UM ESCOLHA SEM AMBIGUIDADES NO PSD
Já aprendi o suficiente sobre o modo como funcionam os partidos para não ter ilusões sobre a realidade que se esconde por detrás da retórica das grandes escolhas, grandes opções e grandes lideranças. Já aprendi o suficiente para perceber como o tempo de oposição prolongada é de vacas magríssimas e que algumas debilidades da oposição têm razões estruturais e não conjunturais, não dependem das lideranças, mas sim da falta de autonomia da sociedade civil e do espaço público face ao peso do Estado e do seu executante, o Governo. Não há solução salvífica, só há a realidade: a de Portugal em 2007 e a do PSD em 2007.
Quem combate o PS no Governo porque acha que este está a fazer mal ao país, não se pode dar ao luxo de esperar por soluções salvíficas, onde se confunde "carisma" com populismo e se acredita que há um Houdini escondido numa esquina à espera de se libertar de todas as cordas e emergir glorioso à tona da água. Não há, e a tentação do PSD pelo escapismo populista do karma, que ganhava todas as eleições, é um dos fardos que pesam sobre a sua crise de credibilidade actual. Não é por aí, nem a espera pelos "notáveis" nem por Houdini servem os dias de hoje.
Vamos aos "notáveis", a sombra que pesa sobre o PSD dos que seriam desejados mas não aparecem. Não sabemos muito bem quão desejados seriam se aparecessem, mas eles pairam sempre como uma sombra de deslegitimação sobre quem está. Seria possível encher esta página de nomes sonantes e conhecidos que estão associados ao PSD, muitos dos quais são mesmo militantes do partido. Mas contam-se pelos dedos de uma mão o número desses "notáveis" que, na sua actividade, tenham efectiva independência do Governo e que estejam dispostos a serem vozes activas da oposição. Eu não digo sequer que estivessem dispostos a actuar na oposição estritamente partidária, como sendo porta-vozes de áreas sectoriais em que têm prestígio e actividade, digo, pura e simplesmente, manifestarem a sua opinião crítica de forma consistente e duradoura contra o Governo, mesmo que a título individual, caso não quisessem sujar as mãos nos partidos. Por exemplo, escrever artigos, dar uma entrevista, exprimir uma crítica séria, tudo coisas que se esperava de quem pela sua postura política é suposto achar que o país está mal governado pelo PS, tanto mais que apoiam o partido alternante. Será porque acham que o Governo de Sócrates é bom? Alguns acham que é um mal menor e que é melhor de que as alternativas e isso leva-os ao silêncio. Mas duvido que seja um número muito significativo. O que se passa é que mesmo entre esses notáveis a independência real do Governo, das suas decisões, da sua colaboração benévola, é escassa. O que muitas vezes se esconde numa certa postura de "silêncio de Estado", que é uma habilidade retórica muito portuguesa, é a necessidade de não hostilizar um Governo que tem sempre mil dossiers em aberto que podem afectar empresas, negócios, lugares, fundações, projectos, ou mesmo esse bem raro que é o "prestígio".
Portugal é um país muito pequeno e com demasiado Estado para ter uma sociedade civil com efectiva independência e isso é mortífero para qualquer partido da oposição que não queira ser apenas uma variante pobre de "bloco central". É este o problema estrutural número um da oposição. A não ser em períodos em que se torna evidente que vai haver uma mudança política a curto prazo, como quando Barroso fez uma convenção no Coliseu com tudo que era colunável na política e na economia na primeira fila, os "notáveis" primam pela prudência e pela cautelosa reserva da política. Não é por acharem que Marques Mendes seja um "mau líder", é porque só tem a perder alguma coisa pelo envolvimento político contra o Governo, fora do tempo. Não é só Marques Mendes que prova o fel desta atitude, mesmo Marcelo Rebelo de Sousa, que frequenta os mesmo salões do poder, quando quis contestar alguns negócios e interesses também provou a solidão e os ataques ao seu "prestígio".
Os defeitos de Marques Mendes são conhecidos. Como herdeiro directo do "nogueirismo", ele representa bem um partido clientelar e provinciano, que hoje é o essencial do PSD que ainda resiste no poder autárquico com sucesso. Como o seu poder vem desse establishment partidário interno, ele precisa de dar-lhes um retorno para manter os seus votos. Mil e uma voltas pelo circuito da "carne assada" atestam essa dependência. Mas seria errado ignorar que ele fez mais pelo "partido nacional" do que os seus antecessores. Embora seriamente limitado pela herança do grupo parlamentar vindo da direcção anterior e com o "partido nacional" em muito mau estado - e aqui Mendes poderia ir mais longe do que a tentação de sucessivas listas de "notáveis" para cargos nominais - Mendes tem ajudado o PSD a libertar-se da crise de credibilidade que vinha do desastre do "menino guerreiro", e duvido que alguém estivesse com vontade e na posição de o ter feito.
