É DO CAMANDRO!
Meu, não dá para te passar tudo, mas é uma cena... Como é que t'hei-de dizer, assim uma cena um bocado marada que não dá prá agarrar logo! Tem bué de words novas, tu nem tosgas, eu pelo menos vejo-me à rasca. A profe também anda bimba com a cena, parece que não topa peva, é assim uma cena toda nova. Aquelas gaitas ca gente teve de encornar - os adjectivos, os verbos, essas cenas, 'tás a ver - agora tem tudo outros nomes, bué de compridos e depois cada cena com uma data de nomes.
Por causa daquele baril que no outro dia dizia na televisão que o fora de jogo "era consoante o árbito", até copiei a cena das consoantes que vem no paper: passou a haver consoantes surdas e sonoras mas, aguenta-te aí, que depois tens consoante oclusiva, fricativa, nasal, oral, lateral, vibrante e africada. Esta do africada julgo que é por causa dos blacks, e a minha miúda, que costuma ler os jornais, ficou lixada, diz que lhe parece é uma cena um bocado racista !
Acho que é uma lei que os políticos fizeram e depois os profes têm de andar com a cena e a gente é que amoxa! Passas a ter de meter nos cornos que há verbo principal impessoal, verbo pessoal intransitivo, verbo principal transitivo directo, verbo principal transitivo indirecto e verbo principal transitivo directo e indirecto, uma cegada! Lá o que são verbos, ainda perguntei ao meu velho lá em casa e o gajo lá disse umas coisas, até falou da cena do transitivo, mas aí já foi muita areia - mas agora isto tudo!
E, ainda por cima, dizem que é para a maralha aprender a escrever, a criar, como eles dizem, uma cena de "hábitos de leitura"! Topas, um gajo a querer ler uma cena numa curte porreira e vêm com esta trapalhada, mais vale um tipo agarrar as words do inglês, que dão para o computas e a malta até topa logo.
Houve um gajo - penso que é do sindicato ou uma cena assim, mas é fixe, alinha com a malta - que me disse que isto vem tudo do mesmo sítio, dos mesmos cromos do Governo e do Ministério que também andam a despedir os profes, a inventar aquela cena marada das "aulas de substituição", a correr com o pessoal que tratava lá da cantina e tudo isso, a fazer um granel do camandro nesta cena toda.
A minha esperança é que agora, com o TLEBS (topas? A Terminologia Linguística para os Ensinos Básico e Secundário) isto vai ficar uma curte muito mais fixe e vou ler o Fernando Pessoa.
Por causa daquele baril que no outro dia dizia na televisão que o fora de jogo "era consoante o árbito", até copiei a cena das consoantes que vem no paper: passou a haver consoantes surdas e sonoras mas, aguenta-te aí, que depois tens consoante oclusiva, fricativa, nasal, oral, lateral, vibrante e africada. Esta do africada julgo que é por causa dos blacks, e a minha miúda, que costuma ler os jornais, ficou lixada, diz que lhe parece é uma cena um bocado racista !
Acho que é uma lei que os políticos fizeram e depois os profes têm de andar com a cena e a gente é que amoxa! Passas a ter de meter nos cornos que há verbo principal impessoal, verbo pessoal intransitivo, verbo principal transitivo directo, verbo principal transitivo indirecto e verbo principal transitivo directo e indirecto, uma cegada! Lá o que são verbos, ainda perguntei ao meu velho lá em casa e o gajo lá disse umas coisas, até falou da cena do transitivo, mas aí já foi muita areia - mas agora isto tudo!
E, ainda por cima, dizem que é para a maralha aprender a escrever, a criar, como eles dizem, uma cena de "hábitos de leitura"! Topas, um gajo a querer ler uma cena numa curte porreira e vêm com esta trapalhada, mais vale um tipo agarrar as words do inglês, que dão para o computas e a malta até topa logo.
Houve um gajo - penso que é do sindicato ou uma cena assim, mas é fixe, alinha com a malta - que me disse que isto vem tudo do mesmo sítio, dos mesmos cromos do Governo e do Ministério que também andam a despedir os profes, a inventar aquela cena marada das "aulas de substituição", a correr com o pessoal que tratava lá da cantina e tudo isso, a fazer um granel do camandro nesta cena toda.
A minha esperança é que agora, com o TLEBS (topas? A Terminologia Linguística para os Ensinos Básico e Secundário) isto vai ficar uma curte muito mais fixe e vou ler o Fernando Pessoa.
