NEGÓCIO DA FOME...
Aparentes ações de grande solidariedade, as campanhas de recolha de
alimentos para carenciados constituem, isso sim, agressivas operações
comerciais.
Quem acaba por mais lucrar são supermercados e
hipermercados, que veem as suas vendas aumentar.
A seguir vem o estado,
pois este acréscimo de consumo representa também aumento na coleta de
impostos.
E os pobres dos pobres que justificam as campanhas são,
afinal, os menos beneficiados.
Em dias de recolha
de alimentos, as grandes superfícies aumentam consideravelmente as suas
vendas, sem sequer necessitarem de promoções ou até de qualquer trabalho
de marketing suplementar.
As administrações do Pingo Doce e do
Continente, que no seu conjunto detêm cerca de 90% do mercado de
distribuição, devem rejubilar com esta campanha comercial, disfarçada de
ação solidária.
Ano após ano, os Bancos Alimentares contribuem para o
acréscimo da sua faturação em dezenas de milhões de euros.
Parte
significativa deste montante engorda os lucros das empresas de
distribuição.
E não só. Também o estado tira
proveito deste acréscimo de consumo, pela via do IVA que é cobrado, em
muitos dos produtos a 23%, o que representa também milhões de euros.
Assim,
os voluntários da Cruz Vermelha que participam na ‘Operação Sorriso'
cumprem a função (involuntária) de promotores de vendas do Continente.
Os milhares de jovens que colaboram com o Banco Alimentar julgam estar a
ajudar as famílias portuguesas, mas as famílias que mais beneficiam das
campanhas de recolha de alimentos são as de Belmiro de Azevedo e de
Soares dos Santos.
A maior parte da ajuda fica
pelo caminho, chegando às centenas de milhares de necessitados apenas
uma reduzida percentagem do generoso esforço financeiro dos portugueses.
E está mal aproveitado o trabalho abnegado de milhares de voluntários
bem-intencionados que são usados, sem disso se aperceberem, como peças
de uma máquina comercial.
Para que as operações de oferta de alimentos
aos mais carenciados sejam eficazes, há que encontrar esquemas
alternativos de distribuição direta dos recursos.
A atividade solidária
não necessita de ser taxada com IVA nem de intermediários que retêm a
maioria do valor dos donativos, como é o caso dos hipermercados.
Paulo Morais
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