sábado, 9 de setembro de 2006

ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA OU ASSEMBLEIA NACIONAL [parte II]

O texto do acordo

23 Comments:

At 9 de setembro de 2006 às 17:28, Anonymous Anónimo said...

Portugal dos três "emes": morangos com açúcar, mms e mateus rosé

Se os nossos níveis de escolaridade continuam a roçar o sub-desenvolvimento, não é por incompetência, mas por visão estratégica dos sucessivos governos instalados no terreiro do paço desde 1928. O conhecimento é subversivo. As sociedades totalmente alfabetizadas são profundamente exigentes, reivindicativas, disciplinadas e intolerantes para com a burla, o peculato, o abuso de poder, a censura, o mau trato de crianças e o abandono de idosos em lares imundos e hospitais sobrelotados.

 
At 9 de setembro de 2006 às 17:32, Anonymous Anónimo said...

De volta à realidade - por Constança Cunha e Sá

Três boas razões para ler este artigo:
1. Futebóis
2. Extinção do PS por Sócrates
3. Participação de Portugal no Líbano

De volta à realidade (in Público)
Constança Cunha e Sá

Ao contrário do que se costuma dizer, o mundo do futebol não é um mundo à parte: é um mundo que revela, como nenhum outro, a aflitiva indigência em que caiu Portugal. Para variar, o deprimente confronto com a realidade, que se segue naturalmente ao calor das férias e ao deserto noticioso de Agosto, deu-se através do futebol e do famigerado caso Mateus. Confesso que "o interesse público" do imbróglio me escapa. Mas, como a maioria dos portugueses que lêem jornais ou vêm televisão, não consigo escapar ao permanente espectáculo oferecido pelo inacreditável major Valentim Loureiro e por essa ruína histórica que dá pelo nome de Madaíl. Pelo meio, como é óbvio, travei conhecimento com o sr. Fiúza, um ilustre desconhecido que, de repente, se transformou na principal figura da actualidade nacional. Há duas semanas, que o país gira à volta das inanidades proferidas pelos representantes máximos do seu futebol, com o presidente de um obscuro Gil Vicente no centro deste glorioso folhetim e sob o olhar severo dos dirigentes da FIFA, que, em nome de uma "justiça desportiva" de carácter universal, ameaçam suspender a participação dos clubes portugueses e da selecção nacional de todas as competições internacionais. Sem querer entrar em detalhes, que sobressaem apenas pela sua absurda singularidade, é impossível não referir a esplendorosa miséria que se reflecte nos inúmeros episódios que recheiam o caso. Ao contrário do que se costuma dizer, o mundo do futebol não é um mundo à parte: é um mundo que revela, como nenhum outro, a aflitiva indigência que reina em Portugal. O major Valentim Loureiro, presidente da Liga, implicado no processo Apito Dourado e um dos grandes vencedores das últimas autárquicas é um produto típico do sistema que mostra, antes de mais, o país em que vivemos: um país, onde floresce a impunidade e a justiça se transformou numa farsa que se caracteriza pela ineficácia e pela prescrição dos grandes processos. Não, o futebol não é um mundo à parte. Pelo contrário, é o espelho que melhor reflecte a nossa mediocridade.
À margem das emoções deste caso, o eng. Sócrates comunicou ao PS, através de um jornal, que tenciona formalizar a inexistência do partido, extinguindo a sua comissão permanente e acumulando a sua liderança com as funções de primeiro-ministro. O PS, como já era de esperar, leu, ouviu e calou. Manuel Alegre fez saber que iria ao congresso, com o seu inofensivo milhão de votos - o que não deixou de surpreender alguns espíritos mais atentos a este tipo de "novidades". E a antiga "ala esquerda"do partido, que tanto barafustou com o eng. Guterres, desapareceu, sem deixar rastro, depois de se ter rendido incondicionalmente à autoridade do chefe. A "pluralidade interna", esse duvidoso trunfo do passado, evaporou-se perante os benefícios da maioria absoluta e o "novo estilo" do eng. Sócrates, que rompeu, abruptamente, com o famoso diálogo socialista. Em vez do diálogo, o eng. Sócrates privilegiou o conflito com os interesses dos "privilegiados" e os "benefícios" de que gozavam as "corporações". Professores, funcionários públicos, magistrados e outros grupos afins transformaram-se, de acordo com o discurso oficial, no bode expiatório de uma crise para a qual os governos do PS, nomeadamente aqueles de que o eng. Sócrates fez parte, tinham generosamente contribuído. Paralelamente, os portugueses são confrontados, todos os dias, com anúncios gloriosos que não só tardam em concretizar-se como acabam, muitas vezes, por ser negados pela própria realidade. A verdade é que, apesar de todos os "planos" apresentados, o desemprego mantém-se, a despesa do Estado cresceu, o investimento caiu, o número de funcionários públicos aumentou e o país mantém-se, firme e empobrecido, na cauda da Europa, desmentindo taxativamente os grandes desígnios da propaganda. Subsiste o "novo estilo" do primeiro-ministro, uma espécie de cavaquismo reciclado, que se caracteriza pelo mito da autoridade, a imagem de determinação, a coragem das medidas "impopulares" e o velho e apreciado desprezo pela ideologia e pelos "jogos" partidários que pontificam na oposição. Com a bênção do prof. Cavaco Silva, em Belém, o eng. Sócrates criou um deserto à sua volta, sem que nada, no seu Governo, garanta que vai "modernizar" Portugal, como afirma a moção de estratégia que vai levar ao próximo congresso do PS - um evento que, como já se percebeu, servirá apenas para amplificar a imagem do primeiro-ministro e o sonho de um "novo estilo" que infelizmente não tem nada de muito novo.

O ministro da Defesa foi, esta semana, à Assembleia da República explicar as razões que levaram o Governo a disponibilizar uma "companhia de engenheiros" para integrar a força de "interposição" que se irá instalar no Líbano, sob a bênção das Nações Unidas. Com excepção dos eleitos do costume, os deputados, do CDS-PP ao PS, passando pelo PSD, acolheram com particular simpatia as explicações dadas pelo ministro. As "obrigações internacionais" do país e o discurso de Estado que estas invariavelmente proporcionam justificam, em parte, o clima de amena concórdia que se gerou à volta do envio de tropas portuguesas para o Médio Oriente. E, no entanto, não é fácil compreender as razões de Estado invocadas pelo dr. Severiano Teixeira, para não falar das circunstâncias em que o país vai participar nessa misteriosa força de "interposição". É evidente que ninguém estava à espera que Portugal fosse para o Líbano pronto a colaborar no desarmamento do Hezbollah - que infelizmente teima em não se deixar desarmar - numa guerra desigual para a qual as nossas tropas não estão preparadas. Mas daí a enviarmos uma companhia de engenheiros que irá ajudar à reconstrução do território, num "contexto humanitário", como garantiu solenemente o ministro, vai um passo difícil de aceitar. A resolução das Nações Unidas, cujos contornos as mesmas Nações Unidas evitam cuidadosamente definir, não aponta para qualquer missão humanitária, onde encaixem os nossos planos de construção civil, mas sim para uma missão militar cujos objectivos passam pelo "desarmamento de todos os grupos armados no Líbano" de forma a permitir que o Governo desse país controle efectivamente todo o seu território. Como é que isso vai ser feito, com um governo que não é mais do que uma ficção e sem impedir o fornecimento de armas ao Hezbollah através da fronteira com a Síria, é um enigma que ainda está por decifrar. Mas seja qual for o destino dessa força internacional, não se consegue perceber que papel está reservado a uma companhia de engenheiros, empenhada na reconstrução do Sul do Líbano e integrada num "contexto humanitário" que, pura e simplesmente, não existe. Convinha que o Governo e a oposição "responsável" explicassem melhor ao país a posição que tão unanimemente defendem.
Jornalista

 
At 10 de setembro de 2006 às 14:00, Anonymous Anónimo said...

