A provarem-se as acusações da justiça espanhola à AFINSA estamos perante um esquema em tudo o idêntico àquele que celebrizou a Dona Branca como a Banqueira do Povo. O esquema é o mesmo, os novos clientes vão permitindo o pagamento de juros aos clientes mais antigos o que leva à atracção de novos clientes, e tudo corre bem até ao momento em que algo falha e a pirâmide desmorona-se.
Mas há uma grande diferença entre a AFINSA e a Dona Branca, a empresa espanhola é fina e a Dona Branca, tal como a telenovela retratou era uma pessoa de modestos recursos culturais. O dono da AFINSA era um exemplo para Portugal onde, como uma boa parte das nossas pobres elites, tinha um título de comendador, alguém que nos massajava o ego nesta disputa com a España. Em contrapartida, da Dona Branca pouco se sabia, não vivia em palacetes e dificilmente distinguiria um Picasso de uma capa do Correio da Manhã.
A Dona AFINSA era fina e a Dona Branca era rasca.
É por isso que a Dona Branca só foi notícia na hora da desgraça, a Banqueira do povo nunca untou a comunicação social, nem foi bajulada pelo Pinto Balsemão. Pelo contrário, a Dona AFINSA era fina, mereceu notícias sucessivas na comunicação social que tudo fazia para levar os papalvos mais as respectivas poupanças aos seus balcões.
A sorte dos portugueses é que a nossa comunicação social é tão credível que mesmo assim a AFINSO não atingiu, nem de longe nem de perto, a dimensão da Dona Branca.
Termino com uma pergunta aos jornalistas do DN e do Expresso que se desdobraram em elogios à AFINSO: quanto investiram? Aposto que não investiram um tostão, e que, muito provavelmente, quem investiu nesses jornais (através de publicidade ou de outros esquemas) foi a AFINSO.
A pretexto das notícias que o Expresso publicou sobre a valia filatélica dos produtos da Afinsa julgo útil compreender a razão pela qual as coisas se passam da forma como passaram: ou seja, algumas notícias foram veículadas por alguns soid-disant jornalísticas para promover os produtos duma empresa, e fizeram-no não por amor à verdade dos factos, à verdade jornalística mas por um outro quadro de motivações que aqui tentarei sintetizar. É óbvio que o aqui se diz para alguns jornalistas daquele semanário também é aplicado a outros que têm a mesma conduta, ainda que o façam de forma mais "profissional" e súbtil, o que também não é difícil.
Dito por outras palavras: por que é que "alguns jornalistas de serviço" se empenham em publicitar produtos e serviços de empresas nas páginas do seu jornal? Porque razão o fazem amiudadas vezes e num determinado timing?
É sabido que grande parte dos jornalistas em Portugal são uns tolos sem preparação técnica e formação cultural e muito menos humana. Muitos deles, apenas com os anos de tarimba e uns cursos do Cenjor, movem-se apenas por objectivos mesquinhos, por vendettas pessoais, por invejas e resentimentos conexos, portando-se ainda pior do que a própria classe política que criticam. Mas o mais interessante deste porquê - não passa bem por aí.
Vejamos: uma das mais interessantes criações espontâneas do regime democrático português foi a emergência da função do analista político, do politólogo se se quiser - como agora vulgarmente se diz. Nos seus traços particulares, essa função apresenta traços de originalidade quer relativamente ao comentador político (feita por jornalistas especializados) quer relativamente ao produtor de estratégias partidárias - que é, naturalmente, já um elemento integrado numa organização partidária, que é membro dum partido político e age como tal: observando regras próprias e hierarquias.
No caso português, que veio a lume e foi ampliado exponencialmente pelas estranhas notícias do Expresso sobre a valia empresarial (e cotacional) dos selos da Afinsa - que agora está a deixar em pânico 350 mil clientes/depositantes - a questão de sabermos quem são os jornalistas-analistas de serviço que temos volta a colocar-se ainda com mais acuidade. Pouco interessa aqui saber se o jornalista promotor desse tipo de notícias usa ou não papillon, usa ou não avental maçónico, usa ou não o terço da Opus Dey (ou opus-gay) ou presta qualquer serviço oculto ou é avençado a qualquer outra confraria onde se presta o espírito ou o culto de corporação.
