A BALBÚRDIA NA ESCOLA
As cenas de pancadaria na escola têm comovido a opinião. A última em data, com especial relevo, ocorreu numa escola do Porto e foi devidamente filmada por um colega.
Em poucas horas, o clip correu mundo através do YouTube. A partir daí, choveram as análises e os comentários. Toda a gente procura responsáveis, culpados e causas. Os arguidos são tantos quanto se possa imaginar: os jovens, os professores, os pais, o ministério e os políticos. E a sociedade em geral, evidentemente. As causas são também as mais diversas: a democracia, os costumes contemporâneos, a cultura jovem, o dinheiro, a televisão, a publicidade, a Internet, a permissividade, a falta de valores, os bairros, o rap, os imigrantes, a droga e o sexo. Para a oposição, a culpa é do governo. Para o governo, a culpa é do governo anterior. O trivial.
Deve haver um pouco disso tudo. O que torna as coisas mais complicadas. Sobretudo quando se pretende tomar medidas ou conter a vaga crescente de violência e balbúrdia. Se as causas são múltiplas, por onde começar? Mais repressão? Mais diálogo? Mais disciplina? Mais co-gestão? Há aqui matéria para a criação de várias comissões, a elaboração de um livro branco, a aprovação de novas leis e a realização de inúmeros estudos. Até às eleições, haverá alguns debates parlamentares sobre o tema. Não tenho a certeza, nem sequer a esperança, que o problema se resolva a breve prazo.
De qualquer maneira, a ocasião era calhada para voltar a ver a obra-prima do esforço legislativo nacional, o famoso Estatuto do aluno. A sua última versão entrou em vigor em finais de Janeiro, sendo uma correcção de outro diploma, da mesma natureza, de 2002. Trata-se de uma espécie de carta constitucional de direitos e deveres, a que não falta um regulamento disciplinar. Não se pode dizer que fecha a abóbada do edifício legal educativo, porque simplesmente tal edifício não existe. É mais um produto da enxurrada permanente de leis, normas e regras que se abate sobre as escolas e a sociedade. É um dos mais monstruosos documentos jamais produzidos pela Administração Pública portuguesa. Mal escrito, por vezes incompreensível, repete-se na afirmação de virtudes. Faz afirmações absolutamente disparatadas, como, por exemplo, quando considera que a assiduidade (...) implica uma atitude de empenho intelectual e comportamental adequada...! Cria deveres inéditos aos alunos, tais como o de se empenhar na sua formação integral; o de guardar lealdade para com todos os membros da comunidade educativa; ou o de contribuir para a harmonia da convivência escolar. E também os obriga a conhecer e cumprir este estatuto do aluno, naquele que deve ser o pior castigo de todos! Quanto aos direitos dos alunos, são os mais abrangentes e absurdos que se possa imaginar, incluindo os de participar na elaboração de regulamentos e na gestão e administração da escola, assim como de serem informados sobre os critérios da avaliação, os objectivos dos programas, dos cursos e das disciplinas, o modo de organização do plano de estudos, a matrícula, o abono de família e tudo o que seja possível inventar, incluindo as normas de segurança dos equipamentos e os planos de emergência!
Trata-se de um estatuto burocrático, processual e confuso. O regime de faltas, que decreta, é infernal. Ninguém, normalmente constituído, o pode perceber ou aplicar. Os alunos que ultrapassem o número de faltas permitido podem recuperar tudo com uma prova. As faltas justificadas podem passar a injustificadas e vice-versa. As decisões sobre as faltas dos alunos e o seu comportamento sobem e descem do professor ao director de turma, deste ao conselho de turma, destes à direcção da escola e eventualmente ao conselho pedagógico. As decisões disciplinares são longas, morosas e processualmente complicadas, podendo sempre ser alteradas pelos sistemas de recurso ou de vaivém entre instâncias escolares. Concebem-se duas espécies de medidas disciplinares, as “correctivas” e as sancionatórias. Por vezes, as diferenças são imperceptíveis. Mas a sua aplicação, em respeito pelas normas processuais, torna inútil qualquer esforço. As medidas disciplinares são quase todas precedidas ou acompanhadas de processos complicados, verdadeiros dissuasores de todo o esforço disciplinar. As medidas disciplinares dependem de várias instâncias, do professor aos órgãos da turma, destes aos vários órgãos da escola e desta às direcções regionais. Os procedimentos disciplinares são relativos ao que tradicionalmente se designa por mau comportamento, perturbação de aula, agressão, roubo ou destruição de material, isto é, o dia-a-dia na escola. Mas a sua sanção é de tal modo complexa que deixará simplesmente de haver disciplina ou sanção.
O estatuto cria um regime disciplinar em tudo semelhante ao que vigora, por exemplo, para a Administração Pública ou para as relações entre Administração e cidadãos. Pior ainda, é criado um regime disciplinar e sancionatório decalcado sobre os sistemas e os processos judiciais. Os autores deste estatuto revelam uma total e absoluta ignorância do que se passa nas escolas, do que são as escolas. Oscilando entre a burocracia, a teoria integradora das ciências de educação, a ideia de que existe uma democracia na sala de aula e a convicção de que a disciplina é um mal, os legisladores do ministério da educação (deste ministério e dos anteriores) produziram uma monstruosidade: senil na concepção burocrática, administrativa e judicial; adolescente na ideologia; infantil na ambição. O estatuto não é a causa dos males educativos, até porque nem sequer está em vigor na maior parte das escolas. Também não é por causa do estatuto que há, ou não há, pancadaria nas escolas. O estatuto é a consequência de uma longa caminhada e será, de futuro, o responsável imediato pela impossibilidade de administrar a disciplina nas escolas. O estatuto não retira a autoridade na escola (aos professores, aos directores, aos conselhos escolares). Não! Apenas confirma o facto de já não a terem e de assim perderem as veleidades de voltar a ter. O processo educativo, essencialmente humano e pessoal, é transformado num processo científico, técnico, desumanizado, burocrático e administrativo que dissolve a autoridade e esbate as responsabilidades. Se for lido com atenção, este estatuto revela que a sua principal inspiração é a desconfiança dos professores. Quem fez este estatuto tinha uma única ideia na cabeça: é preciso defender os alunos dos professores que os podem agredir e oprimir. Mesmo que nada resolva, a sua revogação é um gesto de saúde mental pública.
