terça-feira, 22 de novembro de 2005

OBJECTIVOS




Cada vez mais os objectivos de vida dos portugueses estão a mudar... agora são outros:

- Aos seis anos o objectivo é ter um telemóvel;

- Aos 8 é ter uma playstation;

- Aos 14 é jogar futebol num clube grande;

- Aos 18 é entrar numa universidade no curso de Consultoria sobre visões intermédias em edifícios inteligentes, mas não muito;

- Aos 22 é arranjar um emprego na função pública;

- Aos 27 é casar com uma gaja boa;

- Aos 30 é divorciar-se;

- Durante os 30's é andar a curtir a vida;

- Aos 40 é casar com uma moça que não chateie muito a cabeça;

- Aos 55 é pedir a reforma antecipada;

- Nos 60 é cuidar dos netos;

- Aos 80 é candidatar-se a Presidente da República.


Paulo Rosado da Silva

2 Comments:

At 22 de novembro de 2005 às 17:53, Anonymous Anónimo said...

Aditividade em Política

Este é o chamado efeito Soares na política à portuguesa.

Esperemos que o comboio não venha com muita velocidade...
O homem é um animal complexo, dual, ambivalente, por vezes mesmo esquizofrénico. Não é novidade para ninguém que muitos de nós já tivemos ensejo em dar um "pontapé na nuca" ao Maria Carrilho - para retomar a expressão tão do gosto de doutor Marcelo Rebelo de Sousa - para passar uma tarde com a Bá-bá num retiro em Fátima numa noite meia crente meia agnóstica - ou mesmo sem meias; ou, na versão gay, dar uns açoites e arrancar os cabelos à Bá-bá para passar umas noitadas pseudo-filosofantes com o Carrilho filósofo e os seus "jogos de racionalidade", que são umas teorias importadas verdadeiramente herméticas, labirínticas e sem sentido.

Isto para dizer que a maior parte de nós tem uma faceta do espírito que ama a paz, a harmonia, a justiça, a solidariedade, o altruísmo e a decência; mas também temos uma face oculta. A tal face do "pontapé na nuca" - recitada semanalmente pelo génio de Marcelo - quando se refere ao anverso de todos aqueles valores e que fazem parte, de igual modo, da própria condição humana.



Ou seja, o homem tem uma outra dimensão que encontra registo noutro tipo de soluções: terror, violência, brutalidade, lançar boatos sobre as pessoas de bem, por exemplo. Enfim, em lugar do amor ao próximo que os católicos de sacristia apregoam, dentro e fora do televisor, eles ainda conseguem ser mais perfídos do que a imagem pura da própria violência.
Mas o exemplo do Carrilho é apenas um resíduo indicativo, não tem mais expressão do que isso. E apenas o evoquei para trazer à superfície aquela dualidade de afectos, de sentimentos, de lógicas e de escolhas que povoam o nosso imaginário e ocupam também o lugar da política à portuguesa.


O meu objectivo nesta reflexão também não é dissertar sobre as peneiras ocas e vãs de bá-bá que um dia sonhou casar com um intelectual para ver se a imagem que teve nesse seu sonho se aproximaria da realidade. Como diria alguém, tudo começa sempre por ser um sonho de alguém. Certas pessoas levam isso muito a sério. No caso dela teve sorte, pois ainda recebia uns milhares de contos mês para fazer um programa de rádio financiado a tara perdida pelo seu actual marido, então ministro da Cultura ao tempo do garboso engº Guterres.



O propósito desta prosa é equacionar uma outra dimensão da condição humana, uma espécie de condição termodinâmica que ajuda, porventura, a explorar muito do que se passa na nossa esfera política - dentro e fora de portas. E é aí que bate o ponto. O meu ponto. Significa isto que no homem existem duas espécies de qualidades:




1) as que se podem adicionar, são as qualidades aditivas;
2) as que se não podem adicionar - são as qualidades não aditivas ou geradoras de um efeito estupidificante/paralisante.

