quarta-feira, 1 de agosto de 2007

NOTÍCIAS DA CACHOEIRINHA

Na escola primária da simpática vila da Cachoeirinha viviam-se horas de frenético alvoroço. O director, Filomeno Semicúpio, os professores, os alunos, os encarregados de educação e até o pessoal menor tinham ficado entusiasmados com o Plano Tecnológico e Educativo anunciado pelo Governo.

Numa reunião convocada pelo director, deliberou-se exprimir devidamente esse regozijo. Ainda não tinham chegado os computadores prometidos, mas foi possível reunir uma dúzia deles para a cerimónia prevista, graças à cooperação de alguns pais e de alguns empresários, que os emprestaram.

O professor Juvenal, que era muito habilidoso, criou um painel de cartolina branca que foi afixado sobre o quadro preto e, com papel de lustro de várias cores, recortou triângulos, quadrados, circunferências, rectângulos e trapézios, colando-os com cola Cisne no painel. Parecia mesmo electrónico.


Chegado o grande dia, com os representantes das forças vivas e os demais cavalheiros engravatados a preceito, as senhoras muito bem postas, as meninas com laçarotes no cabelo e vestidos de organza aos folhinhos cor-de-rosa, e os meninos, muito penteados, de calça azul escura e camisa também cor-de-rosa, doze criancinhas sorridentes mostraram como era fácil utilizar cada ratinho de cada computador para desenhar as figuras geométricas que estavam no painel.

O professor Cereja, responsável técnico da operação, explicou que tudo aquilo seria interactivo quando funcionasse a valer. A professora Eládia, que dava Aritmética, garantiu que assim os meninos iam ser dispensados de aprender a tabuada e as quatro operações, porque o computador fazia essas tarefas enfadonhas por eles. O professor Faneca, da aula de Português, asseverou que as crianças assim até se livravam do pesadelo da TLEBS.


Depois de muitas palmas, o director Semicúpio falou do estrado, agradecendo ao Governo e ao PS esta medida destinada a revolucionar o ensino em Portugal e a despertar, logo desde a infância, o potencial de inovação e desenvolvimento do País.


Houve mais palmas calorosas e então falou também o primeiro-ministro. Evocou a Estratégia de Lisboa, a Europa, o País, a escola, as responsabilidades para com as gerações mais novas, o papel salvífico do Governo e do PS. A seu lado, a ministra da Educação e o ministro da Ciência sorriam num enlevo doce. E houve ainda mais aplausos, apertos de mão, palmadas nas costas e beijinhos, enquanto os meninos chupavam rebuçados.

O correspondente local da RTP, Isolino Capilé, não tinha sido avisado. Regressava à vila, depois de ter ido filmar sete peixes mortos num riacho poluído, quando viu aqueles automóveis todos à porta da escola, percebeu que era coisa importante, pôs a câmara a funcionar, praguejou contra a Direcção de Informação que não lhe tinha dito nada, e ainda conseguiu gravar os discursos do director e do primeiro-ministro e a maneira enternecedora como os meninos estavam a divertir-se com os ratinhos aos ziguezagues no tampo das carteiras.

Quando as altas personalidades foram visitar o resto da escola, o Isolino ainda conseguiu puxar pela banda do casaco do director Semicúpio e suplicou-lhe fizesse umas declarações em exclusivo para a RTP, ainda a tempo do Telejornal das 20.00.

- É um momento maior para a vila da Cachoeirinha, para a região e para o País, começou a dizer enfaticamente o director Semicúpio. Graças ao Governo e ao PS, estamos a dar passos firmes em direcção ao futuro. E nós

O Isolino interrompeu-o à boa maneira dos entrevistadores da RTP:


- O primeiro-ministro parecia muito satisfeito

O director Semicúpio empertigou-se:

- Primeiro-ministro? Que primeiro-ministro?, perguntou surpreendido.


- Ora essa!, O Sócrates! Então ainda agora o filmei lá dentro, atarantou-se o Isolino.

- Homem! Você é parvo? Primeiro-ministro uma ova! Isto não foi uma cerimónia do Governo, mas sim uma cerimónia de apoio ao Governo e ao PS. O Sócrates e o Governo andam muito ocupados com a presidência portuguesa e não têm tempo para cá vir. Chamámos uma agência que tratou de tudo, contratou os figurantes, pagou 30 euros a cada um, e um desses é que veio fazer de primeiro-ministro.

Vasco Graça Moura

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1 Comments:

At 1 de agosto de 2007 às 12:39, Anonymous Anónimo said...

Foi dolorosa, pareceu-me, a prestação da ministra da Educação no Parlamento. Quando penso em alguns nomes - deste e do outro regime - que a antecederam no cargo, pior é praticamente impossível. Maria de Lurdes até nem tinha começado mal. Depois perdeu-se por causa de querer meter o professorado todo no mesmo saco de gatos. A seguir demonstrou que, afinal, o "monstro" acéfalo da 5 de Outubro permanecia, inerme, no alegre fomento da idiotia nacional logo a partir da idade do bibe. Os episódios sucessivos com os exames nacionais são dignos do Burundi e não de um país que preside à União Europeia. Finalmente, a ministra caiu na esparrela de ir ao Parlamento defender um processo administrativo indefensável, com um argumentário tosco que algum assessor lhe pôs à frente dos olhos. Tentou a dialéctica e a técnica do ovo e da galinha. Insulto? Processo? Processo? Insulto? O que é mais grave? Se era assim tão grave, punisse e não arquivasse. Era intelectualmente mais honesto do que a conversa que manteve com os deputados sobre o assunto. Isto para não falar da triste figura dos deputados do PS que usam a cabeça como tapete para o governo limpar os pés. Maria de Lurdes é uma estrela cadente deste governo. Se ainda não percebeu isso, vai a tempo de meter explicador. Nem sequer precisa de exame nacional. Está chumbada.

 

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