terça-feira, 20 de novembro de 2007

A MEDIDA DE TODAS AS COISAS

Foi preciso chegar ao fim de uma entrevista congratulatória (ontem, ao DN e à TSF) para que Durão Barroso fosse questionado sobre a Guerra do Iraque e confessasse: Houve informações que me foram dadas, a mim e a outros, que não corresponderam à verdade.

Ouvir estas as declarações, bem como as dos restantes protagonistas da Cimeira dos Açores, é como ouvir as contraditórias desculpas de um grupo de rapazolas sobre uma noitada que correu mal. Cada um se justifica com os outros. Durão diz agora que só organizou o encontro porque os espanhóis lho pediram. É curioso: na altura toda a gente viu as piruetas que deu para poder aparecer na fotografia.



É embaraçoso para Durão, e mesmo escusado. Nós sabemos hoje muito mais do que as suas justificações insinuam. O memorando de Downing Street, publicado pelo Times em 2005, demonstra que quase um ano antes da guerra George W. Bush já tinha decidido invadir o Iraque. As informações e os factos iriam ser amanhados (fixed around no original) para justificar a decisão. Os seus aliados britânicos sabiam. As actas da reunião de Crawford entre Bush e Aznar, que o El País publicou recentemente, demonstram que um mês antes da guerra Bush recusara a ideia de Saddam abdicar e exilar-se no Egipto. Aznar sabia.



Sabemos hoje que Saddam poderia ter sido contido de muitas formas, já desde os anos 80, e que esta guerra deveria ter sido evitada. Perante isto, Durão diz que agora é fácil. Pelo contrário, Sr. Durão: não foi fácil então ser contra a guerra e não é fácil ainda hoje - desde fascistas a apoiantes de Saddam e a pró-terroristas já fomos chamados de tudo -, mas foi demasiado fácil, isso sim, ir na onda e cuidar da carreira.

Se falo em carreira é porque Durão diz na mesma entrevista que não gosta da expressão carreira política. Declarações portentosas vindas de quem, sobre a Guerra do Iraque, diz ainda o seguinte:

Não temos que estar de forma nenhuma arrependidos da posição que tomámos. Portugal não perdeu nada, também na Europa, com isso. Repare, depois das decisões que tomei, fui convidado a ser presidente da Comissão Europeia e tive o consenso de todos os países europeus. O que demonstra que o facto de Portugal ter tomado naquela altura aquela posição não prejudicou em nada, em nada, a imagem de Portugal junto dos seus parceiros europeus.

Durão Barroso pode não gostar da expressão, mas faz da sua carreira política a medida de todas as coisas. Aquelas frases sugerem bem como funciona a sua cabeça e a de tantos políticos como ele. Portugal não tem que estar arrependido do apoio à invasão do Iraque. Porquê? Porque não perdeu nada com isso. Não perdeu o quê: honestidade, credibilidade, autoridade moral? Nada de tais coisas; foi a nossa imagem que não sofreu. E como sabemos que a nossa "imagem" não sofreu? Porque a carreira de Durão o demonstra.

Esta é a mais pura inversão moral. A carreira de um indivíduo é a medida da imagem de um país. A imagem de um país é mais importante do que o seu comportamento. E a opinião dos parceiros - em geral mais ricos, poderosos e brancos - é mais importante do que o destino de gente que é menos qualquer dessas três coisas.

Muitos anos, muitos jornais e muitas crónicas depois, pergunto-me se será demasiado ter uma palavra sobre os quinhentos mil mortos e quatro milhões de refugiados desta guerra. Mas afinal, os portugueses não devem preocupar-se com isso, porque Durão Barroso veio depois a ser nomeado para um cargo importante. Mais alguma coisa interessa?


Rui Tavares

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11 Comments:

At 20 de novembro de 2007 às 10:40, Anonymous Anónimo said...

O bom do dr. Barroso, nesta entrevista, quer mostrar à pátria que nunca a esqueceu. Mesmo naquele momento de mesquinhez e de oportunismo em que desertou de 1º ministro para Bruxelas, era na pátria que pensava. Barroso já percebeu - basta falar com ele cinco minutos - que Sócrates precisa ser empurrado para as questões europeias e do mundo. Barroso, o cínico, leva-o pois de carrinho e, de caminho, a ele mesmo. Também não quer o "tratado de Lisboa" referendado - diz em letra de forma o que Sócrates ainda não pode dizer - e, ao contrário deste, já não é aprendiz de feiticeiro junto dos "grandes" do mundo a quem trata por "tu". Depois, afirma, tem saudades de Portugal e do sol. Quer regressar, não sabe, como de costume, quando e para quê. Nós sabemos. Só peço a Deus que não coloque as coisas de tal maneira que me force a ter de o engolir numa outra sua encarnação política. Decididamente não merecemos o dr. Barroso e o dr. Barroso não nos merece.

 
At 20 de novembro de 2007 às 10:59, Anonymous Anónimo said...

Chega com a sua "mulher de confiança", Leonor Ribeiro, colaboradora de anos. No carro vem também um segurança. Numa outra viatura viajam os dois filhos que assim aproveitam a companhia do pai. E, como por detrás do Presidente da Comissão Europeia está o Homem, esta entrevista terá também uma parte mais pessoal. É aí que o político que deixou cair o Durão quando assumiu a Europa se sente menos à vontade. Prefere falar de temas da alta política, área onde já estudou a localização de todos os alçapões que se lhe podem abrir. Sobretudo não gosta de revisitar os tempos em que foi primeiro-ministro. Ainda será cedo para as memórias nacionais e pode ser mau para um líder que hoje é mundial...