Em termos políticos - julgo que Soares estará nesta última categoria reflexiva, pois está alienado - não se vê, ou quando o espelho lhe devolve a imagem fá-lo de forma distorcida que o leva a crer noutra imagem que já não corresponde à sua própria realidade; Cavaco, por seu turno, inscrever-se-á naquela outra categoria de qualidade aditiva.

Veremos como lhe correm os debates, pois a aditividade poderá perverter-se e degenerar para uma situação de subtractividade política, momento em que a adicionalidade deixa de gerar valor político e se entra na entropia, com os eleitorados a reagir diferentemente, mostrando maior indiferença e descrença no candidato. Esta deriva, a ocorrer, significa que Cavaco poderá escorregar nos debates, e regredir duma situação de vantagem socio-eleitoral inicial para uma situação de entropia superveniente, no decurso dos próprios debates.

A não ser que se esconda por detrás das palavras que não diz, que hesite em mostrar-se, que seja demasiado prudente. E demasiada prudência, como dizem os psicólogos da política, tem um nome: é medo. Admito que Cavaco tenha algum. Enfim, julgo que apostar nele é um mal menor nas actuais circunstâncias políticas. Até José Sócrates votará Cavaco no dias das eleições, apesar de vender a ideia à turba que apoia Soares.


Por outro lado, o ciber-leitor e eu poderíamos, se quiséssemos, erguer um ou dois Mário Soares e brincar com ele no ar, num espécie de número de circo, gerando a tal situação de Aditividade. Todavia, já não conseguiríamos essa pequena proeza se o tentássemos fazer separadamente, pois teríamos menos força. Logo, a força dos nossos braços é aditiva.

Imaginemos agora que tentaríamos aplicar o mesmo raciocínio com a temperatura dos nossos corpos. Aí, ao invés, os 36,5º C do nosso corpo - somados aos dos nossos leitores já não poderia ser aditiva. Mesmo com muita fé - jamais a temperatura do nosso corpo totalizaria 73º C. De facto, conservamos a nossa própria temperatura de 36,5º C, por mais que nos aproximemos dos outros. Eis um exemplo contrário, de situação não aditiva. E é precisamente esta relação de entropia e de degenerescência que abunda na política à portuguesa.

Regra geral sem que os visados tenham consciência dela, ou então ocultam-na deliberadamente, como hoje faz Soares - querendo "vender" a imagem de que o "traidor" perante o PS é o Alegre e não ele próprio. É óbvio que aqui há, ab initio, uma questão ética e política (ou de ética política) que impede que as coisas se possam endireitar. Mesmo no plano das relações pessoais. A relação de Soares com Salgado Zenha - com o Gen. Eanes atravessado pelo meio - também gerou cortes fracturantes no seio do PS. Aliás, sempre que este se mete nestas coisas gera estes tipos de clivagens na esquerda, tamanha é a sua obsessão pela glória, desregrado é o seu impulso narcísico. Soares, a dada altura, é ele mais o seu umbigo e a sua circunstância. Resume-se a isso.

Guterres conhecia todas estas "qualidades" de Soares - contra quem conspirou activamente num sótão lisboeta; Cosntâncio - hoje no Banco de Portugal - nem o pode ver de lado; Sampaio abomina-o e nem sequer lhe dá confiança pessoal, cedendo sempre a primazia da cortesia institucional a Cavaco.

Por todas estas razões, respaldadas na história política recente, é impossível que o eng. Sócrates também não conheça bem o carácter de Soares.. Pois ele também foi vítima de Soares quando tentou pegar na liderança do partido!!! E de Soares recebeu apupos e adjectivos nada agradáveis para queria então assumir os comandos da liderança de um partido atingido e esfrangalhado pelos boatos e estilhaços da pedofilia. Já agora, nunca mais se ouviu falar de Ferro Rodrigues que foi para a OCDE.

