometia colocar o país a crescer 3% ao ano, apresentava o plano tecnológico como catalisador do crescimento económico e assegurava que não aumentaria os impostos. Ao mesmo tempo, o país estava cheio de cartazes que prometiam a criação de 150 mil novos postos de trabalho, o inglês para todos logo no terceiro ano do ensino básico, e o complemento solidário para idosos, para retirar 300 mil idosos da pobreza. E, nos últimos dois anos, o primeiro-ministro e o ministro da Economia percorreram o país anunciando megaprojectos de investimento que, depois de concretizados iriam multiplicar o crescimento económico.
Dois anos depois?
- ? os impostos sofreram o maior aumento de que há memória;
- ? o complemento básico para idosos, sete impressos e 13 formulários depois (aqui, o SIMPLEX seguramente não chegou?), beneficiou apenas 20 mil idosos;
- ? há mais 46 mil desempregados (uma média de 73 novos desempregados por dia), e a taxa de desemprego subiu de 7,5% da população activa no primeiro trimestre de 2005 para 8.2% no quarto trimestre de 2006;
- ? não creio que alguém saiba propriamente o que é o plano tecnológico, quanto mais saber como vai a sua concretização;
- ? dos megaprojectos de investimento prometidos pelo Governo, que ascendiam a um montante global de mais de 27 mil milhões de euros, apenas cerca de 4,6 mil milhões de euros foram contratualizados (embora continuem à espera de concretização), isto é, apenas? 16%!
- ? mais importante que tudo: o PIB português cresceu 0,5% em 2005 e 1,3% em 2006, respectivamente o penúltimo e último registos de entre todos os países da União Europeia (1/3 do número de Espanha em 2006), e bem longe dos 3% prometidos.
De todas as promessas atrás elencadas, apenas a aprendizagem do inglês no terceiro ano do ensino básico é uma realidade. Não creio que seja um currículo brilhante, o que o Governo de José Sócrates tem para mostrar aos portugueses. A consequência prática de tudo isto, para além da já referida subida do desemprego, é a continuação (já acontece desde 2000) da descida do nosso poder de compra face à Europa: 4,8% de 2004 até 2007, ou uma redução de 72,4% da média da UE-25 para os 68,9% estimados para este ano pela Comissão Europeia.
Do meu ponto de vista, o maior (mesmo crasso) erro residiu no brutal aumento de impostos decidido em 2005. O maior de que há memória, ao abrigo da fraude orçamental então montada – também a maior de que tenho memória. Este aumento de impostos teve várias consequências, todas elas negativas, que já na altura eram (e foram) facilmente prognosticáveis.
Desde logo, fez reduzir o crescimento económico. Depois de um crescimento de 1,3% em 2004, estou certo que teríamos crescido umas boas décimas acima dos 0,5% e 1,3% registados em 2005 e 2006, respectivamente. Não, não daria para retomarmos a convergência com a Europa – mas esse objectivo não estaria tão longe como está.
Depois, fez aumentar (mais) o desemprego. A deslocalização de empresas para outras paragens (de que todos nos lembramos bem, tantos foram os casos) foi acelerada pelo delirante aumento fiscal decidido em 2005, com a consequente subida do número de desempregados. E as regiões que mais sofreram foram as fronteiriças, sobretudo o (mais pobre) interior do país, por causa do diferencial das taxas de IVA para Espanha (que se alargou para 5 pontos percentuais), agravando, assim, as assimetrias regionais.
E fez com que o PRACE, a "mãe de todas as reformas" da Administração Pública, ainda não tivesse saído do papel. Dois anos depois. Levantando, legitimamente, todas as dúvidas sobre se alguma vez será efectuada: afinal, vamos entrar na segunda metade da legislatura, e para além das preocupações eleitorais, há a presidência portuguesa da UE pelo meio?
E, como no último ano e meio não me tenho cansado de referir, o aumento de impostos não tinha sido necessário. O resultado das contas públicas de 2006, na óptica de caixa, mostra isso mesmo: nesta óptica, o défice foi inferior em mais de 2,2 mil milhões de euros (ou 1,5% do PIB) face ao previsto, revelando uma folga sem precedentes. E isto sem que medidas estruturais do lado da despesa tivessem sido tomadas: as receitas públicas e o corte no investimento público e nas despesas de capital foram os grandes responsáveis, pois o "monstro", residente nas despesas correntes, continuou à solta.
