ATROFIA E "VOO DE PÁSSARA"
Não se concebe a implantação de um novo aeroporto sem a consideração de alternativas. Estas devem ficar de reserva, para o caso de surgirem dificuldades que prejudiquem seriamente a opção a que se deu primazia. No caso da Ota, há uma autêntica inversão deste princípio.
Os estudos feitos entre 1969 e 1974 consideravam impossível um aeroporto a norte do Tejo. Optaram por Rio Frio, mas previram as possibilidades de Porto Alto e de Alcochete. Os estudos feitos entre 1977 e 1982 apontaram para Rio Frio, Porto Alto e Ota. Mas esta graduação aguardava o aprofundamento dos estudos prévios e do plano director. E, em vez da Ota, os técnicos preferiam Alcochete, mas não os deixaram explorar a hipótese. O estudo de 1994 considerou a Ota o local menos adequado: escolheu-se o Montijo e, a seguir, Rio Frio. Em 1999, afastou-se o Montijo, sem justificação, e manteve-se Rio Frio com duas alternativas de orientação das pistas, continuando a Ota a ser a solução residual.
Agora, enveredou-se pela Ota, sem se respeitar o princípio de que, passando esta a hipótese principal, à cautela haveria que manter em agenda mais duas alternativas.
Todas foram afastadas, exactamente quando deviam estar a ser consideradas...
As limitações da Portela decorrem, em grande parte, de a existência da via de circulação paralela à pista mais longa, do lado oposto à aerogare, impedir que aterrem e descolem mais aviões sem risco para a segurança.
A actual capacidade poderia ser aumentada para 54 a 58 aviões/hora se, dizem-me, a pista mais longa rodar para lá do actual caminho de circulação. Com um segundo aeroporto na margem sul a questão da capacidade resolvia- -se. E os custos seriam sempre muitíssimo mais baixos.
A zona escolhida da Ota, com uma parte em leito de cheia do Tejo e de afluentes que a atravessam, implica a construção de três barragens e um aterro sobre um número de estacas que excede de largo as 235 617 previstas. A orografia, entre os três e os 60 metros de altitude, levará a movimentar 50 mil milhões de metros cúbicos de terras. Também me dizem que isto equivale a construir um muro de cinco metros por cinco ao longo da estrada entre Lisboa e Paris! A orografia envolvente, com o Monte Redondo e o Montejunto a poucos quilómetros de distância, dificultará a operação independente das duas pistas paralelas, não sendo possível prever mais de 30 aterragens e 40 descolagens por hora (pouco mais do que a Portela com a circulação corrigida). A criação de superfícies impermeáveis trará inconvenientes e riscos quanto às águas pluviais e subterrâneas. Há inúmeras ribeiras e rios subterrâneos interligados.
A solução será caríssima e de eficácia interrogada.
É impossível a Ota custar três mil milhões de euros: custará mais do dobro devido às questões enunciadas acima. É evidente que os investidores privados não vão assumir à partida os riscos quanto ao sem-fim de imprevistos que está mesmo a ver-se que vão surgir, para mais não sendo de esperar uma vida útil do novo aeroporto excedente a 13/17 anos.
Exigirão do Estado pesadas garantias de cobertura dos eventuais problemas e o Estado acabará por desembolsá-las.
E, se a ANA for uma das contrapartidas oferecidas, Pedras Rubras deixa de ter actividade significativa (já está a perdê-la), o que ajudará o Norte a definhar ainda mais.
Questões técnicas e financeiras deste calibre condicionam as decisões políticas. Um novo aeroporto nacional deve integrar-se num modelo sério de desenvolvimento. A Ota integra-se num verdadeiro modelo de atrofia para o País.Contribuirá para mais macrocefalia mixuruca, mais desertificação do interior, mais assimetrias perversas, mais promoção imobiliária, mais especulação e mais corrupção autárquica.
Acarretará o crescimento selvagem de uma floresta suburbana de cimento armado até Lisboa, sem espaços de qualquer outra natureza e com todos os problemas de infra-estruturas, ambiente, segurança e qualidade de vida, etc., que se conhecem à roda da capital.
Dir-se-á que teremos uns flamingos na margem sul e revoadas de patos-bravos da construção civil na margem norte.