Quem não deve não teme, nesse caso porque razão terá querido ele afastar-se assim, abruptamente??? Terá sido para encobrir alguém, ou um acto isolado da política que teria por finalidade, mesmo que indirectamente, proteger alguém? Não o sabemos, e à velocidade a que a Justiça lusa marcha só numa outra geração é que tudo se descobrirá. Só espero que a Justiça - por vezes tão absurda - não venha a constituir arguídos nesses processos o actual Procurador-Geral da República, a drª Catalina Pestana e de mais uns quantos que já parecem integrar mais um jogo de xadrez, em que as peças propositadamente estão coladas à mesa, em lugar de deslizar suavemente num jogo de lógica para comer peças ao adversário (que é a injustiça inerente aos crimes cometidos, logo dos criminosos).

Tudo isto rouba saúde ao sistema político português, que já andava pelas ruas da amargura e hoje é agravado pela débil economia que temos, incapaz de responder aos desafios de competitividade do mercado internacional e à lógica imparável das múltiplas globalizações que todos os dias nos chegam pela televisão, pelo modem do PC, pelo telemóvel, pela net, pelo emprego, pelas relações sociais, familiares e o mais.

É, aliás, neste actual quadro de relações políticas, dado que tudo é político, que até o líder do PS e PM, o engº Sócrates - terá formalmente de apoiar (naturalmente) Soares, embora na prática, num puro exercício de voto útil (visando até o seu próprio futuro), votará indiscutivelmente em Cavaco Silva.

Ora este raciocínio da Aditividade vs não aditividade pode (e deve) aplicar-se à gestão dos materiais políticos. Basta imaginar o que seria somar Soares + Alegre; ou Anacleto Louçã com Cavaco (e) Silva - como alguns o apelidam. Fazer estas somas (subtractivas) seria um desastre. Há coisas e pessoas - que não ligam. Ou poderiam ligar, mas num quadro de ruptura de cariz pessoal, moral e ética - as coisas deixam mesmo de ligar, e a "bota deixa de bater com a perdigota", como diria a minha querida avó Raquel.
Dito isto, já se torna muito mais fácil uma 1ª conclusão: a estupidez é aditiva, ao passo que a inteligência não o é. A estupidez gosta da multidão, enquanto que a inteligência busca o seu próprio caminho, por vezes no escuro dos conceitos, perscrutando as realidades que ora se escondem ora se transmutam. A estupidez é um bem em abundância no mercado, daí o seu valor marginal; enquanto que a inteligência é um bem precioso raro, daí o valor excepcional.

Basta pensar naquelas balelas que o dr. Soares conta por esse Portugal profundo. Naquelas piadas que até fazem lembrar o antigamente, mas que não têm piada rigorosamente nenhuma. Mas os comensais, os circunstantes parecem estarem ali com uma única finalidade: rirem-se das baboseiras do dr. Soares. E digo babuseiras...porque é realmente o que aquilo é. Aquelas "estórias" de vão de escada, sem interesse público nenhum, o efeito retórico que o seu autor lhes procura dar - ou vantagens que procura retirar - é uma coisa deprimente. É-o pela TV, admito que o teatro ainda seja mais precário e nocivo ao vivo.

E o mais grave é que aquela gente se ri, nervosamente - para agradar ao chefe - e diante do vazio daquilo que no momento ali todos representam. Tudo aquilo não é mais do que um teatro do absurdo... Riem-se de coisas ausentes, de coisas inúteis, vazias, sem sentido. Em suma: riem-se deles próprios.
Mau grado a comparação, sempre que avisto pelo televisor o dr. Soares tentando convencer a turba da sua novidade octogenária, enquadrado pela sua dissimulada modéstia de contador de estórias ao vento - lembro-me sempre daquelas senhoras que na província eram pagas para irem chorar umas meias horas às capelas das igrejas sempre que alguém mais importante na terra morria. Mais outra empreitada de meia hora no cemitério, com umas rezas e umas mesinhas à mistura, por entre gritos e soluços artificiais - e o dia estava ganho.
Uma semana depois, havia outra empreitada-do-choro a fazer dado que morria outro ilustre na terra... E assim são as piadas campanheiras do dr. Soares, coadjuvadas pelo riso nervoso dos seus compagnons de route, que correm para o abismo, empurrados por espirros de que se desconhece a origem e a direcção.
Assim me faz lembrar a campanha fúnebre do dr. Soares mais os seus comparsas: os compagnons de route - que são os mesmos que se riem de tudo e de nada, até deles próprios nesse teatro do absurdo.. Assim, ele sai da história pela porta pequena, certamente!!!

