quarta-feira, 24 de setembro de 2008

OS TROPEÇOS DO CAPITALISMO

Anda por aí grande alvoroço sobre a crise do capitalismo. A falência estrondosa do que se considerava instituições financeiras inabaláveis encontrou cândidas justificações em comentários cuja leviandade destrói o sentido das coisas sérias.
Enquanto George Soros acusa os arautos do neoliberalismo financeiros de mentirosos e manipuladores e assegura, no seu livro The New Paradigm of Financial Market que o sistema actual está a chegar ao fim [José Vidal-Beneyto, in El Pais], um comentador português garantiu que o acontecimento funcionava como revulsivo. Assim, o capitalismo saía mais forte porque limpo das escórias.

Creio que Soros sabe do que fala.
Pelo menos tem a obrigação disso.
Poderoso financeiro de ascendência húngara, especulador fadado para ganhar, sempre foi prudente nas afirmações. E esta, no-lo prova.
Realmente, ele não prevê a data do fim.
Está a chegar, diz. Não, agora; talvez daqui a muitas décadas.
O capitalismo entreajuda-se: a sua sobrevivência nasce dessa capacidade impressionante de renascer das tormentas históricas. E nunca esteve interessado em promover um novo laço social.
Como afirmou Saramago: A vantagem do capitalismo é que nada promete, enquanto o socialismo promete quase tudo.
Quer dizer: não embala esperanças.
O individualismo cria cumplicidades estranhas e inesperadas convivências. E a crise espoletada nos Estados Unidos revela que esse elo societário é, sobretudo, uma junção de interesses que nada tem a ver com princípios.
As coisas estão mal?, recorre-se ao Estado. Não é o capitalismo que falhou: tropeçou, uma vez ainda. Aquela é a sua natureza, reveladora da crença em si mesma, associada ao lugar da família. O capitalismo sempre se regenerará. Até à etapa final.
Como ensinou Marx, previu Lenine e assevera George Soros.

O inevitável acentuar dos problemas económicos e sociais aumentará todas as incertezas.
As generalizadas mudanças de temperatura e de clima, as secas, as chuvas torrenciais, cada vez mais generalizadas, os impressionantes fluxos migratórios, as interrelações culturais, também actuarão em favor de alterações substanciais no sistema.
As exigências do capitalismo podem permitir a evolução das formas e das fontes de financiamento, mas a omnipresença do mercado não é uma fatalidade.

A questão reside, actualmente, na aparente impossibilidade de alternativa. Dos onze governos socialistas ou sociais-democratas que havia, na Europa, em 2000, apenas subsistem três.
Por força das propostas da Direita?
Não.
Em razão de todos eles, de um modo ou de outro, terem deteriorado a sua específica identidade ideológica.
Não reconhecendo os antagonismos dos intervenientes socioeconómicos e culturais, para que serve esta Esquerda?
A crise fornece-nos a resposta: para nada.


B.B.

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4 Comments:

At 24 de setembro de 2008 às 21:14, Anonymous Anónimo said...

A imagem que tenho do capitalismo, para além da miséria, da guerra, da injustiça, da morte e de um anafado porco de cartola e charuto a contar dinheiro, é a do fogo.
Um fogo que é tanto mais brilha quanto mais rapidamente que tudo consome numa verocidade que nem ele controla.
Sempre que se consegue libertar acaba por se consumir a si próprio, por se destruir, por queimar tudo aquilo que lhe dá vida, a matéria de que se alimenta.
Estamos numa dessas alturas e, com a liberalização dos mercados, a globalização e a ganância da especulação, libertaram o monstro autofágico, que rapidamente se consome.
O pior disto tudo é que na sua própria auto-destruição, no esturpor da morte não se coibirá de tudo arrasar, de tudo sacrificar para sobreviver mais uns breves instantes.
A queda dos mercados é o rebentar dessa espiral de lucro desenfreado e o vermos o estado mais capitalista do mundo, os EUA, a fazerem nacionalizações, não deixa de ser caricato.
Claro que, aquilo que está a nacionalizar são prejuízos, a transferi-los para os cidadãos ao mesmo tempo que os Bancos Centrais de todo o mundo colocam nas mãos dos mesmos especuladores que criaram a crise, muitos mais mil milhões que todos acabaremos por ter de pagar.
Quando iremos todos entender que este tipo de sociedade, que todo este consumismo, toda esta competitividade não pode sobreviver.
Quando irão os povos deste mundo decidir que chegou a hora de dar a volta a isto, de fazer deste mundo um lugar onde todos possamos viver em paz e em solidariedade.
Teremos certamente de perder muitas das mordomias e confortos que temos agora, mas pelo menos poderemos ter a esperança de ainda haver um amanhã.