Que Marques Mendes andava já há algum tempo a exigir pactos para que no momento da divulgação do pacto secreto aparecesse como o vitorioso, todos percebemos. Que Sócrates é mais inteligente do que Marques Mendes, não se preocupando com as alcagoitas eleitorais que o líder do PSD poderia ganhar graças ao pacto porque sabe que o PS é o grande ganhador, todos o percebemos. Mas que Cavaco não tenha esperado mais de um dia para cobrar os louros é que não percebemos, de Cavaco esperar-se-ia o silêncio pois ainda faltam mais de quatro anos para as próximas presidenciais, e ao ter dado cobertura a negociações entre partidos que não representam todos os portugueses mostrou que é o presidente de apenas alguns portugueses

 
At 10 de setembro de 2006 às 14:01, Anonymous Anónimo said...

Ninguém tem dúvidas de que Sócrates mudou de posição quanto às propostas de pactos com o PSD, mas retirar a conclusão de que Sócrates é o derrotado e Marques Mendes o vencedor é um erro, corresponde a pensar que o primeiro-ministro é ingénuo.
O que ganhou Marques Mendes?
Uma pequena vitória que lhe dá o estatuto de protegido do cavaquismo presidencial, uma pequena vitória que ganha expressão dentro do PSD onde adquire a autoridade que estava a perder, mas que em termos eleitorais não tem expressão, os eleitores que votaram PS não vão votar PSD, até porque acharão que Sócrates não só sabe governar como consegue dialogar, qualidade que até aqui ninguém lhe reconhecia. Sócrates não cedeu a Cavaco Silva nem beneficiou Marques Mendes, calou o primeiro e amestrou o segundo.

 
At 10 de setembro de 2006 às 14:02, Anonymous Anónimo said...

«O “Cardeal” foi comunista, antes de se ter rendido ao capitalismo transnacional. O “Cardeal” acreditou no interesse público, antes de se ter deixado fascinar pelo interesse privado - como fez quando era ministro da Economia e celebrou, em nome do Estado, o negócio de favor com a Grão-Pará sobre o Autódromo do Estoril. Na altura, o “Cardeal” jurou que o fazia para que a Fórmula 1 - essencial para o interesse público - regressasse a Portugal. E o “Bernie” tinha-lhe garantido pessoalmente que isso aconteceria, não tardava nem dois anos. Oito anos passados e milhões de contos dos contribuintes gastos sem fim nem finalidade à vista no Autódromo do Estoril, o mínimo de decência reclamaria que jamais o “Cardeal” voltasse a exercer funções públicas ou políticas. Mas não: o “Cardeal” - Joaquim Pina Moura - é deputado da nação, eleito em 2005, nas listas do Partido Socialista. E, enquanto deputado, votou favoravelmente o plano do Governo que contém uma aposta estratégica nas energias alternativas, nomeadamente a energia eólica. Porém, o “Cardeal” é também o homem dos espanhóis da Iberdrola, que apostaram forte no negócio milionário das eólicas, mas que perderam o respectivo concurso público. E, por isso, ponderando bem, por um lado o seu estatuto de deputado da nação e do partido do Governo, e por outro a sua fidelidade a quem lhe paga para representar os seus interesses, o “Cardeal” interpôs uma providência cautelar contra a decisão do concurso. Agora, se o tribunal aceitar o seu boicote, todo o processo ficará suspenso durante anos e Portugal continuará a ser o país da UE mais dependente do petróleo externo. Nesta história há duas coisas que não percebo. Uma, é a razão porque não há uma regra nos concursos públicos que obrigue os concorrentes a conformarem-se previamente com o resultado do concurso (a não ser que seja para dar dinheiro a ganhar aos prósperos escritórios da advocacia de negócios públicos). A outra, é a resposta a uma pergunta elementar: é a si que o deputado Pina Moura representa no Parlamento?»

Miguel Sousa Tavares
IN: EXPRESSO

 
At 10 de setembro de 2006 às 14:04, Anonymous Anónimo said...

Sócrates esperam que os partidos excluídos da família cavaquista também assinem o pacto em cujas negociações secretas não participaram nem sequer delas tiveram conhecimento:

«O primeiro-ministro manifestou ontem o desejo de ver os restantes partidos a apoiar o acordo para a Justiça, ontem assinado pelos líderes das bancadas do PS e do PSD. José Sócrates falava na sua residência oficial, poucos minutos após a assinatura do documento - efectuada no salão nobre da Assembleia da República - e um dia depois de PCP, CDS e Bloco de Esquerda se terem insurgido contra as negociações secretas que conduziram ao pacto para a Justiça.»
No: J.N.

Proponha-se a Sócrates que se conseguir o seu propósito agende umas férias parlamentares para os dias do debate

 
At 11 de setembro de 2006 às 09:17, Anonymous Anónimo said...

Uma das consequências mais perversas da realização de negociações secretas é a desconfiança dos que os cidadãos, vão passar a olhar com desconfiança as afirmações públicas de Marques Mendes e José Sócrates.
Quando o primeiro exigir um pacto num qualquer dossier ou se Sócrates assegurar que não o vai negociar ficaremos todos desconfiados de que já está quase pronto para assinar.
Sócrates assegura que não há pacto na Segurança Social enquanto Cavaco diz publicamente que é necessário um acordo neste domínio, será que o primeiro-ministro estará a falar verdade?
A partir de agora esta dúvida é legítima.

 
At 11 de setembro de 2006 às 09:18, Anonymous Anónimo said...

Vasco Pulido Valente percebeu o que um Marques Mendes desejoso de se meter em bicos de pés não quer entender:

«Mas, por muito que o dr. Cavaco queira encontrar "consensos", Marques Mendes não deve ir mais longe. O PSD existe, porque representa uma visão da sociedade e do mundo incompatível com a do PS. Ou, pelo menos diferente. Se concordar com ele no essencial, não precisa de existir. O argumento da "salvação da Pátria", que o Presidente gosta de invocar é um falso argumento, próprio de uma cabeça autoritária e estreita. Há mil maneiras de "salvar a Pátria" e, entre as mil, a do PS e a do PSD. Marques Mendes não pode confundir as coisas. A segurança social, a saúde, a educação, a economia, as finanças, mesmo (ou principalmente) a administração do Estado ficam claramente fora da matéria a negociar ou negociável com o eng. Sócrates, diga o dr. Cavaco o que disser. A "credibilidade" da oposição não está em ajudar o governo, comprometendo o seu carácter e o seu futuro.»

 
At 11 de setembro de 2006 às 09:19, Anonymous Anónimo said...

PACTO NA SEGURANÇA SOCIAL?