E fez ainda mais. Se ultrapassarmos a coreografia, mesmo aquela para que Mendes contribuiu com aquela linguagem morta do "politiquês" com que se exprime, teríamos que olhar com mais atenção para a tendência programática que algumas das suas propostas exprimem, porque me merecem completa concordância e são mais inovadoras do que parecem. Mendes defrontou a questão do aval político automático que se dava aos que ganham no partido apenas porque ganham, autarcas em particular, seja qual for o "escândalo" público e a situação jurídica que os seus actos assumem para o país. Fê-lo imperfeitamente? Fê-lo fechando os olhos a uns casos para empolar outros? Pode ser, mas fê-lo com os custos que até então nenhum dirigente partidário estava disposto a pagar, a começar por aqueles que, como Mendes, foram feitos dentro do aparelho. Avançou com um conjunto de propostas liberais e não teve medo de assim as classificar? Fê-lo na segurança social, na proposta do fim da RTP pública e no modo como enquadrou a proposta de baixa de impostos, como medida alternativa ao modo como o Estado se relaciona com a economia e com o seu próprio tamanho. Foi contraditório nestas propostas com outras em que criticou o encerramento de serviços públicos e "reformas" que o Governo apresenta como destinadas a emagrecer o Estado? Talvez, mas quando se olham essas propostas como foram feitas e não como o PS e Sócrates diz que foram feitas, não há tanta contradição como isso. Aliás, a oposição do PSD com Mendes ao Governo PS está nos antípodas da que o PS fez ao PSD, é muito mais responsável e consistente. O modo como Sócrates trata a oposição justificaria que se dissesse que não merece esta moderação, mas é bom que assim seja.
Isto significa que vou votar em Marques Mendes nas eleições directas do PSD. Com o meu voto singular, de quem tem as quotas em dia, na minha secção, vou votar sem "mas" nenhum, no homem que muitas vezes critiquei com dureza, e certamente continuarei a criticar, e nem sequer o faço pelo princípio do mal menor. Ou seja, não voto Marques Mendes porque a alternativa é Luís Filipe Menezes; votaria Marques Mendes mesmo que a alternativa fosse algum dos "notáveis" que são sempre falados em eleições e se mantêm em silêncio como eternas esperanças do porvir. Estando o país como está, esse silêncio é mais uma abstenção cívica do que um mérito, e num partido como o PSD é mortífero viver de esperanças sebastianistas.
José Pacheco Pereira
Quem combate o PS no Governo porque acha que este está a fazer mal ao país, não se pode dar ao luxo de esperar por soluções salvíficas, onde se confunde "carisma" com populismo e se acredita que há um Houdini escondido numa esquina à espera de se libertar de todas as cordas e emergir glorioso à tona da água. Não há, e a tentação do PSD pelo escapismo populista do karma, que ganhava todas as eleições, é um dos fardos que pesam sobre a sua crise de credibilidade actual. Não é por aí, nem a espera pelos "notáveis" nem por Houdini servem os dias de hoje.
Vamos aos "notáveis", a sombra que pesa sobre o PSD dos que seriam desejados mas não aparecem. Não sabemos muito bem quão desejados seriam se aparecessem, mas eles pairam sempre como uma sombra de deslegitimação sobre quem está. Seria possível encher esta página de nomes sonantes e conhecidos que estão associados ao PSD, muitos dos quais são mesmo militantes do partido. Mas contam-se pelos dedos de uma mão o número desses "notáveis" que, na sua actividade, tenham efectiva independência do Governo e que estejam dispostos a serem vozes activas da oposição. Eu não digo sequer que estivessem dispostos a actuar na oposição estritamente partidária, como sendo porta-vozes de áreas sectoriais em que têm prestígio e actividade, digo, pura e simplesmente, manifestarem a sua opinião crítica de forma consistente e duradoura contra o Governo, mesmo que a título individual, caso não quisessem sujar as mãos nos partidos. Por exemplo, escrever artigos, dar uma entrevista, exprimir uma crítica séria, tudo coisas que se esperava de quem pela sua postura política é suposto achar que o país está mal governado pelo PS, tanto mais que apoiam o partido alternante. Será porque acham que o Governo de Sócrates é bom? Alguns acham que é um mal menor e que é melhor de que as alternativas e isso leva-os ao silêncio. Mas duvido que seja um número muito significativo. O que se passa é que mesmo entre esses notáveis a independência real do Governo, das suas decisões, da sua colaboração benévola, é escassa. O que muitas vezes se esconde numa certa postura de "silêncio de Estado", que é uma habilidade retórica muito portuguesa, é a necessidade de não hostilizar um Governo que tem sempre mil dossiers em aberto que podem afectar empresas, negócios, lugares, fundações, projectos, ou mesmo esse bem raro que é o "prestígio".
