quinta-feira, 19 de abril de 2007

O NACIONAL-PAROLISMO


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No momento em que o Pais segue com relativo alvoroço as peripécias da licenciatura do cidadão José Sócrates, a campanha de publicidade do programa Novas Oportunidades faz crer aos portugueses que, sem o canudo de uma licenciatura, todo o mundo é ninguém.


Trata-se de uma coincidência, pois se fosse intencional as coisas não bateriam tão certo.

E assim, se não tivessem obtido o canudo, Judite trabalharia numa papelaria, Maria numa lavandaria, Pedro seria arrumador de uma sala de espectáculos e Carlos cortava a relva de um estádio.
Com canudo, Carlos Queirós, Maria Gambina, Pedro Abrunhosa e Judite de Sousa são alguém.
Deve ser por isso que Judite de Sousa permite que os seus entrevistados a tratem por Senhora Doutora, embora duvide que esse seja o tratamento dos Bandemónio para com Abrunhosa ou do plantel do Man. United com Carlos Queirós.

Fique claro: o programa Novas Oportunidades é altamente meritório.
Mas a campanha de promoção reflecte o nacional-parolismo segundo o qual quem tem um canudo tem tudo, quem não tem, coitadinho, é órfão de oportunidades.
O que não é verdade.
Em primeiro lugar, porque não é: há pessoas fantásticas, em todas as esferas de actividade, sem habilitações académicas superiores, como há doutores que são simplesmente burros carregados de livros.
Em segundo lugar, porque em Portugal bons conhecimentos valem mais que o conhecimento e uma cunha cobre qualquer insuficiência de currículo.

O culpado desta e de outras manifestações de tacanhez é ainda hoje o velho Salazar.
Não fosse o canudo um raríssimo privilégio, durante tanto tempo, e hoje não seria um objecto de ostentação.
Como um carro novo ou umas férias num destino exótico.


João P. Guerra

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5 Comments:

At 19 de abril de 2007 às 14:29, Anonymous Anónimo said...

A radiografia do país político é anquilosada e cavernosa. Pensemos nos vários erros que foram cometidos ao longo das últimas décadas.


“Dizem que o tempo muda as coisas, mas na verdade somos nós quem tem de as mudar”.
Andy Warhol

O nosso país atravessa uma longa crise que transversaliza vários contextos: económico, judicial, político, fiscal, educacional, cultural, decisional, só para citar alguns.

Se percorrermos os contornos de todos eles, encontramos uma linha condutora que lhes é comum, isto é, conseguimos identificar de forma muito evidente e pragmática, a falta de rigor que lhes está associada. Quando falha o sentido de rigor, desde logo e de forma associada, falham em cadeia um conjunto de pressupostos alavancadores do desenvolvimento sustentado de qualquer sociedade, como sejam a exigência, a excelência e a eficiência. Um país que não paute o seu quotidiano pela forte presença do rigor, no que faz e no que produz, muito dificilmente gerará padrões de grande qualidade e que permitam ganhar uma posição competitiva de dentro para fora.

Façamos uma breve abordagem a alguns dos contextos e chegaremos facilmente à conclusão que é justamente a falta de rigor que vem travando a nossa capacidade de chegarmos mais longe.

No contexto económico temos assistido ao esbanjamento de dinheiros públicos, que poderiam ser canalizados para um efectivo desenvolvimento de infra-estruturas produtivas: o elefante branco que foi Sines, a construção desmesurada de estádios de futebol em 2004, o não aproveitamento dos diversos fundos de coesão e estruturais para finalidades produtivas, só para citar alguns casos.

A radiografia do país político é anquilosada e cavernosa.
Pensemos nos vários erros políticos que foram cometidos ao longo das últimas décadas.
Erros graves, para os quais muito contribui a falta de rigor, com a agravante de nunca se encontrarem os responsáveis pelos vários desastres e responsabilizá-los em definitivo por danos causados às gerações da altura e às vindouras. Dizer que a justiça é feita à boca das urnas, alternando o ciclo politico-partidário, não chega, fica curto para consequências que foram (e outras continuam a ser) graves.
A cultura e a educação têm transmitido inúmeros sobressaltos e estão eivadas de equívocos.
Por falta de acção (em algumas situações), pela inexistência do sentido da eficiência, as últimas três décadas foram um período perdido.
Onde se deveriam fazer verdadeiras reformas, aparecem remendos. Consumiram-se recursos, os proveitos nunca foram visíveis, os equívocos continuam e a culpa continua solteira.