Cavaco diz mata:

«Ao mesmo tempo que elogiou o pacto para a Justiça assinado entre PS e PSD, Cavaco Silva definiu a Segurança Social como o próximo tema a merecer um acordo semelhante. "A Segurança Social diz respeito a um período de tempo muito alargado e às gerações futuras e, por isso, se as forças políticas conseguirem chegar a um entendimento alargado será benéfico para o país", salientou, ontem, em Vila Real.» [Jornal de Notícias]

e Marques Mendes acrescenta esfola:

«Marques Mendes está adisposto a negociar com o Governo um novo pacto para a reforma da Segurança Social. Esta é, afirmou o líder do PSD, uma "reforma de geração" que depende apenas da "vontade política" do executivo socialista.» [Jornal de Notícias]

Pergunte-se a Cavaco Silva se combinou a estratégia política e as intervenções com Marques Mendes, ou se estamos perante coincidências resultantes do oportunismo político do líder do PSD.

 
At 11 de setembro de 2006 às 09:44, Anonymous Anónimo said...

A (nova) União Nacional

Apetecia falar dos vergonhosos incidentes resultantes da incompetência e compadrio de parte do dirigismo do nosso futebol. Só que um outro caso não menos vergonhoso, o "pacto sobre a Justiça" do bloco central, exige atenção especial.

Foram cinco meses de negociações à margem dos portugueses e do funcionamento normal do órgão legislativo constitucional; cinco meses de secretismo entre dois homens que em sucessivos debates mensais parlamentares encenaram (e continuarão a encenar) divergências e projectos políticos e sociais diferentes; cinco meses em que se encontraram à socapa e cinicamente marcavam reuniões para parecer que debatiam com os partidos a reforma da Justiça; cinco meses coroados com uma assinatura onde se percebia uma alegria infantil por terem escondido o segredinho - até dos seus próprios apaniguados -, mas onde a hipocrisia reinou até atingir a dignidade da democracia com um apelo patético à participação de todos.

Bem se sabe que a Justiça em Portugal é lenta, discriminatória e cara. Os responsáveis por esta degradação têm rosto e siglas partidárias conhecidas, o "edifício judicial e judiciário" foi no fundamental construído por decisões conjuntas do bloco central. Por isso mesmo, as propostas e soluções agora negociadas poderiam ser obtidas à vista de todos, com debate público e transparente, em resultado de idênticas ou até alargadas maiorias parlamentares. Assim, o que leva estes senhores a elaborar na penumbra um pacto para ser acriticamente ratificado pela massa dos seus deputados é também o desprezo e a desvalorização da Assembleia da República, forma de fomentar a ideia de que os deputados são supérfluos e que melhor seria diminuir o seu número ao mínimo capaz de ainda manter as aparências de um funcionamento pretensamente democrático.

Convergência é tão grande, o espaço ideológico e os interesses representados pelo PSD tão profundamente ocupados pela política de direita de Sócrates e do PS, que Mendes assina este acordo quase para fazer "prova de vida". Virão seguramente outros pactos, nas leis eleitorais e na segurança social, por mais que até lá simulem profundas diferenças... Não seria então melhor Sócrates propor a fusão do PS com o PSD e formar um só partido, tipo União Nacional? Poupava-se tempo e dinheiro, não se enganavam as pessoas e criava-se o apoio alargado às reformas que de que tanto falam o primeiro-ministro e os gurus do Compromisso Portugal!...

Honório Novo

 
At 11 de setembro de 2006 às 09:45, Anonymous Anónimo said...

O partido único e o cartão único

A assinatura do pacto para a Justiça, na semana que passou, é um acontecimento relevante. A ideia dos "pactos de regime" atravessa de vez em quando a vida política portuguesa; Vasco Pulido Valente fez bem em relembrar que a ideia pertenceu a Sá Carneiro nos primeiros anos de democracia, como forma de assegurar um mínimo de estabilidade e de consenso. Trinta anos depois, não sei se essa "exigência" fará sentido.

A última vez que a ideia de um "pacto para a justiça" foi brandida como uma solução miraculosa para resolver os problemas "do sector", era Santana Lopes primeiro-ministro e o país ainda fervia de indignação e suspeita diante de alguns escândalos judiciais. Percebeu-se a intenção mas ninguém avançou realmente para esse mínimo de "estabilidade e consenso".

Não vem mal ao mundo que exista um "pacto de regime" - na verdade, o mais assustador é que se mencione permanentemente a sua necessidade como se o regime estivesse em perigo e precisasse de salvação. Não está e não precisa. O regime funciona com alguma normalidade. Não existe, como em Espanha, um perigo secessionista ou a ameaça do terrorismo; mas há sectores, ligados à vida do Estado, em que é necessário haver um acordo de princípio e é provável que o da justiça esteja em primeiro plano, juntamente com o da chamada reforma da administração pública. Há outros sectores em que um pacto não faz qualquer sentido - porque há opiniões diferentes sobre o que está em causa na economia, no sistema de ensino, no financiamento da segurança social ou nos regimes fiscais.

O consenso não faz mal a ninguém, mas a diferença existe para ser preservada e é útil que se separem as águas. Voltando ao assunto da semana passada, estamos a viver um momento especial da nossa história política que se traduz num realinhamento pelo centro, e que é resultado de duas eleições históricas as vitórias de Sócrates e de Cavaco Silva fizeram coincidir eleitorados aparentemente distintos depois de uma fase de ressentimento inútil. A direita não fica desconsolada (como previa) com as iniciativas de José Sócrates e a esquerda não veio para a rua (como ameaçava) se Cavaco chegasse a Belém. Cavaco não promoveu o golpe de Estado que o soarismo, por exagero folclórico, antevia; e Sócrates não se mostrou, como a direita temia, "irresponsável" no ataque à indisciplina da administração pública. Pelo contrário, em seis meses Cavaco mostrou que é um bom presidente, e num ano Sócrates foi corajoso como nunca a direita o foi em matérias como a reforma do Estado e a criação de índices de confiança entre os cidadãos. O caminho estava preparado para a aliança entre ambos.

Simplesmente, há limites para o consenso. É normal pensarmos que PS e PSD defendem "sistemas de vida" diferentes, ou, pelo menos, deviam defender - e que Marques Mendes não é a outra face de Sócrates. E por isso é importante que este acordo de regime para a justiça não seja a antecâmara de uma exigência de consenso nacional sobre outras matérias. O país pode viver sem "pactos de regime". O bem comum não assenta na unanimidade, obtida sob pressão, como se fosse inevitável - e muito desejada pelos partidos únicos.

2. A ideia do "cartão único" merece ser discutida trata-se de um documento que vai substituir o Bilhete de Identidade e os cartões de identificação fiscal, de eleitor, de utente dos serviços de saúde e de beneficiário da Segurança Social, e que permite ainda registar informações pessoais relativas ao grupo sanguíneo, a indicações de alergias ou contactos do cidadão. A partir de agora, se essa ideia não for, como parece que é, declarada inconstitucional, cada cidadão terá um "chip" no bolso. Começa-se a controlar por algum lado. Dificilmente se acaba o desfile de coisas absurdas que acontecem depois.

Francisco José Viegas

 
At 11 de setembro de 2006 às 11:11, Anonymous Anónimo said...