António Barreto
Em poucas horas, o clip correu mundo através do YouTube. A partir daí, choveram as análises e os comentários. Toda a gente procura responsáveis, culpados e causas. Os arguidos são tantos quanto se possa imaginar: os jovens, os professores, os pais, o ministério e os políticos. E a sociedade em geral, evidentemente. As causas são também as mais diversas: a democracia, os costumes contemporâneos, a cultura jovem, o dinheiro, a televisão, a publicidade, a Internet, a permissividade, a falta de valores, os bairros, o rap, os imigrantes, a droga e o sexo. Para a oposição, a culpa é do governo. Para o governo, a culpa é do governo anterior. O trivial.
Deve haver um pouco disso tudo. O que torna as coisas mais complicadas. Sobretudo quando se pretende tomar medidas ou conter a vaga crescente de violência e balbúrdia. Se as causas são múltiplas, por onde começar? Mais repressão? Mais diálogo? Mais disciplina? Mais co-gestão? Há aqui matéria para a criação de várias comissões, a elaboração de um livro branco, a aprovação de novas leis e a realização de inúmeros estudos. Até às eleições, haverá alguns debates parlamentares sobre o tema. Não tenho a certeza, nem sequer a esperança, que o problema se resolva a breve prazo.
De qualquer maneira, a ocasião era calhada para voltar a ver a obra-prima do esforço legislativo nacional, o famoso Estatuto do aluno. A sua última versão entrou em vigor em finais de Janeiro, sendo uma correcção de outro diploma, da mesma natureza, de 2002. Trata-se de uma espécie de carta constitucional de direitos e deveres, a que não falta um regulamento disciplinar. Não se pode dizer que fecha a abóbada do edifício legal educativo, porque simplesmente tal edifício não existe. É mais um produto da enxurrada permanente de leis, normas e regras que se abate sobre as escolas e a sociedade. É um dos mais monstruosos documentos jamais produzidos pela Administração Pública portuguesa. Mal escrito, por vezes incompreensível, repete-se na afirmação de virtudes. Faz afirmações absolutamente disparatadas, como, por exemplo, quando considera que a assiduidade (...) implica uma atitude de empenho intelectual e comportamental adequada...! Cria deveres inéditos aos alunos, tais como o de se empenhar na sua formação integral; o de guardar lealdade para com todos os membros da comunidade educativa; ou o de contribuir para a harmonia da convivência escolar. E também os obriga a conhecer e cumprir este estatuto do aluno, naquele que deve ser o pior castigo de todos! Quanto aos direitos dos alunos, são os mais abrangentes e absurdos que se possa imaginar, incluindo os de participar na elaboração de regulamentos e na gestão e administração da escola, assim como de serem informados sobre os critérios da avaliação, os objectivos dos programas, dos cursos e das disciplinas, o modo de organização do plano de estudos, a matrícula, o abono de família e tudo o que seja possível inventar, incluindo as normas de segurança dos equipamentos e os planos de emergência!
Trata-se de um estatuto burocrático, processual e confuso. O regime de faltas, que decreta, é infernal. Ninguém, normalmente constituído, o pode perceber ou aplicar. Os alunos que ultrapassem o número de faltas permitido podem recuperar tudo com uma prova. As faltas justificadas podem passar a injustificadas e vice-versa. As decisões sobre as faltas dos alunos e o seu comportamento sobem e descem do professor ao director de turma, deste ao conselho de turma, destes à direcção da escola e eventualmente ao conselho pedagógico. As decisões disciplinares são longas, morosas e processualmente complicadas, podendo sempre ser alteradas pelos sistemas de recurso ou de vaivém entre instâncias escolares. Concebem-se duas espécies de medidas disciplinares, as “correctivas” e as sancionatórias. Por vezes, as diferenças são imperceptíveis. Mas a sua aplicação, em respeito pelas normas processuais, torna inútil qualquer esforço. As medidas disciplinares são quase todas precedidas ou acompanhadas de processos complicados, verdadeiros dissuasores de todo o esforço disciplinar. As medidas disciplinares dependem de várias instâncias, do professor aos órgãos da turma, destes aos vários órgãos da escola e desta às direcções regionais. Os procedimentos disciplinares são relativos ao que tradicionalmente se designa por mau comportamento, perturbação de aula, agressão, roubo ou destruição de material, isto é, o dia-a-dia na escola. Mas a sua sanção é de tal modo complexa que deixará simplesmente de haver disciplina ou sanção.
O estatuto cria um regime disciplinar em tudo semelhante ao que vigora, por exemplo, para a Administração Pública ou para as relações entre Administração e cidadãos. Pior ainda, é criado um regime disciplinar e sancionatório decalcado sobre os sistemas e os processos judiciais. Os autores deste estatuto revelam uma total e absoluta ignorância do que se passa nas escolas, do que são as escolas. Oscilando entre a burocracia, a teoria integradora das ciências de educação, a ideia de que existe uma democracia na sala de aula e a convicção de que a disciplina é um mal, os legisladores do ministério da educação (deste ministério e dos anteriores) produziram uma monstruosidade: senil na concepção burocrática, administrativa e judicial; adolescente na ideologia; infantil na ambição. O estatuto não é a causa dos males educativos, até porque nem sequer está em vigor na maior parte das escolas. Também não é por causa do estatuto que há, ou não há, pancadaria nas escolas. O estatuto é a consequência de uma longa caminhada e será, de futuro, o responsável imediato pela impossibilidade de administrar a disciplina nas escolas. O estatuto não retira a autoridade na escola (aos professores, aos directores, aos conselhos escolares). Não! Apenas confirma o facto de já não a terem e de assim perderem as veleidades de voltar a ter. O processo educativo, essencialmente humano e pessoal, é transformado num processo científico, técnico, desumanizado, burocrático e administrativo que dissolve a autoridade e esbate as responsabilidades. Se for lido com atenção, este estatuto revela que a sua principal inspiração é a desconfiança dos professores. Quem fez este estatuto tinha uma única ideia na cabeça: é preciso defender os alunos dos professores que os podem agredir e oprimir. Mesmo que nada resolva, a sua revogação é um gesto de saúde mental pública.
António Barreto
Etiquetas: Eduçação
14 Comments:
Desculpem se trago hoje à baila a história da professora agredida pela aluna, numa escola do Porto, um caso de que já toda a gente falou, mas estive longe da civilização por uns dias e, diante de tudo o que agora vi e ouvi (sim, também vi o vídeo), palavra que a única coisa que acho verdadeiramente espantosa é o espanto das pessoas.
