segunda-feira, 20 de março de 2006

OS BANCOS E OS CONTRIBUINTES...

Os jornais do meio do mês traziam uma curiosa comparação dos resultados dos bancos nacionais.
Entre outras coisas interessantes, ficamos a saber que todos os 5 bancos (CGD, BCP, BES, BPI e Santander) tiveram um crescimento de lucros superior a 20%, dando-se até o caso curioso de o BES ter aumentado os resultados em 85% (sim, oitenta e cinco por cento).
Num ano em que o PIB quase não cresceu, tanta fartura mostra que algo está errado nas contas dos nossos bancos.
Mas o mais curioso é a percentagem desses lucros que o bancos pagam de impostos.
Todos se situam num nível próximo dos 20% (18,5% a CGD e o BES, 20% o BPI e o Santander).
Sabendo-se que no IRS, qualquer trabalhador dependente que ganhe mais de 200 contos líquidos por mês paga uma taxa de impostro igual à dos bancos, e aqueles que ganham mais de 1.000 contos o Estado fica-lhe com quase metade (uma taxa de 50%), ficamos a saber que os bancos contribuem para o défice com a mesma medida de um estagiário de qualquer empresa com mulher e filhos. E mesmo assim não é para todos.
É que um dos bancos analisados (o BCP) só paga 10,3% dos lucros para impostos. E eu dou comigo a perguntar porque é que um dos 5 maiores bancos nacionais paga metade dos impostos que os outros pagam.
Porque é que os outros pagam ao nível do estagiário e o BCP paga ao nível do jardineiro ?
Aqui está um interessante enigma para a imaginação de todos nós.
Aceitam-se propostas de explicação
.

J E R

4 Comments:

At 20 de março de 2006 às 14:51, Anonymous Anónimo said...

O país vive um daqueles seus momentos típicos em que a ideologia hegemónica é a ambiguidade. O Governo retoca a imagem, olhando-se ao espelho. A oposição vê o futuro tão brilhante que tem de utilizar óculos escuros. Enquanto isso este sítio entrou numa fase de indigestão crónica. Não é uma vítima do seu sucesso.
Apenas se preocupa em ganhar a batalha mais próxima, sem reflectir se poderá perder tudo depois disso. Poucos parecem tentar ter capacidade para estarem focados no futuro enquanto gerem o presente. A política de terra queimada em que se tem empenhado a oposição só tem paralelo na estratégia «top model» do Governo. Os partidos políticos em Portugal parecem ter sido atacados pelo síndrome primaveril das andorinhas: mudam de direcção no último milésimo de segundo. Por isso mesmo todo o país vive numa espécie de desvario total. Há muitos anos. As ideologias já não definem os partidos e esquerda e direita chocam-se sem entender já qual o seu espaço de influência. Parece que só Cavaco e Sócrates sabem o que querem. Aquele está a construir à sua volta um projecto conservador sustentado. Este gere a sua imagem de forma profissional. Os partidos, entretanto, perderam-se neste filme. Basta olhar para o PSD e para o CDS. E para a sua existência em forma de telenovela.

 
At 20 de março de 2006 às 14:54, Anonymous Anónimo said...

É o capitalismo estúpido - por Miguel Sousa Tavares

É O CAPITALISMO ESTÚPIDO

[Um artigo de Miguel Sousa Tavares que por ser lúcido, oportuno, estruturado e crítico deve ser lido e relido na íntegra. Se possível com Marx e Hayeck à cabeceira. E, já agora, com a doutrina social da Igreja - para não destoar muito nem esquecer ninguém].

