quarta-feira, 1 de março de 2006

O PAÍS PROFUNDO

O fim do interior

Portugal sempre foi um país cujo interior, o chamado país profundo, fez e desfez Governos e regimes.
Os chefes, desde que há um mínimo sinal de democracia, acantonaram-se no Terreiro do Paço, mas ficaram sempre reféns dos caciques locais e da longa teia de interesses que lhes garantiam um eterno comércio: favores por votos.
Só que o país dos últimos anos tornou-se um eucaliptal à volta dos principais centros urbanos.
Tudo está em Lisboa e Porto e em mais meia dúzia de cidades.
O Governo é cada vez menos refém dos votos do interior.
Porque este emigrou, para o estrangeiro ou para as grandes cidades.
Para Lisboa, apesar de manter a sede da outrora guarda pretoriana do regime contra o interior no seu coração, este é para abater.


Dão-se subsídios para o interior definhar com honradez, como o comércio tradicional.
Neste encontram-se idosos longe de tudo e de todos, no meio de florestas queimadas.
Como não há jovens, não há crianças.
Sendo assim, escolas ou centros de saúde, são caras e dispensáveis.
O desaparecimento da velha província processa-se a um ritmo alucinante.
O Estado é o Jack, o Estripador, do interior do nosso país.
Os autarcas vão perdendo o seu poder.
O interior já fez a sua última carga da brigada ligeira contra o Terreiro do Paço. E perdeu.

Fernando Sobral

2 Comments:

At 2 de março de 2006 às 12:57, Anonymous Anónimo said...

«Um povo imbecilizado e resignado, humilde e macambúzio, fatalista e sonâmbulo, burro de carga, besta de nora, aguentando pauladas, sacos de vergonhas, feixes de misérias, sem uma rebelião, um mostrar de dentes, a energia dum coice, pois que nem já com as orelhas é capaz de sacudir as moscas; um povo em catalepsia ambulante, não se lembrando nem donde vem, nem onde está, nem para onde vai; um povo, enfim, que eu adoro, porque sofre e é bom, e guarda ainda na noite da sua inconsciência como que um lampejo misterioso da alma nacional, - reflexo de astro em silêncio escuro de lagoa morta (…)

Uma burguesia, cívica e politicamente corrupta ate à medula, não descriminando já o bem do mal, sem palavras, sem vergonha, sem carácter, havendo homens que, honrados (?) na vida intima, descambam na vida publica em pantomineiros e sevandijas, capazes de toda a veniaga e toda a infâmia, da mentira a falsificação, da violência ao roubo, donde provém que na politica portuguesa sucedam, entre a indiferença geral, escândalos monstruosos, absolutamente inverosímeis no Limoeiro (…)

Um poder legislativo, esfregão de cozinha do executivo; este criado de quarto do moderador; e este, finalmente, tornado absoluto pela abdicação unânime do pais, e exercido ao acaso da herança, pelo primeiro que sai dum ventre, - como da roda duma lotaria.

A justiça ao arbítrio da Politica, torcendo-lhe a vara ao ponto de fazer dela saca-rolhas; (…)

Dois partidos (...), sem ideias, sem planos, sem convicções, incapazes (...) vivendo ambos do mesmo utilitarismo céptico e pervertido, análogos nas palavras, idênticos nos actos, iguais um ao outro como duas metades do mesmo zero, e não se amalgando e fundindo, apesar disso, pela razão que alguém deu no parlamento, - de não caberem todos duma vez na mesma sala de jantar (...)»

Guerra Junqueiro
In: "A PÁtria"

 
At 3 de março de 2006 às 10:40, Anonymous Anónimo said...

Lamentavelmente estamos a assistir há amior vergonha do mundo e desde país...É tão triste ver o nosso interior desmoronar-se sem que ninguém faça nada, ninguém não os politicos têm ajudado a cavar e muito a cova para enterrar o nosso interior, como se este fosse uma peste negr a abater...Todos temos de ser urbanos, ninguém pode descender de gente do interior...

 

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