Paralelamente à estupidez e à inteligência - que em Cavaco também não abunda - resta dizer que a brutalidade e a violência não são factores aditivos, embora tendam a unir-se e a apresentar-se com uma forte unidade e coerência. Temos uma ilustração deste enquadramento no que se tem passado em França, e é de todos conhecido. Aqueles incêndios, aquela violência desproporcionada ganhou consistência e venceu as forças da ordem que tentavam aplacar os actos de vandalismo suscitados na sequência da miserável condição social e económica em que aqueles imigrantes vivem (ou melhor, vegetam) em França e na Europa em geral.

Esses incidentes - que mitigam problemas estruturais da sociedade de acolhimento mais as precárias condições de vida das sucessivas vagas de comunidades de emigrantes do Norte de África que têm afluído a França - revelaram uma força desproporcionada à sua massa real. Até se tornar assustadora. De certo modo, também se tornaram acontecimentos com grande "Aditividade" política.

Mas tudo isto, os casos de França, da Europa social e económica que está a marcar passo na economia mundial, as condições de governabilidade em Portugal - que perde quotas de mercado em todos os terrenos e sectores, assumiu importância vital devido à ciência moderna, a qual facultou ao homem a criação do Paraíso ou do Inferno na Terra. E aí voltamos à "estória" do Carrilho e da Bá-bá - do inferno e do paraíso. Ou seja, tanto podemos criar um mundo de artificialidades, de terror, de miséria - votado à perdição - como gerar um mundo de felicidade, de saúde e de prazer.

A questão é que todos nós temos a nossa dose de loucura e de estupidez. Seria bom que a nossa loucura fosse erasmiana (de Roterdão), mas não é. Ou seja, nem sempre a nossa loucura é sinónima de razão ou de racionalidade. E é aqui que o nó górdio engrossa o seu caudal: esses 10 ou 20% de estupidez natural que transportamos é Aditiva, multiplica-se como formigas e insectos em África. E isso é que é perigoso. Porque é isso que Soares faz, apelando muitas vezes para os nossos mais baixos instintos.

Um exemplo comezinho: como todos nós sabemos Cavaco tem uma tremenda cara de pau. É ríspido e pouco simpático, apesar do seu porte atlético e de fazer em tempos 100 m nuns breves segundos. Vou mesmo mais longe: sempre que vejo aquela cara geométrica, mais parece uma cara de gesso formatada num molde bem definido, vejo sempre um daqueles manequins da rua dos fanqueiros já com os dedos partidos e a mostrar a cor do gesso. Só que Cavaco é tudo isso e mais outro tanto. Fala como se tivesse permanentemente na casa de banho fazendo a sua habitual contracção intestinal para ver se consegue ...... para os portugueses. Fala como se tivesse a fazer culturismo com os maxilares, e toda aquela sua contratura muscular na face faz com que o homem quando queira denunciar um traço de felicidade só consiga partilhar um traço de vénia intestinal. Aquilo é doloroso: enquanto Soares, bonacheirão, fala e disserta sobre tudo nada dizendo, mas fá-lo com prazer - como se tivesse a manjar uma cassata de morangos com chantily; Cavaco parece que está sempre com uma vara de 10 metros enfiada pelas plantas dos pés que o varam até à nuca, e aquilo sai-lhe sempre em esforço.

Ora isto penaliza Cavaco. E não é certamente o Fernando Lima, o pobre Lima que o Dn trucidou - tal como os camiões pesados faziam à Pantera Cor-de-Rosa que colavam ao alcatrão - que irá inverter essa incerteza facial que só subtrai pontos à imagem política de Cavaco e créditos à sua confiança.

