sábado, 8 de dezembro de 2007

ÁFRICA EM LISBOA


1 Se mora em Lisboa e tem possibilidades para tal, este é o fim-de-semana aconselhado para fugir da cidade. De anteontem até amanhã, Lisboa está ocupada por uma monumental feira de futilidades chamada Cimeira União Europeia-África. São 127 delegações, oitenta chefes de Estado, dos quais mais de 50 africanos, três milhares de participantes em apoio aos chefes de Estado, mais de quatro mil polícias mobilizados de norte a sul do país com todas as folgas canceladas e todos a horas extraordinárias, centenas de aviões a aterrar e três helicópteros mais um F-16 (!) a sobrevoarem a zona dos 'trabalhos' para garantirem a segurança de tão ilustres turistas. Vinte e dois hotéis estão integralmente reservados para eles (todos os de luxo para os africanos), e o trânsito estará cortado em várias zonas ribeirinhas da cidade e, a certas horas, talvez também na Marginal, já que sua excelência, o celerado Mugabe, vai dormir ao Estoril e o beduíno Kadhafi monta as tendas, para si e para parte da sua comitiva de 250 acompanhantes, no Forte de S. Julião da Barra (excelente local para montar a tenda, em frente ao mar por onde saímos a caminho de África e onde Paulo Portas recebia Donald Rumsfeldt para discutir o êxito do Iraque).

Para agravar o caos, algumas de suas excelências, os sobas africanos, são muito dados a exigências de classe. Nos hotéis, só suites presidenciais, champagne Veuve Clicquot Grande Damme e caviar beluga. Nas ruas, seguranças privados armados, além da polícia portuguesa, carros blindados topo de gama e ambulâncias atrás (conforme viram nos filmes americanos): quanto mais feroz é a ditadura que os sustenta, maior é o cagaço que têm, o que se compreende bem.

Para que serve este imenso 'bazaar'? Principalmente, para nada, como dizem os alentejanos. Tudo o que havia a discutir e a assinar, como a tão desejada por Sócrates 'Declaração de Lisboa', já está acordado e escrito. Mas os grandes do mundo precisam e adoram estas oportunidades mediáticas e, afinal de contas, um fim-de-semana em Lisboa, com dois banquetes e um concerto com a Marisa e a Cesária Évora pelo meio, nem é nada desagradável: os europeus aproveitam para ver sol e os africanos para ver mundo e mandarem as "madames" às compras. Não é Paris nem Londres, mas sempre é um país hospitaleiro, que gosta de receber bem e cuja política externa não incomoda ninguém e se contenta em que lhe dêem coisas inócuas e que soam bem, como a 'Declaração de Lisboa'.

Em concreto, a cimeira vai custar umas dezenas de milhões de euros aos portugueses, a Europa rica vai dar à África miserável 1,2 mil milhões de euros até 2010 - dos quais, como de costume, apenas cerca de 10% chegarão ao destino e terão utilidade concreta. Destarte, a Europa sacode os seus problemas de consciência, como um pai que passa um cheque ao filho 'com problemas' e não se preocupa mais com o assunto. Mas os produtos agrícolas de África - a sua melhor hipótese de sair da miséria - continuarão fechados aos mercados europeus para proteger a sagrada PAC e os agricultores ricos da França e outros mais e o comércio em geral continuará a ser ditado por relações de desigualdade e batota. A Europa continuará a dar peixes, mas não a ensinar a pescar. Quanto à África e aos seus ditadores de opereta, com as mãos manchadas de um sangue que não sai e os bolsos atulhados de dinheiro roubado às suas populações, limita-se a estender a mão a mais uma esmola e a agradecer a oportunidade de reconhecimento internacional por que a diplomacia portuguesa tanto se esforçou nos últimos meses.

Esta é a triste história das relações da Europa com África de há cinco décadas para cá: os governos europeus dão umas esmolas e, em troca, avançam a seguir as multinacionais que sacam tudo o que podem sacar e enchem as contas bancárias dos governantes africanos na Suíça. Quando as cenas de miséria do continente negro se começam a tornar outra vez incómodas nas televisões ocidentais, convoca-se nova cimeira com os corruptos e dá-se-lhes mais uma esmola para aliviar as consciências ou produz-se mais uma grandiosa Declaração de Lisboa ou de Reiquejavique para enganar os tontos. Mas nunca os ricos se atrevem a exigir aos pobres que roubem menos e que matem menos - isso estragaria os negócios. Assim, a 'Declaração de Lisboa' não deixará, certamente, de conter uma referência 'muito forte' aos direitos humanos e à democracia, a qual será tranquilamente apoiada por gente estimável como Mugabe, do Zimbabwe, José Eduardo dos Santos, de Angola, ou Omar Bongo, do Gabão - que, juntos, perfazem oitenta e oito anos de poder, de arbitrariedades de toda a ordem e de negócios, mais uma sempre bem-vinda e inestimável factura de hotel em Lisboa.

