segunda-feira, 15 de maio de 2006

OBVIAMENTE DEMITO-O


Eleições de 1958


Obviamente demito-o


Em 1958, acedendo ao convite da oposição democrática, apresentou-se como candidato independente às eleições presidenciais.


O mote da campanha eleitoral foi lançado pela célebre frase "Obviamente demito-o", numa conferência de imprensa no Café Chave D'Ouro em Lisboa , a 10 de Maio de 1958, em resposta a um jornalista da France Press que lhe pergunta qual o destino que daria a Salazar no caso de ganhar as eleições.


A vasta movimentação popular que se seguiu permitiu criar pela primeira vez em três décadas de ditadura uma dinâmica de unidade da oposição contra o regime salazarista.

O carisma do "General sem medo" surgiu como um fenómeno inesperado, bem como a erupção de massas no processo eleitoral. O candidato da oposição anunciou o então facto inédito de não desistir da ida às urnas.
O povo do norte de Portugal concentrou-se numa gigantesca manifestação no Porto - a fim de o receber poucos dias após a sua declaração contra o ditador. Esta jornada a 14 de Maio de 1958 reacordou um velha tradição de liberalismo que a ditadura de Salazar não conseguira extinguir após mais de trinta anos de ditadura. Receando que a popularidade de Delgado se espalhasse de Norte a Sul do país, Salazar proibiu a deslocação deste a Braga - um baluarte do catolicismo e berço da revolta militar do 28 de Maio de 1926 que instaurara a ditadura militar. A cidade foi ocupada por cinco mil membros da Legião Portuguesa - medida preventiva de intimidação e de exibição do poder que todavia não impediu vastas concentrações de pessoas pela região aclamando o candidato da democracia.


Apanhadas de surpresa pelo levantamento espontâneo do entusiasmo popular por todo o país, o regime tomou medidas de emergência destinadas a evitar mais demonstrações em Lisboa. Assim, após a chegada de Delgado à estação de Santa Apolónia a 16 de Maio de 1958 as forças da Guarda Nacional Republicana e os agentes da PIDE exerceram repressão sobre a população lisboeta que acorrera em massa para receber Delgado. As notícias dos tumultos e dos ataques das forças para-militares contra a população de Lisboa apareceram na imprensa estrangeira que começou a dedicar mais atenção a Portugal, país habitualmente pacato.


Após os incidentes e tumultos ocorridos no Porto e em Lisboa, a 14 e 16 de Maio, a polícia política (PIDE) aumentou a repressão contra a população que participava espontaneamente na campanha apelidada de "subversiva" pela imprensa controlada. Apesar do mecanismo eleitoral ser manipulado desde o recenseamento, apesar das dificuldades intransponíveis na cópia dos cadernos eleitorais e na distribuição por parte da oposição dos boletins de voto, ainda assim o Estado Novo, temendo um enorme desaire eleitoral, decretou a proibição da fiscalização do escrutínio por parte da oposição. Os números oficiais deram quase 25% dos votos a Humberto Delgado, contra 75% do candidato oficial, Américo Tomás, não sendo possível ainda hoje apurar os resultados reais dada a amplitude da fraude.
Com medo de no futuro passar por um outro "golpe constitucional" que representava a possibilidade de a oposição voltar a lançar-se numa campanha eleitoral como a de 1958, Salazar promove, em Agosto de 1959 uma revisão constitucional na qual se suprime o sufrágio directo sendo substituído por sufrágio indirecto proporcionado por um colégio eleitoral de total confiança do Governo.


Que linda foi a campanha em Ponte de Sôr...
Passados estes anos todos não poderiamos esquecer os homens e mulheres livres de Ponte de Sôr que participaram na campanha eleitoral do General Humberto Delgado, para eles o nosso obrigado pela vossa luta em defesa da LIBERDADE.

3 Comments:

At 15 de maio de 2006 às 16:32, Anonymous Anónimo said...

Homens e mulheres honestas, que nunca se serviram da política para nada.
Não são como os trafulhas/vigaristas que estão hoje no poleiro da CMPS.

 
At 15 de maio de 2006 às 18:03, Anonymous Anónimo said...

