VALORES DE IMPORTAÇÃO
Parece que o vídeo da zaragata ocorrida entre uma aluna e uma professora do Liceu Carolina Michaëlis de Vasconcelos, no Porto, sobressaltou as serenas consciências e permitiu uma resoluta série de opiniões.
Putativos culpados: a aluna, a professora, a escola, a ministra - e os pais.
Não me atrevo a juízos definitivos.
A vigilância hierarquizada, assim como a punição pelo método da pirâmide, correspondem, em última análise, a insidiosas extensões dos mecanismos de poder.
O que está em causa, modestamente o creio, é a questão do sistema, não as debilidades do regime. Este possui os desvios e as turbulências comuns às suas estruturas e instituições. Aquele nunca cedeu ao seu radical objectivo.
A verdade é que, um pouco por todo o mundo, a violência nos estabelecimentos de ensino é um dado adquirido.
Os estudantes do Maio de 68 exigiam Tudo, já!, e invocavam ser a última das gerações marcadas pela injustiça. Sacolejaram a velha doutrina. O festim durou um instante. E os seus líderes deram no que deram, com especial relevo para a teatralidade pungente de Cohn-Bendit. O mal-estar persiste porque se alterou alguma coisa a fim de tudo ficar na mesma. A fórmula de Lampedusa aplica-se, também, às situações a que temos assistido. Não há ausência de valores. Há, isso sim, outros valores de rápida importação, sobre os quais nenhuma reflexão tem sido feita. A nova ordem económica mundial modificou, substancialmente, o articulado no qual se estatuiu, durante décadas, a nossa existência comum. Tudo se tornou precário, instável e inquietante. Destruiu-se comportamentos consolidados, disposições familiares de séculos, mecanismos que garantiam equilíbrios sociais. No fundo, a organização não passava de uma dissimulada sanção normalizadora ou, se o quiserem, punitiva, por opressora. Acusam-se os pais e os professores de desatenção, negligência, falta de zelo; os alunos, de desobediência, insolência, má educação. E reclama-se a velha autoridade. As fracções mais ténues de conduta não são analisadas à luz das novas regras - nas quais o mercado e a inobservância dos laços solidários desempenham poderosos papéis.
Em todos os sectores funcionam aparelhos penais, num espaço que as sociedades deixaram vazio, por não esclarecerem a dimensão das novas regras. E estas foram estabelecidas pelo capitalismo moderno, rude e desenfreado por inexistência de alternativa credível.
Vivemos num tempo evolutivo. A escola, a Igreja, a justiça, o amor, o conceito de família, a noção de comunidade, tal como no-lo foram inculcados, são sacudidos porque emergiram outras modalidades de poder. O caso do liceu do Porto é um dos sinais do tempo. Nem mais nem menos graves do que outros.
B.B.
Putativos culpados: a aluna, a professora, a escola, a ministra - e os pais.
Não me atrevo a juízos definitivos.
A vigilância hierarquizada, assim como a punição pelo método da pirâmide, correspondem, em última análise, a insidiosas extensões dos mecanismos de poder.
O que está em causa, modestamente o creio, é a questão do sistema, não as debilidades do regime. Este possui os desvios e as turbulências comuns às suas estruturas e instituições. Aquele nunca cedeu ao seu radical objectivo.
A verdade é que, um pouco por todo o mundo, a violência nos estabelecimentos de ensino é um dado adquirido.
Os estudantes do Maio de 68 exigiam Tudo, já!, e invocavam ser a última das gerações marcadas pela injustiça. Sacolejaram a velha doutrina. O festim durou um instante. E os seus líderes deram no que deram, com especial relevo para a teatralidade pungente de Cohn-Bendit. O mal-estar persiste porque se alterou alguma coisa a fim de tudo ficar na mesma. A fórmula de Lampedusa aplica-se, também, às situações a que temos assistido. Não há ausência de valores. Há, isso sim, outros valores de rápida importação, sobre os quais nenhuma reflexão tem sido feita. A nova ordem económica mundial modificou, substancialmente, o articulado no qual se estatuiu, durante décadas, a nossa existência comum. Tudo se tornou precário, instável e inquietante. Destruiu-se comportamentos consolidados, disposições familiares de séculos, mecanismos que garantiam equilíbrios sociais. No fundo, a organização não passava de uma dissimulada sanção normalizadora ou, se o quiserem, punitiva, por opressora. Acusam-se os pais e os professores de desatenção, negligência, falta de zelo; os alunos, de desobediência, insolência, má educação. E reclama-se a velha autoridade. As fracções mais ténues de conduta não são analisadas à luz das novas regras - nas quais o mercado e a inobservância dos laços solidários desempenham poderosos papéis.
Em todos os sectores funcionam aparelhos penais, num espaço que as sociedades deixaram vazio, por não esclarecerem a dimensão das novas regras. E estas foram estabelecidas pelo capitalismo moderno, rude e desenfreado por inexistência de alternativa credível.
Vivemos num tempo evolutivo. A escola, a Igreja, a justiça, o amor, o conceito de família, a noção de comunidade, tal como no-lo foram inculcados, são sacudidos porque emergiram outras modalidades de poder. O caso do liceu do Porto é um dos sinais do tempo. Nem mais nem menos graves do que outros.
B.B.
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