sexta-feira, 30 de outubro de 2009

POBRE PÁTRIA ENTREGUE A TAL GENTE...

Desagrada-me ter de molhar a caneta na tinta do desalento e da mágoa. Não me sinto bem a dizer mal. Mas o mal aí está, numa sociedade decrépita, cujos dirigentes demonstram uma felicidade tão intensa quanto leviana, e a elite, averiguadamente, não se interessa pelos destinos do País. Numa entrevista a Ana Lourenço, na SIC, terça-feira, António Barreto fez uma análise demolidora da situação. Barreto demonstrou, com números e dados de facto, que Portugal parece condenado a não se sabe bem o quê.



Avisou: "Nos próximos anos, pode haver um movimento de emergência nacional." Como, "emergência nacional"? Intervenção militar? Ruptura absoluta na economia e nas finanças? Surgimento de um poder baseado nos bancos e nos juízes? Nada é de pôr de lado. Tudo é admissível. Qualquer destas hipóteses tem acontecido, a espaços mais ou menos curtos, um pouco por todo o lado dito "ocidental."

Na verdade, de que forma se pode organizar um país, o nosso, com 600 mil desempregados, 20 mil compatriotas a viver na faixa da miséria, 40 mil idosos com fome, milhares de grandes, pequenas e média empresas a fechar, e uma mocidade sem perspectivas, não só aqui como em outros países?

A precariedade instalou-se na vida, nos costumes, nos hábitos e na resignação portugueses. Não vale a pena estruturar as coisas nem a longa nem a curta distância. Os salários estão cada vez mais baixos, e os gentis senhores Van Zeller e Vítor Constâncio propõem: nada de aumentos! O jornalismo português existe numa baixeza moral e profissional nunca vista, nem mesmo nos tempos da Censura, da PIDE, das guerras coloniais. Sei muito bem que há gente incomodada quando escrevo e digo isto. E digo isto nos jornais, nas televisões, nas rádios e em debates para que, frequentemente, sou convidado.

Raramente notícias com a importância daquelas que referi vão para as primeiras páginas, abrem os telejornais, são comentadas e esclarecidas. A rotina dos que interpretam os factos escapa destes casos, recusa a sua análise. Os comentadores são muito independentes, muito imparciais, muito limpos, muito "distanciados" e não têm por objectivo incomodar quem manda.

As doses maciças de futebol com que nos anestesiam as capacidades críticas atingem os territórios do obsceno. O País está em declive acentuado, e não sou só eu que o digo, e a música que nos tocam é maviosa.

Os vencimentos são tão baixos que não chegam para sustentar famílias com um e dois filhos. Recorrem aos bancos da fome, à Caritas, e a outras organizações cristãs e a movimentos de solidariedade social. Há dias, o "Correio da Manhã" informava dos criminosos (não há outro termo: criminosos) ordenados e reformas obtidos por cavalheiros que talvez se julguem acima do bem e do mal. É uma notícia aterradora pela pouca-vergonha que comporta. Uma casta de privilegiados sobreleva todas as ideias de justiça e de equilíbrio social, por mais minguadas que sejam. Aqueles de nós, cada vez mais reduzidos, por medo ou por compromisso, aqueles de nós que manifestam indignação e repulsa por este estado de coisas são apodados de comunistas. Alguns, até, perseguidos, pelo singelo desejo de uma pátria solidária e fraterna. Como devem calcular, sei muito bem do que falo.

No entanto, creio que a função social da Imprensa corresponde, cada vez mais, à necessidade de se criar novos laços sociais. De contrário, corremos o risco de uma explosão generalizada, com consequências imprevisíveis. As pessoas mais novas pouco ou nada sabem do nosso passado próximo recente. Poucos filmes "políticos", pouca investigação histórica, poucos resultados de ordem pedagógica. Os escritores portugueses parecem ter-se demitido da sua exemplaridade. Abandonaram os testamentos legados por uma literatura que forneceu o retrato moral, estético, ético e intelectual do Portugal sequestrado. A ausência de debate e de polémica resulta desse abandono trágico.

O retrato de António Barreto ao País foi terrível, por perturbador. Com uma secura implacável e a voz serena e calma que se lhe conhece, o sociólogo não escamoteou nem ocultou as novas figuras de autoridade, como o medo, que nos limitam e constrangem. E Ana Lourenço, muito bem preparada, formulava as perguntas apropriadas àquilo que Barreto ia dizendo. E Barreto não esqueceu os tropeções por que tem passado o jornalismo português, cada vez mais medíocre, mais apressado, mais levezinho e ligeirinho. Uma grande entrevista, que devia servir de exemplo a muitos e muitas preopinantes das televisões, que apenas procuram o sobressalto, a surpresa e o pequeno escândalo.