Sei que até o meu tio (que é distraído, excepto quando joga ténis) - no Memórias Futuras - partilhará deste ponto de vista. Até ele um crente no socialismo votará agora, muito a contragosto, Cavaco. E num ambiente destes, temos de convir, os cheiros da política não são muito prazenteiros e o sol não brilha, ofusca. Assim, nem os hóspedes de um hotel de 2 estrelas, ficarão na sala de estar depois da hora do repasto. Cavaco é tudo isto. Isola-se, enquanto que Soares atira-se ao mundo. Veremos se alguém o apanha - procurando aqui gerar o efeito Robert Williams.


É por tudo isto que o velho Soares é um adepto da estupidez em política. Ele conhece bem as manhas do povo português, e está confiante que esses 10% de estupidez não sejam geradores de um efeito multiplicativo, como julgo que a realidade confirmará. Na prática, Soares com essas suas atitudes de contador primitivo de estórias de campanha política apela para os mais baixos instintos na certeza de que através deles obtenha a maioria dos votos - fixando-se nesse denominador comum. É a sua presunção, é a sua fesada. Ele acha que é assim que se ganham eleições. No fundo, faz o que sempre fez: contras umas estorietas que ninguém percebe, não têm piada nenhuma mas de que todos se riem... Todos os seus compagnons de route, bem entendido...


Qualquer dia, num debate perto de si, ainda veremos Soares acreditando nas mentiras que conta simpáticamente ao povo, dizendo à populaça que Cavaco até foi ministro das Finanças e das Obras Públicas de Salazar, e com ele andou nos andaimes da Ponte sobre o Tejo fundeando os alicerces da mesma - tal como Freitas tinha andado enfeudado ao prof. Marcello Caetano. Ora como Freitas agora não está na liça - é Cavaco que faz o seu papel de equivalente funcional, como diria Robert Merton. Soares julga que estas atoardas servem, ainda hoje, para arrebatar eleições - colando às pessoas (certos estereótipos) e apenas se permite representar esses papéis apenas porque teve um passado antifascista. Mas creio que o que Portugal lhe deu a ele foi descomunalmente maior do que ele deu à pátria...



Soares está diagnosticado. Tudo nele é previsível, e, doravante, Cavaco será o seu ponto de fixação/obsessão. Em rigor, quando penso no papel do dr. Soares na história política destes útimos 40 anos em Portugal - vem-me à memória uma deriva que nos diz que a civilização ocidental tem dado imenso à comunidade, mas é esse mesmo Ocidente - de que o dr. Soares se deveria envergonhar - e que fez da civilização ocidental/Euromundo - um contributo inestimável para a humanidade. Hoje, é visível esse tremendo cadastro mui pouco limpo, devido ao problema de ausência de projecto político para a Europa, de lideranças credíveis e de uma competição regulada que transforme a existência humana em algo aceitável. É tudo isso que está em jogo na regulação política a partir do epicentro do Palácio de Belém.

Ante este turbilhão de desgraças, parece que a nossa salvação está no exterior. Na OCDE, na ONU, na UE e em mais uns quantos fora internacionais que venham cá dizer aos imberbes como se governa e faz política.

É terrível viver num país em que os ex-ministros de Salazar ainda intervém na formulação das linhas que cozem e descozem o ensino superior em Portugal, os mesmos que agora tecem loas à governabilidade do sector a partir da OCDE. Se amanhã, porventura, a Europa regredir e instaurar sistemas de partido único e o Velho Continente se converter naquilo que foi no passado recente - um amontoado de ditaduras, só temos de esperar o chamado efeito moreia - com todos os ex-ministros de Salazar que ainda estão vivos e a esperniar - hoje enfeudados ao PS (e amanhã a quem estiver no poder, como qualquer meretriz que está onde estiver o dinheiro) - clamando pelo regresso do velho botas. E muitas desses restolhos da política à portuguesa não hesitarão em dizer: regressa paizinho, ou melhor, Salazar - porque estás perdoado e "nós" temos muitas saudades tuas.

