sexta-feira, 5 de setembro de 2008

FÁBRICAS DE OCIOSOS INÚTEIS

Dificilmente acreditamos no discurso político.
Esvaziados de ideologia (com excepção do PCP), desprovidos de convicções, reeditando o rotativismo suicida do século XIX, o PSD e o PS não são carne, nem peixe, nem arenque vermelho: apenas uma teia reticular de interesses e de cumplicidades.
Conduziram-nos até ao nojo da política.
Secaram as mais módicas assunções de civismo.


Serviram de péssimo exemplo aos mais novos.
Aqueles sinistros agrupamentos de jotas mais não são do que máquinas de produzir inutilidades.
Repare-se nos trajectos de antigos dirigentes juvenis de ambos os partidos.
A canseira que acumulámos é proporcional ao exercício do ócio praticado por aquela gente.

É natural que desconfiemos de tudo e de todos, no que se refere a política. Os exemplos são propícios a duvidar da virtude.
O recente caso de Paulo Portas, que ocultou, durante um ano, o pedido de demissão do seu vice, Luís Nobre Guedes, e o silêncio deste sobre o assunto, é significativo.
Aliás, parece que o silêncio se tornou a regra da arte.
Sócrates emudece quando se trata de esclarecer as origens da onda de violência que varre o País.
Manuela Ferreira Leite reserva, para o próximo domingo, dia do encerramento, em Castelo de Vide, da Universidade de Verão do PSD a revelação da excelsa grandeza das suas ideias.
A pátria, expectante e a arquejar, está de joelhos.
Até lá, até se chegar a esse domingo luminoso, em que a verdade fundamental será dita como um sacramento, os cem jovens inscritos nos cursos, terão de se contentar com aqueles graves senhores que lhes falam das venturas do porvir, consubstanciadas na admirável social-democracia do estimável partido.
Na falta do gracioso intermezzo que lhes seria certamente proporcionado pelo alto sentido de humor do prof. Marcelo, escutarão, com embevecido assombro, o verbo eloquente do imenso socialista António Vitorino, que não está ali por engano.

O panorama permite-nos admitir que estamos perante uma cegada.
A própria estratégia do silêncio, da dr.ª Manuela Ferreira Leite, configura uma situação mais próxima do folclore que se censura do que da reflexão que se reclama.
Naturalmente, há casos de escrúpulo e de pudor.
Não os encontro na política.
Mas conheço alguns em literatura, embora raríssimos, seja dito.
A verdade, no caso vertente, é que a mudez da chefe do PSD devia ser correspondida pelo seu staff.
Sucede, rigorosamente, o contrário: os que têm falado só têm dito disparates e tolejos.
A ideia de que o pensamento recatado é uma demonstração de seriedade, não conduz a parte alguma.
A política, enquanto tal, é o exercício da relação com o outro, e, em princípio, a prática de um diálogo só interrompido pela arrogância – ou pela fragilidade, aliás, o esconderijo da arrogância.

A chamada reentrada nada traz de novo.
Exactamente porque os partidos de poder deixaram de se comprometer com os problemas do nosso tempo.
Os outros, retomam a interpretação partidária, por vezes engraçada e maliciosa, outras, repetitivas sobre o problema da relação entre fins e meios na política.
Não há debate, não há polémica, não há empenhamento no uso de uma doutrina, de um projecto, de uma dinâmica.
O mundo mudou e as chamadas sociedades modernas ainda não encontraram resposta.
O neoliberalismo não encontra resistência, nem crítica, nem sistema de ideias que, pelo menos, o conteste com seriedade e lucidez.
As reacções são meramente emocionais, quando não provocam o mais sonoro dos bocejos.

O aparecimento de uns vagos preopinantes de Direita pareceu, inicialmente, possibilitar uma interessante agitação.
Tudo se resume a uma espécie de comentário jocoso, pouco original, inspirado no estilo de Vasco Pulido Valente, com pequenas e grotescas citações de autores anglosaxónicos.
A diferença é que Pulido leu e lê, está atento à lazeira da pátria, e as suas grandes referências intelectuais encontram-se no chão cultural do século XIX português.
O homem é um chato, um enfadado, há quarenta e tal anos que assim é. Porém, é um prosador de recorte, sobretudo quando é injusto na apreciação, o que, curiosamente, o torna mais atractivo, por mordaz.
Todavia, até ele, neste momento, me parece um pouco fatigante, pela não oculta tendência em defender o indefensável: a dr.ª Manuela Ferreira Leite.

Nada nos encaminha para o júbilo.
Tudo nos empurra para o desencanto. E, no entanto, é preciso acreditar que as coisas não podem permanecer, eternamente, nesta estrebaria moral. Depois do 25 de Abril, um grande poeta, Pedro Tamen, escreveu um poema lindíssimo, que continha este verso: Agora, estar.
A festa não durou muito.
Não tivemos força para impedir o regresso do reino cadaveroso.
O que por aí se vê não é o resultado de uma vitória sobre a anarquia.
É um monte de escombros, sob o qual ficou soterrado o mais exíguo sonho de felicidade.