O retorno do recalcado aí está. O recalcado não encontra motivação em coisa alguma. Depois, é informado da miséria, do desespero e da angústia que o rodeiam; dos ordenados (diz-se "vencimentos", é mais civilizado) dos "gestores" que foram, que são e que estão para vir. Tudo o recalca. Tudo o abate. Tudo o conduz à frustração.


B.B.

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13 Comments:

At 30 de outubro de 2009 às 17:31, Anonymous Anónimo said...

Dizer que o País está de pantanas, todos nós sabemos. Dizer que a pobreza aumenta de dia para dia em Portugal, todos nós sabemos. Dizer que está tudo mal em Portugal, todos nós sabemos. O que eu gostava de ouvir desses "especi.alistas", era soluções para tudo isto

 
At 30 de outubro de 2009 às 18:38, Anonymous Anónimo said...

Administrador da REN é um dos 13 arguidos

por LusaHoje

O administrador da Rede Eléctrica Nacional (REN) José Penedos é um dos 13 arguidos da operação Face Oculta, uma investigação da Polícia Judiciária (PJ) a várias empresas acusadas de corrupção, confirmou à Lusa fonte policial.

José Penedos junta-se ao seu filho, o advogado Paulo Penedos, e a Armando Vara, vice-presidente do Millenium BCP, na lista de arguidos mediáticos, numa investigação que culminou com uma única detenção, a do empresário Manuel José Godinho.

O empresário de Ovar, dono da SCI - Sociedade Comercial e Industrial de Metalomecânica SA, está hoje a ser ouvido no Juízo de Instrução Criminal da Comarca do Baixo Vouga, em Aveiro, que vai definir se permanecerá em prisão preventiva ou se lhe será aplicada outra medida de coacção.

A PJ investigou a actividade de um grupo de empresas, que, através de um esquema organizado, terá sido beneficiado na adjudicação de concursos e consultas públicas, na área de recolha e gestão de resíduos industriais.

Quarta-feira a PJ efectuou cerca de 30 buscas domiciliárias e a locais de trabalho em Aveiro, Ovar, Santa Maria da Feira, Lisboa, Oeiras, Sines, Alcochete, Faro, Ponte de Sor e Viseu.

Pede-se a quem tenha algum conhecimento de qual o domicilio que vou investigado no âmbito do processo face oculta, o favor de divulgar.
Zé da Ponte por favor investigue quem a PJ investigou em Ponte de Sor.

Ver
http://www.observatoriodoalgarve.com/cna/noticias_ver.asp?noticia=32720
http://dn.sapo.pt/inicio/portugal/Interior.aspx?content_id=1405729

 
At 30 de outubro de 2009 às 19:05, Anonymous K. said...

O presidente da CIP entende que empresas continuam a precisar de apoios, pelo menos até 2011. Sobre o aumento do Salário Mínimo Nacional (SMN) em 25 euros, Francisco Van Zeller defendeu que, em 2010, esta retribuição não deve ser aumentada porque as empresas correm o risco de fechar.
É assim mesmo, o estado que continue a apoiar as empresas com o dinheiro dos nossos impostos que eles não podem dar uns miseráveis 25 euros (80 cêntimos por dia) a quem vive com 450 euros de ordenado mínimo. Se não podem então algo está errado porque eu não vejo faltar dinheiro para pagar dezenas ou centenas de milhares de euros aos administradores e gestores. Quando ouvimos que políticos trabalham para dezenas de empresas, (lembro-me do Nobre Guedes que para ser ministro do ambiente teve de abdicar de 30 cargos em empresas), e onde só devem ir quando o rei faz anos e recebem milhares de euros não podemos deixar de nos revoltar.
Vão todos à merda e quem trabalha acorde e lute pelos seus direitos. Já basta desta pouca-vergonha.

 
At 30 de outubro de 2009 às 19:13, Anonymous L.C. said...

A figura de Vara é irritante. Foi ele que andou a decretar para que as matrículas dos carros importados usados começassem por K, foi o autor da estúpida Tolerância Zero nalgumas estradas, numa demagógica caça à multa, foi aluno dessa escola superior de virtudes que era a Independente, criou aquela Fundação para a Prevenção que deu bronca ao ponto de Sampaio ter exigido ( e sem chorar!) que Guterres demitisse o trasmontano... Vara é daquelas figuras do regime que sem ele a democracia era uma desgraça e nós desgraçados contribuintes e cidadãos uns parias sem sabermos onde deveríamos cair mortos.