Isso pouco interessa. Mas tal não deixa de nos recentrar na compreensão que leva a explicar porque razão aquelas notícias saíram daquela maneira e não doutra: porque razão os jornalistas do Expresso escreveram o que escreveram - num dado timing - a propósito dos produtos da Afinsa? É claro que não vamos aqui interpelar todos os jornalistas económicos - que usam ou não papillon. Tal seria ainda mais ridículo do que usar papillon. O que dizemos é que no caso português, o chamado analista político, económico, social, cultural parece ser, ao mesmo tempo, ao contrário do que ocorre na Europa, essa criatura que se apresenta como ser independente ou neutro, mas depois, se neles fizermos incidir as lentes do macroscópio, verificaremos que eles apenas se representam a si mesmos. O que lhes concede uma liberdade de movimentos e de opinião muito superiores à que "está-à-mão" de quem está integrado numa acção política organizada, num partido por exemplo. Não queremos com isto crucificar todos os "nicolaus" e "maquiaveis" e os demais jornalistas que tentam fazer o melhor que podem e sabem. Mas certas notícias, pela forma, conteúdo e timing com que são veiculadas na imprensa dita de referência - e pelas incidências que têm (ou ajudam a ter) nos mercados financeiros e especlativos - deveriam de imediato ser objecto de investigação judicial a fim de esclarecer as verdadeiras motivações que lhes deu origem. Parece-nos ser o caso das notícias da Afinsa veiculadas pelo semanário Expresso de Pinto Balsemão. Em suma: o analista-jornalista dos novos tempos tem de ser mais do que um mero peão que é, a cada momento, instrumentalizado por poderosos grupos financeiros cujas estratégias são incompatíveis com o direito à informação isenta, objectiva e rigorosa. E nada disto seria particularmente nocivo se não houvessem portugueses lesados com as acções da Afinsa, ainda por cima de um português de Viseu, o sr. Figueiredo. Se isto não se esclarecer, ficará sempre a suspeita de manipulação de informação, de compra de informação, de corrupção de jornalistas, de ocultação de questões e explicitação de outras, em modos de formação de decisões, de favores empresariais que visam favorecer certas empresas ou posições e desfavorecer ou contrariar outras empresas ou posições. O que gostaríamos de dizer aqui aos "jornalistas da tanga" que hoje manipulam boa parte da informação que nos "dão a beber" (como se todos fossemos burros), e o grupo de empresas e informação e comunicação de Balsemão tem vindo a insistir nessa "lógica da batata", é que o caminho menos natural, produtivo e saudável para a avaliação dos acontecimentos políticos passa precisamente pelo registo das notícias que o Expresso fez passar sobre a Afinsa. O que é triste. A política é uma acção, ou melhor uma relação que produz resultados e efeitos, e tudo se desenvolve num contexto onde nenhum decisor é solitário e independente uns dos outros. Mas também excusava-se de ir tão longe, porque assim cheira a esturro. E se cheira a esturro é porque algo se queimou. E nós cremos aqui que o que foi esturrado - foi essa verticalidade, isenção e liberdade de informação que - para o ser - terá de ser verdadeiramente livre e independente dos grupos empresariais que, a dado momento, certos "artistas" da informação económica se prestam a dar uma mãosinha - sabe-se lá com que contrapartidas. O que dizemos, para finalizar, é que quer a ocultação quer a mentira são as novas gémeas meretrizes que têm a perna curta...
Na semana passada soube-se que muitos portugueses e espanhóis tinham aplicado as suas poupanças em selos, entre eles o distinto figurão desta cidade "tira dentes bugalheira".
Estavam convencidos que estes investimentos se viriam a traduzir em aplicações muito rentáveis e com pouco risco. Aparentemente as suas expectativas não se vão materializar.
Toda a teoria económica sugere que não existem máquinas de fazer dinheiro. No fundo os aforradores individuais foram vítimas de um logro, de uma promessa que não era credível.