 
At 24 de setembro de 2008 às 21:15, Anonymous Anónimo said...

Crise financeira mundial, especulação, mudança de paradigmas, subprime, falências em catadupa, globalização, fundos de pensões, deslocalizações, bolsas em baixa, questões energéticas, escassez de petróleo, quedas do crescimento, revisões em baixa, volatilidade, dívidas tóxicas, intervenções estatais, acusações e alarmes de toda a ordem e feitio… Lendo os jornais, ouvindo a rádio, vendo a televisão, perde-se o pé num mar encapelado de notícias sobre matérias de que, uns, percebemos muito pouco, e para que outros tentam fornecer pistas de enquadramento, sem que nenhuns possam ter a veleidade de acertar e sobretudo sem que o cidadão comum consiga ter uma perspectiva tranquilizadora ou, sequer, minimamente esclarecedora do que se está a passar.

O cidadão comum sente que, a pouco e pouco, vai sendo tramado na sua esfera pessoal. É tudo o que consegue vislumbrar. Começa com a prestação do empréstimo para compra de casa. Passa pelo preço do combustível que mete no carro. Vai vivendo de inquietação em inquietação e de incerteza em incerteza. E, se acaso é pequeno investidor, não deixa de ser induzido a entrar na bola de neve apesar de muito assustado: não faltarão consultores financeiros a dizer-lhe que se ganha mais fazendo jogadas rápidas numa situação de instabilidade como a presente…

No auge da crise, surgem medidas enérgicas dos bancos centrais e das autoridades financeiras, com o objectivo de evitar que se perverta por completo a economia de mercado em que o mundo ocidental está habituado a viver confortavelmente e que não tem alternativa, o que acarretaria consequências económicas e sociais de alcance negativo incalculável. Aos leigos como eu, parece que o capital quereria tornar-se um factor de produção em roda livre, subalternizando ou devorando a importância do factor trabalho e funcionando em rede imparável de bolsa para bolsa à roda do mundo, quando não de offshore para offshore, paredes meias com o terrorismo e com o crime mafioso. Mas haja calma. Não pode ser assim.

Face a estes problemas de alcance planetário, as questões do modelo social e, de um modo geral, as políticas de solidariedade e de emprego, estão longe de encontrar uma solução estável e harmónica e as próprias organizações internacionais terão grande dificuldade em traçar um rumo seguro e em criar mecanismos adequados de controlo ou de regulação. A questão é a de saber se as medidas em curso serão suficientes.

Há poucos anos, ainda as coisas estavam muito longe de atingir o ponto de desnorte e o coeficiente de irracionalidade em que se encontram actualmente, aventou-se que a situação estaria relacionada com a pressão fortíssima a que os gestores de capitais estavam submetidos no sentido de obterem imperativamente resultados cada vez melhores a apresentar às assembleias gerais de que dependem, de modo a serem mantidos nas suas funções. Isso terá levado a muitas concentrações e fusões de empresas e também a muitas deslocalizações e dispensas de pessoal, numa procura de redução de custos e optimização de ganhos que afectou inúmeras regiões da Europa, acabando por desumanizar completamente a concepção e o funcionamento das empresas e dando cada vez mais lugar a uma tradução alucinante da vida em números e dos números em metástases empresariais consecutivas.