Marques Mendes está adisposto a negociar com o Governo um novo pacto para a reforma da Segurança Social. Esta é, afirmou o líder do PSD, uma "reforma de geração" que depende apenas da "vontade política" do executivo socialista.

"Um acordo (para a reforma da Segurança Social) depende apenas da vontade política do Governo", afirmou o líder social-democrata, Luís Marques Mendes, em declarações aos jornalistas no final de uma visita ao 13º Salão Profissional de Moda, que decorre em Lisboa. (...)

Talvez mais importante do que a conflitualidade de tipo étnico ou religioso tem-se acentuado os problemas decorrentes da conflitualidade na discriminação alimentada pelo próprio sistema económico que ao não gerar riqueza nem emprego tende a sacrificar as gerações vindoiras em benefício das gerações mais velhas - que hoje, para agravar o problema, vivem cada vez mais tempo.
Desta quadratura do círculo nasce um problema grave: a sustentabilidade da segurança social e a clivagem que cada grupo ou agente ocupa relativamente aos demais na sua grelha de avaliação competitiva: seja em termos de eficácia profissional, polivalência e outros skills que interferem na estruturação das relações distributivas e proteccionistas.
Trocando por miúdos: a estruturação destas relações podem ser resumidas da seguinte forma, se bem que nós aqui não pedimos a benção aos drs. Medina Carreira e Silva Lopes (este ainda deve ler economia pelos manuais do séc. XIX, o outro é demasiado futurista e está já no séc. XXV).
Julgo, contudo, que na avaliação deste embrólio do Estado e da sociedade - dado que o bolo é sempre pequeno para o números de pessoas que pretendem comer uma talhada, podemos encontrar os extractos sociais mais competitivos que se orientam no sentido do risco, da racionalização e das vantagens sociais e económicas - que vão encontrar pessoas com os mesmos interesses noutras sociedades e noutras regiões, as quais pretendem evitar o excesso de incertezas.
Depois temos os extractos sociais dependentes que, em rigor, precisam do sistema produtivo, dos canais distributivos e proteccionisstas e recusam o excesso de racionalização e procuram a conflitualidade social - que, por seu turno, lhes permite alimentar as emoções das massas com base nas quais depois desencadeiam greves, bloqueios e um sem número de esquemas (regra geral com enquadramento sindical) que visam desfuncionalizar a máquina do Estado e até a paralisia do aparelho e do tecido produtivo privado.
Ou seja, aqueles buscam as racionalizações da relações económicas, estes buscam as emoções para fazer a resistência. Pelo que os extractos sociais dependentes tendem a potenciar a conflitualidade agressiva gerada pelos efeitos da mobilidade dos capitais, dos equipamentos e know how empresarial - que desmantelam todas essas velhas resistências à mobilidade, barreiras proteccionistas e as regulamentações restritivas, aumentando aqui a possibilidade de se alimentar dinâmicas pró-cíclicas, tornando ainda mais difícil a correcção daquelas tendências negativas.
Conseguir firmar um pacto ao nível da SS seria romper com uma certa inércia de envelhecimento e de esterelidade social em que Portugal vegeta há anos. Seria fazer evoluir uma sociedade madura - que já não faz ovulação - para um sociedade em expansão, emergente que visaria eliminar os bloqueios que ainda hoje acentuam a dramatização das crises no sistema da segurança social.
Por todas estas razões cremos que o discurso político deveria representar uma espécie de cartografia ou uma bússola dessa desejada trajectória (ascendente). Será que o pacto (mais um!!!) terá a capacidade de fazer esse pequeno grande milagre!?

 
At 11 de setembro de 2006 às 14:33, Anonymous Anónimo said...

Jorge Sampaio andou anos a pedir pactos de regime.

Tanto pediu que já ninguém acreditava neles. Pacto de regime para a justiça, pacto de regime para as finanças públicas, pacto de regime na mensagem de ano novo e na abertura do ano judicial. A certa altura, pacto de regime parecia uma espécie de canivete suíço que o antigo Presidente tirava do bolso sempre que o assunto gerava discórdia nacional e ele não queria (não podia) comprometer-se com uma posição. Como é lógico, uma parte do país deixou de levar a sério o apelo de Jorge Sampaio. Aquilo que podia ser uma boa ideia converteu-se num desabafo pífio do Palácio de Belém que os governos e partidos ouviam sem grande atenção.

E de repente, tudo mudou. José Sócrates e Marques Mendes decidiram dar um primeiro passo no sentido de fechar um acordo global sobre Justiça. O que se alterou de tão extraordinário para que Sócrates, sem necessidade, se tenha aproximado de Marques Mendes? E por que razão Mendes aceitou o convite para dançar com o seu principal adversário? Finalmente: será este um verdadeiro pacto de regime ou apenas um acordo mole recebido com salvas de canhão? Vamos por partes:

1) Para Sócrates o acordo é um bom acordo. Apesar de a maioria absoluta o dispensar destes jogos florais, o facto de estender a mão ao líder da oposição revela alguma disponibilidade para dividir uma fatiazinha do poder. Para um primeiro-ministro com perfil de mandão, esta prova de abertura ajuda a pintá-lo com cores mais humanas. Nos dias que correm, não é uma ajuda negligenciável. Ainda por cima sobra outra vantagem: Mendes perde margem de manobra para arrasar a política do Governo na área da Justiça. A partir de agora, nesta matéria, Governo e Mendes são sócios.

2) Para o líder do PSD, apesar dos futuros constrangimentos, o acordo também é bom. Marques Mendes deixa por uns instantes a actual inexistência política em que vegetava para, finalmente, contar para alguma coisa de substantivo. Não é pouco para um líder da oposição esmagado pela maioria absoluta do Governo e por um sistema político que o converte em alvo a abater.

3) Dito isto, a dúvida mais importante: o pacto para a Justiça é mesmo importante? A resposta não é a preto e branco. Por um lado, o acordo entre os dois maiores partidos garante estabilidade normativa. Ou seja, as mudanças que forem aprovadas não serão, em princípio, desfeitas quando o PSD for governo. Ou seja, o que mudar agora não será para desfazer amanhã. O fim da permanente agitação legal é um avanço que o país agradece. Visto assim, é só vantagens. Acontece que as mudanças que estão sobre a mesa representam o maior denominador comum entre os dois partidos. São alterações óbvias que não provocam grandes divisões. As divisões, como se sabe, estão noutros temas. A Segurança Social é um deles, as Finanças Públicas outro. Aqui Sócrates não se senta à mesa com ninguém.

 
At 11 de setembro de 2006 às 17:30, Anonymous Anónimo said...