Qual foi, para si, o momento decisivo do acordo [sobre o Tratado Constitucional] obtido em Lisboa no mês passado?

Em relação ao Tratado de Lisboa, o momento decisivo foi o acordo a que se chegou durante a presidência alemã quanto à definição do mandato. Mas é justo reconhecer que sem a determinação da presidência portuguesa e sem o esforço feito para que todos se concentrassem naquele mandato e se conseguisse o acordo agora, já, no Conselho Europeu de Outubro, não teríamos ainda o Tratado aprovado por todos os países. Este foram os dois momentos decisivos, uma vez que se procurou ultrapassar o impasse institucional que se seguiu ao voto negativo em França e nos Países Baixos. Mas, se quisermos recuar, houve outros momentos importantes porque essencialmente logo a seguir ao voto negativo em França e na Holanda houve quem quisesse que a Europa entrasse em depressão, que a Europa abandonasse todo o projecto de reforma. Com determinação, foi possível evitar o bloqueamento das instituições ao mesmo tempo que se conseguiu criar as melhores condições para fazer renascer um consenso em torno de um novo Tratado, que já não é a Constituição Europeia como estava mas que é, sem dúvida, um Tratado que representa um progresso importante para a Europa.

Até que ponto o facto de terem coincidido dois portugueses à frente das instituições europeias ajudou a acelerar este entendimento a 27?

Bom, em primeiro lugar, fiquei obviamente muito orgulhoso por se ter conseguido este acordo, como disse [protagonizado por] dois portugueses: o primeiro-ministro José Sócrates à frente do Conselho e eu próprio à frente da Comissão Europeia. Com certeza [que isso ajudou], e tivemos sempre, como aliás o próprio primeiro-ministro já disse, uma excelente cooperação, uma cumplicidade permanente para chegar a este resultado.

Estamos a falar de muitos contactos diários?

Diários não direi, mas muitos contactos sem dúvida e não só entre nós próprios mas entre as nossas equipas. A União Europeia não consegue resultados se não houver uma excelente articulação entre a presidência do Concelho e a presidência da Comissão Europeia. Neste caso, o facto de sermos portugueses, de falarmos a mesma língua e de nos conhecermos muito bem, evidentemente ajudou. Fico satisfeito porque, como sempre disse, não sou apátrida, sou português. O presidente da Comissão Europeia procura defender o interesse geral europeu e tem de ser objectivo, não pode, digamos assim, jogar só para casa, mas a verdade é que sou português. E por isso fiz tudo para que os acordos se tornassem possíveis durante a presidência de Portugal.

Se, em vez de um português, na comissão estivesse um belga ou um irlandês, este Tratado poderia ter sido igualmente conseguido em Lisboa?

Francamente não sei. Mas há uma coisa que lhe posso dizer: um português à frente da Comissão Europeia representa também uma visão portuguesa da Europa. Aliás, o próprio primeiro-ministro [José Sócrates] - e talvez seja melhor citá-lo a ele, visto que talvez não me fique muito bem ser eu a dizer isso -, disse que tem sido muito importante ter um português à frente da Comissão Europeia. Mais do que no Tratado, importante mesmo noutras matérias. Por exemplo, imaginemos o que é ter alguém à frente da Comissão Europeia que não esteja verdadeiramente empenhado na coesão económica e social, que não queira uma Europa solidária com as regiões menos favorecidas, alguém que venha de um país daqueles que acha que já se gasta demasiado nos fundos estruturais... Com certeza que a perspectiva seria diferente. Ou imaginemos à frente da Comissão Europeia alguém que pensasse que é bom um directório dos grandes países, que quatro ou cinco países podem cozinhar entre si as grandes decisões e depois servi-las melhor ou menos bem preparadas aos outros... Portanto, o facto de ser alguém que vem de Portugal, que está empenhado na coesão económica e social na Europa, que pratica uma solidariedade social mais forte, alguém que queira que os pequenos e médios países tenham exactamente a mesma dignidade que as grandes potências europeias, obviamente que isso é uma visão também portuguesa e por isso eu estou satisfeito de poder levar a cabo esta agenda. E digo, sem qualquer espécie de pretensão, que isso é reconhecido hoje por um conjuntos de países que estão mais empenhados nestes valores.

Está a lançar a sua disponibilidade para um outro mandato ou está a falar apenas das vantagens que o presidente oriundo de um pequeno país pode ter à frente da Comissão Europeia?

Estava precisamente a responder à pergunta. Não estava aqui a lançar nenhuma candidatura a qualquer mandato. Mas, se me põe essa questão, devo dizer o seguinte: faltam dois anos para concluir o mandato da Comissão Europeia, o que normalmente no Governo é metade de um mandato. Por isso, neste momento, não acho oportuno pronunciar-me quanto àquilo que poderá acontecer daqui a dois anos. O que lhe posso dizer, também sinceramente, é que estou a gostar imenso do que estou a fazer, estou muitíssimo motivado. Voltemos, então, ao Tratado. Além da retirada do hino, da bandeira e dos outros símbolos federalistas, quais são para si as diferenças entre o Tratado Constitucional, chumbado em referendo por alguns países, e aquele que vai ser assinado no dia 13, em Lisboa?