Este tipo de fenómenos ocorre em quase todas as sociedades em determinados momentos da sua história. Perante dificuldades as pessoas são levadas a acreditar que podem atingir o nível de rendimento ambicionado ou perdido através de «jogadas inteligentes» e com um pequeno golpe de génio individual.
A Albânia sofreu na sua história recente de um episódio de características semelhantes. Parece assim possível acreditar que estes fenómenos são mais prováveis em sociedades que estão em crise.
Mas em Portugal estes fenómenos são aparentemente muito recorrentes. Há uns tempos tivemos o fenómeno da D. Branca. O episódio Alves dos Reis encaixa também nesta saga. Neste último a história é muitas vezes contada em meios sociais com um misto de crítica e admiração pela ousadia do homem.
Mais recentemente observamos uma grande adesão dos portugueses ao Euromilhões, onde gastam muito dinheiro sabendo que o valor esperado dos prémios a receber é inferior à a sua aposta.
Também a segurança social, quando desenhada através de um mecanismo de repartição em que as transferências dos trabalhadores activos suportam as pensões dos reformados, pode ser um exemplo de uma falácia cognitiva. É por isso fundamental garantir que o sistema é financeiramente sustentável e geracionalmente justo.
Todos estes fenómenos podem ser sintetizados como casos particulares de um enviesamento cognitivo conhecido chamado a falácia do jogador. A falácia do jogador é a noção errada de que a probabilidade de ocorrência de um determinado fenómeno aumenta ou diminui em função de ocorrências recentes. A variante mais comum é a crença de um jogador de roleta que, após perder muitas vezes por apostar no vermelho e ver sair sempre números pretos, acredita que se apostar a sua fortuna toda mais uma vez no vermelho a sua probabilidade de recuperar as suas perdas é bastante boa. Neste caso qualquer conselheiro racional pode informar o jogador que ele está ser vítima de um enviesamento cognitivo. Mas o próprio acredita mesmo que a sua probabilidade de ganhar é bem maior que 50%.
Porém, na vida real, a falácia do jogador ocorre de forma mais subtil. Por exemplo no caso dos selos, os jogadores podem ter dúvidas quanto ao retorno do investimento que lhes é prometido. Começam, por isso, por apostar um pequeno montante. Como o casino - sob a máscara de uma empresa - lhes paga aquilo que lhes prometeu para um pequeno montante, os jogadores acreditam que o rendimento é agora uma certeza e passam a investir montantes maiores.
Alguns poderão pensar que esta tendência para os portugueses serem vítimas da falácia do jogador será algo específico à cultura portuguesa. Encaixa aliás bem na visão da saudade sebastiânica que tantas vezes usamos para nos caracterizar - acreditamos que alguém nos virá salvar da nossa triste sorte. Eu prefiro acreditar que estes enviesamentos cognitivos são comuns a todas as sociedades. Aliás estão amplamente demonstrados em várias experiências psicológicas rigorosas com sujeitos oriundos de todas as culturas.
Ainda assim vale a pena lembrar que a criação de valor resulta sempre de investimento em actividades produtivas e da criatividade, esforço e energia de cada um. Neste sentido aplicar recursos em obrigações ou acções é muito diferente do que apostar na valorização de objectos coleccionáveis.
No primeiro caso estamos a juntar o nosso capital ao de outros investidores de forma a que ele possa ser usado em actividades produtivas criadoras de valor e riqueza. No caso dos selos estamos apenas a acreditar que o nosso «especialista» a quem entregamos o dinheiro é muito bom a avaliar e transaccionar selos.
Esta é talvez a principal lição colectiva deste episódio desesperante para as vítimas: são as empresas que criam valor nas sociedades modernas. E por isso são elas que melhor empregarão as poupanças dos cidadãos e da sociedade. Mas só vale a pena aplicar poupanças em empresas onde se perceba qual a visão da sua liderança e como é que a estratégia dessa empresa cria valor para a sociedade e os seus investidores.
Talvez por isso seja legítimo pensar que é a escassez de empresas e empresários com ambição e que queiram abrir o capital das suas empresas à sociedade que empurra as poupanças individuais para contos do vigário.