Vara saltou a vida à vara e conseguiu saltar de Trás-os-Montes, onde era vagamente um obscuro bancário, para a ribalta de um grandioso banqueiro. Ninguém lhe tira o mérito, o talento e a obstinação, mas que há gente com sorte ninguém duvide. Amigo especial de Sócrates, companheiros de estrada ( aquela que liga as berças à capital, o provinciano ao urbano de fatiotas Afonso Dominguez, o pato bravo- engenhocas ao visionário das polis e rotundas) Vara, Armando Vara, está agora de novo nas manchetes por motivos mais melindrosos. Não será uma campanha negra, mas o administrador do BCP já clamou inocência.

Com um dia sem tempo para ler notícias a fundo, as gordas remeteram-me para esta figura do planeta socialista. Depois daquele fax sobre o Freeport (de que não se voltou a falar) a esta nova novela, o país continua a prometer comédia da boa. E, claro está, acreditamos na Justiça.

 
At 30 de outubro de 2009 às 19:15, Anonymous Anónimo said...

Segundo o Eurostat, a taxa de desemprego em Portugal aumentou 0,1 por cento em Setembro, para 9,2 por cento. E, apesar do desemprego não parar de subir, a ausência de respostas políticas por parte do Governo sugere que o desemprego não é nem um problema, nem uma prioridade.

 
At 30 de outubro de 2009 às 19:17, Anonymous João Gonçalves said...

Isto é tudo tão mau, tão incessantemente mau, que até o regime se confunde com sucata e sucata com o regime.

 
At 30 de outubro de 2009 às 19:21, Anonymous Anónimo said...

Armando Vara recebeu dez mil euros em dinheiro pagos num gabinete do BCP.
Ninguém terá ficado surpreendido por encontrar o nome de Armando Vara associado a mais uma trapalhada.
Mas se esta notícia do Expresso for verdade, será que José Sócrates vai continuar a falar de inveja social?

 
At 30 de outubro de 2009 às 19:29, Anonymous Anónimo said...

Não me digam que a empresa visitada cá a cidade foi a Câmara Municipal da cidade?

 
At 31 de outubro de 2009 às 00:09, Anonymous Anónimo said...

Caros Pontessorenses,
Ponte de Sor aparece ligada à operação «FACE OCULTA» basta visitar o link:
http://sic.sapo.pt/online/noticias/pais/Face+Oculta+Jos%C3%A9+Penedos+administrador+da+REN+e+um+dos+13+arguidos.htm
Não estou a ver outra entidade, que não a Câmara para ter ligações com o empresário Manuel Godinho, muito provavelmente trazido pelo Empresário Carlos Saraiva.
Já fui informado que no inicio desta semana o Presidente Taveira Pinto se deslocou a Lisboa com Urgência, acompanhado pelo advogado que se encontra de licença sem vencimento mas, que presta serviços à autarquia.
Resta-nos saber se essa deslocação não teve a ver com esta notícia vinda a público ontem na TV e hoje na net.
Seria bom que houvesse alguma explicação sobre isto. Zé da Ponte desafio-te para investigares esta notícia.

 
At 31 de outubro de 2009 às 16:26, Anonymous Anónimo said...

O Expresso de hoje já diz alguma coisa:
«Banco de Portugal abre
inquérito a Armando Vara
* Investigação das Sucatas avança para as autarquias»

 
At 31 de outubro de 2009 às 21:20, Anonymous M.F. said...

Depois de ler os jornais esta manhã fiquei com a impressão que toda a gente anda mais solta com este caso de corrupção da sucata e dos resíduos sólidos. Como se, finalmente, se tivesse apanhado um peixe do tamanho conveniente, e de uma espécie permitida.Nem muito pesado nem raquítico.A tempo de ser preparado para o almoço. Ou muito me engano ou este caso vai mesmo para a frente.Ou vai passar à frente.

 
At 1 de novembro de 2009 às 19:15, Anonymous Anónimo said...

Não se iludam o senhor que faláis não tem nada com isto mas sim com outros asuntos que não andam adormecidos relacionados com a zona de montargil mas com a inercia da oposição pelo que se sabe parece que tem sido alguns populares a precinar as autoridades já que as forças politicas do concalho nomeadamente o PSD e a CDU foram adormecidos após a campanha eleitoral, sabemos que as obras foram embargadas,que existem autos de embargo elaborados pela ARH do TEJO mas mesmo asim e não sei como algumas coisas continuam na mesma, o que me surpreende e a inercia e isto já vai sendo habitual nas forças politicas quando perdem as eleiçoens calam-se, deixo aqui um alerta aos senhores da politica pontesorense, não critiquem actuem depois de tudo feito não há volta a dar a questão, se tiverem que denunciar alguma situação façam-no agora ou então calem-se para sempre.

 
At 2 de novembro de 2009 às 15:04, Anonymous Anónimo said...

Perdoa-lhes Senhor, que eles não sabem o que dizem!

 

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