«VAI por aí uma euforia tonta com as OPA e a Bolsa de Lisboa. Em tom entusiasmado, garantem-nos que estão de volta os bons tempos do optimismo económico e da «dinamização» da sempre letárgica Bolsa de Lisboa, e juram até que os simpaticamente chamados «investidores internacionais» estão de volta ao mercado de capitais português. Confesso que não percebo tanta euforia: quando os abutres financeiros voltam a pairar no céu é porque há carne fresca para engolir. Como habitualmente, as vítimas vão ser os ingénuos que ouviram dizer que «a bolsa está a dar» e que, sem tempo, conhecimentos e «contactos», vão meter lá as suas poupanças só para perceber que chegaram tarde e a más horas, porque os «investidores internacionais» e os especuladores nacionais já «realizaram mais-valias» e, ala que se faz tarde, foram-se para outras paragens. Já assisti, pelo menos, a duas conjunturas de euforia bolsista entre nós, e não me lembro que a bolsa tenha saído credibilizada ou que o país tenha visto a sua riqueza acrescida, as suas empresas mais competitivas ou a economia mais sólida. Lembro-me, sim, de algumas fortunas feitas em «over-night» e de algumas empresas sem futuro capitalizadas até ao absurdo, e logo vendidas pelos seus proprietários.

Mas a verdade é que andam todos eufóricos, com estes jogos de OPA e contra-OPA. Ensinam-nos, até às décimas, a composição societária da Sonae, da PT, da EDP, do BPI, do BCP, do BES, ficamos a saber quem está por trás de quem, quem está com os espanhóis e quem é suspeito de «patriotismo», quais são os negócios com marca da Opus Dei e os da Maçonaria, e, em tom íntimo, ouvimos dissertar sobre as intenções do Paulo, do Belmiro, do Ricardo, do Fernando e do Engenheiro. Espantados, vemos o acossado presidente da PT discursar às tropas comparando-se ao general Kutuzov resistindo ao Napoleão-Belmiro às portas de Moscovo, e vemos os amigos de ontem acusarem-se de ataques «hostis» e, entrelinhas, de quererem roubar à má-fila o negócio alheio. A paz implodiu entre os cavalheiros da finança, mas, aparentemente, isto é um bem para o país, tão bom que os ministros do Governo não disfarçam a sua satisfação com o que consideram «a retoma da confiança» e «a demonstração de que o mercado funciona». Não compreendo: não foi Marx quem ensinou que é assim que o capitalismo caminha para a sua autodestruição, engolindo-se todos uns aos outros? E não são estes, apesar de tudo, ministros de um governo socialista?

Mas há mais coisas que, estupidamente, me custam a compreender que façam a euforia de um Governo socialista, observando de fora, e deleitado, este espectáculo de miúdos a jogar Monopólio. Vejamos: se, depois de sucessivas fusões e aquisições, só restam praticamente três bancos privados portugueses, não é mau para a concorrência e para os consumidores que um deles engula outro? Com mais de meio milhão de desempregados, não é pior que as anunciadas OPA resultem também em já anunciados despedimentos? Quando se quer impor o aumento da idade da reforma, é saudável que se anunciem, como resultante das OPA, reformas antecipadas, chamadas tecnicamente de «aproveitamento de sinergias»?

E, já agora, o principal: de onde vem tanto dinheiro? À custa de quem foram obtidos os astronómicos lucros da EDP? É sem dúvida louvável que o presidente-cessante da empresa se despeça dando um bónus de 120 euros a cada um dos seus 8.000 trabalhadores (além dos tradicionais e infinitamente mais generosos prémios aos administradores, decididos por um órgão societário, hoje determinante, chamado «comissão de vencimentos»): mas não seria mais louvável que tivéssemos a electricidade mais barata, conforme foi solenemente prometido quando se privatizou a EDP? E o que andava a PT a fazer com tanto dinheiro que, só agora, sob ameaça, resolveu dobrar o dividendo dos accionistas, assim como só agora se dispõe a aceitar o fim do seu confortável monopólio de facto na rede fixa? Não teria sido possível, sem OPA, ter aberto o sector à concorrência muito antes, para que o telefone tivesse deixado de ser entre nós um produto de luxo e os portugueses não fossem obrigados a sofrer o pior e mais caro serviço de telefone fixo de toda a Europa?