Só quem não tem entrado numa escola nestes últimos anos, só quem não contacta com gente desta idade, só quem não anda nas ruas nem nos transportes públicos, só quem nunca viu os "Morangos com açúcar", só quem tem andado completamente cego (e surdo) de todo é que pode ter ficado surpreendido.
Se isto fosse o caso isolado de uma aluna que tivesse ultrapassado todos os limites e agredido uma professora pelo mais fútil dos motivos - bem estaríamos nós! Haveria um culpado, haveria um castigo, e o caso arrumava-se.
Mas casos destes existem pelas escolas do país inteiro. (Só mesmo a sr.ª ministra - que não entra numa escola sem avisar - é que tem coragem de afirmar que não existe violência nas escolas).
Este caso só é mais importante do que outros porque apareceu em vídeo, e foi levado à televisão, e agora sim, agora sabemos finalmente que a violência existe!
O pior é que isto não tem apenas a ver com uma aluna, ou com uma professora, ou com uma escola, ou com um estrato social.
Isto tem a ver com qualquer coisa de muito mais profundo e muito mais assustador.
Isto tem a ver com a espécie de geração que estamos a criar.
Há anos que as nossas crianças não são educadas por pessoas. Há anos que as nossas crianças são educadas por ecrãs.
E o vidro não cria empatia. A empatia só se cria se, diante dos nossos olhos, tivermos outros olhos, se tivermos um rosto humano.
E por isso as nossas crianças crescem sem emoções, crescem frias por dentro, sem um olhar para os outros que as rodeiam.
Durante anos, foram criadas na ilusão de que tudo lhes era permitido.
Durante anos, foram criadas na ilusão de que a vida era uma longa avenida de prazer, sem regras, sem leis, e que nada, absolutamente nada, dava trabalho.
E durante anos os pais e os professores foram deixando que isto acontecesse.
A aluna que agrediu esta professora (e onde estavam as auxiliares-não-sei-de-quê, que dantes se chamavam contínuas, que não deram por aquela barulheira e nem sequer se lembraram de abrir a porta da sala para ver o que se passava?) é a mesma que empurra um velho no autocarro, ou o insulta com palavrões de carroceiro (que me perdoem os carroceiros), ou espeta um gelado na cara de uma (outra) professora, e muitas outras coisas igualmente verdadeiras que se passam todos os dias.
A escola, hoje, serve para tudo menos para estudar.
A casa, hoje, serve para tudo menos para dar (as mínimas) noções de comportamento.
E eles vão continuando a viver, desumanizados, diante de um ecrã.
E nós deixamos
O episódio da "Professora Pequenina e da Aluna Matulona" num repente encheu os noticiários e pôs todos os comentadores de acordo. A primeira impressão foi de horror perante a violência, o ódio e a solidão a que aquela heróica professora esteve sujeita. Depois compreendemos que esta cena, filmada "em directo da sala de aula", foi só o último episódio do "Descalabro da Escola Pública". Uma novela que dura há trinta anos, produzida e dirigida pelos 25 Ministros de Educação do Bloco Central.
Depois de tantos ministros e de tantas reformas, como é que a escola chegou a este estado?
SINTOMAS:
Há décadas que os sintomas se vão agravando, de governo para governo, de ministro para ministro e de reforma para reforma:
1. a sala de aula a transformar-se num "campo de batalha" onde o professor se confronta diáriamente com 30 alunos, que manifestamente o odeiam!
2. as vítimas da agressão, professores e auxiliares, a preferirem CALAR e a não accionar os procedimentos apropriados!
3. o aproveitamento escolar a cair para níveis nunca vistos!
4. o governo a oferecer subidas de notas automáticas, cursos recorrentes, habilitação de competências, isenção de horário (diploma para o engenheiro das maisons)!
5. os estudantes totalmente desinteressados dos estudos!
6. a escola pública para os pobres e a escola privada para os ricos!
7. as "matilhas" chefiadas por animais dementes, em praxes de crueldade, tortura e depravação!
DIAGNÓSTICO:
Como causas da doença acusam-se todos os parceiros:
* a falta de autoridade dos professores;
* a falta de preparação dos professores que "provocam" a agressividade dos alunos;
* a difícil população dos bairros pobres e também a difícil população dos bairros ricos;
* a falta da educação pelas famílias, a violência familiar e a destruição da família tradicional;
* a falta de amor na família e na sociedade;
* a falta de religião e moral;
* a agressividade dos jogos e da televisão;
* a criminalidade que vem de fora da escola ou a criminalidade que flui da escola para fora, conforme se queira;
* a falta de psicólogos nas escolas;
* a difícil instrução dos processos disciplinares e aplicação das penas;
Para o diagnóstico todos têm parte da razão, mas para a cura todos caem no mesmo erro: Atacam os sintomas em vez de atacar a doença.
TERAPIA:
Porque é que o governo tentou várias vezes apagar o filme no YouTube?
Porque castigaram tão duramente o aluno que filmou a cena?
Se a cena não fosse filmada e publicada no YouTube, alguém se teria preocupado com o assunto?
A suspensão dos alunos vai acabar com o mal?
Mais uma vez vem ao de cima o embuste, o imenso cinismo, a falta de seriedade, a longa mentira que vai desde a "imagem que vendem de si próprios" até à governação que efectivamente praticam:
1. Manifestam-se "escandalizados" com a agressão;
2. Anunciam medidas draconianas;
3. "Matam" o mensageiro;
4. E varrem para baixo do tapete;
E com cada episódio de violência a escola desce mais um degrau, rumo ao inferno.
Há imensos exemplos que demonstram este procedimento típico do Bloco Central, recordemos apenas três, bem conhecidos:
1. O professor universitário agredido e perseguido pelo cábula que chumbou e o reitor diz que "nada pode fazer"!
2. O professor alcoólico que viola uma menor de 13 anos, na sala de aula e que continua impunemente a dar aulas!
3. As crianças da Casa Pia, entregues ao cuidado do Estado, que são violadas, drogadas, compradas e vendidas, pelos próprios responsáveis da confiança do governo nomeados para cuidar delas, ainda impunes, que arrastam o julgamento e depois ainda alteram o código penal para melhor proteger os criminosos!
É vulgar dizer-se que a escola pública é uma imagem da sociedade:
- na crise de valores
- na criminalidade e a violência
- na corrupção e a impunidade
As tristes imagens a que tivemos o privilégio de assistir são resultado:
- de muitos anos de "varrer para baixo do tapete", de laxismo e de cinismo;
- da perda de valores humanos, sociais e cívicos;
- de corrupção dos usos e dos costumes;
Dentro e fora da escola!