R.C.
Para conhecer melhor o TLEBS ver: MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO
5 Comments:
Ler a legislação, li. Perceber, não percebi.
Pouco, um pouco, nada?
Pois é... novos nomes para velhos conceitos e agora? O que é ou deixa de ser o que é?
Alguns exemplos do TLEBS:
"O João ficou em segundo lugar"
"segundo" era um numeral ordinal; passa a ser um adjectivo numeral, porque qualifica em que posição o João ficou.
"Vem para aqui"
"aqui" era um advérbio de lugar; agora
é um advérbio adjunto de lugar
"A cobra é bonita"
"cobra" era um substantivo comum, feminino do singular; muda para nome comum, concreto, contável, não humano, animado, epiceno do singular. Era errado chamar-lhe "feminino" porque há cobras macho e fêmeas, por isso é "epiceno"
"Ele não viu nenhum homem"
"nenhum" era um determinante indefinido; agora é um quantificador universal, porque exprime um todo
Um artigo de Miguel Sousa Tavares que começa assim:
«O meu cão é um ser estranho de classificar. Geneticamente apto para caçar - o chamado “cão de parar” -, é pouco cão e pouco de parar. Em vez de “parar”, prefere perseguir e afugentar a caça, porque acha que, se eu o solto no campo, é para caçar para ele e não para mim. Afora isso, também tem mais de humano do que de cão - conforme já me tinha avisado o Manuel Alegre quando lhe contei que tinha um «épagnol bretton» (“cuidado, o tipo vai achar que é pessoa e que pertence à família!”). E, realmente, é verdade: tem um focinho que reflecte fielmente os seus estados de alma, os quais são puramente humanos: paixão, amor, alegria, segurança, conforto, ou ciúme, zanga, desconfiança, falta de paciência para me aturar. Insiste em ter o privilégio e a primazia na disputa dos melhores lugares dos sofás, tem o estranho hábito de me dar abraços quando me apanha a jeito e, de um modo geral, recusa-se a aceitar que haja coisas de humanos vedadas a cães como ele.»
E acaba assim:
«E depois fui pesquisar o que queriam ao certo fazer à minha velha gramática, companheira de tantos milhares e milhares de páginas produzidas não sei bem para quê. E declaro que descobri coisas fantásticas, sem dúvida impressionantes, todavia incompreensíveis, pelo menos sem uma acção de formação radical. Descobri que o simples artigo, o velho artigo definido, é promovido a “determinante artigo”: não percebo a vantagem, mas até aí ainda vou. O pior é quando me propõem designações como a “coerência pragmática ou funcional”, o “modificador”, o “designador rígido”, o “anafórico”, a “catáfora”, a “meronímia”, o “ataque da sílaba”, a “coda da sílaba”, o “agentivo”, ou uma coisa entre todas misteriosa chamada “ordem OVS”. Isto para já não falar do “género epiceno”, que tem a particularidade de se poder dividir em “variantes comuns” ou “comuns de dois”. Caramba, importam-se de falar português?»
A TLEBS [Terminologia Linguística para os Ensinos Básico e Secundário] só deveria entrar em vigor após três anos de experiên-cia pedagógica.
Todavia, em Março de 2005, no mesmo mês em que o Governo Sócrates entrou em funções, mas ainda antes, o ministério enviou às escolas uma circular, que já aqui citei por mais de uma vez, determinando que a TLEBS constituísse uma referência no tocante às práticas lectivas, à concepção de manuais e aos documentos produzidos em matéria de ensino e divulgação da Língua Portuguesa.
Ia-se irresponsavelmente longe de mais em matéria de experiência pedagógica. Na prática, organizava-se tudo para que a TLEBS entrasse logo em vigor. Com o absurdo de a "experiência" implicar desde logo a concepção de manuais...
O mais elementar sentido de responsabilidade de qualquer alto funcionário imporia se aguardasse mais uns dias ou umas semanas, até que a nova ministra pudesse decidir conscientemente em matéria de tamanha complexidade.
Vasco Teixeira, presidente da APEL [Associação Portuguesa de Editores e Livreiros], confirma que o ministério, não só então, mas posteriormente, induziu os editores a prepararem manuais em conformidade (DN, 23- -11-2006). Face a isto, vê-se também do DN que o adjunto da ministra, Ramos André, mete os pés pelas mãos.
E isto quer dizer que alguém se terá aproveitado da situação de transição entre governos para criar um facto consumado...