Essencialmente, as diferenças foram as de retirar do Tratado aquilo que lhe daria precisamente essa natureza constitucional, como se a Europa fosse uma espécie de super-Estado. Não apenas os símbolos que referiu mas [há diferenças em] algumas outras questões.

Aceita a crítica de que o texto é demasiado complexo, com muitos links para outros acordos pontuais?

Tenho de aceitar, é verdade. Mas foi assim que os Estados membros quiseram. Depois da oposição que houve à Constituição, muitos ou alguns Estados membros disseram que tinha de se retirar aquilo que era, a meu ver, um dos aspectos positivos do Tratado Constitucional, que era dar uma maior coerência ao texto, aproximá-lo de um texto fundador. Ora, a opção que ganhou foi a seguinte: não, isto não é uma refundação da Europa, isto é um Tratado que vem modificar outros Tratados. Efectivamente houve uma modificação. Dito isto, ao mesmo tempo quero também reconhecer que o Tratado de Lisboa é sem dúvida um grande progresso em relação ao Tratado de Nice.

Não estamos, então, perante uma operação de cosmética?

Não, houve algumas diferenças. Por exemplo, em relação a alguns países que ficaram com o chamado optout [possibilidade de ficar de fora em algumas matérias do Tratado]. A Polónia, em princípio, vai manter o optout para a carta dos direitos fundamentais; ao Reino Unido não se lhe vão aplicar algumas disposições em matéria de polícia, segurança e justiça.

Quais são os aspectos essenciais em que este Tratado constitui um progresso em relação ao anterior?

Há três pontos fundamentais que são um progresso claro em relação à actual situação. [Primeiro] mais democracia. [Haverá] maior intervenção do Parlamento Europeu e até dos parlamentos nacionais, que podem ter uma certa intervenção no processo de decisão europeu. Depois, maior eficácia de decisão. Isto é muito importante. Só para dar um exemplo, houve 40 casos que até agora eram sujeitos a decisão por unanimidade e que passam a ser decididos por maioria qualificada. Isto pode parecer uma coisa técnica mas é importante. As pessoas compreendem que, numa união que tem 27 países, conseguir a unanimidade é mais difícil do que quando a união tinha apenas 15. Por isso, para evitarmos uma paralisação, foi aceite que haverá muitos mais casos em que se aplica a decisão por maioria qualificada. A terceira questão é maior coerência na política externa. O alto representante para a política externa, que hoje é o senhor [Javier] Solana actua hoje prestando contas apenas ao conselho, isto é, aos governos. O alto representante passará a ser vice-presidente da Comissão Europeia, ou seja, vamos conseguir ter na Comissão Europeia as dimensões intergovernamental e comunitária, o que à partida sugere que vamos actuar de maneira mais coerente na área externa. Estas são, a meu ver, as três inovações principais do Tratado.

Sente, então, que continuará a faltar esse momento fundador?

Eu, que sou europeísta, teria aprovado maior ambição, mas também sou realista e sobretudo sou democrata. Tivemos de encontrar uma solução não tão avançada, não tão ambiciosa, mas que representa também um progresso. É nesse sentido que eu julgo que não devem os europeístas ficar desiludidos.

Como é que o presidente da comissão europeia vê o problema específico da Bélgica, país sem uma solução governativa há meses? Como pode isso influenciar a aprovação deste Tratado?

A Bélgica tem, de facto, essa situação de crise política, mas [o Governo] funciona normalmente e por isso tem mecanismos jurídicos e constitucionais que lhe permitem assinar o Tratado. Provavelmente será ainda o primeiro-ministro do último governo, mas que está ainda em funções, que virá aqui a Lisboa. Depois haverá um processo de ratificação e eu espero que nessa altura haja um governo na plenitude das suas funções.

Houve algum acordo tácito entre os 27 para que não houvesse referendos na generalidade dos países?

Se houve, não dei por esses acordos. Só um país declarou a sua intenção de proceder a um referendo porque é constitucionalmente obrigado a isso: a Irlanda. Há países que proíbem expressamente nas suas constituições a realização de referendos sobre tratados internacionais. Dito isto, qualquer país tem o direito de ratificar o tratado como entende. Uma coisa posso dizer, como todos os países vão assinar nós esperamos naturalmente que ratifiquem. Um governo quando assina um tratado internacional está a assumir uma responsabilidade.

Além de presidente da comissão europeia, o senhor é português. Portugal nunca discutiu a Europa desde os tempos da CEE. Sendo que as forças portuguesas política e governativamente mais relevantes, o PS e o PSD, têm a mesma orientação nesta matéria, não seria agora uma boa oportunidade para fazer um referendo a propósito do Tratado de Lisboa?

Não posso entrar neste debate interno que sei que está a haver em Portugal sobre a questão do referendo. Às vezes apetece-me, mas tenho de me conter pelas minhas funções. Mas é tão legítimo, de um ponto de vista democrático, termos uma decisão por referendo como por voto parlamentar. Pode haver debates com ou sem referendo.

E os cidadãos europeus podem entender essa forma de decisão?

Normalmente as pessoas dizem todas que preferem o referendo, como é natural, e depois, curiosamente, não vão votar... Aliás, em Portugal, tanto quanto sei, os referendo não têm tido sequer a maioria necessária para serem vinculativos... Bom, o debate é interessante, mas sinceramente não quero que das minhas palavras depreendam qualquer orientação. Para a comissão europeia é tão legítimo um como o outro modo de aprovação do Tratado. O que eu não posso aceitar, como democrata que sou, é que se desvalorizem os parlamentos. Se não teríamos um populismo permanente.