O panorama judicial é terrorífico. O cidadão não entende como se deixam prescrever processos importantes; como se arrastam pelos tribunais de forma penosa e por anos indetermináveis, processos que acabam por cair no esquecimento de queixosos e arguidos; como se prologam no tempo indefinidamente, questões laborais que penalizam sempre a parte mais fraca, ou seja, quem trabalha. São tantas as questões e tão antigas, que ninguém que pense de forma racional consegue entender a falta de rigor para de uma vez por todas, se tomarem as fragilidades por oportunidades e resolver de definitivamente todo o conteúdo que a justiça encerra.

É determinante, que aqueles que tomam as decisões que condicionam o país e os portugueses, entendam a cultura do rigor. Não se pode pactuar com o “nacional porreirismo”, que tudo desculpa e tão ao gosto de tanta gente. Já que importamos mais do que consumimos, penso que só ficaria bem aos agentes das grandes decisões, importarem a cultura do rigor e da exigência que se pratica noutros países, por exemplo na Alemanha, Suécia, Reino Unido e aqui mesmo ao lado, na Espanha. Muitas vezes, em palcos internacionais, chega-se a confundir o nosso país com a Espanha, mas mesmo só na perspectiva da ignorância geográfica, porque na forma como ambos os países encaram o rigor, a exigência e a excelência, nada temos em comum, com claro e acentuado déficit para os portugueses.

Estou em crer, que o nosso estado de fraco desenvolvimento, mais do que na falta de cabeças pensantes, entronca numa falta de rigor estrondosa que anda de braço dado com um facilitismo bacoco e saloio, que tudo perdoa e que não exige responsabilidades reais. Assim torna-se difícil evitar os fracos desempenhos nacionais.
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At 19 de abril de 2007 às 14:30, Anonymous Anónimo said...

Provavelmente os mais avisados terão razão: tão cedo o primeiro-ministro não sairá de cena da telenovela sobre as suas credenciais académicas. E não me parece que a estória acabe depressa, por uma razão que até agora não ouvi, nem li, em lado nenhum (talvez por erro meu): o primeiro-ministro teve, ou não, um comportamento sério? Julgo que é isto, e pouco mais do que isto, que está em causa.

Julgo que é isto, e pouco mais do que isto, que está em causa.

E sem este esclarecimento, até ao tutano, o assunto não morre. Claro que há outros dramas laterais, como o facto do primeiro-ministro usar um título que, eventualmente, não tem (alguém se interessa?), ou que tentou pressionar os jornalistas (até parece que foi o primeiro), ou que demorou a dar explicações sobre o assunto (quem não se lembra dos governos do professor Cavaco?), e por aí fora.

Mas, o que muitos pensam em surdina, mas hesitam em escrever ou em dizer, é simples: será que o primeiro-ministro foi conivente, ou cúmplice, ou interveniente, de alguma forma, na trapalhice sobre as suas credenciais académicas? Porque, salvo melhor opinião, é totalmente indiferente saber se é engenheiro técnico, ou se usa o ENG antes do nome sem a tal ter direito.

Ora, seguindo uma lógica consequente, temos que das duas uma: ou, de facto, se prova que houve fraude, e o primeiro-ministro participou na conjura, ou não se prova nem uma coisa nem outra.

Se for a última hipótese, isto é, que não houve fraude, ou que tendo existido o primeiro-ministro em nada teve a ver com o assunto, o caso é arrumado.

Poderá não ser engenheiro com todos os pergaminhos, mas é totalmente indiferente para o cargo que, legitimamente, ocupa.

Havendo fraude, e provando-se que o primeiro-ministro participou, de alguma forma, no processo, o caso muda de figura.

E é esta – e só esta – última hipótese que interessa considerar.

Porque, ao contrário de algumas teses bem pensantes (caso de Pacheco Pereira, por exemplo), não é indiferente saber que quem lidera os destinos do Governo é sério, ou não. Para qualquer eleitor/contribuinte faz toda a diferença.