Como foi bonita a festa...
No 1º de Maio de 1974.
No correto do Jardim da Ponte, nas ruas da ponte...
O rosto dos homens e mulheres da ponte rebentavam de alegria.
A sua luta em prol da liberdade tinha valido a pena.
Bandeiras de Portugal que foram utilizadas na campanha de Humberto Delgado, tinha vindo para a rua festejar a liberdade de todos os da ponte...
Obrigado a todos vós combatentes da liberdade pela determinação.
Um forte obrigado a todos vós, ficaram, sempre no meu coração.

 
At 16 de maio de 2006 às 09:03, Anonymous Anónimo said...

A história foi-me contada muitos anos depois e não o foi por nenhum dos protagonistas. Assim, pode acontecer que alguns dos pormenores não estejam correctos)

O meu avô plantou-se desde manhãzinha à porta do local onde estava instalada a mesa de voto. Quando chegaram os membros da Mesa encararam-no com azedume e proibiram-no de permanecer nas instalações após ter votado. Nada disso o incomodou. Rodeado de alguns amigos, o velho republicano não arredou pé da porta durante todo o dia enquanto era informado das várias diligências em relação aos alertas junto dos eleitores mais esquecidos. Cada conhecido que entrava era cumprimentado e a maioria assegurava-lhe, baixinho, que seria mais um voto garantido no General.
Pouco antes da votação encerrar o meu avô estava eufórico - tudo indicava que "os republicanos", como ele dizia, iriam ter uma vitória retumbante, muito para além do esperado.
A contagem dos votos foi feita à porta fechada e só alguns responsáveis locais da Administração Pública foram admitidos a presenciá-la. Pressentia-se a hipótese de fraude mas a diferença entre os dois candidatos parecia tão grande que qualquer tentativa de trapaça eleitoral seria demasiado escandalosa - julgavam quase todos.
Finalmente os resultados foram anunciados. Sem qualquer pingo de vergonha, o candidato da Situação foi declarado vencedor por mais de 80% dos votos.
Houve protestos, dizem-me que até algumas gargalhadas. O meu avô terá ficado tão espantado que não esboçou qualquer reacção durante 1 ou 2 minutos. Mas quando os sicários do regime (muitos transitaram, tranquilamente, a partir de 1974, para o actual) se preparavam para abandonar o local, o meu avô não resistiu e invectivou-os o mais que pôde. Assustados, os situacionistas começaram a correr rua abaixo enquanto o velho republicano era acalmado pelos amigos. Mas não chegou - a Guarda, prontamente chamada pelos serventes da União Nacional, deu-lhe voz de prisão ali mesmo.


Telefonaram para o meu pai que era advogado no Porto - «Venha depressa, o seu pai foi preso! Perdeu a cabeça quando viu que tinham vigarizado os resultados do General.»
O meu pai não gostou: «De que é que estavam à espera? Então não viram que foi assim pelo país todo?». Meteu-se no carro e fez o mais depressa que podia as 3 horas que distavam aqueles cento e poucos quilómetros.
Mal chegado, foi directo para a esquadra e exigiu a libertação de seu pai. O Chefe da Guarda disse-lhe que não podia ser - «Tenho ordens para o deixar aqui até amanhã ao almoço.»
Foi a vez do meu pai azedar - «Ordens de quem? Do seu superior ou da União Nacional? Não o pode ter aqui, ninguém apresentou queixa.» O diálogo foi aquecendo.
Algum tempo mais tarde o meu avô ouviu a porta da cela a abrir-se. Sorriu, aliviado, quando viu o meu pai - «É para ir embora?», perguntou confiante. «Não», respondeu o meu pai - «achei que ia ficar aqui muito sozinho e resolvi fazer-lhe companhia».
E foi assim que no dia em que o país se enxovalhou numa imunda trapaça eleitoral, o meu avô e o meu pai passaram a noite juntos na prisão.

O país assim continuou, amorfo, medroso, abafado, bovino. Quando os assassinos do regime mataram o General Sem Medo o meu avô já não era vivo. O meu pai ainda viveu o suficiente para ver quase todos os defeitos da antiga Situação transportarem-se, incólumes, para o actual regime. O rebanho, esse, é sempre o mesmo.

 

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