A Europa passará a ter um presidente do conselho europeu não rotativo. Podem surgir choques frontais entre o presidente da comissão e o presidente do futuro conselho europeu?

Eu apoiei a ideia que está no Tratado de um presidente permanente do conselho. Inicialmente, quando era primeiro-ministro de Portugal, resisti bastante. Fiz parte, aliás, de um grupo de países que se opôs à formulação inicial dessa figura porque por detrás da proposta alguns viam aí o directório. [Alguns países] queriam escolher um presidente que fosse alguém de um dos grandes estados para de certa forma impor a vontade dos países mais fortes à generalidade dos países médios ou pequenos. E a Comissão Europeia tem sido sempre o aliado dos grandes, dos médios e dos pequenos, não apenas, uma emanação do interesse dos grandes. Bom, depois negociámos no sentido de garantir um certo equilíbrio de poderes que me dá satisfação e hoje eu apoio porque se conseguiu esse equilíbrio. Um dos pontos importantes do equilíbrio foi precisamente o alto representante de política externa. Apoio também porque é mais eficiente. É muito dispendioso em termos de tempo, de energia, estarmos a adaptar as agendas em função das presidências que mudam de seis em seis meses.

Quem é que vê as pessoas que se perfilam para esse cargo?

Bom, não posso, não posso...

Blair, o próprio Junker...?

Nem sob tortura me arrancam um nome. [risos]

A União Europeia tem muitos países à porta e os cidadãos interrogam-se até que ponto pode ir este mosaico, qual poderá ser a coerência final deste projecto. Como é que vê a questão? A União Europeia pode entrar pela Ásia através da Turquia? Pode ir até aos Urais?

A questão que se coloca é precisamente a Turquia e não vamos evitá-la. É uma questão mais séria, difícil. A opinião pública de alguns países opõe-se maioritariamente, com bastante expressão, a essa ideia...

Sobretudo a França e Alemanha...

Sim, e também a Áustria, por exemplo. E outros países. Mas foi decidido por unanimidade - unanimidade, insisto -, com o voto e o empenhamento grande da França e da Alemanha, começar negociações para a adesão da Turquia. Se se assumem compromissos com outros países e depois não se cumprem, que garantias haverá que o próximo compromisso é cumprido? Por isso, eu defendo que devemos continuar as negociações com a Turquia. Foi decidido unanimemente. Não foi decidido integrar a Turquia. Foi decidido começar negociações com a Turquia e depois tomar uma decisão em função do resultado das negociações. É necessário que a Turquia cumpra todos os requisitos políticos e económicos e é necessário também que a União Europeia esteja em condições de integrar a Turquia.

E a religião tem alguma influência?

O problema é muito esse. É cultural. É o problema de saber se um país esmagadoramente islâmico pode fazer parte de um conjunto que não tem essa religião. E eu quero acreditar que sim. Acho que seria um excelente sinal para o mundo que a religião não fosse um factor de divisão. Pelo contrário, que fosse possível plenamente afirmar [em conjunto]os valores democráticos, a dignidade da pessoa humana, o Estado de Direito, as liberdades e os direitos fundamentais, a igualdade de direitos entre homens e mulheres. A questão dos direitos das mulheres é aqui especialmente importante. Por isso, se me perguntam se gostaria um dia de ver a Turquia [aderir à UE] eu respondo: gostaria, mas uma Turquia plenamente democrática, avançada e moderna. E acho que não devemos fechar neste momento a porta a essa possibilidade.

Outro dos grandes problemas é o Kosovo. Hoje estão a realizar-se eleições naquele território. Está a esvair-se a esperança de um entendimento entre a Sérvia e o Kosovo e poderá haver ali uma declaração de independência que pode abalar as relações no interior da Europa. Como é que o Presidente da Comissão Europeia vê esta questão?

Com preocupação, sincera preocupação. E temos vindo a acompanhar. Não é uma competência em primeiro lugar da Comissão Europeia. Estas questões estão a ser acompanhadas nas Nações Unidas. E há um representante da União Europeia nessa troika, juntamente com os Estados Unidos e a Rússia, representante esse que reporta ao Conselho, isto é à presidência e aos Estados membros. Mas estamos a acompanhar com preocupação essa matéria, porque parece cada vez mais difícil o acordo entre Belgrado, isto é a Sérvia, e Pristina, capital do Kosovo. O que lhe posso dizer é que estamos a fazer um esforço para que as partes cheguem a um entendimento mínimo. Dia 10 de Dezembro haverá um relatório do secretário-geral das Nações Unidas sobre essa matéria e então teremos de tomar uma posição. Não posso neste momento antecipar qual venha a ser a posição. Para mim é muito importante procurar que os Estados-membros da União Europeia estejam unidos. Que não apareçam divididos.

E os Estados Unidos também, com a União Europeia...

Isso é outra coisa. O que me parece é que os Estados Unidos têm uma posição clara. A Rússia tem uma posição clara. A Europa terá uma posição clara? Essa é que é a questão. Espero que sim. E tem havido esforços para aproximar as posições dos Estados-membros.

Em que ponto está a definição da política energética comum dentro da União Europeia?