O mais assustador e preocupante é a irracionalidade de proliferação de todos esses processos e a dificuldade de conceber como é que o Estado pode desempenhar com eficácia um papel corrector numa economia liberal. Mesmo sabendo--se que esta é uma situação limite, mesmo tratando-se tão-somente de combater as perversões do sistema, mesmo lançando mão de medidas excepcionais, há tantos factores em jogo e tantas interdependências em fase que ainda não é líquido que se possa chegar a uma regulação satisfatória.

Para já, se as recentes intervenções da administração Bush não conseguirem resolver o problema, a questão terá sido simplesmente adiada com avultadíssimos paliativos cujo custo acabará a ser suportado pelos contribuintes norte-americanos. Mas… e nesse caso a Europa? E quando é que o Governo português se deixará de manipulações e demagogias que não têm o condão de colocar Portugal ao abrigo dos cenários de worst case?

 
At 25 de setembro de 2008 às 18:18, Anonymous Anónimo said...

A realidade, há muito pressentida, chegou em força aos mercados financeiros. Os bancos e os consumidores têm finalmente algo em comum, estão afogados em dívidas e o mercado imobiliário não os deixa vir à tona respirar. Estamos a assistir a um colapso em tempo real. A tempestade do crédito, que começou nos EUA, já assola a Europa, a Rússia, o Japão, a China. Praticamente todo o mundo.

Vivemos um período em tudo semelhante ao pré crash de 1929. De facto, o rácio da riqueza entre os 0,01% mais ricos e os 10% mais pobres que desde 1929, até meados dos anos 80, andou nos 180-1, está agora em níveis de 880-1. Imediatamente antes do crash de 1929 era de 850-1. Na altura o móbil do crime foi o mercado de acções, hoje, é o mercado imobiliário.

Por isso, esqueçam o que lêem e ouvem nas notícias, e se estão à espera de um crash bolsista lembrem-se que a quando a bolsa crasha é porque tudo o resto já caiu também. «Toda a nossa economia está em risco» foi a missa cantada hoje de madrugada, pelo presidente Bush, ignorando que foram as políticas em louvor do “deus mercado”, que conduziram a esta situação. Os EUA já eram, mas o mundo inteiro ainda mantém a ideia contrária e toma decisões com base nas directrizes do império americano, ajudando os grandes tubarões a planearem a fuga e a deixarem o menino nos braços da classe média, cega por promessas de infalibilidade do sistema e incorruptibilidade do império. Conversa tal e qual a imposta nas vésperas da grande depressão de 1929. Por isso, em vez de termos uma grande depressão teremos uma enorme depressão.

Segundo 99% dos especialistas, economistas comentadores e outros, foi a "imprudência" dos "maus" gestores financeiros (banqueiros e outros) e a desregulamentação do mercado que trouxeram a crise ao sistema. Com tão bom diagnóstico os especialistas estão agora certos que as medidas entretanto anunciadas (encharcamento dos mercados financeiros com dólares e euros, nacionalizações de algumas empresas falidas, autorizações de concentrações sem olhar aos anteriores regulamentos "anti-monopólio") vão mesmo resolver esta crise. O problema é que ninguém acredita. Nem eles próprios.

 
At 1 de outubro de 2008 às 13:56, Anonymous Anónimo said...

o sério problema é que não há alternativas (pelo menos para os próximos 10 anos. Já todos vimos que o comunismo não funciona, as teorias Marxistas não passam disso, teorias que na prática não tem aplicabilidade. E vejam bem o Putim se saiu do poder, o Medveved é o sim senhor do chefe, o homen de mão que nem as aparências de autonomia política consegue manter. Comunas da treta vão pregar pra outro lado.

 

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