Na passada semana, com um descaramento e desplante inacreditáveis, o Secretário de Estado do Orçamento veio admitir que talvez o aumento de impostos, visto a posteriori, tenha sido excessivo! Talvez, imagine-se! Ora, se um responsável do Ministério das Finanças vem reconhecer este "talvez", é porque essa é mesmo a realidade. E portanto, é tempo de exigir ao Governo que baixe desde já a carga fiscal. Tem folga para isso: cada ponto do IVA custa cerca de 450 milhões de euros; 5 pontos no IRC custam aproximadamente o mesmo (números do Governo). E, portanto, a proposta apresentada no último sábado pelo presidente do PSD, Luís Marques Mendes, o que não poderá é ser acusada de irresponsabilidade. Repare-se: descer já o IVA de 21% para 20% e o IRC de 25% para 22% custará, mantendo tudo o resto constante (coeteris paribus) cerca de 720 milhões de euros. E que positivo será para a economia, para as empresas e as famílias, e para a nossa competitividade, que tal aconteça rapidamente! Mas mesmo que se quisesse já baixar o IVA para 19% e o IRC para 20%, como Marques Mendes propôs que aconteça até ao final da legislatura, o custo total, coeteris paribus, seria de 1,35 mil milhões de euros? Para uma folga de 2,2 mil milhões de euros? que mais é preciso acrescentar?!...
E a esta folga devem ainda ser somados 1,36 mil milhões de euros que a concretização do PRACE deverá (deveria?) produzir em 2007, e que constam da actualização de Dezembro último do Programa de Estabilidade e Crescimento. Ah, e claro: isto é admitindo "tudo o resto constante". Porque taxas mais baixas desincentivam, por si só, a fraude e evasão, aumentando a base de contribuintes pagantes. Um bom exemplo foi o que sucedeu com a descida do IRC de 30% para 25%, sentida na execução orçamental de 2005. De uma quebra prevista na receita deste imposto de 500 milhões de euros, chegámos, afinal, a uma perda realizada inferior a 100 milhões de euros? Logo?
A subida de impostos de 2005 (e anos seguintes) deu a este Governo uma folga de dois anos (para já). Que foram totalmente desperdiçados. E prejudicou, e de que maneira, a economia. Estivemos perante uma imensa fraude a que deve ser colocado um fim o mais rapidamente possível, até para que as decisões estruturantes do lado da despesa pública, que continuam adiadas, possam ser tomadas. Para que o PRACE possa, enfim, avançar na sua plenitude. E para que a nossa competitividade ganhe, através da fiscalidade, um fôlego de que bem necessita!...
P.S. – Também na passada semana, com a honestidade e humildade que lhe são habituais, o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais veio reconhecer que a introdução de um escalão adicional de 42% no IRS terá sido desajustada. Como na altura não me cansei de referir, para além de desadequada, foi demagógica ("os ricos que paguem a crise"!), não trouxe acréscimo de receita que se visse, e foi ao arrepio das mudanças que mesmo a "velha" Europa – Espanha e França, calcule-se! – está a protagonizar, depois da Europa de Leste: simplificação dos sistemas fiscais, redução dos escalões e? redução das taxas. Em Portugal, fez-se tudo ao contrário. Triste sina a nossa!...
Portugal não é um spa e o PS não é uma piscina aquecida. Esse, aparentemente, é o sentimento do ministro Augusto Santos Silva na sua entrevista ao "DN". Para ele o desemprego é o problema do País e o corporativismo uma força de bloqueio. Acredita-se na bondade das suas palavras.