2 Daqui a três semanas, entra em vigor a tão falada lei sobre o tabaco em restaurantes, hotéis e similares. Há coisas na lei que são simplesmente um castigo imposto aos fumadores, não ditado por qualquer preocupação de protecção aos não-fumadores, como a proibição absoluta de poder haver um espaço reservado para os fumadores nos hospitais, comboios ou transportes marítimos. Quanto aos restaurantes e afins, a liberdade de escolha dos próprios foi substituída por um sistema de condicionantes tais que parece que a generalidade dos estabelecimentos concluiu ser mais simples e mais barato nada fazer e proibir o fumo. É uma história bem portuguesa: os proprietários dos restaurantes tiveram meses para discutir a lei, um ano para se prepararem para ela e só agora, à bica do prazo, é que se lembraram de a avaliar para concluir que nada há a fazer. E, assim, temos mais uma lei que, carregada de equitativas intenções, acaba por se revelar totalmente unilateral: quem fuma deixa de poder frequentar restaurantes, como se tivesse peçonha, ou então vem à rua a meio da refeição, confraternizar com os arrumadores e expor-se à curiosidade pública como elemento anti-social. E assim entramos na modernidade. Só não sei é porque continuam os transportes públicos a lançar fumo para a cara dos passantes como nenhum outro veículo, as suiniculturas continuam impunemente a envenenar os rios e a indústria alegremente a rebentar com todos os limites de emissão de gases que acordámos em Quioto, já lá vão dez anos.

3 Sem nenhuma promoção da RTP, passada em dias consecutivos e a uma hora tardia, está no ar, desde o princípio desta semana, a mais extraordinária série televisiva que de há muito vi: 'Guerra e Paz', produzida pela BBC. Talvez o melhor romance de sempre, pela mão da melhor produtora de sempre de séries de qualidade. Melhor ainda que o golo do Ricardo Quaresma na Luz, sábado passado.


Miguel Sousa Tavares

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4 Comments:

At 10 de dezembro de 2007 às 22:29, Anonymous Anónimo said...

Foi lindo as fotos dos carros diplomaticos a porta das cimeiras paralelas no Elefante Branco, no Gallery, etc,etc
Por onde andam os nosso dinheiros

 
At 10 de dezembro de 2007 às 22:29, Anonymous Anónimo said...

Foi lindo as fotos dos carros diplomaticos a porta das cimeiras paralelas no Elefante Branco, no Gallery, etc,etc
Por onde andam os nosso dinheiros

 
At 10 de dezembro de 2007 às 23:38, Anonymous Anónimo said...

Texto Final da Cimeira Euro-Africana de Lisboa (2007)
1) África é declarada Continente Aberto.
2) Os recursos do Continente Africano são considerados Património da Humanidade.
3) Os signatários comprometem-se, no prazo de um mês, a entregar, no Tribunal Internacional de Haia, a lista integral dos Crimes contra a Humanidade cometidos pelos respectivos Chefes de Estado, Governo e Governantes, em geral.
4) O Tribunal de Haia compromete-se a instruir, no prazo de 30 dias, os respectivos processos, quando os houver.
5) Num prazo de 60 dias, o Tribunal Internacional de Haia procederá ao julgamento e condenação dos referidos dirigentes.
6) Em alternativa, e mal seja formulada a acusação, poderão os citados dirigentes optar por resignar a todos os seus cargos e poderes, com direito aos exílios nas suas residências secundárias de Côte-d'Azûr, Estoril, ALLgarve, Bahamas, Califórnia e afins.
7) Disponibilização imediata, via Internet, de todos os bens móveis e imóveis, em posse dos Governantes Africanos, e sua reposição no Erário Público de cada estado.
8) No caso de condenação ou abandono voluntário de funções, procederá a Assembleia Geral das Nações Unidas à nomeação de Altos-Comissários, encarregados de colocar sob a administração directa da O.N.U. os Estados temporariamente desprovidos de Governos, até à realização de eleições livres, com a participação de todas as correntes políticas e de opinião presentes.
9) Redefinição das fronteiras entre estados, com vista a que elementos das mesmas tribos, nações, culturas e famílias não estejam separados, ou agregados por linhas de raia virtuais.
10 ) Confiscação dos bens, no estrangeiro, dos dirigentes depostos, e sua conversão, sob a tutela da O.N.U. em Programas Intensivos de desminação do Continente, Programas de Alfabetização Acelerada, Vacinação em massa, Camapnhas de prevenção da SIDA e Definição de um Patamar de Alimentação e Remuneração Mínimas.
11) Estabelecimento imediato de protocolos com as melhores Universidades Mundiais, com vista ao intercâmbio de docentes e definição de Licenciaturas, Mestrados e Doutoramentos, a serem leccionados nos territórios de origem, com um prazo de execução de 5 anos, e destinados a formarem um corpo de elite social, capaz de assegurar as gestões nacionais, no nível político, económico, financeiro e jurídico.
12) Levantamento exaustivo das riquezas minerais, naturais e das reservas energéticas do Continente, as quais passarão a fazer parte do Património da Aldeia Global, tuteladas e administradas pelas Nações Unidas e distribuídas com a seguinte ordem de prioridade:
a) Usufruto dos autóctones.
b) Criação de indústrias euro-africanas, com benefício paritário das populações de ambos os Continentes.
c) Partilha Mundial dos mesmos, em troca de alimentação, vestuário, tecnologia e equipamento, com excepção draconiana para as armas.
13) Utilização dos jactos privados dos ex-ditadores locais, na constituição de uma frota social, destinada a tratamentos de urgência nos hospitais europeus, enquanto não estiverem em pleno funcionamento estruturas sanitárias equivalentes no Continente Africano.
14) Protocolos de excelência com os raros governantes que têm cumprido as regras de qualificação e dignificação humana das respectivas populações.
15) Levantamento dos bens culturais do Continente, com vista à implantação imediata de infra-estruturas de nível avançado, em prol da indústria turística local.
16) Imediata liberalização do espaço aéreo africano, com vista à permissão de rotas de companhias "low-cost".
17) Alterações constitucionais imediatas, em cada estado, com vista à definição de igualdades entre raças, sexos, opções sexuais e liberdades de opinião e culto.
18) Esboço preliminar de um Mercado Comum Africano, com relações priveligiadas com o Espaço Económico Europeu, e preparação de uma Constituição Pan-Africana.
19) Colocação, em regime de paridade de aquisição, dos melhores produtos africanos, nas prateleiras europeia, e o seu recíproco.
20) Perdão imediato das dívidas dos Estados Africanos, ao abrigo de uma Adenda Histórica de Compensações Coloniais.
21) Colocação de brigadas da Interpol e de todos os recursos tecnológicos, Via Satélite, GPS e escutas telefónicas, com vista ao imediato desmantelamento do tráfico de seres humanos, em ambos os lados do Mediterrâneo.
22) Colocação dos altos comandos das Forças Armadas de cada estado sob a chefia de Comandos Internacionais para a Paz, nomeados pela O.N.U.
22) Este acordo entra imediatamente em vigor.
Lisboa, 9 de Dezembro de 2007
O Presidente em Exercício da Comissão Europeia
José Manuel Düraü Barrozo
O Presidente em Exercício da Presidência Rotativa da União Europeia
José Sócrates, "Eng."