O Bloco Central está a chocar os "ovos da serpente". Estes alunos ambiciosos, cábulas, que sabem o que querem, que não olham a meios, chefes de matilha sem respeito por quaisquer valores humanos, têm o perfil da "má moeda" que manda no Bloco Central e no país. De que matriz saiu o Primeiro-ministro?
A educação dá-se em casa.
A Escola transmite Conhecimento.
Os pais educam.
Os professores ensinam.
Quem quiser obrigar os professores a serem pais não é uma coisa nem outra.
É um palhaço ou um criminoso
A situação que se vive no ensino básico, hoje em dia, é dramática.
Quando escolhi ser professor – e eu escolhi mesmo sê-lo, porque desisti de uma carreira na indústria para me dedicar ao ensino – não escolhi ser polícia, advogado ou lutador de wrestling.
Decidi ensinar, na suposição de que iria encontrar crianças e adolescentes que queriam aprender.
E, nos anos 80 e 90 foi isso que encontrei.
Não digo que já não houvesse maus alunos.
Em cada turma havia 2 ou 3 que se recusavam a aprender.
Outros que me diziam, logo à partida, que o meu esforço e investimento neles seria em vão, porque nunca tinham conseguído sucesso a matemática.
Dava-me uma especial alegria vê-os, depois, conseguir superar as dificuldades e transformar o costumeiro 2 num 3 e até num 4.
Mas isso eram outros tempos.
A esmagadora maioria dos alunos queria aprender e passar com boas notas.
Nos últimos 3 a 4 anos a degradação do ambiente escolar tem sido chocante.
Pelo que leio, esse fenómeno é geral.
Pode ser que isto seja uma vaga negativa que venha a ser substituída por uma outra mais positiva, mas não acredito muito nesse optimismo dado o comportamento e o tipo de atitudes revelado pelos miúdos que, de ano para ano, nos entram na sala de aulas.
São em número crescente os miúdos que nos chegam à escola sem regras comportamentais absolutamente nenhumas.
Como se tivessem vindo directamente da selva. Ora isso é preocupante, pois eles já entram ali no 5ª ano. Já passaram 4 noutra escola e mais 2 ou 3 num jardim de infância. E pior: os que entram com alguma educação – leia-se “regras comportamentais de convivência em sociedade” - depressa a perdem contagiados pelos que nunca a interiorizaram.
O sistema falha a todos os níveis.
Os pais cada vez têm menos tempo para “perder” com os miúdos em casa.
Fruto da voragem dos dias, os que estão desempregados estão desmoralizados porque nunca mais encontram emprego e o dinheiro falta, os que trabalham cada vez têm que trabalhar mais e até mais tarde para manterem o posto de trabalho. Não sobra disponibilidade para com as crianças que crescem ao sabor da televisão e da rua – os mais pobres – e ao da playstation e do msn – os mais “sortudos”.
Os pais perderam a disponibilidade e a paciência – à noite, já cansados – para conversarem com os filhos.
Uma grande parte dos pais demitiu-se mesmo da obrigação do acompanhamento da vida pessoal e escolar dos filhos.
A escola que trate deles.
E, de facto, a Escola já os alimenta e os entretém.
Só falta vesti-los e lavá-los.
E já nem isso falta, em muitos casos.
Para muitos pais, a Escola devia estar aberta até à hora de jantar e de preferência devia dar-lhes o jantar também. E a dormida, porque não? E ao fim de semana levá-os a passear.
De facto, a escola devia era manter dentro de muros os alunos durante todo o ano, como antigamente acontecia nos seminários e nos colégos internos.
E os pais, no Natal, entre o fim de uma novela e o início da próxima e no defeso da época futebolística iam lá vê-los para fiscalizar se está tudo bem e poderem, eventualmente, processar a escola se esta não ministrasse, aos seus “educandos”, as doses de amor e carinho devidamente estipuladas no regulamento interno.
Essa era a escola ideal para os nossos dias, pelos vistos.
Mas essa escola não existe.
Então o que é que existe?
Existe uma escola tradicional frequentada por miúdos provenientes de famílias em grande sofrimento e sem disponibilidade para eles.
Pais que se recusam a ir à escola mesmo quando para isso intimados por carta registada com aviso de recepção.
Porque já não suportam ser confrontados com mais problemas. Querem é que lhe aliviem alguns.
Pais que, antes que a Directora de Turma possa abrir a boca, já estão a pedir roupa, comida ou qualquer coisa que ela tenha lá em casa e de que não precise.
Pais de miúdos que, no 5º ano de escolaridade, com apenas 11 anos, vivem sem regras e por isso já não respeitam ninguém.
Qual a resposta da Escola a esta nova realidade?
A mais fácil: inventar atabalhoadamente e em catadupa turmas de currículos alternativos. Turmas para onde se segregam crianças cujo grau de desenvolvimento sócio-cultural é o de simplesmente não conseguirem ler com 14 e com 15 anos. E alunos destes são aos milhares por esse interior fora!
Trata-se de crianças e adolescentes absolutamente retardados (ainda não tenho medo das palavras), dir-se-ia expostos a algum tipo de radiação ou doença que lhes tolheu toda e qualquer possibilidade para aprenderem o mais básico de entre o mais comum.
E o que mais me choca é o número galopante de miúdos nestas condições!
De onde vem esta gente?
Que lhes terá acontecido para ficarem assim, num nível intelectual tão empedernido?
Vêm das aldeias para a cidade.
O que lhes aconteceu , não sei.
Nem vejo nenhum assistente social – dos 800 que se acotovelam em reuniões sucessivas em tudo o que é sítio - minimamente preocupado com isso.
Tenho é a impressão de que nem no tempo da fome, da 2º grande guerra , se verificou um grau de subdesenvolvimento comparável nas crianças aqui à volta de Ponte de Sôr.
Na minha Escola existem casos dramáticos de alunos que sobrevivem em condições precárias em seio familiar que não lhes proporciona as mínimas condições de dignidade Humana, nem são acompanhados por qualquer organismo oficial.
Alertei para esse facto os órgãos competentes.
Alguns mostraram-se muito sensíveis ao problema e não percebeuram porque não tinha conhecimento detes casos.
Eu explico-lhe: porque as escolas não os reportam.
Abafam-nos, mantendo as crianças e as famílias a passar mal, quando a Segurança Social, logo ali ao lado, disponibiliza, por Lei, programas de ajuda e de socorro a famílias e jovens carenciados.