Antes de rejuvenescer, o País necessita de fazer uma cura de gorduras supérfluas. Mas, para isso resultar, necessita de mostrar a bússola que mostra onde é o norte do futuro aos que vão engrossando as filas de desempregados e à classe média que não vê um destino saudável. Augusto Santos Silva não pode pedir uma mão cheia de tudo a quem está a oferecer uma mão cheia de nada. Quando se vê tantas pessoas nas ruas a clamarem contra um Governo que é o melhor a gerir a sua imagem nos últimos anos, é porque o descontentamento é real. A carta que o Governo está a enviar à sociedade tem o código postal errado. E Santos Silva deveria entender isso. Cada vez que soa o alarme de uma deslocalização, o executivo diz que, ou já sabia, ou está a acompanhar o caso. O País pergunta: para que é que serve o Governo? Para nos dar a terrível notícia depois dela estar concretizada? Quando Santos Silva fala de corporativismo diz o quê? Que quem quer saúde perto da sua porta está contra as reformas? Compreende-se o pavor do ministro quando diz que o PS deve ocupar o centro: isto é, deve tornar-se a Grande Muralha de São Bento. Ideologicamente deve absorver a oposição e as críticas. Mesmo as internas.
Dois anos é tempo suficiente para uma criança já andar com alguma facilidade e dizer as primeiras palavra, já se lhe conhecem alguns traços do seu temperamento e não falta na família quem consiga dizer com toda a certeza de que sai ao pai ou sai à mãe. Habitualmente os políticos chegam ao poder já "crescidinhos", mas isso não sucedeu com José Sócrates que pouco tempo antes das legislativas que o levaram a São Bento ainda andava a mendigar nas concelhias do PS na esperança de vir a ter peso suficiente para lhe darem ouvidos no próximo congresso.
Mas a combinação inesperada entre o processo Casa Pia e a Santanada acabou por levar a um parto precoce, Sócrates chega ao poder sem saber como e com um programa que não passava de um exercício de retórica. Meia dúzia de dias depois o primeiro-ministro já tinha nas mãos o relatório de Constâncio para dar o dito por não dito e das propostas da campanha eleitoral nada resta. Passámos a ter um governo do qual só conhecemos os tiques do primeiro-ministro, as anedotas do Manuel Pinho, as medidas já adoptadas, as que estão em discussão e as que a comunicação dá como certas e que habitualmente são adoptadas quando a discussão pública sem a participação do Governo se esgotou.
Depois de ter andado alimentado a pão duro e bolorento este "papo-seco" até sabe a pão-de-ló, por mais que o PCP mobilize manifestações e que o Marques Mendes organize almoços ao sábado para anunciar as audiências que vai solicitar a Cavaco Silva na semana seguinte, o eleitorado sente-se de barriga cheia mesmo que não saiba lá muito bem o que comeu e sem acesso a qualquer ementa para que possa saber ou escolher o que vai comer a seguir. Sócrates é um dietista que veio para nos emagrecer e melhorar a saúde e a verdade é que está a ter resultados, alguns portugueses começam a lembrar aquele burro que o dono habituou a viver sem comer, mas que para azar acabou por morrer de fome.
Quem também sente alguma fome são os partidos do poder, depois de anos de vacas gordas à custa de cargos públicos para militantes, familiares, amigos e conhecidos estão a sofrer com a perda do poder, ao fim de dois anos não escondem o sofrimento que estão a ter devido ao síndrome da abstinência. No PSD e no PP não faltam sinais de isso, ao fim de dois anos ainda não perceberam porque deixaram a criança crescer e ainda por cima a criança sai ao pai, afinal de contas quando era um jovem militante da JSD o primeiro-ministro era Cavaco Silva.
«De acordo com uma sondagem CM/Aximage, 42,2 por cento dos portugueses considera que o Executivo está a governar pior do que esperava. E no próprio eleitorado do PS, 35,5 por cento confessa-se desiludido com o Governo que elegeu. Na avaliação de expectativas sobre o Executivo, 38 por cento dos inquiridos que votaram no PS nas legislativas de 2005 não se considera defraudado. Uma diferença ténue de 2,5 pontos percentuais entre os dois diagnósticos que indicam alguma insatisfação dentro do eleitorado socialista. Neste balanço, só 23,4 por cento dos votantes no PS afirma que o Governo está a trabalhar melhor do que esperava.»
Correio da Manhã
Talvez seja tempo de Sócrates começar a perceber que a insensibilidade tem o seu preço.
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