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A DONA BRANCA E A DONA AFINSA
A provarem-se as acusações da justiça espanhola à AFINSA estamos perante um esquema em tudo o idêntico àquele que celebrizou a Dona Branca como a Banqueira do Povo.
O esquema é o mesmo, os novos clientes vão permitindo o pagamento de juros aos clientes mais antigos o que leva à atracção de novos clientes, e tudo corre bem até ao momento em que algo falha e a pirâmide desmorona-se.
Mas há uma grande diferença entre a AFINSA e a Dona Branca, a empresa espanhola é fina e a Dona Branca, tal como a telenovela retratou era uma pessoa de modestos recursos culturais.
O dono da AFINSA era um exemplo para Portugal onde, como uma boa parte das nossas pobres elites, tinha um título de comendador, alguém que nos massajava o ego nesta disputa com a España.
Em contrapartida, da Dona Branca pouco se sabia, não vivia em palacetes e dificilmente distinguiria um Picasso de uma capa do Correio da Manhã.
A Dona AFINSA era fina e a Dona Branca era rasca.
É por isso que a Dona Branca só foi notícia na hora da desgraça, a Banqueira do povo nunca untou a comunicação social, nem foi bajulada pelo Pinto Balsemão.
Pelo contrário, a Dona AFINSA era fina, mereceu notícias sucessivas na comunicação social que tudo fazia para levar os papalvos mais as respectivas poupanças aos seus balcões.
A sorte dos portugueses é que a nossa comunicação social é tão credível que mesmo assim a AFINSO não atingiu, nem de longe nem de perto, a dimensão da Dona Branca.
Termino com uma pergunta aos jornalistas do DN e do Expresso que se desdobraram em elogios à AFINSO: quanto investiram?
Aposto que não investiram um tostão, e que, muito provavelmente, quem investiu nesses jornais (através de publicidade ou de outros esquemas) foi a AFINSO.
A pretexto das notícias que o Expresso publicou sobre a valia filatélica dos produtos da Afinsa julgo útil compreender a razão pela qual as coisas se passam da forma como passaram: ou seja, algumas notícias foram veículadas por alguns soid-disant jornalísticas para promover os produtos duma empresa, e fizeram-no não por amor à verdade dos factos, à verdade jornalística mas por um outro quadro de motivações que aqui tentarei sintetizar.
É óbvio que o aqui se diz para alguns jornalistas daquele semanário também é aplicado a outros que têm a mesma conduta, ainda que o façam de forma mais "profissional" e súbtil, o que também não é difícil.
Dito por outras palavras: por que é que "alguns jornalistas de serviço" se empenham em publicitar produtos e serviços de empresas nas páginas do seu jornal?
Porque razão o fazem amiudadas vezes e num determinado timing?
É sabido que grande parte dos jornalistas em Portugal são uns tolos sem preparação técnica e formação cultural e muito menos humana.
Muitos deles, apenas com os anos de tarimba e uns cursos do Cenjor, movem-se apenas por objectivos mesquinhos, por vendettas pessoais, por invejas e resentimentos conexos, portando-se ainda pior do que a própria classe política que criticam.
Mas o mais interessante deste porquê - não passa bem por aí.
Vejamos: uma das mais interessantes criações espontâneas do regime democrático português foi a emergência da função do analista político, do politólogo se se quiser - como agora vulgarmente se diz.
Nos seus traços particulares, essa função apresenta traços de originalidade quer relativamente ao comentador político (feita por jornalistas especializados) quer relativamente ao produtor de estratégias partidárias - que é, naturalmente, já um elemento integrado numa organização partidária, que é membro dum partido político e age como tal: observando regras próprias e hierarquias.
No caso português, que veio a lume e foi ampliado exponencialmente pelas estranhas notícias do Expresso sobre a valia empresarial (e cotacional) dos selos da Afinsa - que agora está a deixar em pânico 350 mil clientes/depositantes - a questão de sabermos quem são os jornalistas-analistas de serviço que temos volta a colocar-se ainda com mais acuidade.
Pouco interessa aqui saber se o jornalista promotor desse tipo de notícias usa ou não papillon, usa ou não avental maçónico, usa ou não o terço da Opus Dey (ou opus-gay) ou presta qualquer serviço oculto ou é avençado a qualquer outra confraria onde se presta o espírito ou o culto de corporação.