Ora aqui está outro de efeito de aditividade, ou seja, de estupidez multiplicada na esfera política que se somaria, com êxito, ao chamado efeito restolho que aqui inventámos faz algum tempo

 
At 29 de novembro de 2005 às 01:20, Anonymous Anónimo said...

REVISTA “GRANDE REPORTAGEM”
Joaquim Vieira
(publicados nas revistas de 3, 10, 17, 24 de Setembro e 1 de Outubro de 2005)

Joaquim Vieira foi despedido da Revista, da qual era director, na última semana de Outubro

O POLVO (1)

Com Soares, já não há moral para criticar Ferreira Torres, Isaltino, Valentim ou Felgueiras.

Além da brigada do reumático que é agora a sua comissão, outra faceta distingue esta candidatura de Mário Soares a Belém das anteriores: surge após a edição de Contos Proibidos – Memórias de Um PS Desconhecido, do seu ex-companheiro de partido Rui Mateus. O livro, que noutra democracia europeia daria escândalo e inquérito judicial, veio a público nos últimos meses do segundo mandato presidencial de Soares e foi ignorado pelos poderes da República. Em síntese, que diz Mateus? Que, após ganhar as primeiras presidenciais, em 1986, Soares fundou com alguns amigos políticos um grupo empresarial destinado a usar os fundos financeiros remanescentes da campanha. Que a esse grupo competia canalizar apoios monetários antes dirigidos ao PS, tanto mais que Soares detestava quem lhe sucedeu no partido, Vítor Constâncio (um anti-soarista), e procurava uma dócil alternativa a essa liderança. Que um dos objectivos da recolha de dinheiros era financiar a reeleição de Soares. Que, não podendo presidir ao grupo por razões óbvias, Soares colocou os amigos como testas-de-ferro, embora reunisse amiúde com eles para orientar a estratégia das empresas, tanto em Belém como nas suas residências particulares. Que, no exercício do seu «magistério de influência» (palavras suas, noutro contexto), convocou alguns magnatas internacionais – Rupert Murdoch, Silvio Berlusconi, Robert Maxwell e Stanley Ho – para o visitarem na Presidência da República e se associarem ao grupo, a troco de avultadas quantias que pagariam para facilitação dos seus investimentos em Portugal. Note-se que o «Presidente de todos os portugueses» não convidou os empresários a investir na economia nacional, mas apenas no seu grupo, apesar de os contribuintes suportarem despesas da estada. Que moral tem um país para criticar Avelino Ferreira Torres, Isaltino Morais, Valentim Loureiro ou Fátima Felgueiras se acha normal uma candidatura presidencial manchada por estas revelações? E que foi feito dos negócios do Presidente Soares? Pela relevância do tema, ficará para próximo desenvolvimento.


O POLVO (2)

A ética política é um valor permanente, e as suas violações não prescrevem.

