sábado, 28 de abril de 2007

A OCASIÃO FAZ O LADRÃO

A actual Lei das Autarquias, ao permitir que, no executivo camarário, tenham assento governo e oposição, é o espelho fiel de uma administração pública pouco transparente e promíscua, mais fadada para sacudir as responsabilidades do que para as assumir.

Acresce que, para além de manietar os vereadores da oposição ao co-responsabilizá-los pelas decisões (e aos munícipes apenas lhes interessa a decisão, pouco lhes importa a discussão), permite ainda ao presidente da câmara não só colher por inteiro os louros do trabalho dos seus opositores como também desculpar-se com eles sempre que as coisas não correm de feição. Sendo certo que é o presidente da câmara que tem os melhores meios (quando não os únicos) para fazer passar a sua mensagem.
Ora, a mixórdia é a principal inimiga da democracia na medida em que não permite ao cidadão avaliar correctamente os méritos ou deméritos de quem tinha a responsabilidade de governar. Acresce que, vivendo nós num país republicano, seria lógico que estivessem criadas as condições para impedir que alguém se perpetuasse no poder. É, aliás, isso que distingue os regimes republicanos dos monárquicos. Sendo certo que, num país republicano, as eleições não podem, nem devem servir para plebiscitar o “monarca”.Já dizia Lord Acton que «todo o poder corrompe e o poder absoluto corrompe absolutamente». E com inteira razão. A política só faz sentido se tiver subjacente a devoção à causa pública. E é apenas e tão só neste caso que os políticos merecem ser respeitados. Isto é, quando a sua motivação assenta, em primeira linha, na prossecução do interesse público e não, obviamente, na prossecução de interesses particulares ou próprios.

Quem governa tem muitas vezes de escolher entre medidas de curto prazo extremamente populares, mas lesivas do interesse público, e medidas impopulares, mas necessárias cujos efeitos benéficos são deferidos no tempo. Ora, é precisamente aqui que a limitação de mandatos de cargos políticos aparece como única garantia da prossecução do interesse público por parte dos eleitos.

Com efeito, se não houver limitação de mandatos, é óbvio que a preocupação de quem está no poder (acreditar que pode ser de outro modo é não conhecer a natureza humana) será, em primeiro lugar, a de tomar as medidas que garantam a sua reeleição, mesmo que, para tal, seja necessário sacrificar o interesse público. Sem esquecer que o poder acaba inevitavelmente por criar uma teia de interesses que se vai refinando com o tempo e que não tem outro fim que não seja a de perpetuar o próprio poder.

A limitação de mandatos dos cargos políticos é, sem qualquer sombra de dúvida, a única medida com potencialidade para reformar o nosso sistema político, fazendo com que a política possa ser entendida como um serviço público e não como a defesa do “tacho”.

Alterar a presente lei é, pois, um imperativo da própria democracia. E o sentido da mudança só podia ser um: por um lado, garantir a transparência do sistema, seguindo-se o princípio democrático mais elementar de que quem ganha deve governar; por outro, impedir a institucionalização do caciquismo.

Na minha opinião, isso seria conseguido se fossem introduzidas as seguintes alterações: limite do número de mandatos do presidente da câmara e dos vereadores a tempo inteiro (o máximo dois mandatos de cinco anos); dependência do executivo camarário da Assembleia Municipal, com o consequente reforço dos poderes de fiscalização desta, sendo eleito presidente da Câmara o primeiro elemento da lista vencedora.


REXISTIR

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1 Comments:

At 29 de abril de 2007 às 23:57, Anonymous Anónimo said...

O problema é que para reformar o sistema político era necessário legislar. E quem legisla são precisamente os políticos. Ora querer que os políticos façam leis para que se lhes acabe a mama é pedir de mais.

 

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