Está a avançar muito. Aqui há tempos seria quase um sacrilégio falar-se em política energética. Não estava nas competências da Comissão Europeia. Na presidência alemã conseguiu-se um acordo quanto aos princípios fundamentais. Agora estamos a discutir os detalhes e às vezes os detalhes são o mais difícil de conseguir, em termos de um acordo entre todos países. Já apresentámos uma série de propostas para o mercado interno de energia e vamos apresentar agora um pacote de medidas no que diz respeito à luta contra as alterações climáticas. Espero que os Estados-membros cheguem a consensos nestas áreas. É muito importante. A política energética, para mim, é uma das principais da Europa do futuro, porque é uma política que responde a uma necessidade económica, mas também a uma necessidade de segurança, e porque está ligada às questões de alterações climáticas, também a uma necessidade de conservação do nosso meio ambiente. A política energética está no centro das prioridades da União Europeia no século XXI.

E aí tem havido algum choques com o governo russo, nomeadamente com o Presidente Putin. Como é que tem evoluído essa situação?

A Rússia está com uma posição negativa em relação às nossas iniciativas. E nós estamos num diálogo com a Rússia, obviamente procurando defender o interesse europeu, que é aquilo que nos compete fazer. A Rússia está a querer valorizar muito a sua posição de fornecedor e nós estamos a fazer ver à Rússia que é do nosso interesse e do interesse deles termos uma interdependência positiva, mas não uma posição de dependência da Europa.

O desequilíbrio é muito grande, neste momento?

É sem dúvida alguma. Há perspectivas diferentes. Ainda agora, nesta cimeira de Mafra, foram discutidas. Temos estados a explicar aos nossos parceiros russos que temos de aplicar à energia as mesmas regras que aplicamos noutros sectores. [É preciso] evitar monopólios, evitar concentrações que limitem a concorrência e prejudiquem os consumidores. E que nos coloquem numa situação de dependência. Há países da União Europeia que estão quase cem por cento dependentes do gás que vem da Rússia. Não parece correcto, do ponto de vista da concorrência. Se nós aplicamos à Microsoft regras da concorrência , como aplicámos recentemente, e com grande êxito, (e não por qualquer posicionamento anti-norte-americano) também o devemos fazer na energia. Parece-nos incorrecto que uma empresa de um determinado sector tenha uma posição de tal modo dominante no mercado europeu que impeça a livre concorrência e venha a pôr em causa a segurança energética. Não é fazer um julgamento de intenção. É uma questão de princípio, garantir a concorrência livre no mercado. Nós, comissão europeia, fizemos algumas propostas que se forem aprovadas impedem uma empresa de um país terceiro de ter posições de controlo no sector energético na Europa. Acho que é uma boa proposta.

O que se faz contra países, como a China, que têm regras completamente diferentes?

Faz-se, precisamente, usando ao máximo a vantagem de termos um mercado de 500 milhões de consumidores. A Europa é, no seu conjunto, a maior potência económica do mundo. O valor agregado do produto interno dos diferentes países já é maior do que o dos Estados Unidos. E usando esse poder conjugadamente, negociando uma posição forte e coerente com a China, a Rússia, com os nossos aliados norte-americanos. É por isso que eu digo que a vocação da união Europeia no século XXI é precisamente gerir a globalização. A Europa, mantendo o mundo aberto, porque a Europa exporta e não pode fechar-se agora no proteccionismo, deve levar os outros a abrir também.

Disse ontem em Barcelona que o populismo é perigoso e estava a falar da América Latina e sobretudo daquele incidente entre o Rei Juan Carlos e o presidente da Venezuela, [Hugo Chavéz]. Como é que se relaciona hoje a Europa com uma América Latina cada vez mais influenciada nos movimentos basistas ou até mesmo na revolução cubana de há 40 anos?

É do nosso interesse, da Europa, temos uma excelente relação com a América Latina. Dada a convergência de tradições e culturas, Portugal e Espanha têm nisso um interesse específico. Dito isto, o nosso relacionamento deve ser feito na base de um diálogo político franco e aberto e não nos agrada que em alguns países da América Latina se volte a um discurso de uma retórica ultranacionalista, populista, demagógica, seja ela de direita ou de esquerda. A ideia de uma América Latina dos caudilhos é uma má ideia para a América latina, região que tem um imenso potencial. Aliás, alguns países já estão a crescer bastante, e não estou a falar agora daqueles países que têm reservas de petróleo extraordinárias e que [por isso] têm o rei na barriga, passe a expressão. Estou a falar daqueles que têm vindo mesmo a crescer. O caso brasileiro é notável. O Chile tem tido políticas admiráveis. A América latina tem um grande futuro se não cair outra vez na retórica dos caudilhos e dos populismos. Se vai por essa via não há investimento com confiança e o futuro não será grande coisa.

O que espera da cimeira com África?

Espero resultados concretos em várias áreas, nomeadamente na área da energia, na área da luta conjunta contra as alterações climáticas e alguns princípios de acordo no respeito às migrações entre África e União Europeia. Espero também um diálogo franco e aberto sobre as questões dos direitos humanos e em geral sobre a questão dita da governação: como ter uma melhor governação em África de forma a libertar o potencial imenso que aquele continente tem e que está ainda por explorar.

Até que ponto o incidente entre Gordon Brown e Mugabe pode pesar sobre a cimeira entre a UE e África?