Portugal é um país muito pequeno e com demasiado Estado para ter uma sociedade civil com efectiva independência e isso é mortífero para qualquer partido da oposição que não queira ser apenas uma variante pobre de "bloco central". É este o problema estrutural número um da oposição. A não ser em períodos em que se torna evidente que vai haver uma mudança política a curto prazo, como quando Barroso fez uma convenção no Coliseu com tudo que era colunável na política e na economia na primeira fila, os "notáveis" primam pela prudência e pela cautelosa reserva da política. Não é por acharem que Marques Mendes seja um "mau líder", é porque só tem a perder alguma coisa pelo envolvimento político contra o Governo, fora do tempo. Não é só Marques Mendes que prova o fel desta atitude, mesmo Marcelo Rebelo de Sousa, que frequenta os mesmo salões do poder, quando quis contestar alguns negócios e interesses também provou a solidão e os ataques ao seu "prestígio".
Os defeitos de Marques Mendes são conhecidos. Como herdeiro directo do "nogueirismo", ele representa bem um partido clientelar e provinciano, que hoje é o essencial do PSD que ainda resiste no poder autárquico com sucesso. Como o seu poder vem desse establishment partidário interno, ele precisa de dar-lhes um retorno para manter os seus votos. Mil e uma voltas pelo circuito da "carne assada" atestam essa dependência. Mas seria errado ignorar que ele fez mais pelo "partido nacional" do que os seus antecessores. Embora seriamente limitado pela herança do grupo parlamentar vindo da direcção anterior e com o "partido nacional" em muito mau estado - e aqui Mendes poderia ir mais longe do que a tentação de sucessivas listas de "notáveis" para cargos nominais - Mendes tem ajudado o PSD a libertar-se da crise de credibilidade que vinha do desastre do "menino guerreiro", e duvido que alguém estivesse com vontade e na posição de o ter feito.
E fez ainda mais. Se ultrapassarmos a coreografia, mesmo aquela para que Mendes contribuiu com aquela linguagem morta do "politiquês" com que se exprime, teríamos que olhar com mais atenção para a tendência programática que algumas das suas propostas exprimem, porque me merecem completa concordância e são mais inovadoras do que parecem. Mendes defrontou a questão do aval político automático que se dava aos que ganham no partido apenas porque ganham, autarcas em particular, seja qual for o "escândalo" público e a situação jurídica que os seus actos assumem para o país. Fê-lo imperfeitamente? Fê-lo fechando os olhos a uns casos para empolar outros? Pode ser, mas fê-lo com os custos que até então nenhum dirigente partidário estava disposto a pagar, a começar por aqueles que, como Mendes, foram feitos dentro do aparelho. Avançou com um conjunto de propostas liberais e não teve medo de assim as classificar? Fê-lo na segurança social, na proposta do fim da RTP pública e no modo como enquadrou a proposta de baixa de impostos, como medida alternativa ao modo como o Estado se relaciona com a economia e com o seu próprio tamanho. Foi contraditório nestas propostas com outras em que criticou o encerramento de serviços públicos e "reformas" que o Governo apresenta como destinadas a emagrecer o Estado? Talvez, mas quando se olham essas propostas como foram feitas e não como o PS e Sócrates diz que foram feitas, não há tanta contradição como isso. Aliás, a oposição do PSD com Mendes ao Governo PS está nos antípodas da que o PS fez ao PSD, é muito mais responsável e consistente. O modo como Sócrates trata a oposição justificaria que se dissesse que não merece esta moderação, mas é bom que assim seja.
Isto significa que vou votar em Marques Mendes nas eleições directas do PSD. Com o meu voto singular, de quem tem as quotas em dia, na minha secção, vou votar sem "mas" nenhum, no homem que muitas vezes critiquei com dureza, e certamente continuarei a criticar, e nem sequer o faço pelo princípio do mal menor. Ou seja, não voto Marques Mendes porque a alternativa é Luís Filipe Menezes; votaria Marques Mendes mesmo que a alternativa fosse algum dos "notáveis" que são sempre falados em eleições e se mantêm em silêncio como eternas esperanças do porvir. Estando o país como está, esse silêncio é mais uma abstenção cívica do que um mérito, e num partido como o PSD é mortífero viver de esperanças sebastianistas.
José Pacheco Pereira
Etiquetas: PSD
3 Comments:
Textos apologéticos asseguravam o ressurgimento do rei Sebastião, vindo do nevoeiro. Há dias grassou indignação no seio do grupo parlamentar do PSD, porque Marques Mendes terá recorrido ao nevoeiro para explicar com veemência a falta de qualidades da maioria dos deputados laranjinhas.