A rede de negócios que Soares dirigiu enquanto Presidente (ver esta coluna na anterior GR) foi sedeada na empresa Emaudio, agrupando um núcleo de próximos seus, dos quais António Almeida Santos, eterna ponte entre política e vida económica, Carlos Melancia, seu ex-ministro, e o próprio filho, João. A figura central era Rui Mateus, que detinha 60 mil acções da Fundação de Relações Internacionais (subtraída por Soares à influência do PS após abandonar a sua liderança), as quais eram do Presidente mas de que fizera o outro fiel depositário na sua permanência em Belém – relata Mateus em Contos Proibidos. Soares controlaria assim a Emaudio pelo seu principal testa-de-ferro no grupo empresarial. Diz Mateus que o Presidente queria investir nos media: daí o convite inicial para Silvio Berlusconi (o grande senhor da TV italiana, mas ainda longe de conquistar o governo) visitar Belém. Acordou-se a sua entrada com 40% numa empresa em que o grupo de Soares reteria o resto, mas tudo se gorou por divergências no investimento. Soares tentou então a sorte com Rupert Murdoch, que chegou a Lisboa munido de um memorando interno sobre a sua associação a «amigos íntimos e apoiantes do Presidente Soares», com vista a «garantir o controlo de interesses nos media favoráveis ao Presidente Soares e, assumimos, apoiar a sua reeleição». Interpôs-se porém outro magnata, Robert Maxwell, arqui-rival de Murdoch, que invocou em Belém credenciais socialistas. Soares daria ordem para se fazer o negócio com este. O empresário inglês passou a enviar à Emaudio 30 mil euros mensais. Apesar de os projectos tardarem, a equipa de Soares garantira o seu «mensalão». Só há quatro anos foi criminalizado o tráfico de influências em Portugal, com a adesão à Convenção Penal Europeia contra a Corrupção. Mas a ética política é um valor permanente, e as suas violações não prescrevem. Daí a actualidade destes factos, com a recandidatura de Soares. O então Presidente ficaria aliás nervoso com a entrada em cena das autoridades judiciais – episódio a merecer análise própria.


O POLVO (3)

A empresa Emaudio, dirigida na sombra pelo Presidente Soares, arrancou pouco após a sua eleição (ver esta coluna na anterior GR) e, segundo Rui Mateus em Contos Proibidos, contava «com muitas dezenas de milhares de contos ‘oferecidos’ por [Robert] Maxwell (...), consideráveis verbas oriundas do ‘ex-MASP’ e uma importante contribuição de uma empresa próxima de Almeida Santos». Ao nomear governador de Macau um homem da Emaudio, Carlos Melancia, Soares permite juntar no território administração pública e negócios privados. Acena-se a Maxwell a entrega da estação pública de TV local, com a promessa de fabulosas receitas publicitárias. Mas, face a dificuldades técnicas, o inglês, tido por Mateus como «um dos grandes vigaristas internacionais», recua. O esquema vem a público, e Soares acusa os gestores da Emaudio de lhe causarem perda de popularidade, anuncia-lhes alterações ao projecto e exige a Mateus as acções de que é depositário e permitem controlar a empresa. O testa-de-ferro, fiel soarista, será cilindrado – tal como há semanas sucedeu noutro contexto a Manuel Alegre. Mas antes resiste, recusando devolver as acções e emperrando a reformulação do negócio. E, quando uma empresa alemã reclama por não ter contrapartida dos 50 mil contos (250 mil euros) pagos para obter um contrato na construção do novo aeroporto de Macau, Mateus propõe o envio de um fax a Melancia exigindo a devolução da verba. O governador cala-se. Almeida Santos leva a mensagem a Soares, que também se cala. Então Mateus dá o documento a O Independente, daqui nascendo o «escândalo do fax de Macau». Em plena visita de Estado a Marrocos, ao saber que o Ministério Público está a revistar a sede da Emaudio, o Presidente envia de urgência a Lisboa Almeida Santos (membro da sua comitiva) para minimizar os estragos. Mas o processo é inevitável. Se Melancia acaba absolvido, Mateus e colegas são condenados como corruptores. Uma das revelações mais curiosas do seu livro é que o suborno (sob o eufemismo de «dádiva política») não se destinou de facto a Melancia mas «à Emaudio ou a quem o Presidente da República decidisse». Quem devia, afinal, ser réu?