Já tem sido dito, e bem, que não é uma cimeira da Europa com o Zimbabwe, é uma cimeira da Europa com África. Há um problema específico, mas não é o único problema que há em África em termos de direitos humanos. Há outros. Do ponto de vista mediático vai ter impacto, não tenhamos dúvidas, mas eu espero que para além disso haja espaço e tempo para um diálogo sobre as questões de fundo, incluindo aliás a questão dos direitos humanos e a situação do próprio Zimbabwe, que deve ser colocada com ou sem o presidente do Zimbabwe aqui.

In: Entrevista à TSF/DN
18/11/07

 
At 20 de novembro de 2007 às 11:02, Anonymous Anónimo said...

Pobre Europa

AS AMBIÇÕES DA UNIÃO EUROPEIA, proclamadas pelos seus dirigentes, são enormes. A famosa estratégia de Lisboa deu corpo a algumas delas. Apesar de ter falhado, está agora a ser ressuscitada. É, com o tratado constitucional e as afirmações destemperadas dos políticos europeus, um hino às aspirações ilimitadas. A Europa quer ser o continente da paz. O maior espaço económico do mundo. O conjunto de países mais inovador na ciência e na tecnologia. O que possui o melhor sistema de segurança social. O que alimenta o Estado de protecção mais humano do planeta. O que melhor recebe os imigrantes. O que trata com mais cuidado dos países pobres.
A União quer ainda ser respeitada pelos outros quase 200 países que pululam nas Nações Unidas. Quer ser parceiro indispensável na resolução de todos os conflitos do mundo. Quer ser pelo menos igual, em poderio, aos Estados Unidos da América. Quer falar com uma só voz e ter um presidente estável. Quer ter os mais elevados índices de crescimento económico e as mais baixas taxas de desemprego. Quer estar na vanguarda dos países que respeitam o ambiente. A Europa pretende ser uma espécie de modelo: a democracia mais avançada, mas também a mais social.
Mas a Europa não quer sofrer a concorrência “desleal” dos países asiáticos e africanos. Quer proteger os seus agricultores, sobretudo se falarem francês. Pensa em restaurar algumas formas de proteccionismo. Não quer gastar recursos com as Forças Armadas, nem criar uma defesa efectiva europeia. Quer que os Estados Unidos assegurem a nossa segurança, mas que o façam sob comando dos europeus. Para que tudo isto seja verdade, a Europa quer... mais Europa. Mais coesão, mais integração, mais federação, mais uniformidade, mais coordenação, mais eficácia, mais políticas únicas e menos forças centrífugas. O tratado constitucional é agora, dizem, o instrumento privilegiado para alcançar esses objectivos. É o meio indispensável à ambição. A diversidade europeia, que todos elogiam sem convicção, é vista como uma fragilidade. Reduzir esta variedade é o fim último deste tratado.
A história do tratado constitucional é a história de uma fraude política. Alguns povos recusaram a Europa mais ou menos federal, assim como a Constituição. Fez-se um tratado praticamente igual, mais complexo, mais técnico, mais incompreensível. Com os objectivos explícitos de enganar a opinião; de aprovar furtivamente o que tinha sido recusado; e de evitar que houvesse novos referendos. Os argumentos dos defensores do tratado e opositores dos referendos são intelectualmente pobres, politicamente autoritários, tecnicamente medíocres e moralmente condenáveis. Dizem que “não vale a pena”; que “o parlamento é tão legítimo quanto o povo”; que “é muito complexo e técnico” e, por isso, “incompreensível para o eleitorado”; que “é igual ao anterior”; e também que “é diferente do anterior”.
Não é só no método e no processo que este tratado é uma fraude. Também no seu conteúdo. Sob a aparência de um melhoramento, concretizado em competências marginais conferidas ao parlamento europeu, este tratado é um dos mais potentes recuos da democracia na Europa. O Parlamento europeu, pela sua natureza, estrutura e função, não é uma instituição favorável à democracia. Por outro lado, este tratado relega definitivamente os parlamentos nacionais para a arqueologia política e confere-lhes um estatuto tão relevante para a liberdade como o de uma qualquer direcção geral dos recursos hídricos.
A experiência portuguesa dos referendos é lamentável. Todos os partidos começaram por ser seus adversários. Depois, gradualmente, todos passaram a ser favoráveis, mas sempre na dependência das circunstâncias. Um partido só é a favor do referendo se a sua realização permitir alcançar certos objectivos. Evitar um incómodo interno do partido, como por exemplo com o aborto e a regionalização. Recuperar de uma derrota parlamentar. Abrir uma cisão dentro do partido adversário. Obrigar o partido adversário a acompanhar, mesmo contra a vontade. Proporcionar uma espécie de plebiscito. Condicionar o Presidente da República. Ser uma boa cobertura para a covardia, isto é, permitir que um partido, um governo ou um líder não tome posição.
Ninguém é favorável, por princípio, à realização de um referendo em momentos taxativos, como sejam as revisões constitucionais (nacional ou europeia) ou temas de excepcional importância. Ninguém é, por convicção, favorável a este mecanismo de democracia directa que pode, em determinadas situações, ser um complemento eficaz da democracia representativa. A cultura democrática em Portugal é medíocre, ínfima e oportunista. Nesta discussão, para Sócrates, Menezes, Portas e outros, as questões importantes são outras. Quem é o primeiro a tomar posição? Quem tem mais divisões internas, o PS ou o PSD? E se o governo disser que sim, mas o Presidente disser que não, o PS não ganha nos dois carrinhos? Se o PS e o PSD são ambos a favor da União, nenhum partido retira louros?
Mesmo nestas circunstâncias, o referendo europeu seria, especialmente para os portugueses (únicos que sobre o tema nunca se exprimiram), mas para os europeus também, uma oportunidade única, talvez a última, de dar a voz aos povos. De legitimar ou corrigir os planos estabelecidos e as estratégias seguidas. De contrariar a cada vez mais profunda clivagem entre política e sociedade, entre governos e cidadãos. Sem legitimação (ou reprovação) pública e popular, a “construção” europeia aumentará o abismo que a separa das sociedades e dos cidadãos. As grandes crises, como aquela em que vive a Europa, demoram anos, décadas. São geralmente agravadas pelos remédios fáceis que lhes são administrados. Dentro de algum tempo, este tratado terá talvez o mesmo destino que a folha de papel de Chamberlain.