Claro que há a questão do rigor, da exigência, da transparência que o percurso académico do primeiro-ministro está longe de ser exemplar. Poder-se-á dizer que Sócrates será como Frei Tomás quando pregava: "façam como eu digo e não façam como eu faço". Mas, entre a eventual falta de rigor e a colaboração num crime há a diferença que distingue o distraído do aldrabão.

Ou seja: os graus de gravidade são, absolutamente, diferentes e não confundíveis.

Até porque se coloca uma questão não desprezável: se for verdade a hipótese mais pessimista, e para a qual não bastam suspeitas mas produção de prova concludente e irrefutável, haverá consequências a retirar. A mais importante das quais será saber se alguém que participa numa fraude pode, por exemplo, ser primeiro-ministro?

A discussão poder-se-á abrir, porque faltaria ainda saber (no terreno desta hipótese mais terrífica) se uma fraude desta dimensão (razoavelmente insignificante ao lado de tanta matéria importante) merece uma destituição?

Escrevendo num espaço de uma associação empresarial que faz da ética uma preocupação central, o tema faz todo o sentido. Mas, como em todas as questões éticas, a resposta não será fácil, na medida em que se percebem as consequências do que seria este terramoto político como o de suspender um mandato a meio da viagem.

Com esta seria a terceira vez, seguida, em que um primeiro-ministro não terminava o seu mandato.
Infelizmente, presunção minha, o tema ainda vai dar pano para muitas mangas.

 
At 19 de abril de 2007 às 14:43, Anonymous Anónimo said...

- Já sabes a última?
- Não. Conta...
- O Governo vai lançar uma nova medida no âmbito do Simplex. Chama-se "Diploma na Hora".
- Eh pá, isso interessa-me. Sempre quis ter o canudo mas chateia-me à brava ter que queimar as pestanas...
- Pois para a obtenção de um diploma, a partir de agora, bastará indicar sob compromisso as habilitações do candidato e a nota final pretendida. Existem ainda outras modalidades acessórias: "Equivalências na Hora" e "Mestrado na Hora". E funciona tudo a qualquer dia da semana. Mesmo ao domingo!
- Ainda bem que me informas, pá. Vou já tratar disso. Faço questão de ter um mestrado em Física Quântica.
- E eu quero um em Engenharia Atómica. 'Bora lá.
Eu não te disse há dois anos que era porreiro votar no PS?

 
At 19 de abril de 2007 às 14:45, Anonymous Anónimo said...

Philip Roth, A Mancha Humana, excerto:


O Verão de 98 [...] foi caracterizado por um enorme regabofe de devoção, um regabofe de virtude, quando ao terrorismo, que destronara o comunismo como ameaça predominante à segurança do país, sucedeu o brochismo e um presidente viril, vigoroso e de meia-idade e uma impetuosa e enfeitiçada funcionária de 21 anos, desaforados no Salão Oval como dois putos adolescentes num parque de estacionamento, ressuscitaram a mais antiga paixão comunal da América, historicamente talvez, até, o seu prazer mais pérfido e subversivo: o êxtase da beatice hipócrita. [...] Foi o Verão em que, pela milésima milionésima vez, a bagunça, o caos e a confusão demonstraram ser mais subtis do que a ideologia deste e a moralidade daquele. Foi o Verão em que o pénis de um presidente esteve na cabeça de toda a gente e a vida, em toda a sua despudorada obscenidade, confundiu uma vez mais a América. [Trad. Fernanda Pinto Rodrigues, Dom Quixote, 2004]


Se trocar pénis por diploma percebe o ponto do farisaísmo galopante

 
At 19 de abril de 2007 às 14:47, Anonymous Anónimo said...

Um segundo ponto, que não me parece menos importante e não vejo tratado: o Primeiro-Ministro já confessou perceber perfeitamente que as pessoas tenham dúvidas sobre a sua licenciatura. Compreenderá seguramente também que, perante a singular coincidência de, a cada facto novo, surgirem e multiplicarem-se mais e mais incongruências, as pessoas mantenham as suas suspeitas. Ter afirmado que era perfeitamente natural formar-se a um domingo, dia 8.9.96, sustentando depois que foi inequivocamente a 8.8.96 que se formou, e não a um domingo, e ver agora os que o formaram a jurar que foi no tal domingo de Setembro é, no mínimo, complicado e não ajuda a clarificação alguma.