Ao lembrar-se do nevoeiro, o leader do PSD obrigou-me a retirar do justo esquecimento o rei ao qual António Sérgio apodou de “valente pedaço de asno”, precisamente por ser a fulgurante expressão da incompetência, da impreparação, da incapacidade que nos conduziram ao desastre de Alcácer-Quibir.
Não sei se Marques Mendes estava a pensar em semelhante analogia ao socorrer-se da névoa obscura, a fim de caracterizar os ditos deputados, de qualquer forma todos sabemos das debilidades de muitos “pais da Pátria”, da sua falta de qualidade; mas ao contrário dos poetas, dos escritores, dos cientistas, dos artistas, dos advogados, dos historiadores, dos músicos, dos jornalistas e tutti-quanti, que não o são apenas por quererem, mas sim porque possuem talento e estudaram de modo a conseguirem a necessária preparação para o serem, toneladas de políticos são-no dada a circunstância de carregarem a pasta do chefe, manteigarem a torto e a direito, continuando assim enquanto os deixam.
Os indignados deputados fariam bem se nos mostrassem provas do continuado e competente exercício da função, da força dos seus estudos a gerarem rigorosos e justificados projectos-lei, do seu empenho em acompanharem e defenderem os eleitores, das suas visitas de trabalho às populações para além da festa, procissão, feira, congresso e jantares caciqueiros.
O povo caricatura impiedosamente os parlamentares, metendo no mesmo saco os deputados trabalhadores, dotados de conhecimentos e donos de carreiras exemplares em termos profissionais, com os deputados sem eira nem beira em matéria de formação, trabalho e currículo a todos os níveis,. Está mal, mas adianta o rifão: paga o justo pelo pecador.
A precisar de espesso nevoeiro anda Scolari, de modo a esconder-se a fim de fazer um exame de consciência, uma espécie de balanço – privado – de modo a conseguir cumprir o contrato sem mais contratempos dos que os provindos, certamente, da entidade internacional disciplinadora do futebol, pois a nível doméstico – nós por cá muito nacional-porreirismo. Não é Sr. Madaíl?
Como era de esperar já se fazem conjecturas cobre a continuidade do contrato entre Scolari e a Caixa Geral de Depósitos. Aí sim, a carteira do maroto brasileiro leva enorme rombo.
Inesperadamente, ou talvez não, as directas para a escolha do líder do PSD estão a mostrar ao país que o partido que mais governou este país não passa de uma associação recreativa mal organizada. Depois do espectáculo triste que os dois candidatos têm proporcionado ao país, assiste-se a uma verdadeira opa em vésperas da escolha, os votos estão a ser comprados a troco do pagamento de quotas.
Trata-se de herança resultante do passado genético do PSD, lembra-nos a ANP de que o PSD herdou dirigentes, estruturas e membros. Tal como sucedia no tempo da ANP, também quando o PSD governa tende a confundir a sociedade e o Estado com o partido, multiplicam-se as pressões para que cidadãos com cargos no Estado ou que exercem actividades que dependem da generosidade governamental adiram ao partido. Recordo o tempo de Cavaco Silva, quando, com alguma periodicidade, se realizavam sessões de apresentação dos novos sócios, algumas realizavam-se no CCB e professores e cientistas eram apresentados à sociedade como se fossem aquisições de uma equipa de futebol.
Mesmo depois da limpeza dos cadernos constata-se que uma parte significativa dos militantes não pagam as quotas, desinteressam-se das suas “acções” numa empresa que deixou de dar lucro. Chega-se ao cúmulo de nos Açores, onde lidera um tal Costa Neves, que foi ministro da Agricultura (que contava com o actual secretário de estado dos Assuntos Fiscais como zeloso assessor até ao dia em que a pia baptismal das Novas Fronteiras o converteu num crente convicto das vantagens do socialismo anunciado por Sócrates), apenas 36 dos 8218 terem as quotas em dia.
O mais curioso é mesmo com a compra de votos com dinheiro de origem desconhecida há uma grande probabilidade de a escolha vir a ser decidida pelos “militantes” açorianos que não pagam quotas.
Ainda bem que tudo aponta para mais uma derrota eleitoral do PSD nas próximas legislativas, se isso não suceder o país corria o risco de vir a ter um primeiro-ministro que chega ao cargo porque uns amigos duvidosos lhe compraram os votos ou por meia dúzia de militantes açorianos, quem nem pagam quotas, votam onde Costa Neves ou Mota Amaral lhes diz para votarem.
Este Partido está velho e já foi substituído pelo PS, por isso já não tem argumentos de combate, porque a política do PS é aquela que o actual PSD gostaria de fazer
Espero, por isso que venha alguém com uma nova política, uma política mais "Social Democrata", que tem andado arredada do PSD (e também do PS, apesar de se chamar "Partido Socialista").
Zé da Burra o Alentejano
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