António Barreto
In:Público
18/Novembro/2007

 
At 20 de novembro de 2007 às 14:13, Anonymous Anónimo said...

Terça-feira, Novembro 20, 2007
Carta a Durão Barroso


Caro Durão Barroso,

Escrevo-lhe para lhe manifestar a minha admiração que tenho por si, reforçada pela coragem que teve em assumir que foi enganado. Um engano qualquer um tem e se formos enganados por gente de reconhecido rigor e honestidade como Bush, Blair ou Aznar, mesmo que o tenham feito inadvertidamente ou com a melhor das intenções de nada nos podem acusar, não passaria pela cabeça de ninguém duvidar da palavra do George ou dos documentos da CIA onde se assegurava que o Iraque estava atulhado de armas de destruição em massa.

Confesso que estava a ficar preocupado, depois de Bush, Blair e Aznar terem reconhecido em público que tinha havido um pequeno engano comecei a recear que o seu silêncio poderia levar muitos a pensar que o responsável pelo erro era o Zé.

Enganos à parte foi azar, o passeio a Bassorá do Agrupamento Alfa teria sido um bom negócio se as coisas tivessem corrido bem, agora teríamos a Brisa a construir a auto-estrada entre Bassorá e Bagdad, a Efacec a construir o novo parlamento local, a Optimus a gerir uma rede de telemóveis e o primeiro-ministro do Iraque a beber o nosso tinto às escondidas. Enfim, fica para a próxima.

Mas correu quase tudo mal, os negócios não se fizeram e como se isso fosse pouco nem conseguimos vender a Galp aos amigos da Carlyle com dinheiro emprestado pela CGD. Restou-nos a gratidão e compreensão da Europa e o meu amigo teve um cargo à altura da sua dimensão. O reconhecimento que não teve por cá conseguiu-o na Europa onde todos os seus líderes lhe pedirem para esquecer a candidatura de António Vitorino e propor o seu próprio nome para o cargo de presidente da Comissão.

Fez bem, o interesse da Europa era o interesse do seu país e Santana Lopes já tinha provado na CML que daria um bom primeiro-ministro, foi cuidar da Europa e o país bem entregue. Só é pena que eu seja um dos poucos portugueses que o entende, que lhe reconhece mérito e consegue ver a sua honestidade e integridade.

Creio que acredito em tudo o que nos diz, acredito que foi enganado, acredito que só agora percebeu o engano, acredito que não traiu António Vitorino, acredito que foi para Bruxelas a pensar no interesse do país, enfim, acredito em tudo o que o Zé quer que eu acredito.

Não me alongo mais pois está na hora do intervalo aqui no Júlio de Matos.

Um seu admirador.
Abraço.

 
At 20 de novembro de 2007 às 14:14, Anonymous Anónimo said...

DURÃO BARROSO JULGA-NOS PARVOS

Ao justificar o seu apoio à invasão e destruição do Iraque Durão Barroso está a considerar-nos parvos, teria sido mais honesto se justificasse a sua opção por estar a apoiar dois amigos que foram determinantes pata a sua ambição, ser presidente da Comissão.

Durão Barroso não foi enganado, não leu os únicos documentos que haviam sobre a matéria, simplesmente leu o que lhe convinha ler, leu os documentos forjados pelos americanos que só convenceram os que estavam envolvidos na manobra de Bush. É bom recordar a Bush que durante meses os inspectores da ONU procuraram armas proibidas e não as encontraram.

Durão Barroso não foi enganado, tentou enganar os portugueses mas nem isso conseguiu. Vir agora justificar-se é um gesto de oportunismo e de cobardia. De oportunismo porque sabe muito bem que envolveu Portugal numa guerra com base em documentos falsos que foram produzidos para enganar a opinião pública. Cobarde porque sabendo desde o princípio da manobra em que se envolveu foi o último dos líderes presentes nas Lages a ter a assumir a sua responsabilidade.

 
At 20 de novembro de 2007 às 14:25, Anonymous Anónimo said...

Estamos bem governados, qunado sao eles proprios que se intitulam buros, quem assina d ecruz sem saber a verddae ou e burro ou analfabeto.
Bela Europa governada por tal gente

 
At 20 de novembro de 2007 às 14:37, Anonymous Anónimo said...