Coisas que nunca mudam

1 Entre Dezembro e Agosto, Américo Amorim ganhou trinta ou quarenta milhões de contos apenas devido à posição accionista que tomou na Galp, num negócio realizado a instâncias e com o apoio do Governo. Não acrescentou qualquer riqueza à empresa, não criou um posto de trabalho, não a geriu, não empenhou nela nem talento, nem esforço, nem risco. Nada: limitou-se a ver a sua posição accionista a valorizar-se e a cobrar dividendos excepcionais graças àquilo que para o comum das pessoas foi uma dificuldade acrescida - o aumento do preço dos combustíveis. Como a margem de lucros da Galp está indexada ao preço do petróleo na origem, a empresa ganha tanto mais dinheiro quanto mais caro comprar o crude e quanto mais caro o vender aos consumidores. A Galp e Américo Amorim tiveram um ano excepcional, não porque a Galp tenha sido mais bem gerida ou feito melhores negócios, mas porque o Irão se transformou numa ameaça nuclear, o Iraque é um pântano sem fim à vista, a Venezuela tem um Presidente antiamericano e o Golfo do México foi episodicamente atingido por um furacão que suspendeu a produção «off-shore» de petróleo. Como explicava Marx, o dinheiro faz dinheiro, independentemente de qualquer mérito ou talento, e isso, realmente, é o pecado original e incurável do capitalismo.

2 Trinta ou quarenta milhões ganhos assim devem pesar na consciência - digo eu. Uma das formas de resolver o problema e aliviar o peso é fazer filantropia, uma coisa sem grandes tradições entre nós (Gulbenkian é a excepção e era arménio). Entre nós, as Fundações têm como objectivo principal a fuga aos impostos. De vez em quando, jovens jornalistas perguntam-me que temas de reportagem de investigação é que lhes aconselharia: invariavelmente respondo-lhes “investiguem as Fundações”. As Fundações com nomes sonantes: Luís Figo, Joe Berardo, Stanley Ho, etc. Investiguem quanto é que elas gastam realmente em filantropia e quanto é que recebem de volta em isenções fiscais e outros benefícios concedidos pelo Estado. Pode ser que as minhas desconfianças não tenham razão de ser, mas o esclarecimento seria útil e, aliás, deveria constar de informação pública anual.

3 O “Cardeal” foi comunista, antes de se ter rendido ao capitalismo transnacional. O “Cardeal” acreditou no interesse público, antes de se ter deixado fascinar pelo interesse privado - como fez quando era ministro da Economia e celebrou, em nome do Estado, o negócio de favor com a Grão-Pará sobre o Autódromo do Estoril. Na altura, o “Cardeal” jurou que o fazia para que a Fórmula 1 - essencial para o interesse público - regressasse a Portugal. E o “Bernie” tinha-lhe garantido pessoalmente que isso aconteceria, não tardava nem dois anos. Oito anos passados e milhões de contos dos contribuintes gastos sem fim nem finalidade à vista no Autódromo do Estoril, o mínimo de decência reclamaria que jamais o “Cardeal” voltasse a exercer funções públicas ou políticas. Mas não: o “Cardeal” - Joaquim Pina Moura - é deputado da nação, eleito em 2005, nas listas do Partido Socialista. E, enquanto deputado, votou favoravelmente o plano do Governo que contém uma aposta estratégica nas energias alternativas, nomeadamente a energia eólica. Porém, o “Cardeal” é também o homem dos espanhóis da Iberdrola, que apostaram forte no negócio milionário das eólicas, mas que perderam o respectivo concurso público. E, por isso, ponderando bem, por um lado o seu estatuto de deputado da nação e do partido do Governo, e por outro a sua fidelidade a quem lhe paga para representar os seus interesses, o “Cardeal” interpôs uma providência cautelar contra a decisão do concurso. Agora, se o tribunal aceitar o seu boicote, todo o processo ficará suspenso durante anos e Portugal continuará a ser o país da UE mais dependente do petróleo externo. Nesta história há duas coisas que não percebo. Uma, é a razão porque não há uma regra nos concursos públicos que obrigue os concorrentes a conformarem-se previamente com o resultado do concurso (a não ser que seja para dar dinheiro a ganhar aos prósperos escritórios da advocacia de negócios públicos). A outra, é a resposta a uma pergunta elementar: é a si que o deputado Pina Moura representa no Parlamento?

4 A ministra da Educação tem uma proposta simples: que os professores entrem e progridam na carreira, não em função de um direito natural ou da antiguidade, mas do mérito. Dos resultados obtidos, das aulas dadas, das provas prestadas. Antes mesmo de conhecerem os detalhes da proposta, já os Sindicatos dos Professores estavam a ameaçar com “a maior greve que o país jamais viu”. Nesta resposta sindical, além da já intragável atitude sistemática da Fenprof e do indigerível Paulo Sucena, encontramos a própria resposta à razão da decadência continuada do movimento sindical. Porque o mundo mudou, mas eles continuam a defender o mesmo de sempre: o “colectivo”, a “luta de massas”, os que têm emprego garantido até à eternidade, os que acham que todos devem ser tratados por igual, quer trabalhem e se esforcem quer vivam de meter “baixas” e fazer greve sem razão. Só um mau trabalhador teme uma selecção baseada no mérito: os bons não temem, e, por isso, os bons não estão hoje nos Sindicatos. Não é uma boa notícia, é uma má notícia: os maus patrões agradecem.

Há trinta anos que a política de educação neste país está sequestrada pelos Sindicatos dos Professores. E essa é uma das razões evidentes do nosso atraso e subdesenvolvimento. Senhora ministra: por favor, não desista.

Miguel Sousa Tavares
IN:EXPRESSO

 
At 12 de setembro de 2006 às 09:49, Anonymous Anónimo said...

É INACEITÁVEL

O que está a suceder com o pretendido pacto na Segurança Social, Cavaco não se cansa que é seu desejo que haja um pacto neste capítulo, enquanto Marques Mendes não perde a oportunidade para dizer que não usar uma maioria absoluta no parlamento é egoísmo. Para além de uma tentativa clara de subversão das regras da democracia em favor de um modelo político que transforma a AR numa Assembleia Nacional, assistimos a uma estratégia aparentemente concertada entre o PR e o líder de um partido minoritário para levar um governo eleito a adoptar o que não propôs nem no seu programa eleitoral nem no seu programa de governo.

 
At 12 de setembro de 2006 às 10:01, Anonymous Anónimo said...

Bloco central deixa fora do acordo medidas de combate à corrupção

O combate à corrupção, alvo recente de três projectos-lei apresentados na Assembleia da República pelo deputado socialista João Cravinho, ficou de fora do pacto sobre justiça assinado sexta-feira passada entre o PS e o PSD.

Na parte do acordo relativa à revisão do Código Penal, nenhum dos cinco pontos indica que o combate à corrupção foi matéria de entendimento entre os dois partidos. Segundo o texto divulgado na sexta-feira, a revisão do código penal a operar pelos dois partidos irá consagrar a responsabilidade penal das pessoas colectivas, adaptará a legislação portuguesa à legislação internacional em matérias como o direito das crianças, combate ao tráfico de pessoas, exploração sexual, pornografia, prostituição infantil e criminalidade organizada.

O texto diz ainda que é "reforçada a aplicação de penas alternativas à privação de liberdade, reservando-se a prisão para as situações de criminalidade especialmente grave", versando ainda crimes como os relacionados com a violência doméstica, incêndios florestais e crimes contra o ambiente.

Nem da parte do PS nem do PSD o DN obteve uma justificação oficial para tal ausência. Contudo, da parte dos socialistas é dito, oficiosamente, que "não se mexeu nada porque não era preciso". Ou seja, no entender das mesmas fontes não é preciso mexer no Código Penal para tornar mais eficaz o combate à corrupção. A questão não é de leis mas sim de melhorar o funcionamento da investigação criminal. Incentivando, por exemplo, os investigadores, premiando-os na sua ascensão profissional em função dos casos que consigam levar a tribunal e obter condenações - uma ideia há muito avançada por Alberto Costa, ministro da Justiça.