O subdesenvolvimento no interior começa nas famílias, é certo, mas não termina nelas.
Os professores não são pais dos alunos.
Os professores só são Pais dos seus filhos.
Eu tenho 1.
Não tenho 70.
Ninguém pense que eu me vou substituir aos 140 pais dos meus 70 alunos.
Matar o mensageiro
«Vídeo: aluno que filmou transferido.»
Como sempre, nos regimes "pequeninos", mata-se o mensageiro. Se o vídeo não tivesse sido feito e, muito principalmente, se não tivesse sido colocado no youtube, nem passado nas tv's, tudo estaria bem e as pacíficas "escolas" do rectângulo, geridas pela dona Lurdes e pela dona Margarida, ambas senhoras com provas dadas de eficiência, capacidade e labor, eram sítios paradísiacos e funcionavam quase tão bem como na finlândia...
PORQUE SERÁ QUE PASSAM O TAMPO A COMENTAR OS PROBLEMAS DAS ESCOLAS DO PORTO, LISBOA, ETC..... COMENTEM E PREOCUPEM-SE COM AS CRIANÇAS E ESCOLAS DA CIDADE. NÃO ACHAM BOA IDEIA!!!
Então as escolas da cidade não são "muito boas"??????????????
Segundo os comentadores do post anterior a este vai tudo bem nas escolas da cidade??????????????
É tudo bom?????????????????????
A comida é feita na cantina??????
O aquecimento é muito bom?????????
O parque desportivo escolar é do melhor??????????????????????????
As casas de banho são do melhor??????????????
Tudo é bom????????????????????????
Ou será que é tudo uma grande m...?
NÃO SEI SE TUDO VAI BEM, SE ALGO VAI MAL OU SE TUDO ESTÁ MAL...QUEM SABE É QUE DEVE COMENTAR... POIS COM O BEM ESTAR E SEGURANÇA DAS NOSSAS CRIANÇAS NÃO SE DEVE BRINCAR
É verdade o tal "estatuto" não faz sentido, é confuso e os seus destinatários não irão compreendê-lo, a não ser que contratem juristas, Ah! Ah! Ah!
A violência existe nas escolas porque falta a autoridade e o castigo que seria devido por mau comportamento, indisciplina e até mesmo delinquência.
A maioria das crianças e jovens pode ser corrigida de qualquer desvio através de uma simples conversa, mas basta um "rebelde" para boicotar uma aula e para arrastar consigo outros que não levantariam qualquer problema. Os mais humildes são as primeiras vítimas e a escola não tem hoje maneira de as proteger.
Não havendo a possibilidade de castigos físicos, que castigos aplicar então nas escolas? A expulsão da sala de aula ou da escola apenas transfere o problema para outra escola ou para o exterior da escola. Esses jovens irão dar azo à sua liberdade doentia noutro lugar. A expulsão da sala de aula não poderá ser aplicada aos mais novos e uma simples palmada no rabo seria por vezes suficiente.
Como não se podem aplicar quaisquer castigos físicos, muito úteis até certa idade, e na falta de outros que sejam realmente eficazes: resta a impunidade que serve de incentivo para o desenvolvimento deste fenómeno. Eu, no meu tempo de escola fui castigado algumas vezes, mas nunca por mau comportamento, com algumas palmadas e não fiquei traumatizado por isso, nem conheço quem tenha ficado. Pelo contrário, acho que foram úteis e me levaram a fazer os “trabalhos de casa”, que de outra forma ficariam sempre esquecidos pela brincadeira com os outros rapazes. Os castigos físicos eram bem tolerados pelos pais de todas as crianças e não consta que fossem piores pais do que os actuais.
Quando falo em castigos físicos, refiro-me a umas palmadas no rabo, na mão ou até umas reguadas até cerca dos 10, 12 anos de idade, o que é suficiente para moldar o comportamento do jovem para com o professor. Quaisquer castigos físicos não deverão ser aplicados nas escolas a partir daquelas idades. Se o mau comportamento persistir, então os jovens terão que ser encaminhados para "Casas de Correcção" ou lá como lhes queiram chamar. Aí deve ser feito um trabalho de socialização dos jovens, incutindo-lhes regras éticas, sociais e hábitos de trabalho. Deverão estar sujeitos a regras, como o levantarem-se e deitarem-se a uma hora certa, tratarem eles próprios das suas necessidades pessoais, como fazerem a cama e outras tarefas. As actividades escolares e a preparação para uma vida profissional deverão estar incluídas. As actividades de lazer devem ser permitidas só em dias definidos e ser canceladas em caso de castigo.
Se nada mudar nas nossas escolas, continuaremos a criar cada vez mais seres insociáveis que apenas farão o que lhes dê prazer, que nunca se habituarão a cumprir regras, pelo que serão uns inúteis e viverão sempre à custa do trabalho alheio porque é mais fácil.
Mas os castigos físicos são por ora condenados pelas nações ocidentais, pela EU e pelo nosso país. Assim, as mudanças terão que ocorrer primeiro em países como os EUA, UK, França..., onde o problema da delinquência não é novidade. Portugal, nisto, como noutras matérias seguirá depois o exemplo. Os pais irão então aceitar a alteração e compreender a necessidade para a protecção até dos seus próprios filhos que são as primeiras vítimas dos poucos jovens delinquentes.
Há quem diga que tudo se resolve se os pais derem educação aos filhos. Pergunto: e quando os próprios pais não a têm, como podem ministrá-la aos filhos?
Zé da Burra o Alentejano
O sr. Presidente da República, a fazer fé nos jornais, depois de regressado de uma ex-colónia, em 'estado de choque' com a 'violência' nas escolas, chamou, ou vai chamar, o sr. Procurador Geral, para uma conversa de pé de orelha. Entretanto, o mesmo PGR, sorridente e babado, pôs-se - durante o fim de semana - em bicos de pés, puxando dos galões por, há uma série de meses ter falado na violência nas escolas como uma área de intervenção prioritária da... PGR.
Infelizmente nem Cavaco, nem o tal senhor sorridente, do Palácio de Palmela, perceberam ainda a dimensão - real e verdadeira do problema. Em 99,9% dos casos não é um caso de polícia, ou - sequer de associação criminosa, ponto. São somente casos gritantes de falta de educação, civismo, valores e princípios, que os jovens não recebem em casas das famílias, e que a escola - e a classe docente - não sabe, e não está preparada - e vocacionada - para dar.
