quarta-feira, 22 de março de 2006

DOUTOR DE BOLONHA/DOUTOR DA MULA RUSSA

"O Presidente da República promulgou hoje o decreto-lei que alinha o Ensino Superior português com o Processo de Bolonha. Este é o primeiro diploma aprovado por Cavaco Silva desde que tomou posse."
SIC



Habitualmente opino sobre o que sei, nalguns casos sei mesmo, noutros julgo que sei, mas sobre o processo de Bolonha só sei mesmo que nada sei. Mas neste post vou opinar sobre o que não sei e isso é grave pois não só deveria ter interesse em saber, como as entidades responsáveis nada fizeram para que eu estivesse informado e deveriam tê-lo feito pois, por via da paternidade, sou parte interessada.

Tenho ouvido uns lamirés sobre Bolonha, mas tenho ficado sempre com a ideia de que isso é assunto de sacerdotes de cátedra, e agora que o ministro pegou fogo no rabo e teve uma crise de pressa, perguntei ao filho que estuda no terceiro ano de um curso universitário com a duração de cinco, se sabe o que vai fazer para o ano e a resposta foi a de que ninguém sabia.
No país do Plano Tecnológico um estudante do terceiro ano de um curso tecnológico não sabe se acaba o curso em Julho ou daqui a dois anos e meio…

Imagino-me no meu terceiro ano de economia (acabaram de ser excluídos os suspeitos de escreverem este blogue que tenham formação em direito) a ouvir dizerem-me toma lá o diploma que já és doutor!.
Quando voltasse a casa para dizer à minha mãe que já era doutor, como fez o Dias Loureiro quando chegou a ministro, calculo que a resposta seria a mesma do senhor Félix quando o filho inútil regressou de uma tentativa falhada de emigração em França e entrou em casa cumprimentando-o com um esmerado bonjour papa, ouviu a resposta pronta do pai a gritar para a mãe Oh Rita, leva-o para a cozinha que o mal dele é fome!.
No caso da minha mãe, que muito provavelmente teria a ideia que Bolonha fica em Itália, a resposta seria do tipo "só se fores doutor da mula russa". E tal como o filho do senhor Félix ainda sentiria esse estigma e da mesma forma que o emigrante falhado responde com a lista dos impropérios locais sempre que alguém lhe telefona a dizer bonjour, também eu ficaria foram de mim e mandaria a alma que me tratasse por dr. para um local menos próprio.

Seria um economista sem saber nada de política económica ou de econometria ou de economia matemática, para não referir muitas outras cadeiras que tive nos últimos dois anos de curso, em que se concentrava o saber da profissão.
Seria, enfim, um economista à bolonhesa, um prato rápido feito por políticos irresponsáveis que deixaram para a última hora o que deveriam ter feito em anos.

Mas, muito provavelmente, o prejuízo não seria assim tão grande, a Função Pública nunca me exigiu nada que fosse além da aritmética e duvido que a maioria das projecções de receitas fiscais feitas neste país exija mais do que uma regressão simples.
Também no sector privado não faltarão os gestores em cujo currículo se deveria ter substituído metade das cadeiras de gestão por uma de bem saber comer à mesa.

J.E.R.