Isso pouco interessa.
Mas tal não deixa de nos recentrar na compreensão que leva a explicar porque razão aquelas notícias saíram daquela maneira e não doutra: porque razão os jornalistas do Expresso escreveram o que escreveram - num dado timing - a propósito dos produtos da Afinsa?
É claro que não vamos aqui interpelar todos os jornalistas económicos - que usam ou não papillon.
Tal seria ainda mais ridículo do que usar papillon.
O que dizemos é que no caso português, o chamado analista político, económico, social, cultural parece ser, ao mesmo tempo, ao contrário do que ocorre na Europa, essa criatura que se apresenta como ser independente ou neutro, mas depois, se neles fizermos incidir as lentes do macroscópio, verificaremos que eles apenas se representam a si mesmos.
O que lhes concede uma liberdade de movimentos e de opinião muito superiores à que "está-à-mão" de quem está integrado numa acção política organizada, num partido por exemplo.
Não queremos com isto crucificar todos os "nicolaus" e "maquiaveis" e os demais jornalistas que tentam fazer o melhor que podem e sabem. Mas certas notícias, pela forma, conteúdo e timing com que são veiculadas na imprensa dita de referência - e pelas incidências que têm (ou ajudam a ter) nos mercados financeiros e especlativos - deveriam de imediato ser objecto de investigação judicial a fim de esclarecer as verdadeiras motivações que lhes deu origem. Parece-nos ser o caso das notícias da Afinsa veiculadas pelo semanário Expresso de Pinto Balsemão.
Em suma: o analista-jornalista dos novos tempos tem de ser mais do que um mero peão que é, a cada momento, instrumentalizado por poderosos grupos financeiros cujas estratégias são incompatíveis com o direito à informação isenta, objectiva e rigorosa. E nada disto seria particularmente nocivo se não houvessem portugueses lesados com as acções da Afinsa, ainda por cima de um português de Viseu, o sr. Figueiredo.
Se isto não se esclarecer, ficará sempre a suspeita de manipulação de informação, de compra de informação, de corrupção de jornalistas, de ocultação de questões e explicitação de outras, em modos de formação de decisões, de favores empresariais que visam favorecer certas empresas ou posições e desfavorecer ou contrariar outras empresas ou posições.
O que gostaríamos de dizer aqui aos "jornalistas da tanga" que hoje manipulam boa parte da informação que nos "dão a beber" (como se todos fossemos burros), e o grupo de empresas e informação e comunicação de Balsemão tem vindo a insistir nessa "lógica da batata", é que o caminho menos natural, produtivo e saudável para a avaliação dos acontecimentos políticos passa precisamente pelo registo das notícias que o Expresso fez passar sobre a Afinsa.
O que é triste.
A política é uma acção, ou melhor uma relação que produz resultados e efeitos, e tudo se desenvolve num contexto onde nenhum decisor é solitário e independente uns dos outros.
Mas também excusava-se de ir tão longe, porque assim cheira a esturro. E se cheira a esturro é porque algo se queimou. E nós cremos aqui que o que foi esturrado - foi essa verticalidade, isenção e liberdade de informação que - para o ser - terá de ser verdadeiramente livre e independente dos grupos empresariais que, a dado momento, certos "artistas" da informação económica se prestam a dar uma mãosinha - sabe-se lá com que contrapartidas.
O que dizemos, para finalizar, é que quer a ocultação quer a mentira são as novas gémeas meretrizes que têm a perna curta...
Na semana passada soube-se que muitos portugueses e espanhóis tinham aplicado as suas poupanças em selos, entre eles o distinto figurão desta cidade "tira dentes bugalheira".
Estavam convencidos que estes investimentos se viriam a traduzir em aplicações muito rentáveis e com pouco risco.
Aparentemente as suas expectativas não se vão materializar.
Toda a teoria económica sugere que não existem máquinas de fazer dinheiro.
No fundo os aforradores individuais foram vítimas de um logro, de uma promessa que não era credível.
Este tipo de fenómenos ocorre em quase todas as sociedades em determinados momentos da sua história.