APOSTILA – Lemos as listas dos best sellers (o Alexandre O’Neill chamava-lhes as bestas céleres), e já não nos surpreendemos com o rol de futilidades, de estropícios literários, de imbecilidades programadas que suscita o interessa (e a compra) do português.
Não há uma, escassamente uma, minimamente uma só obra daquelas que marcam pela qualidade.
Contudo, há-as.
São devoradas pela onda de criminalidade literária.
Desejo, somente, referir: Portugal na Espanha Árabe, de António Borges Coelho, Editorial Caminho. É a terceira edição de um monumental trabalho de investigação e de amor, composto de quatro volumes e, agora, reunido num só tomo. Borges Coelho é um dos maiores historiadores portugueses de sempre. Como o seu escrúpulo e o seu rigor nada têm a ver com a feira de vaidades em que se transformou o nosso meio cultural; e a ignorância e o descaso adquiriram carta de alforria nos media – o nome de António Borges Coelho raramente é referido. Porém, é um intelectual de alto coturno, um português raro, um professor que a Universidade aclamou.
Este Portugal na Espanha Árabe ensina-nos muito daquilo que somos, e da importância da cultura muçulmana no desenvolvimento da nossa própria compleição cultural. Depois, é escrito num idioma de lei.
Tudo a concorrer para que os meus Dilectos adquiram este extraordinário texto. E se os jovens da Universidade de Verão do PSD frequentassem as páginas deste volume aprenderiam, certamente, muitíssimo mais do que com aquilo que ouviram e vão ouvir.


B.B.

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1 Comments:

At 6 de setembro de 2008 às 13:25, Anonymous Anónimo said...

Ao contrário do que por aí se tem comentado, não partilho da opinião de que o silêncio da actual liderança do PSD seja uma estratégia política, talvez o seja mas apenas porque é a que mais se adequa ao perfil e aos afazeres pessoais dos seus membros. Manuela Ferreira Leite, António Borges, são gente que nunca ficou com grandes calos na mão a colocar tijolos no edifício do PSD, isso é trabalho dos militantes porque eles são os “eleitos” que acham que devem governar por avaliação curricular, as eleições não passam de um maçada feita de sondagens e actos eleitorais.

Manuela Ferreira Leite passou de modesta directora-geral a ministra porque era amiga pessoal de um Cavaco Silva que era tão desconhecido como ela, nunca fez grande trabalho partidário, a sua passagem pela distrital de Lisboa do PSD passou despercebida, marcou o início das lideranças pobres nessa importante estrutura do PSD. Ao optar pela ausência e pelo silêncio Ferreira Leite mata dois coelhos com uma cajadada, evita o mau cheiro da massa de militantes anónimos e ganha tempo para os seus afazeres domésticos, tempo importante agora que tem um neto para acompanhar. No conceito de partido é ela que leva o partido ao poder, a organização e o projecto pouco conta, a política faz-se de plásticas ideológicas, golpes de asa.

Ninguém imagina António Borges em reuniões partidárias, é mais fácil vê-lo na mesa de Belmiro de Azevedo no “Espírito do Douro”, o salamaleque organizado todos os anos pela SONAE, do a comer uma sandes de courato numa qualquer festa do Pontal. O homem tem muitos afazeres profissionais, considera-se a si próprio demasiado brilhante para a aceitar que o seu contributo partidário vá muito além de apresentar a sua figura como cartaz. Desde que pertence a esta equipa António Borges teve duas aparições, uma para dizer banalidades evidentes sobre política económica e um artigo no Público onde defendeu que a gestão do aeroporto do Porto deveria ser entregue numa bandeja a Belmiro de Azevedo, o dono do jornal. O próprio Rui Machete, o presidente da Mesa do Congresso há muito que vive das mordomia da democracia como presidente da “lucrativa” Fundação Luso Americana.

Para esta equipa a política resume-se às próximas eleições, se conseguirem evitar a maioria absoluta de Sócrates vão aguardar que Cavaco provoque uma crise política e promova a sua velha “ajudante” a primeira-ministra, nesse caso teremos um Presidente que acumula com as funções de primeiro-ministro num esforço para terminar a carreira afirmando-se como o salvador do país. Se não conseguirem esses objectivo regressam aos seus afazeres pessoais e familiares.

Portanto não entendo o porquê de tanta curiosidade em relação à próxima aparição de Manuela Ferreira Leite, se não vier anunciar aos seus crentes o quarto segredo de Fátima pouco mais vaio dizer do que banalidades. Vai dizê-las com aquele ar de seriedade e de rigor que Manuela Ferreira Leite tanto aprecia quando é oposição e quer salvar o país, mas não passarão de banalidades. Sério seria apresentar um projecto vem vez de testar banalidades nas sondagens eleitorais, algo que Pedro Passos Coelho propôs.

 

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