E os lucros dos bancos, santo Deus?! Como é que num país onde o PIB cresce 0,5% e os depósitos dos clientes, geridos «private» e profissionalmente, pouco mais valorizam do que a taxa de inflação (e, vá lá, vá lá...), os bancos conseguem apresentar lucros de 60 e 70%? E como podem pagar em média 10% de IRC sobre os lucros - graças ao «off-shore» da Madeira, à «consolidação fiscal» e a uma série de bonificações e isenções - enquanto os seus clientes pagam até 42% de IRS e o porteiro do banco alguns 20%? Onde está a riqueza do país correspondente à riqueza destes gigantes nacionais? Onde estão as empresas que crescem e criam empregos e riqueza graças a financiamento acessível, energia a preços concorrenciais e telecomunicações eficientes e baratas?

Sim, eu sei: lá fora, dizem-nos, é igual. «Lá fora», e «na vizinha Espanha», em particular, também há OPA e «off-shores» e fusões e lucros absurdos no sector financeiro. Já me explicaram isso vários economistas, vários ministros, vários pragmáticos - e eu continuo sem perceber bem. Também sei que há a «globalização» e a necessidade de as nossas principais empresas ganharem «dimensão crítica», para resistirem a investidas do estrangeiro e não termos de cair na situação onde agora se encontram espanhóis e franceses, inventando legislação retroactiva e batotas de emergência engendradas pelos governos, para defenderem os seus «campeões nacionais». Mas, permitem-me um desabafo? A finalidade do capitalismo, como aliás a de toda a economia, não é a satisfação das necessidades individuais? Pois se assim é e se vivemos num incontornável mundo globalizado, a mim, enquanto consumidor e destinatário final das politicas económicas, é-me indiferente a nacionalidade da operadora telefónica, da seguradora do meu carro ou do banco que me financia o crédito à habitação: quero é poder escolher entre quem melhor me sirva.

Por teimosia patriótica ou por necessidade estratégica, acho prudente não abrirmos mão de algumas coisas, mas de outra natureza: a água, a língua e a cultura, a paisagem natural e o património, as 200 milhas, as leis e tradições de vida em sociedade, a Justiça pública, a Caixa Geral de Depósitos, a Selecção Nacional de Futebol e o arquipélago dos Açores. Acrescento, por razões de pura política, mais duas instituições, que acho que devem ser defendidas e até subsidiadas: a agricultura e o Vasco Pulido Valente. A agricultura, por razões à vista de preservação da vida rural e da paisagem e de povoamento e ordenamento do território; o Vasco Pulido Valente, porque, sem o seu pessimismo extremo, temo que já não restassem, por oposição, quaisquer razões para optimismos.

Agora, de duas uma: ou se quer ver o mercado funcionar a sério e então não são admissíveis distorções à concorrência nem situações de favor e privilégio; ou isto não é a sério e não finjam que é, quando dá jeito, e que já não é quando aqui d'el rei que vêm aí os espanhóis engolir os nossos «campeões nacionais».

 
At 20 de março de 2006 às 15:40, Anonymous Anónimo said...

Possivelmente, neste momento, nem um governo do bloco central + cds, que bloco central + pc não pode ser, por causa de 1975, tocaria nos interesses dos banqueiros, porque esses grandes (com)patriotas logo levavam muito dinheiro para o estrangeiro. Capitalismo selvagem é portanto isto mesmo, num extremo, e comunismo\socialismo, no outro extremo, foi 75, nomeadamente com a nacionalização dos bancos. Pelo meio ficou a breve moderação já longínqua. Em frente só se vislumbra nova revolução, que não deveria ser de direita.

 
At 20 de março de 2006 às 15:42, Anonymous Anónimo said...