Ao fazer a figura que fez - avalizando a vaidade fútil de um PGR que pura e simplesmente não percebe qual o papel de uma magistratura e de um Ministério Público - Cavaco demonstra que pelo menos numa área - nos últimos 25 anos não apreendeu, nem evoluiu rigorosamente nada - A educação foi a sua mancha original no cavaquismo, e continua a sê-lo - agora. Mais, a prazo, Cavaco só contribui - en passant - para a degradação da imagem que a sociedade tem na Justiça -
ao assacar a esta uma responsabilidade que é - para variar - de facto impossível de cumprir.
Pior, adia uma reflexão séria e urgente - sobre este modelo de sociedade, e de família, que (não) educa os alunos que temos, alimentando a ilusão de que tudo não passam de meros casos de polícia, quando muitas vezes - por absoluta (in)acção e omissão os responsáveis primeiros são os pais, que pura e simplesmente se demitem das suas funções e aqueles que modelam um sistema educativo, o qual - pura e simplesmente - não esta adaptado àquilo que é a realidade dos dias de hoje...
António Barreto, sociólogo, um artigo notável, demolidor do nosso sistema de ensino e a propósito de um dos seus instrumentos legais, o actual Estatuto do Aluno. U
ma lei deste ano e que substituiu uma outra, entendida ainda como mais celerada, pelo próprio instrumento legal que a substitui.
Em conclusão, escreve:
" O estatuto é a consequência de uma longa caminhada e será, de futuro, o responsável imediato pela impossibilidade de administrar a disciplina nas escolas. O estatuto não retira a autoridade às escolas ( aos professores, aos directores, aos conselhos escolares). Não! Apenas confirma o facto de já não terem e de assim perderem as veleidades de voltarem a ter. O processo educativo, essencialmente humano e pessoal, é transformado num processo "científico", "técnico", desumanizado, burocrático e administrativo que dissolve a autoridade e esbate as responsabilidades. Se for lido com atenção, este estatuto revela que a sua principal inspiração é a desconfiança dos professores. Quem fez este estatuto tinha uma única ideia na cabeça: é preciso defender os alunos dos professores que os podem agredir e oprimir. Mesmo que nada resolva, a sua revogação é um gesto de saúde mental pública."
A questão colocada nos termos sugeridos, aponta para um problema básico e essencial que ainda ninguém resolveu discutir publicamente: quem é que fez este Estatuto?
Quer dizer, quem é que o redigiu, com base em que estudos e pareceres ou ideologia?
De onde provém esta enormidade legislativa e quem é que a assinou, como autor directo?
Esmiuçando: de onde vêm estas ideias, que segundo António Barreto se resumem a uma só, a de proteger os alunos indefesos dos professores agressores naturais, num mundo de bons selvagens?
Cheira-me demasiado a história da carochinha, com recurso a imaginários de lobo-mau e contos infantis, mas todas as fábulas têm uma moral escondida ou óbvia. E esta, não é clara nos pressupostos e nas finalidades.
Por isso, importa, quanto antes determinar, individualizar e fulanizar os autores deste aborto legislativo e de consequências graves para a saúde pública. Mental, segundo o sociólogo.
Sabendo nós que todas as leis têm paternidade directa, individualizada por vezes no singular, importa que se conheça publicamente o autor do monstro, para que possa ser capado na capacidade de reprodução legiferante.
No fim de contas, é uma medida simples e fácil, de higienização da vida pública, tal como Barreto defende, sem subterfúgio retórico.
Por vezes, tenho aqui apontado a escrita para a responsabilização ideológica do ISCTE, no processo legiferantemente ideológico.
Reconheço como injusta, tal atribuição em modo de bode expiatório e vou arrepiar caminho.
O ISCTE nacional ( que não se confunde necessariamente com outro, de repercussão internacional e virado precisamente para a Educação), é um viveiro de sociólogos, alguns de grande pacotilha e que nunca produziram um estudo decente e que todos possam ler, sem abandonarem a leitura ao fim de meia dúzia de frases.
Uma boa maioria das teses apresentadas por tais luminárias, destinam-se apenas a currículo incerto, para emprego certo em lugar de prestígio político.
Ainda assim, não merece o opróbrio da responsabilização pelo actual estado do ensino público.
Os seus investigadores, não dedicam, aliás, grande tempo de estudo, aos problemas do ensino.
Mas, dos seus formandos, já não se pode dizer o mesmo. E será por aí que é preciso indagar, acerca das ideias peregrinas que nos conduziram à catástrofe.
Em concreto: esta ministra, onde foi aprender as ideias que terá, sobre Educação?
Foi no ISCTE ou nos seminários tipo mba, da pobreza intelectual e portanto de pacotilha, como outros que por lá passaram?
Que ideias proliferam no ministério da Educação, actual e passado, capazes de produzirem estes monstros legislativos, assim mesmo julgados pelas leis que os vêm substituir e em relação aos quais, não há discussão pública, pormenorizada, nos nomes e influências?
Os críticos do sistema, apontam geralmente para vítimas que se julgam sempre inocentes e até escrevem livros de crítica ao sistema que serviram e ajudaram a construir.
Roberto Carneiro, Marçal Grilo, Ana Benavente, Veiga Simão, devem ficar sempre com as culpas, desta desgraça colectiva?
Não terão as costas demasiado largas para tanto?
Não fará um certo jeito, a alguns anónimos, celerados nas ideias e que logram sempre passá-las como moeda corrente e de alto valor fiduciário, para utilizar a imagem do cavaquismo pretendente?
Em resumo:
Como é que se gizam e organizam as leis de educação em Portugal?
Quem as redige e quem as leva a aprovação ministerial?
Houve comissões de redacção? Estudos prévios?
Quem fez parte das mesmas e quem ainda faz?
No final, saber de onde provém as propostas concretas, nomeadamente se são originais ou copiadas de algum modelo estrangeiro ou esquecido em alguma tese peregrina de aluno pretencioso, talvez valesse a pena.
Mesmo sem esperar pelo estudo, certamente completo, abrangente e esgotante, que um tal Pedroso anda a fazer, por conta do Orçamento de todos nós.
Os jornais podiam fazer tal indagação.
As revistas também.