Perante dificuldades as pessoas são levadas a acreditar que podem atingir o nível de rendimento ambicionado ou perdido através de «jogadas inteligentes» e com um pequeno golpe de génio individual.
A Albânia sofreu na sua história recente de um episódio de características semelhantes. Parece assim possível acreditar que estes fenómenos são mais prováveis em sociedades que estão em crise.
Mas em Portugal estes fenómenos são aparentemente muito recorrentes.
Há uns tempos tivemos o fenómeno da D. Branca.
O episódio Alves dos Reis encaixa também nesta saga.
Neste último a história é muitas vezes contada em meios sociais com um misto de crítica e admiração pela ousadia do homem.
Mais recentemente observamos uma grande adesão dos portugueses ao Euromilhões, onde gastam muito dinheiro sabendo que o valor esperado dos prémios a receber é inferior à a sua aposta.
Também a segurança social, quando desenhada através de um mecanismo de repartição em que as transferências dos trabalhadores activos suportam as pensões dos reformados, pode ser um exemplo de uma falácia cognitiva.
É por isso fundamental garantir que o sistema é financeiramente sustentável e geracionalmente justo.
Todos estes fenómenos podem ser sintetizados como casos particulares de um enviesamento cognitivo conhecido chamado a falácia do jogador.
A falácia do jogador é a noção errada de que a probabilidade de ocorrência de um determinado fenómeno aumenta ou diminui em função de ocorrências recentes.
A variante mais comum é a crença de um jogador de roleta que, após perder muitas vezes por apostar no vermelho e ver sair sempre números pretos, acredita que se apostar a sua fortuna toda mais uma vez no vermelho a sua probabilidade de recuperar as suas perdas é bastante boa.
Neste caso qualquer conselheiro racional pode informar o jogador que ele está ser vítima de um enviesamento cognitivo.
Mas o próprio acredita mesmo que a sua probabilidade de ganhar é bem maior que 50%.
Porém, na vida real, a falácia do jogador ocorre de forma mais subtil.
Por exemplo no caso dos selos, os jogadores podem ter dúvidas quanto ao retorno do investimento que lhes é prometido.
Começam, por isso, por apostar um pequeno montante.
Como o casino - sob a máscara de uma empresa - lhes paga aquilo que lhes prometeu para um pequeno montante, os jogadores acreditam que o rendimento é agora uma certeza e passam a investir montantes maiores.
Alguns poderão pensar que esta tendência para os portugueses serem vítimas da falácia do jogador será algo específico à cultura portuguesa.
Encaixa aliás bem na visão da saudade sebastiânica que tantas vezes usamos para nos caracterizar - acreditamos que alguém nos virá salvar da nossa triste sorte.
Eu prefiro acreditar que estes enviesamentos cognitivos são comuns a todas as sociedades. Aliás estão amplamente demonstrados em várias experiências psicológicas rigorosas com sujeitos oriundos de todas as culturas.
Ainda assim vale a pena lembrar que a criação de valor resulta sempre de investimento em actividades produtivas e da criatividade, esforço e energia de cada um.
Neste sentido aplicar recursos em obrigações ou acções é muito diferente do que apostar na valorização de objectos coleccionáveis.
No primeiro caso estamos a juntar o nosso capital ao de outros investidores de forma a que ele possa ser usado em actividades produtivas criadoras de valor e riqueza.
No caso dos selos estamos apenas a acreditar que o nosso «especialista» a quem entregamos o dinheiro é muito bom a avaliar e transaccionar selos.
Esta é talvez a principal lição colectiva deste episódio desesperante para as vítimas: são as empresas que criam valor nas sociedades modernas. E por isso são elas que melhor empregarão as poupanças dos cidadãos e da sociedade.
Mas só vale a pena aplicar poupanças em empresas onde se perceba qual a visão da sua liderança e como é que a estratégia dessa empresa cria valor para a sociedade e os seus investidores.
Talvez por isso seja legítimo pensar que é a escassez de empresas e empresários com ambição e que queiram abrir o capital das suas empresas à sociedade que empurra as poupanças individuais para contos do vigário.
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