Se é este o modelo de desenvolvimento (deveras ornitológico) que o Governo quer para Portugal, então pode limpar as mãos à parede. Nem a senhora Rattazzi, tão gozada pelo Camilo, ousaria conceber assim esse Portugal a voo de pássara.
Os estudos feitos entre 1969 e 1974 consideravam impossível um aeroporto a norte do Tejo. Optaram por Rio Frio, mas previram as possibilidades de Porto Alto e de Alcochete. Os estudos feitos entre 1977 e 1982 apontaram para Rio Frio, Porto Alto e Ota. Mas esta graduação aguardava o aprofundamento dos estudos prévios e do plano director. E, em vez da Ota, os técnicos preferiam Alcochete, mas não os deixaram explorar a hipótese. O estudo de 1994 considerou a Ota o local menos adequado: escolheu-se o Montijo e, a seguir, Rio Frio. Em 1999, afastou-se o Montijo, sem justificação, e manteve-se Rio Frio com duas alternativas de orientação das pistas, continuando a Ota a ser a solução residual.
Agora, enveredou-se pela Ota, sem se respeitar o princípio de que, passando esta a hipótese principal, à cautela haveria que manter em agenda mais duas alternativas.
Todas foram afastadas, exactamente quando deviam estar a ser consideradas...
As limitações da Portela decorrem, em grande parte, de a existência da via de circulação paralela à pista mais longa, do lado oposto à aerogare, impedir que aterrem e descolem mais aviões sem risco para a segurança.
A actual capacidade poderia ser aumentada para 54 a 58 aviões/hora se, dizem-me, a pista mais longa rodar para lá do actual caminho de circulação. Com um segundo aeroporto na margem sul a questão da capacidade resolvia- -se. E os custos seriam sempre muitíssimo mais baixos.
A zona escolhida da Ota, com uma parte em leito de cheia do Tejo e de afluentes que a atravessam, implica a construção de três barragens e um aterro sobre um número de estacas que excede de largo as 235 617 previstas. A orografia, entre os três e os 60 metros de altitude, levará a movimentar 50 mil milhões de metros cúbicos de terras. Também me dizem que isto equivale a construir um muro de cinco metros por cinco ao longo da estrada entre Lisboa e Paris! A orografia envolvente, com o Monte Redondo e o Montejunto a poucos quilómetros de distância, dificultará a operação independente das duas pistas paralelas, não sendo possível prever mais de 30 aterragens e 40 descolagens por hora (pouco mais do que a Portela com a circulação corrigida). A criação de superfícies impermeáveis trará inconvenientes e riscos quanto às águas pluviais e subterrâneas. Há inúmeras ribeiras e rios subterrâneos interligados.
A solução será caríssima e de eficácia interrogada.
É impossível a Ota custar três mil milhões de euros: custará mais do dobro devido às questões enunciadas acima. É evidente que os investidores privados não vão assumir à partida os riscos quanto ao sem-fim de imprevistos que está mesmo a ver-se que vão surgir, para mais não sendo de esperar uma vida útil do novo aeroporto excedente a 13/17 anos.
Exigirão do Estado pesadas garantias de cobertura dos eventuais problemas e o Estado acabará por desembolsá-las.
E, se a ANA for uma das contrapartidas oferecidas, Pedras Rubras deixa de ter actividade significativa (já está a perdê-la), o que ajudará o Norte a definhar ainda mais.
Questões técnicas e financeiras deste calibre condicionam as decisões políticas. Um novo aeroporto nacional deve integrar-se num modelo sério de desenvolvimento. A Ota integra-se num verdadeiro modelo de atrofia para o País.Contribuirá para mais macrocefalia mixuruca, mais desertificação do interior, mais assimetrias perversas, mais promoção imobiliária, mais especulação e mais corrupção autárquica.
Acarretará o crescimento selvagem de uma floresta suburbana de cimento armado até Lisboa, sem espaços de qualquer outra natureza e com todos os problemas de infra-estruturas, ambiente, segurança e qualidade de vida, etc., que se conhecem à roda da capital.
Dir-se-á que teremos uns flamingos na margem sul e revoadas de patos-bravos da construção civil na margem norte.
Se é este o modelo de desenvolvimento (deveras ornitológico) que o Governo quer para Portugal, então pode limpar as mãos à parede. Nem a senhora Rattazzi, tão gozada pelo Camilo, ousaria conceber assim esse Portugal a voo de pássara.