Não duvidará ainda o Primeiro-Ministro que esta estranha atitude dos Inspectores da Inspecção-Geral do Ensino de, numa inspecção generalizada, andarem a pedir especificamente os seus registos, avoluma enormemente as suspeitas e, pior, faz pensar aos portugueses que o próprio Primeiro-Ministro estará por trás de tudo.

Ora, sabendo ele de tudo isto, culpando a UnI por tudo isto, e conhecendo todo o mal que ela está a fazer à sua carreira, ao país, e a todos os alunos e professores da UnI, bons e maus, culpados e inocentes, de que está à espera para responsabilizar os que considera responsáveis, a entidade que acusa?

É que, na verdade, uma coisa é uma Universidade ter os seus arquivos e secretaria desorganizados; e outra, bem diferente, é a suspeita gravíssima de que vende diplomas por atacado. A primeira suspeita é, de certo modo, relativamente pouco importante; a segunda suspeita é gravíssima e afecta todos os alunos. A primeira não é suficiente para encerrar uma Universidade, a segunda é mais do que suficiente. A primeira não provoca despedimentos nem dúvidas, a segunda amontoa-as nos empregadores e colegas de profissão desses alunos.

Deste modo, como aluno da UnI, como objecto principal das suspeitas, como Primeiro-Ministro, a José Sócrates não resta outra solução do que defender-se (e a todos os alunos) atacando a referida UnI. Essa defesa-ataque não pode ser feita com o uso do poder, do poder de encerrar, de ameaçar, de esconder, de enviar batalhões de inspectores e de suprimir e queimar os documentos. Isso não é sequer legal nem defende os interesses dos milhares de alunos da UnI, que verão os seus cursos e diplomas ficarem sempre, para toda a eternidade, sob suspeita.

Aquilo que todos os alunos deveriam exigir de José Sócrates era que este encabeçasse a demonstração da transparência de todo o seu percurso académico nos Tribunais, que é onde estas questões se resolvem, responsabilizando a UnI, a sua organização administrativa e os seus arquivos, já que a considera ser responsável e por essas deficiências por todas estas dúvidas, e ilibando assim a questão pedagógica e científica da UnI, que, juntamente com o factor da proximidade do anterior estabelecimento de ensino, tanto justificou a sua escolha quando se inscreveu. E a UnI defender-se-ia como pudesse. Encerrá-la e queimar a documentação não é solução para os alunos que por lá passaram, incluindo aqui, obviamente, o Primeiro-Ministro.

Estão milhares de alunos sob suspeita de terem trocado os seus cursos por patacos, ao invés de os terem tirado com noites seguidas de salutar marranço, demonstração de sapiência e avaliação condigna, como certamente terá acontecido com José Sócrates. Essa imensidão de alunos inocentes clama ao Senhor Primeiro-Ministro: "demonstre, Senhor Primeiro-Ministro, inequivocamente, que o seu percurso académico no curso não deixa quaisquer dúvidas, para salvar todos os milhares de alunos que cursaram na mesma UnI. Ajude-nos! Salve-nos!"

O Senhor Primeiro-Ministro José Sócrates, pela posição que ocupa e exemplo que quer dar ao país, deve isto a estes milhares de alunos da sua UnI. Tem a obrigação de responsabilizar a UnI e demonstrar inequivocamente em Tribunal (agora que funcionam tão bem por sua intervenção) que o seu percurso académico é perfeitamente natural e habitual, como o de todos os restantes alunos da UnI e de outras Universidades, e que apenas a organização administrativa de dita UnI é que é deplorável, e que apenas por isso se amontoam dúvidas sobre a valia do seu canudo. E sobre a de todos os outros alunos aí formados.

Esta demonstração inequívoca é o mínimo que o Primeiro-Ministro pode fazer pelos alunos cuja formatura foi obtida pela UnI. Mandar o solícito Ministro Mariano Gago titubear explicações estremecidas para os jornalistas não chega. Os alunos da UnI, os seus colegas da UnI, aqueles jovens que desconsoladamente não pôde ensinar e formar já não sei bem por que motivo não lhe merecem menos. E o país agradece.

 

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