Este filho de um Cherne, mesmo depois de ver as consequências da sua atitude, das centenas de milhares de mortes de civis, mulheres e crianças, da fome, da miséria de que foi responsável, continua a chamar amigo aqueles que diz terem-lhe mentido e não mostra um pingo de arrependimento pelo que fez.
Pelo contrário, tem até a distinta lata de considerar que, toda aquela destruição e morte se justificaram só para ele poder ser Presidente da Comissão Europeia.
Tenho vergonha de este “parvalhão” ser português.

 
At 20 de novembro de 2007 às 14:40, Anonymous Anónimo said...

Tive oportunidade de ouvir a entrevista. O mestre de cerimónias da Cimeira dos Açores falava como se também ele tivesse decidido alguma coisa naquela reunião onde suou as estopinhas para aparecer na meia dúzia de fotografias que depois distribuiu entre a imprensa doméstica. Falava como a virgem enganada a quem tinham levado a honra com mentiras e quem o entrevistava não lhe perguntou porque nunca confrontou quem o enganou com essas mentiras. Realmente, seria uma pergunta duplamente tonta. Durão soube daquilo pela mera casualidade de ter sido o escolhido para anfitrião e tê-lo sabido ou não em nada alteraria o que depois aconteceu. E ainda mais tonta porque seria a última coisa que passaria pela cabeça daquele que mais lucrou com o sacrifício que fez em receber os outros três no seu estabelecimento. Serviço feito, serviço pago. A honra manchada não poderia ter tido melhor compensação. Ou então, ainda teriamos para aí um "Eu, José Manuel" a rivalizar com a obra da outra enganada Carolina.

 
At 20 de novembro de 2007 às 15:35, Anonymous Anónimo said...

Ninguém está livre de ser enganado por um mentiroso ou de ser arrastado por uma mentira.

Mas há mentiras em que só cai quem quer. Foi o caso da mentira sobre a existência de armas de destruição maciça com que se procurou justificar a invasão do Iraque e uma guerra que continua, mais de quatro anos depois. Desde que a decisão de invadir o Iraque foi anunciada, em 16 de Março de 2003, os protagonistas e figurantes da reunião dos Açores, um a um, foram admitindo que os argumentos com que justificaram a guerra constituíam uma mentira. O último a admitir a mentira foi Durão Barroso, ao tempo primeiro-ministro de Portugal e anfitrião do encontro, no ano seguinte graduado em presidente da Comissão Europeia.

De então para cá o Iraque foi mergulhado no absoluto caos e na total destruição. A guerra causou mais de meio milhão de mortos, um sofrimento não mensurável, um conflito que não tem saída. Entretanto, os alegres compadres da reunião da Lajes vão confessando com displicência que participaram na difusão de uma mentira planetária, como se confessassem a autoria de uma inocente peta do 1º de Abril. Todos são políticos profissionais, alguns foram punidos pelo eleitorado, mas todos continuam a exibir-se como protagonistas da cena política, personagens responsáveis, merecedores de crédito, dignos de prebendas, sem mácula para memória futura nem razão para remorsos. Não consta que algum tenha perdido o sono por ver diariamente as imagens dos horrores do Iraque.

Em Março de 2003 já se sabia que os argumentos para justificar a guerra constituíam uma mentira. Com essa data e nesse sentido, há um ror de pareceres técnicos e de opiniões. Caiu quem quis, por irresponsabilidade e/ou interesse.

 
At 21 de novembro de 2007 às 14:41, Anonymous Anónimo said...

Há uma passagem nas percepções de Pedro Santana Lopes que mostra José Manuel Durão Barroso.
É a ingenuidade contra a sagacidade – e, quando assim é, há o risco de um encontro no cume da cidade imperial com o mundo a seus pés. Conta Santana no livro em que mediu cada palavra: e ali estavam, num jantar em Roma, a sós, o narrador enquanto chefe de um governo que o amigo lhe deixou por um salto tão irrecusável quanto inesperado.
Ali estavam a cumprir um sonho que a metade de um todo sente como o alcance do destino.
Conhecemos os passos de quem não percebeu o que estava para acontecer e aconteceu; e o caminho de quem mediu cada passo como quem dá o primeiro e decisivo passo. Nada em Durão Barroso é por acaso mesmo quando parece um acaso. Quando agora diz que foi enganado por alguém que lhe deu informações erradas sobre o Iraque e que agiu por pressão de “aliados e amigos, sobretudo Espanha”, está a olhar longe.
É a sua verdade, aquela que jamais alguém desdirá.
Bush está de partida com um selo na testa onde se lê “incompetente” em todos os dialectos do planeta; Aznar viaja como conferencista sem futuro à vista que não seja o ócio; Blair passou a pasta antes de ser corrido por mau comportamento.
E Santana é voluntário numa aliança de duvidosa oportunidade.
No caminho de Durão não há espaço para imprevistos.
Não foi a cumplicidade no ataque ao Iraque que bloqueou o salto europeu – pelo contrário, a disponibilidade terá amparado a solução; não será o convívio com Sócrates que dificultará o regresso à pátria – pelo contrário, a solidariedade cria abrangência.
O caminho está em permanente construção e é nesse pressuposto que se deve enquadrar a assunção de um erro.
Involuntário, como convém.

 
At 28 de novembro de 2007 às 00:48, Anonymous Anónimo said...

O Dr. Durão Barroso mostra bem o estofo que têm a maioria dos políticos cá do País.Artistas de circo sempre prontos a saltar para o trapézio mais alto enquanto o povo cá em baixo fica á espera da queda que nunca acontece porque eles têm sempre a rede por baixo.

 

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