PS e PSD consideraram não ser necessário que o pacto abrangesse a corrupção mas tal opção está longe de ser consensual, pelo menos no PS. Há semanas, o deputado do PS apresentou no Parlamento três projectos para reforço dos meios do Estado no combate à corrupção, que aguardam agendamento.

Ontem, ouvido pelo DN, Cravinho escusou-se a comentar a ausência do tema no acordo PS-PSD, alegando ainda não conhecer o documento em pormenor. Contudo recordou um artigo seu publicado no DN em Janeiro de 2005 (pré-campanha das eleições legislativas), artigo intitulado, precisamente, "É imprescindível um pacto anticorrupção". Nesse artigo, Cravinho considerou que "nada seria mais salutar para consolidar a confiança nos políticos" do que um "exigente e eficaz pacto anticorrupção". Cravinho considerava na altura - e, porque nada mudou, deverá continuar a considerar hoje - que era um "mistério desconcertante" o facto de tal ideia não ter ocorrido a quem "solicita a confiança do eleitorado".

O deputado sugeria, por exemplo, que uma das medidas poderia ser a imposição ao procurador-geral da República de deslocações periódicas ao Parlamento.

João Pedro Henriques
No:Diário de Notícias
12 de Setembro de 2006

 
At 12 de setembro de 2006 às 10:08, Anonymous Anónimo said...

Em França, notam-se agora as sequelas do caso Outreau, em que se provou serem rotundamente falsas certas imputações a arguidos, num caso de abuso sexual de menores e que por causa disso ficaram presos, injustamente, durante meses.
Como medida emblemática para atalhar a outros erros judiciários de idêntico teor, o governo francês, pela mão de Sarkozy pretende aprovar legislação que permita a gravação audiovisual de todos os casos de detenção provisória, incluindo o momento do primeiro interrogatório pelo juiz de instrução. A medida é copiada do sistema inglês que aliás a praticam desde os anos oitenta.
Diga-se que por lá, o juiz é mesmo de instrução e que por isso a faz e não apenas o da instrução, como por cá acontece, limitando assim o papel do juiz à sindicância do que se fez no Inquérito. E a medida concreta, destina-se a permitir que outras instâncias avaliem a apreciação efectuada aos factos.
Em França, a reforma vem de um levantamento geral de indignação em relação a um sistema que funcionou mal e que produziu um clamoroso erro judiciário. Mesmo assim, é discutida abertamente quanto à eventual eficácia e adequação.

Em Portugal, o actual movimento de reforma do sistema judicial, como o comprovam as palavras do próprio ministro da Justiça, Alberto Costa, teve como motivação concreta, um caso concreto - o da Casa Pia, onde aparentemente “aprendeu” muito. Essa aprendizagem contradiz a estudada indignação em tempos demonstrada num Prós & Contras, quando um António Cluny lhe notou a impressão geral de que o governo pretendia arremeter contra o poder judicial, exactamente como revindicta do processo Casa Pia.
Assim, por cá, a reforma vem a reboque de aprendizagens a propósito de um processo que ainda nem terminou; que envolveu figuras públicas e políticos do partido com poder executivo e cujo conhecimento público dos factos já publicitados, permite dizer que não tem qualquer comparação com o caso francês.

Em França, a reforma vem após a verificação de um grave erro judiciário, cujas causas foram analisadas em sede de Assembleia Nacional, com a presença de representantes do poder judicial concreto que participou na ocorrência desse erro. A discussão que se gerou, colocou em causa alguns princípios e alguns métodos e originou um aceso debate nos media, a propósito do funcionamento do sistema.
Uma das conclusões a que se chegou, foi a da ocorrência de erros humanos, derivados da falta de experiência, na origem directa de erros judiciários. Diagnosticada uma das causas, afectou-se-lhe uma solução já utilizada noutros países.
Em Portugal, a reforma negociada em segredo, vem após a ocorrência de supostos erros, na investigação dos factos. Esses putativos erros, foram apontados pela defesa dos arguidos excelentíssimos… e apesar de decorrerem exclusivamente de legislação aprovada pelos mesmos que agora a pretendem revogar, foram durante muito tempo, procedimentos comuns, nunca contestados. As escutas telefónicas a notáveis, por exemplo e o seguimento dado a denúncias anónimas, seguiam regras incontestadas desde finais dos anos oitenta, tendo passado incólumes por tribunais superiores, incluindo o Constitucional. Os interrogatórios seguidos noite dentro, precisam agora de medida legislativa para o seu extermínio. Contudo, o segredo de justiça para o qual alguns se estão a c****, ainda não é desta que vai para a retrete.
Pelos vistos, só agora se descobriram essas regras maléficas que pacificamente existiam nos códigos, hospedadas e escondidas, à espera de momento propício para atacar.
Calhou essa má sorte aos políticos indefesos que as legislaram. De repente, com o apoio estrénue de comentaristas da corte, descobriram-lhe a extrema perversidade e é por isso que vem aí a reforma. Sendo para o "bem geral", só pode ser piadosa; sendo oculta em mistério de intenções, também será algo mentirosa e sendo negociada em segredo e em pacto, é certamente algo nebulosa.
E com o lado útil, traz ainda consigo um lado agradável: submeter os representantes máximos do poder judicial, a um controlo de qualidade normalizada e sujeitar os decanos a suportar a companhia e diversidade de profanos com hábitos de mérito, devidamente graduado, como convirá.

 
At 12 de setembro de 2006 às 16:39, Anonymous Anónimo said...

Os pactos de regime começam a soar como cantos de sereia. Parecem soluções infalíveis para os males do país. Talvez sejam. Mas podem ser o encantamento que pode fazer perder o tino aos marinheiros de serviço, Sócrates e Marques Mendes.
O pacto de regime para a justiça foi, para Sócrates, a forma de adormecer a oposição. Era um acordo leonino: o PSD dava o beneplácito e o Governo poderia dizer, mais tarde, que tinha reformado o sector. Para Sócrates, um pacto de regime é um acordo de cavalheiros. Dois ou mais pactos assemelham-se a um motim. E se há coisas de que o líder do Governo não gosta é de demasiado ruído à sua volta. Na sua estratégia de fazer de Marques Mendes politicamente afónico, Sócrates não contou que Cavaco falasse com um timbre de voz acima do que lhe é normal. Ao pedir mais pactos de regime, Cavaco colocou Sócrates como vítima do seu anterior sucesso. E deu força a Marques Mendes na sua estratégia de cercar Sócrates de compromissos. Cavaco, sob a capa de fomentar a paz, está a alimentar um braço de ferro entre Sócrates e Marques Mendes. Algo que o primeiro dispensaria. E que o segundo vê como uma oportunidade de atingir o palco. Cavaco sorri. A proposta de novos pactos de regime serve-lhe para deslocar o centro de gravidade política de S. Bento para Belém. Tudo o que Sócrates desejaria evitar. Até porque, recusando agora pactos sobre sectores fulcrais, o primeiro-ministro poderá aparecer no futuro como o mau da fita.