Pela 1ª vez na história o socialismo apresenta-se sem gerar emprego nem desenvolvimento económico e social.
Porque será que isto acontece?
À primeira vista esta constatação parece paradoxal, pois nunca como hoje o desenvolvimento tecnológico; a valorização da competição e da livre iniciativa, ou seja, o império da lei, foram tão vincados.
Mas ao lado desse activo da globalização feliz parece sobrepor-se um passivo da globalização negativa, com custos dramáticos na vida das populações. Esse passivo decorre, sobretudo na Europa (alargada), uma vez que nos EUA a crise é mais atenuada, da transposição problemática da ética protestante e calvinista que formatou o espírito capitalista em toda a área do Ocidente.

Na prática, todos aqueles países que importaram este modelo de capitalismo made in USA, incorporando nele apenas a sua dimensão económica, com prejuízo da dimensão social, estão hoje com inúmeros problemas sociais que tolhem o seu modelo de desenvolvimento. I.é, a liberalização dos mercados, a privatização dos serviços e a globalização competitiva - sem os correspondentes contrapesos sociais e culturais – acaba, necessariamente, por infligir danos sociais dramáticos às populações menos equipadas do ponto de vista cultural, social e tecnológico.
Pois é aí que as resistências às mudanças se fazem mais sentir.
Ponte de Sôr é um desses exemplos.

Que fazer, então, para disciplinar e humanizar os efeitos nefastos desse capitalismo selvagem?
Julgamos que a resposta mais adequada consiste em fortalecer as instituições da sociedade civil, ajustando aquela ética protestante, sistematizada por Max Weber, às necessidades de cada país.
Isto é, à lógica neoliberal, que o Consenso de Washington (sob intensa contestação mundial) reforçou, deve-se sobrepor a ética personalista e uma visão culturalista a fim de resolver os principais problemas de cariz social.
Sob pena de eclodirem descontentamentos sociais em cadeia resultantes de acumuladas frustrações económicas derivadas daquele “consenso”.

Neste enredo algo terá de ser feito para renovar o capitalismo dos vencedores – que enchem os cemitérios de empresas falidas e de milhões de desempregados em todo o mundo.
Mas, por outro lado, também não se vislumbra como é que os “vencidos” deste processo desigual possam fazer o turn over da situação e criar um novo sistema. As desigualdades sociais agudizam os conflitos religiosos, e ambos criam um caldo de cultura que leva ao terrorismo em rede (catastrófico, globalitário e suicidário) de que já temos amarga experiência.

O que nos remete para outra questão: qual a configuração política emergente do Estado?
Aqui temos uma bifurcação: continuar a ser a velha e pesada estrutura burocrática que faz de conta que ainda é um Estado-Providência; ou, como parece mais credível, articular os seus interesses e os seus recursos com os da sociedade civil no sentido de abrir uma frente comum em vista às reformas a concretizar. Na saúde, na educação, na justiça, no mercado, etc.

A arte desta magna reforma estará, porventura, na harmonização das agendas e dos interesses de todos esses players: Estados e actores privados. E todos eles comungando do valor da competição baseado no pluralismo dos valores ocidentais e no conjunto de direitos que informam o rule of law.

Conseguir esta reforma das reformas seria, afinal, renovar as regras do próprio sistema político (económico e social) europeu.
Seria reformar o Estado de Bem-Estar que hoje agoniza na antecâmara da morte.
Seria, por fim, casar a ética liberal com a ética de responsabilidade social, num ajustamento de Estado-sociedade-mercado fortalecendo as instituições da sociedade civil, já com o Estado emagrecido, mais musculado, racional, enérgico e eficaz.

De molde a que os verdadeiros inimigos fossem, na realidade, os problemas económicos e sociais, potenciados por aquela cultura de imitação incompleta (e desumanizada) que a Europa bebeu da criatura que, historicamente, gerou: a ética calvinista que fez da América o país mais rico do mundo perante o espanto da Europa.
O problema está em disciplinar e humanizar a “besta”.

 

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