 
At 10 de dezembro de 2007 às 23:39, Anonymous Anónimo said...

... é verdade que teve de ser uma rapidinha, mas eu não podia deixar um dos homens mais charmosos do Mundo deixar Lisboa, sem lhe dar um pouco do meu afecto, e disse ao guarda-costas se o deixava ir aos chichis da "Brasileira", para eu lhe sacar um galão, no fundo, queria que ele, especialista em colocar bombas e fazer despenharem-se Jumbos da Aviação Comercial, me fizesse cair no colo "bombas" daquelas que eu tanto preciso, mas ele foi muito lacónico: o acordo com Sócrates apenas incluía uns fins de semana prolongados nos desertos da Líbia, muito agarradinho, o outro a gemer como uma canciozinho, e o Jabal-al-Camelo a despejar-lhe nas bordas um pouco dos seus leites beduínos.
"Dizem que você fode muito bem...", ainda arrrisquei, "pois fodo", já fodi a vida a muita gente, e ainda vou foder a mais, se a tanto me ajudar o engenho e a arte.
Depois, apalpou-me as mamas, "falso, como eu gosto... Aposto que isto é tudo silicone do verdadeiro", e eu, "é, querido, e deixe-me dizer-lhe que o achei um charme, figuras como a sua já as acreditava extintas, como as pinturas rupestres do deserto líbio, ou os poços de água que continua a tirar do seu oceano subterrãneo, para alimentar as fontes da vaidade. Vai secar tudo em 25 anos, mas de aqui a 25 anos, se deus quiser, ainda você estará no Poder, eu, mais gorda e relaxada, na esquina do Conde Redondo, e Mugabe a cumprir, a par com Sócrates, os respectivos segundos jubileus.
Depois, veio a parte técnica: como é que ele consegui afazer aquele segurar a saia com a mão e rodar a anca, tipo Dona Amélia, já na fase do exílio francês, "é fácil", disse ele, "aprendei com a vossa Amália, a grande Amália, maior do que a nossa grande Farouh'za, é só fazer assim", e virou o cu para mim e deu duas nalgadas fortes, uma para a esquerda, outra para a direita. "Gostou?... No fundo é este truque que me mantém no Poder há tantos Crime..., perdão, Anos".
Ficámos amigas, perdão, amigos: prometi mexer os meus cordelinhos, para lhe arranjar umas horas de "part-time", no "Fontória", e ele arranjar-me uns caralhos de beduíno, coisa que se visse, nada daquelas amostras de seguranças da noite, tipo picha de porco curta e enrolada, é uma triste vida de dieta a minha...

 

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