 
At 13 de setembro de 2006 às 09:29, Anonymous Anónimo said...

Cavaco Silva introduziu um novo modelo de sistema político, no início desta legislatura Portugal vivia em democracia, passados dois apeadeiros do roteiro cavaquista o país foi parar a uma pactocracia onde o parlamente vive animado para discutir decisões menores, já que nas questões fundamentais impõe-se a salvação da Pátria, e por salvação da Pátria entende-se adoptar as posições de um partido que governou mal e de forma incompetente e cujas propostas os portugueses rejeitaram nas urnas, atribuindo-lhe menos de 30% dos votos.

Na pactocracia não há debate público, os assuntos são discutidos em segredo e os eleitores levam com as decisões como se fossem crianças a comer a sopa com receio da vinda do lobo mau, não existe Programa de Governo mesmo que tenha sido aprovado no parlamento, as prioridades e as medidas mais importantes são definidas por alguém sem competências executivas e que quando concorreu à eleição não fez sufragar nenhum programa de governo.

A pactocracia de Cavaco Silva parte do pressuposto de que o funcionamento regular da democracia leva a resultados piores do que o desejáveis, a pactocracia é a negação da democracia, assenta numa visão paternalista desta e no reconhecimento das vantagens do corporativismo. O exercício do poder com base em pactos e envolvendo os partidos que Cavaco Silva entende deverem participar significa a exclusão de muitos portugueses da decisão política, os eleitores dos partidos excluídos nem governam nem criticam pois tudo se faz em segredo para que não ocorram as perturbações típicas da democracia.

 
At 13 de setembro de 2006 às 09:40, Anonymous Anónimo said...

É da natureza da democracia ser conflitual, não amolecer as diferenças e ter sempre uma porta ou uma janela alternativa aberta. Os "pactos" indiferenciam e misturam o que não é misturável "a bem da nação". Só que a nação não se "salva" por o regime "virar" pactício. Uma "união nacional" em democracia não deixa, nem por isso, de ser uma "união nacional". "Infantiliza" o regime em vez de o amadurecer. Ninguém vota em partidos ou em pessoas para se diluírem uns nos outros. O governo do engº Sócrates tem uma proposta "ideológica" para a segurança social que, bem ou mal, foi sufragada nas urnas. O dr. Marques Mendes tem outra e o dever de contestar a do governo. Não são dissolvíveis uma na outra apenas porque são dois tipos porreiros e preocupados com o "futuro". E Cavaco não tem de ter nenhuma e, sobretudo, não deve tentar transformar o líder da oposição no bonzo de serviço, anulando-o. Cada macaco em seu galho. Para conversa da treta, já basta a justiça.

 
At 13 de setembro de 2006 às 09:43, Anonymous Anónimo said...

Até que ponto os pactos de regime - como aquele que o PS e o PSD acabam de subscrever na área da Justiça - são úteis, necessários e até indispensáveis para garantir a reforma e a credibilidade das instituições num Estado de direito democrático? Em que medida podem perverter e até subverter a substância e os mecanismos da própria democracia representativa?

Estas são questões que não permitem respostas fáceis nem expeditas. Mas colocam-se hoje com premência cada vez maior nas democracias modernas. As velhas clivagens ideológicas e os cenários de ruptura radical entre modelos de sociedade foram sendo substituídos pelo imperativo dos consensos em áreas fulcrais, nomeadamente naquelas que implicam a governabilidade para além dos ciclos eleitorais e legislativos. Em Portugal é esse, manifestamente, o caso da justiça. Mas não deveriam sê-lo também os casos da Segurança Social - como pretendem o Presidente da República e o PSD -, do sistema educativo ou até da reforma da administração pública?

A partir do momento em que o Governo do PS acabou, embora com manifesta contrariedade inicial, por aceitar o pacto da justiça, que é que o leva a não admitir outros pactos assentes numa mesma lógica negocial com o maior partido de oposição e de alternância governativa? Aberto um precedente, porque não alargar o horizonte dos compromissos e ousar ir mais longe?

No caso da Segurança Social conhecem-se os argumentos formais: segundo o PS, a proposta do PSD não garantiria a sustentabilidade do sistema. Mas parece óbvio que, neste campo, as reservas ideológicas - mais estatizantes do lado do PS, mais liberais do lado do PSD - não são suficientes para impedir o diálogo e a aproximação pragmática das posições dos dois partidos nucleares da democracia portuguesa. O que explica a recusa do PS não são as reservas ideológicas, mas os cálculos estritamente (estreitamente) políticos. E, em particular, o facto de José Sócrates temer ficar prisioneiro na rede de um novo bloco central tecida por Cavaco Silva.

Nada disto teria acontecido se Sócrates tivesse uma visão estratégica das reformas que pretende fazer (ou de que só assumiu a necessidade depois de ter tomado posse como chefe do Governo) e não uma visão meramente táctica e instrumental da acção política que oscila em função das circunstâncias - e da qual já fez refém o seu próprio partido.

Imaginemos que o primeiro-ministro, em vez de ser surpreendido e ultrapassado pela iniciativa do pacto para a justiça, avançada por Marques Mendes e apadrinhada por Cavaco, tinha sido ele próprio a propô-la. Imaginemos ainda que Sócrates tinha ousado desafiar o maior partido da oposição para subscrever não apenas esse pacto isolado mas um pacto global sobre as questões cruciais de regime na perspectiva de uma década. Só que, para isso, era preciso que Sócrates tivesse a força de convicção e um genuíno sentido da necessidade de pactuar essas reformas para além de um horizonte de poder a curto/médio prazo, por considerá-las fundamentais para superar os bloqueios do País. Isso exigia, sobretudo, uma espessura de estadista com visão do futuro e não apenas empenhado em preservar, tão duradouramente quanto possível, a sua sobrevivência política.

Evidentemente, é lícito argumentar que a lógica dos pactos de regime é perniciosa para a democracia representativa, na medida em que reduz o Parlamento a uma mera câmara de eco dos negócios políticos feitos nos bastidores - excluindo os partidos que neles não participaram e até a grande maioria dos deputados daqueles que formalmente os aprovaram. O problema é que os "excluídos" - ou seja: o CDS, o PCP e o Bloco de Esquerda - se limitam a uma agit-prop contra qualquer com- promisso reformador e os grupos parlamentares do PSD e do PS se diluem no anonimato da instrumentalização partidária.

O actual quadro parlamentar é talvez o mais enquistado, mais medíocre e menos livre das últimas três décadas, o que coloca uma questão fundamental à crise de representação política em Portugal. Não parece ser isso, todavia, o que preocupa o actual chefe do Governo - apostado claramente em domesticar o PS à medida dos seus desígnios políticos e pessoais.

Perante uma tal aridez da democracia representativa, faz todo o sentido questionar a legitimidade democrática dos pactos de regime - o da justiça ou quaisquer outros. Mas o cepticismo e o desprezo que Sócrates hoje ostenta perante a instituição parlamentar não são muito diferentes daqueles que, no fundo, Cavaco tem (e teve) acerca dela. O problema não são os pactos de regime, mas as formas democráticas de fazer política com base em ideias, convicções e liberdade de opinião. Essa seria, no fundo, a reforma fundamental.