O POLVO (4)

Ao investigar o caso de corrupção na base do «fax de Macau» (ver esta coluna na anterior edição), o Ministério Público entreviu a dimensão da rede de negócios então dirigida pelo presidente Soares desde Belém. A investigação foi encabeçada por António Rodrigues Maximiano, procurador-geral adjunto da República, que a dada altura se confrontou com a eventualidade de inquirir o próprio Soares. Questão demasiado sensível, que Maximiano colocou ao então procurador-geral da República, Narciso da Cunha Rodrigues. Dar esse passo era abrir a caixa de Pandora, implicando uma investigação ao financiamento dos partidos políticos, não só do PS mas também do PSD – há quase uma década repartindo os governos entre si. A previsão era catastrófica: operação «mãos limpas» à italiana, colapso do regime, república dos juízes. Cunha Rodrigues, envolvido em conciliábulos com Soares em Belém, optou pela versão mínima: deixar de fora o Presidente e limitar o caso a apurar se o governador de Macau, Carlos Melancia, recebera um suborno de 250 mil euros. Entretanto, já Robert Maxwell abandonara a parceria com o grupo empresarial de Soares, explicando a decisão em carta ao próprio Presidente. Mas logo a seguir surge Stanley Ho a querer associar-se ao grupo soarista, intenção que, segundo relata Rui Mateus em Contos Proibidos, o magnata dos casinos de Macau lhe comunica «após consulta ao Presidente da República, que ele sintomaticamente apelida de boss». Só que Mateus cai em desgraça, e Ho negociará o seu apoio com o próprio Soares, durante uma «presidência aberta» que este efectua na Guarda. Acrescenta Mateus no livro que o grupo de Soares queria ligar-se a Ho e à Interfina (uma empresa portuguesa arregimentada por Almeida Santos) no gigantesco projecto de assoreamento e desenvolvimento urbanístico da baía da Praia Grande, em Macau, lançado ainda por Melancia, e onde estavam «previstos lucros de alguns milhões de contos». Com estas operações, esclarece ainda Mateus, o presidente fortalecia uma nova instituição: a Fundação Mário Soares. Inverosímil? Nada foi desmentido pelos envolvidos, nem nunca será.


O POLVO (CONCLUSÃO)

O anúncio da recandidatura de Soares veio acordar velhos fantasmas

As revelações de Rui Mateus sobre os negócios do Presidente Soares, em Contos Proibidos (ver anteriores edições desta coluna), tiveram impacto político nulo e nenhuns efeitos. Em vez de investigar práticas porventura ilícitas de um chefe de Estado, os jornalistas preferiram crucificar o autor pela «traição» a Soares (uma tese académica elaborada depois por Edite Estrela, ex-assessora de imprensa em Belém, revelou as estratégias de sedução do Presidente sobre uma comunicação social que sempre o tratou com indulgência). Da parte dos soaristas, imperou a lei do silêncio: comentar o tema era dar o flanco a uma fragilidade imprevisível. Quando o livro saiu, a RTP procurou um dos visados para um frente-a-frente com Mateus – todos recusaram. A omertà mantém-se: o desejo dos apoiantes de Soares é varrer para debaixo do tapete esta história (i)moral da III República, e o próprio, se interrogado sobre o assunto, dirá que não fala sobre minudências, mas sobre os grandes problemas da nação. Com a questão esquecida, Soares terminaria em glória uma histórica carreira pública, mas o anúncio da sua recandidatura veio acordar velhos fantasmas. O mandatário, Vasco Vieira de Almeida, foi o autor do acordo entre a Emaudio e Robert Maxwell. Na cerimónia do Altis, viam-se figuras centrais dos negócios soaristas, como Almeida Santos ou Ilídio Pinho, que o Presidente fizera aliar a Maxwell. Dos notáveis próximos da candidatura do «pai da pátria», há também homens da administração de Macau sob tutela de Soares, como António Vitorino e Jorge Coelho, actuais eminências pardas do PS, ou Carlos Monjardino, conselheiro para a gestão dos fundos soaristas e presidente de uma fundação formada com dinheiros de Stanley Ho. Outros ex- «macaenses» influentes são o ministro da Justiça, Alberto Costa, que, como director do Gabinete de Justiça do território, interveio para minorar os estragos de um caso judicial que destapou as ligações entre o soarismo e a Emaudio, ou o presidente da CGD por nomeação de Sócrates, Santos Ferreira, que o governador Melancia pôs à frente das obras do aeroporto de Macau. Será o polvo apenas uma bela teoria da conspiração?

 

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