Vasco Graça Moura
Etiquetas: OTA
3 Comments:
Não percebo nada de engenharia nem considero que a questão da localização da Ota seja um debate de engenheiros.
Mal estará o nosso país se a democracia for gerida corporativamente, cabendo aos técnicos tomar as decisões, não me recordo, por exemplo, de ter visto Cavaco Silva ler relatórios técnicos para decidir as suas obras, este recurso aos técnicos apenas traduz a falta de credibilidade dos políticos e quando um líder da oposição se faz acompanhar de engenheiros para apoiarem as suas propostas é porque admite que não tem argumentos políticos ou porque pretende que uma suposta legitimidade técnica se sobreponha à legitimidade política para decidir.
Não junto a minha voz ao coro conduzido pelo jornal Público de Belmiro de Azevedo a que se juntou Marques Mendes (sabe Deus porquê), Jerónimo de Sousa porque imagina que um aeroporto vai salvar as suas autarquias da decadência em que caíram depois de trinta anos a tentar construir uma little RDA na margem Sul ou Francisco Louça que apoia tudo o que lhe possa dar votos.
Mas não estou convencido de que a melhor localização seja a Ota e muito menos que seja necessário construir um novo aeroporto com a urgência dramática com que nos é apresentada pelo ministro Mário Lino. É mais do que evidente que uma obra pública desta dimensão não significa apenas a solução de um problema de transportes, o investimento envolvido é suficiente para afectar a nossa economia, a actividade económica gerada é suficiente para criar a ilusão de prosperidade económica que poderá assegurar condições favoráveis a uma vitória do PS em 2013.
É evidente que a Portela está a ficar saturada, mas também é verdade que na Portela não aterram apenas aviões com passageiros, aterram centenas de aviões de mercadorias (os das companhias de Express mail como a DHL, a TNT e muitas outras) e aviões militares. Não compreendo porque motivo Lisboa está cercada de aeroportos militares quando quase não temos força aérea, um aeroporto em Alverca, outro na Portela e um em Montijo.
Ainda não me explicaram porque motivo os lisboetas vão ter que apanhar o avião algures quase no centro do país (para alegria de Vital Moreira) e Lisboa continua a ser reservada para aviões militares.
Não entendo o porquê desta abordagem medieval de uma cidade fortificada, cheia de quartéis militares e rodeada de três aeroportos militares e uma base naval.
Se o Governo me provar que recorrendo a Alverca para os voos e mercadorias (aproveitando as sinergias com um importante terminar rodoviário numa época em que cada vez mais se combinam estas duas vias de transportes de mercadorias) e ao Montijo para um novo aeroporto internacional para onde poderiam ser desviados parte dos voos da Portela não se resolve o problema então que escolha a nova localização.
Se o objectivo do Governo é fazer renascer o keynesianismo com objectivos eleitorais então devo recordar que os resultados dos investimentos feitos pelos governos de Cavaco Silva estão à vista e que não salvaram o PSD que acabou por ser derrotado graças à confusão que fez entre o Estado e o partido, fenómeno que o PS está a produzir com menos tempo de governo do que sucedeu na época de Cavaco Silva. Se o objectivo do Governo é estimular a economia à custa das obras públicas isso significa que Sócrates não aprendeu nada nas viagens que fez à Finlândia e à Irlanda quando ainda era primeiro-ministro estagiário.
Direi sim à Ota mas só depois de Sócrates me mostrar a sua indispensabilidade, depois de convencer que a opção Ota nada tem que ver com os calendários eleitorais e depois me provar que o que pretende é resolver um problema e não criar condições para se eternizar no poder à custa do progresso de um país que em vez de investir em saber continua a betonar o desenvolvimento.
Para meu relativo espanto - pouca coisa me espanta hoje em dia - o sr. engº Lino, inscrito na Ordem dos Engenheiros e ministro da Ota, ainda está em funções. Foi ao Parlamento responder a uma comissão qualquer e não se percebeu nada do que disse sobre a TAP e a Portugália. Lino é o homem de palha de Sócrates para enfrentar o PR acerca da Ota. Se Cavaco respeitar o seu pensamento sobre o novo aeroporto na Ota, expresso antes, durante e depois de ter sido candidato e presidente eleito, Sócrates não terá outro remédio senão desfazer-se do homem antes que o homem o desfaça a ele.
Quem é o autor desta opinião tão bem fundamentada?
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