Vicente Jorge Silva
In: Diário de Notícias
19-09-2006

 
At 13 de setembro de 2006 às 14:27, Anonymous Anónimo said...

De um momento para o outro os políticos descobriram a fórmula de transformar o chumbo em ouro. Deram a essa fórmula milagrosa o nome de pactos de regime.
Depois da justiça já se fala da segurança social. A seguir irão pedir-se, por certo, pactos sobre a educação, as florestas, a energia ou talvez sobre a velocidade máxima a que os ministros podem circular nas auto-estradas. De um momento para o outro os políticos descobriram um elixir. Tudo os une, nada os separa. Bastou Cavaco Silva ter acenado com o ramo da oliveira dos pactos e os partidos tornaram-se pombas da paz celestial. Perguntam--se os mais ingénuos: o que é que separa hoje o PS e o PSD? Um líder? Os gregos inventaram a retórica para que, no seu mundo democrático, todos tivessem as mesmas hipóteses de persuadir. As diferenças de propostas poderiam valer uma vitória. Quando, de um momento para o outro, os pactos de regime se transformam no soro do regime é porque as ideias alternativas se extinguiram. Acreditamos que há sectores em que o bloco central português deve ter ideias concretas para não mudar de políticas cada vez que um ministro ultrapassa os limites de velocidade. A segurança social, assunto que vai ser fulcral nas próximas décadas, deve ter uma estratégia de Estado. Mas quando se quer fazer de tudo o resto uma paz pobre é porque se deixou de ter ideias. E, assim, bastava haver um único partido: aquele que, num país da América Latina, foi baptizado de revolucionário institucional.

 
At 16 de setembro de 2006 às 22:40, Anonymous Anónimo said...

O PACTO


O chamado "Pacto para a Justiça", celebrado entre o Governo PS e a oposição PSD, sob os bons auspícios do Presidente da República, tem dado motivo a muita discussão, muita especulação e muita falsa consternação. No limite, muitos não o fizeram por menos: o pacto representaria a demissão da oposição, a abdicação da essência do jogo democrático e até, horror dos horrores, o primeiro sinal da ressurreição do maléfico "bloco central". A verdade, porém, é bem mais simples: há falta de temas políticos nesta "rentrée".

Desde logo, não vejo porque razão haveria Sócrates de piscar o olho ao "bloco central", quando governa com uma confortável maioria absoluta, dispõe de um apoio seguro nas sondagens e na opinião pública e começa a ter boas notícias na frente económica. Depois, não vejo em que é que a celebração de um acordo pontual entre o Governo e o principal partido da oposição possa, por si só, pôr em causa a regra da alternância democrática e subverter o papel próprio de Governo e da oposição. Aliás, nestas coisas, nós nunca estamos satisfeitos: ou achamos que a oposição é sempre do contra ou, quando não é, achamos que se vendeu ao Governo. Mas, que eu saiba, não existe, excepto nas regras internas do PCP, nenhuma obrigação democrática de as oposições serem sistematicamente contra tudo o que os governos fazem.

É evidente que acordos destes serão sempre excepcionais, em razão da matéria ou de circunstâncias excepcionais, e a sua banalização, então sim, teria o condão de subtrair alternativas à política e esvaziar a oposição de sentido. Por isso mesmo, o desejo, que se compreende, de Cavaco Silva ver o pacto da justiça estender-se a outras áreas fulcrais da governação é um desejo que deve ser contido nos justos limites da sua perigosidade. Compreende-se que o Presidente queira promover os "consensos" (na esteira, aliás, de Jorge Sampaio), mas nenhum Governo, sobretudo se de maioria absoluta, tem obrigação de governar por consenso. Antes pelo contrário: foi eleito para aplicar o seu programa, em alternativa ou contra os dos outros partidos. Eis uma regra que os comunistas nunca compreenderam: a legitimidade e obrigatoriedade de os governos aplicarem o programa com que foram eleitos, mesmo que o resto do país os enfrente no parlamento ou nas ruas.

Aceito a necessidade e compreendo a vantagem de um pacto na área da justiça, assim como noutras áreas que têm que ver com a estrutura do Estado: o sistema político ou as Forças Armadas. Já não vejo necessidade de tal acontecer noutras áreas de governação, como a Segurança Social ou mesmo a política externa - cujo consenso podre entre PS e PSD vigorou durante décadas, só tendo sido efectivamente quebrado por Durão Barroso, quando nos alinhou com a aventura desastrada de Bush no Iraque, depois de ter jurado que lhe haviam mostrado "provas" irrefutáveis de que Saddam Hussein possuía armas de destruição maciça.

O critério de separação, que não é sempre nítido, pode, todavia, ser estabelecido entre o que são matérias de Estado e o que são matérias da governação. A política externa, os assuntos europeus, a economia, a segurança, por exemplo, são tudo áreas determinantes da governação, mas não são matérias de pactos nem de consensos, porque todas elas envolvem opções ideológicas e escolhas políticas, sem as quais o jogo partidário, em que assenta a democracia, deixa de fazer sentido. Claro que, por exemplo, face ao iminente colapso financeiro da Segurança Social, seria talvez desejável que as principais forças políticas, da direita à esquerda, coincidissem no diagnóstico do problema e da sua solução. Mas quando, como é o caso, essa coincidência não existe e antes - como resulta claro das propostas do PS, PSD, PCP e BE - o que existe é uma divergência política e ideológica sobre a solução a adoptar, nem o Governo está obrigado a procurar um acordo nem a oposição está obrigada a facilitar a solução do Governo. É assim que as coisas funcionam, em democracia.

Já quanto ao pacto sobre a justiça, como disse, é diferente. Não apenas se está a tocar na própria estrutura do Estado democrático, como se está no domínio altamente sensível em que dois poderes, o legislativo e o executivo, determinam a organização de um terceiro - o judicial. A essa luz, se alguma coisa há a lamentar sobre este pacto, não é que ele tenha existido, mas que, já que existiu, não se tenha ido mais longe e não se tenha aproveitado a oportunidade para ir à raiz de muitos dos males da justiça, que todos conhecem e sabem assentar na mentalidade e resistência corporativa dos corpos judiciais. Dois partidos que em conjunto representam 80% do eleitorado e que dispunham do apoio político de um Presidente recém-eleito por maioria absoluta, tinham obrigação de ter mostrado mais coragem e ter ido bem mais além. Mas, enfim, isso é uma sina nossa: nunca se faz nada de uma vez só, mas apenas se avança por pequenos passos, muitas vezes mais pequenos do que o ritmo a que os problemas se vão acumulando.

P.S. - A EPUL é uma empresa municipal da Lisboa constituída com o fim de construir casas de habitação em terrenos municipais e vendê-las mais baratas. Nunca o conseguiu: vende-as a preços de mercado e, às vezes, mais caras. Já isso é extraordinário, mas, mais extraordinário ainda, é que uma empresa que vende casas a preço de mercado, sem ter de pagar os terrenos, fique tão entusiasmada quando obtém lucros que distribua prémios de gestão entre os seus administradores. Não basta agora que, num acesso de pudor tardio, despertado só depois de se descobrir a coisa, eles devolvam os prémios. Deviam também devolver os lugares que ocupam, porque a mentalidade revelada não serve para gerir coisa pública.

Miguel Sousa Tavares
No: Expresso

 

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