Mas não tenho esperança de maior, neste projecto educativo
As aulas do terceiro período da Escola Carolina Michaëlis, no Porto, começam, por ordem da DREN, com uns minutinhos de "reflexão" e de "educação cívica". Também foi estabelecido que os telemóveis "apanhados" dentro das salas de aula serão confiscados. Quanto a isto, e depois do que se viu, quem é que terá coragem para confiscar telemóveis àqueles monstrinhos? De resto, é a mesma treta "pedagógica" e o experimentalismo a funcionarem. Não se fabrica "cidadãos" por passes de mágica. Muito menos se passa, de um dia para o outro, do jardim zoológico para a escola, sobretudo quando o experimentalismo e a "pedagogia" não têm feito outra coisa senão destruí-la. Não existe escola onde os professores têm medo de dar aulas.
Quando eu tinha a idade da “rapariga do telemóvel” não havia telemóveis. Frequentava o que então se chamava de “liceu”. Diziam que eram precisas referências e no discurso oficial elas eram Deus, a Pátria e a Família. Eu ligava pouco a isso num registo teórico distante, mas tinha as minhas referências. Aconchegantes. A minha casa, os meus professores e os meus amigos.
Nessa altura, uma fatia dos meus colegas lembrou-se de chamar ao “liceu” Amílcar Cabral. Outra fatia respondeu chamando ao “liceu” António de Spínola. Houve uns estalos e umas vaias quando alguns de nós participaram num concurso televisivo entre “liceus” que se chamava “Taco a Taco”. Os iluminados, de esquerda, diziam que o concurso visava legitimar o regime. Os não tocados por essa luz, de direita e de coisa nenhuma, só se queriam divertir vencendo os “liceus” rivais. Era um mundo pequeno, um porto de abrigo. Sem grandes rasgos mas também sem grandes riscos. Fiquei para ver o desaparecimento de duas palavras que nunca mais foram usadas. Essas palavras não foram banidas por serem de direita, porque os de esquerda também as praticavam. Essas palavras morreram porque se esvaíram e não passa pela cabeça de ninguém das “escolas secundárias” que pudessem ter existido. Essas palavras eram duas e diziam-se “temor reverencial”. Que era o que, por exemplo, os alunos tinham perante os professores. Não era pânico, nem sequer medo em estado puro. Era respeito. Seguido de reverência. É verdade que os professores contribuíam porque se davam ao respeito. Mas tudo isso são coisas do passado e retórica bafienta.
Hoje, no admirável léxico novo das “escolas secundárias”, mais as “C+S” e outras siglas incompreensíveis, onde aos professores cabe “motivar” os alunos, onde se preenche fichas novas com técnicas novas, onde se deve “aprender a aprender”, “aprender a ser”, “ser e aprender” e outras notáveis conjecturas, há um pobre de um professor, manifestamente fora de água, que revela esta coisa gloriosa: “nas minhas aulas os alunos recebem e enviam mensagens pelo telemóvel, ouvem música nos leitores de MP3, vão à casa de banho, à secretaria e onde querem aos quartos de hora, conversam uns com os outros, enfim, fazem o que querem. Qual é o meu papel? Apenas um, mantê-los mais ou menos sossegados durante hora e meia”. A “ditadura do aluno”, de há muito instalada, traduz-se na ideia fixa de que as regras são feitas, na prática, pelos alunos e, em todo o caso, são feitas em proveito dos alunos e não tanto em vista da sua aprendizagem. As regras são feitas com o objectivo estatístico da passagem, cumprida a rota do facilitismo instalado. Os próprios professores são muitas vezes coniventes porque acham que não são pagos para se maçarem e o melhor é deixar correr. É nesta admirável bolha que se conhece, da boca do PGR, que “se soubessem a quantidade de faxes que eu recebo de professores a relatarem agressões” e se precisa, na letra dos jornais, que no último ano lectivo foram agredidos 185 professores. Face ao que o secretário de Estado da Educação vem insurgir-se contra “a imagem de que as escolas são o caos”. Pois, são lá agora! Caos seria se “a velha”, tivesse morrido. E se a outras “velhas” e “velhos” lhes acontecesse o mesmo. Aí sim, seria preocupante. Ora não estamos aí. Caos seria, também e bem pior, se os telemóveis não funcionassem direito. Ou se o MP3 avariasse. Se não se pudesse marcar encontros com as namoradas “para fazerem sexo nas casas de banho”. Aí sim, seria preocupante. Ora não estamos assim. Os telemóveis funcionam, o MP3 também e os encontros florescem tranquilos.
Dizem ser fácil comparar a situação do ensino público e do privado. Pois é. Fácil, mas justo. Porque se a “rapariga do telemóvel” andasse numa escola privada e tivesse feito o que fez tinha o caminho traçado no minuto seguinte. E desde a rua, pelo lado de fora, podia perguntar-se, se alguma réstia de angústia lhe restasse naqueles neurónios, se é bom viver assim. Viver assim é viver na bolha das novas tecnologias. As que substituem a família e os amigos. As que fazem das manhãs e tardes uma televisão e das noites uma Internet. As que fazem viver virtualmente. As que fazem viver para o YouTube. Se Portugal vivesse a vida real, o caso da “rapariga do telemóvel” só podia ter um desfecho, para lá do óbvio para a própria: a demissão imediata de toda a equipa governativa da educação.
O telemóvel na selva
Será que vamos ficar a saber o que se passa dentro das escolas portuguesas através dos telemóveis, do YouTube e, logo a seguir, das televisões? Tudo começou com a já famosa e triste cena na escola Carolina Michaelis, no Porto, em que uma adolescente de 15 anos arrancou à força o seu telemóvel das mãos de uma professora. Dias mais tarde, numa aula de Economia de outra escola, um grupo de alunos berrava e batia furiosamente nas carteiras para impedir um professor de falar.
Com a difusão generalizada, entre os estudantes, dos telemóveis e gadgets electrónicos, não será surpreendente que a tendência se propague numa onda de contágio imparável até chegarmos a um efeito próximo dos ‘directos’ televisivos, alimentando um voyeurismo que começa nos espectadores imediatos de cenas indecorosas e se repercute nos espectadores em geral.
Os primeiros estarão provavelmente mais excitados com o poder exibicionista de divulgar pela net o espectáculo a que assistiram (e onde eventualmente participaram) do que predispostos a questionar-se sobre o seu papel nessa cena e o significado do que aconteceu. Quanto aos segundos, talvez se mostrem mais propensos a ficar incrédulos e a barafustar contra o escândalo do que em reflectir sobre os motivos desse escândalo – e em que medida eles próprios, enquanto pais, educadores, políticos, cidadãos, são também responsáveis por ele.