Consta agora que nada menos de 15 mil professores pedem a aplicação da nova terminologia. É falso.
Os professores foram ouvidos no processo de preparação da TLEBS, mas com vista à detecção de necessidades e lacunas.
Não podiam pedir a aplicação de algo que ainda não existia e cuja formulação final não podiam conhecer.
E tanto é assim que esse envolvimento de 15 mil professores vem referido... exactamente no preâmbulo da portaria!
Se agora se invoca a posição deles, completamente descontextualizada, é lícito supor que alguém estará a utilizar abusivamente documentação por aqueles assinada e colhida nessa fase para persuadir o Governo de que o processo é irreversível.
Incidentalmente, anote-se que Helena Soares (Público, 17-11-2006) diz resultar a TLEBS "de um trabalho de nove anos que envolveu 15 mil professores de Português". Qualquer leitor desprevenido é induzido a crer que uma portentosa legião de cérebros interveio activamente na elaboração das soluções consagradas na TLEBS. Ora, se Helena Soares tivesse feito a 4.ª classe na escola de antigamente de que fala com tanta displicência, teria ficado mais apta a ler e a reproduzir correctamente o preâmbulo da portaria, onde se refere "um conjunto de acções, amplamente participadas (foram envolvidos cerca de 15 mil professores dos ensinos básico e secundário), com vista à identificação de necessidades e lacunas"...
Mas quem é que está envolvido em tudo isto?
Quem fez parte da comissão, do grupo de trabalho, do núcleo produtor, do que quer que seja que um belo dia deu à luz a TLEBS? Ninguém?
Quem cozinhou uma coisa que se diz não obedecer a nenhuma teoria linguística específica não se apresenta?
Quem avaliza academicamente a cientificidade, a coerência e o rigor dessa culinária de compromissos sumiu-se?
Quem a conferiu na perspectiva dos ensinos básico e secundário, lhe deu a sua concordância, informou superiormente sobre ela e a levou a despacho do Governo é uma entidade difusa, obscura ou incógnita?
Quem analisou a coordenação do seu conteúdo com os restantes aspectos do ensino do português evaporou-se?
Quem ponderou os seus inconvenientes face à aprendizagem de línguas estrangeiras e à cooperação com os países de língua portuguesa desapareceu?
Quem decidiu mandar aplicar a nova terminologia por circular fica no anonimato?
Quem vai aferir progressivamente os resultados não tem rosto?
Quem certifica os novos manuais, em matéria tão confusa, não sai de um limbo turvo?
Quem anuncia a revisão periódica da TLEBS, mesmo que isso contrarie a validade dos livros escolares por seis anos, foi pregar a outra freguesia?
Quem previu a maneira como as crianças que começaram a aprender com uma terminologia vão passar a ter de utilizar outra não se assume?
De quem se trata afinal?
São sombras de recorte fantasmagórico? Funções predicativas? Ectoplasmas? Modificadores? Enteléquias? Disjunções? Lobisomens? Meras frases entrechocando-se à solta no espaço virtual? Espectros? Mónadas desgovernadas? O fantasma da ópera? Elfos vagueando ululantes pela calada das noites sem luar?
Não, senhora ministra. A culpa não é sua.
Mas, agora, a responsabilidade é.
Vasco Graça Moura
No: DN de 29/11/2006
A pedra filosofal
1. A ciência é dinâmica e a Linguística é um fascínio. As suas várias perspectivas constituem focos iluminantes na formação dos professores (em especial, de línguas). Mas o terramoto que a TLEBS desencadeia, incluindo discutíveis opções científicas, reside sobretudo nos planos pedagógico-didáctico, institucional, económico e político-cultural — planos que tenho desmontado em contextos vários (em longas entrevistas — à RTP 1, à Antena 1, ao DN, ao EDUCARE, etc., entrevistas de que, até agora, vieram a público apenas brevíssimos relâmpagos); na «Nota Explicativa» à Gramática Pedagógica e Cultural da Língua Portuguesa — Porto Editora, 2006; na revista 2Pontos:, etc.
2. A TLEBS agita-se, aliás, em atmosfera de estranho aroma a censura. Exemplifico: uma intervenção minha no jornal das 13H00 (5.Out., RTP1 — breves segundos de um depoimento de mais de uma hora) foi o único tema «rasurado» nos noticiários seguintes. Algo pior ocorreu com uma reacção minha à intervenção (a meu ver, penosa) que uma responsável da TLEBS divulgou no Público (7.Out.) e no Sol (8.Out.). Respondi nesse mesmo dia. Nem o Público nem o Sol se dignaram publicar a minha reacção. Foram ringue de uma posição unidireccional, mas não deram palco à voz contraditória. Quem tem medo da Liberdade?
3. Se me tenho mostrado hostil à TLEBS, é porque nela vejo sapatos de adulto para pezitos de criança. Como lembrei em obra recente (Blues pelo Humanismo Educacional?, 2006, p. 12), nenhum pediatra diz a uma criança: «— O menino foi acometido por uma crise gastromixorreica.». Dir-lhe-á, provavelmente: «— Dói a barriga, dói? Onde dói?» Será que esta «linguagem» faz dele um «médico» menos credível ou, pelo contrário, ao de[s]codificar o jargão científico, apenas demonstra que se trata de alguém mentalmente... são? Deixem que os pezitos das crianças calcem sapatinhos (linguísticos) à sua medida. E até, se necessário for, linguisticamente ortopédicos.
4. Quando responsáveis advogam que a TLEBS é fundamental para uma escrita correcta, Sá de Miranda, Camões ou Pessoa devem sorrir... Se tivessem sido mergulhados neste magma terminológico, acaso teriam sucumbido, enjoados ou arrastados na enxurrada conceptual que ela comprime e exprime.
5. E quando outros responsáveis afirmam que «a TLEBS é para professores», nada acrescentam ao que eu próprio tenho escrito. Mas esquecem duas coisas: não dizemos TL («Terminologia Linguística» — ponto final), mas TLEBS. Ora, é a segunda parte desse título — «para os ensinos básico e secundário»(!) — que tenho vindo a contestar.
6. Mais: a TLEBS, porque pouco acrescenta ao índice de um qualquer dicionário de Linguística, é perigosa (para crianças) e redundante (para professores). Nem é porto de partida, nem é ponto de chegada. Nem sequer é uma «nova terminologia», mas uma «nova e voluntarista teimosia» em emplastrar os ensinos básico e secundário com pastosas nomencla(tor)turas que, salvo um ou outro aspecto mais fecundo, não devem, à letra, ser usadas nestes níveis de ensino. Mas a transposição directa e pari passu de conceitos mal geridos e digeridos está já em curso. O que é, simplesmente, obsceno.
7. Nada tenho contra o uso de metalinguagens. Mas estas são como o Sol; tanto ilumina como, se olhado directa e fixamente, cega. Adivinha-se, pois, uma cegueira educacional. Como lembrei naquela obra: Que estranha língua nacional é esta, que em vez de agregar, segrega? Em vez de encantar, acantona? Em vez de atrair, trai?
8. Sobre a fragilidade científica de algumas das opções da TLEBS, muito haveria a dizer. Mas tomemos um mero exemplo. Nada há que permita a alguém insinuar, sem abuso, que rejeito o designador «nome» (já o usava em obras minhas de 1977!). Mas, quando, recentemente, Filomena Viegas convocava João de Barros como auctoritas nesta decisão da TLEBS, parecia ignorar os usos mítico-teológicos de tò onoma e de nomen (com milhares de anos), os lógicos, os filosóficos, os literários? Inacreditável!
9. Quem dá a estas Damas e Cavalheiros o direito de imporem algo que não é apenas do domínio de «especialistas», mas uma questão social? Compreende-se. É que a Grammatica da lingua portuguesa, com os mandamentos da santa mádre igreja... (de João de Barros, 1539), parece deixar claro que o nomen se funde no numen (divindade). Ora, ao “decapitar” o “substantivo” — manifestação da aristotélica ousia protê —, a TLEBS guilhotina uma das mais densas palavras da língua. Levasse a TLEBS às últimas consequências a sua gesta, saneando todas as designações equivalentes, e corporizaria a concentracionária sociedade descrita por Orwell.
As nomenclaturas (nomenclator era o escravo que «procedia à chamada») e as guilhotinas não são enfeite de iluministas, mas efeito de pseudo-iluminados.
10. Tudo isto seria mero pormenor, no plano micro, se não fosse pedra filosofal da cidadania, no plano macro. Humboldt avisou-nos (e nem Saussure nem Hjelmslev o infirmam): as línguas não são weltbild (etiqueta), mas weltansicht (visão), plural. Por isso a Liberdade não é apenas um nome ou uma nomenclatura. É um fenómeno substantivo. Pluralmente articulável, mas? muito singular.
Álvaro Gomes
In: Jornal de Letras, Artes e Idéias
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