Na verdade, o que há de verdadeiramente original nestas cenas não é elas acontecerem agora – mas poderem ser registadas e difundidas quase em tempo real. O que há de novo é o voyeurismo: o telemóvel e, eventualmente, uma qualquer câmara miniatura que capta algo que antes ficava encerrado no segredo (e nos medos) das quatro paredes de uma sala de aula.
A novidade é que já não é possível fingir que não se sabia, remetendo esse desconhecimento para uma distância confortável, anódina, estrangeira – tal como quando somos confrontados com as imagens insuportáveis de um massacre absurdo no campus de uma universidade americana. Estamos ainda longe disso, é certo, pelo menos à primeira vista, mas as sementes da violência nas escolas massificadas de hoje estão dispersas um pouco por toda a parte – e, também, naturalmente, na nossa sociedade.
O problema maior é que levámos demasiado tempo a acordar para um fenómeno cujas raízes são já antigas – e, por isso, somos agora forçados a ver aquilo que persistimos em ignorar ou a supor longe de nós, apesar dos sinais evidentes da sua proximidade. A passagem da velha escola elitista e autoritária à escola democrática e massificada foi um caminho feito sem reflexão e sem soluções (pedagógicas, institucionais, sociológicas, espaciais) à altura dos desafios que essa transformação colocava.
Não espanta, portanto, que perante a irrupção violenta de uma realidade longamente recalcada se manifestem hoje, entre nós, duas atitudes diametralmente opostas mas convergindo numa idêntica cegueira: a primeira celebra a nostalgia do velho autoritarismo salazarento e de uma disciplina de caserna típica de alguns internatos; a segunda insiste na condescendência com os abusos e a recusa da autoridade, invocando motivos socioeconómicos, culturais e afectivos para explicar (e desculpar) toda a sorte de comportamentos desviantes.
Eis um exemplo elucidativo de como os extremos se tocam e se mostram igualmente impotentes. Se a escola se tornou palco de um mal-estar tão profundo e disseminado – desde a crise de autoridade dos professores à crescente degradação dos resultados pedagógicos, passando pela aridez dos equipamentos – é certamente porque existem males de raiz por superar. Mas isso não se consegue fazendo das escolas um sucedâneo de quartéis ou um prolongamento de jardins de infância. Como se a autoridade se confundisse fatalmente, num caso como noutro, pela positiva ou pela negativa, com autoritarismo.
É indispensável assegurar a autoridade e dignidade dos professores, a responsabilização dos alunos (e famílias), a repressão dos comportamentos contrários à normalidade escolar e cívica. Mas para que isso não se traduza apenas em votos piedosos é preciso que a escola deixe de ser uma selva massificada, desqualificada, caótica, um espaço onde prospera exactamente o contrário daquilo que a escola deve proporcionar.
A partir do momento em que os professores temem assumir a sua própria autoridade – seja por receio de ela poder ser confundida com autoritarismo, seja por puro e simples medo de represálias – o sentimento de irresponsabilidade, de impunidade, de primitivismo selvagem tende a ocupar o vazio. Não terá sido por acaso, aliás, que a professora agredida por uma aluna por causa de um telemóvel só se queixou à direcção da sua escola depois de o caso ter sido divulgado na net. É decerto um caso entre muitos, já que os professores não têm de ser heróis, e ninguém, de resto, lhes agradece nem paga para isso numa sociedade onde a escola massificada reflecte a mais corrosiva das crises pedagógicas: a dos valores.
Dir-se-á que, apesar de tudo, este caso pode ter um efeito pedagógico exemplar, uma vez que as imagens difundidas pelo YouTube funcionarão como prova contra um acto de violência que, assim, não ficará impune. Mas é um efeito perverso e puramente intimidativo. O medo, o temor do castigo, não dispensam a compreensão – e a interiorização – do erro. Por mais que possa parecer uma doce ingenuidade, é isso o que diferencia uma sociedade policiada de uma sociedade com regras de convivência e respeito verdadeiramente assumidas, democráticas. E é também por isso que importa construir a diferença entre a escola e a selva – ainda que com telemóveis e YouTube.
Vicente Jorge Silva
No:"SOL"
Se repararmos na Natureza, nas comunidades de animais há sempre os que procuram e se tornam líderes dentro dessas comunidades, mas para atingir o estatuto testam os seus iguais e lutam com eles para se imporem e atingir a posição de líder; outros há que não chegam ao topo, porém estabelece-se uma hierarquia que é respeitada por toda a comunidade até que apareça um novo líder: normalmente um elemento mais jovem e robusto que consiga destronar o líder anterior.
Nos seres humanos passa-se exactamente o mesmo e é observado nos empregos, nos clubes, nos partidos políticos, nas escolas e até em nossas casas. Até de entre os que seriam em princípio iguais há líderes. O poder e a liderança ganha-se suplantando iguais e concorrentes, mas também é preciso exibir essa qualidade aos restantes membros do grupo para que o líder seja por eles reconhecido e respeitado. Então, como chefe poderá beneficiar de privilégios vários que me escuso de enumerar.
A delinquência e violência mais grave que se observa nas escolas trata-se precisamente do processo de luta para atingir, exibir e ganhar o estatuto na escala da liderança sobre colegas, professores e funcionários e se atingida essa posição há que mantê-la, demonstrando-a diariamente porque há sempre um aspirante a líder à espreita.
Assim, quem defende que a escola deve funcionar como uma “democracia” está completamente enganado: 1.º) A escola nunca poderá ser uma democracia porque o aluno candidato a líder vai por à prova o seu professor (ou outro funcionário) para tentar dominá-lo e mostrar aos seus colegas a sua capacidade de liderança e isso não pode acontecer, o professor nunca pode deixar-se ultrapassar pelo aluno. Em muitos casos isso já aconteceu e eis a razão porque a mesma turma respeita um professor e não outro; 2.º) As verdadeiras democracias também não existem, nem entre nem dentro dos próprios partidos, existe sim muita luta por liderança entre partidos e dentro dos próprios, aliás como em qualquer outro lugar em que haja o exercício do poder. Para se ao topo há que ultrapassar muitas barreiras e os adversários ficarão sempre à espreita para depor o líder logo que seja oportuno.
Os nossos filhos começam desde tenra idade a testar-nos para verem de que forma conseguem aquilo que desejam: choram, berram, batem o pé, chegam a bater-nos: começam com um sacudir de mão, depois uma palmadinha e se não os paramos em breve crescerá a sua ousadia. Os pais sabem!
Zé da Burra o Alentejano
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